Acórdão nº 51064684020208210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quinta Câmara Criminal, 09-05-2022

Data de Julgamento09 Maio 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo51064684020208210001
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001705131
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

5ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Criminal Nº 5106468-40.2020.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: Estupro (art. 213)

RELATOR: Desembargador IVAN LEOMAR BRUXEL

APELANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

RODRIGO C., 44 anos na data do fato (DN 09/03/1976), foi denunciado e condenado, por incurso no artigo 213, caput, (duas vezes), do Código Penal.

Os fatos, ocorridos na comarca de Porto Alegre, foram assim descritos na denúncia, recebida em 25/11/2020 (abreviaturas ausentes no original):

1.º FATO:

No dia 15 de abril de 2018, por volta das 23h48min, em lugar incerto e não sabido, em Porto Alegre, RS, o denunciado RODRIGO C., mediante grave ameaça, consistente no uso de faca e ameaças verbais, constrangeu a vítima Franccielle S.S. a ter com ele conjunção carnal.

2.º FATO:

Nas mesmas circunstâncias de tempo e local, em Porto Alegre, RS, o denunciado RODRIGO C., mediante grave ameaça, consistente no uso de faca e ameaças verbais, constrangeu a vítima Franccielle S.S. a praticar com ele ato libidinoso diverso da conjunção carnal.

CIRCUNSTÂNCIAS COMUNS AOS FATOS:

Por ocasião dos fatos, a vítima, que trazia seu filho no colo, desceu por volta das 19h, de um coletivo na E.K., Vila Nova, em Porto Alegre, e atravessou a rua, momento em que parou um veículo na sua frente e dele desceu o denunciado, que abordou a vítima, lhe agarrando pelo braço e ordenando que entrasse no carro. Diante da negativa da vítima, o denunciado ameaçou de dar um tiro no seu filho, ato que fez com a vítima ingressasse no automóvel.

Na sequência, o denunciado, privando a vítima de sua liberdade, passou a andar de carro com a vítima, até que, em determinado momento, mandou que ela fechasse os olhos a levou-a para uma casa abandonada. No trajeto, o denunciado dizia para a vítima que já tinha ficado preso e que se ela gritasse a mataria.

Ao desceram do carro e ingressarem na casa, o denunciado ordenou que a vítima tirasse a roupa, pegando, em prosseguimento, uma faca, que colocou nas costas da vítima e passou a manter com ela conjunção carnal e atos libidinosos diversos da conjunção carnal, consistentes em sexo oral e tentativa de sexo anal.

Os atos sexuais foram praticados na presença do filho da vítima.

Depois do denunciado ter violentado a vítima, mandou ela entrar no carro e, novamente, mandou fechar os olhos, largando-a no bairro da Restinga.

A vítima, posteriormente ao fato, compareceu na Delegacia de Polícia e reconheceu o denunciado como autor do delito (auto de reconhecimento pessoal na fl. 26 do IP).

A DEFESA apelou, agitando preliminar de inobservância do artigo 226 do Código de Processo Penal. No mérito, pretende absolvição, alegando insuficiência probatória. Subsidiariamente, busca a redução da pena, o afastamento do concurso formal e a isenção das custas processuais.

Oferecida contrariedade.

Parecer pelo improvimento.

É o relatório.

VOTO

- PRELIMINAR. NULIDADE DO RECONHECIMENTO.

Questão assim examinada na sentença:

Da Preliminar.

Em que pese os argumentos trazidos pela defesa - sobre a desconformidade do reconhecimento realizado na esfera policial - verifica-se que as determinações constantes no art. 226 do CP - em sua grande maioria - foram seguidas pela Autoridade Policial - eventos 1 - "INQ1" do IP n.º 5100350-48.2020.8.21.0001 quando do ato do reconhecimento pessoal do réu. De qualquer sorte, o ato – reconhecimento – constitui apenas elemento de convicção acerca da autoria delitiva, cuja força probatória é relativa e depende, inexoravelmente, de corroboração por outras provas.

De qualquer sorte, eventuais inobservâncias das regras insertas no art. 226 do CPP não afastam a credibilidade do ato quando firme o reconhecedor na convicção de que a pessoa apresentada protagonizou o ato delitivo, ainda mais quando a descrição narrada pela vítima condiz com as características do acusado.

Portanto, afasto a preliminar.

O procedimento para reconhecimento de pessoas que trata o artigo 226 do Código de Processo Penal, mesmo que efetuado na fase policial, seja fotográfico ou pessoal, se possível, deverá ser efetuado de acordo com as diretrizes ali estabelecidas.

A interpretação legal da jurisprudência majoritária, tanto nesta Corte quanto no e. Superior Tribunal de Justiça, há tempos inclinou-se no sentido de que o procedimento do artigo 226 do Código de Processo Penal é meramente recomendatório e eventual inobservância das diretrizes não configura nulidade, necessariamente.

Não obstante, verdade que recentemente as Turmas do e. Superior Tribunal de Justiça e o e. Supremo Tribunal Federal voltaram a discutir a matéria, admitindo reconhecer nulidade em casos especiais, no caso de único elemento de prova, mas tal não foi dotado de repercussão geral, tampouco de efeito vinculante.

Além disso, neste caso, a prova não se limitou ao reconhecimento fotográfico. Por óbvio, se o reconhecimento como foi efetuado não for suficiente, ou existir indícios de indução, ou erro no apontamento, ausentes outras provas, o desfecho será outro.

De qualquer sorte, é o caso de repetir, já que insistentemente colocado o tema pelas defesas, que o mero reconhecimento, seja pessoal ou fotográfico, na fase policial, necessita ser renovado em juízo, por ocasião do contraditório, e se tal não acontecer, pouco - ou nada - valerá.

Assim, a insistência na questão é de pouca utilidade.

E válido acrescentar, ainda, como se verá mais adiante, que, no caso em tela, a vítima foi levada para uma casa abandonada, depois foi estuprada por ele. Toda essa cena foi presenciada pelo filho da ofendida, que contava apenas com um ano de idade à data do fato.

Então, dificilmente a vítima esquecerá o rosto do autor do(s) fato(s).

A presença de falsas memórias, como sugere a DEFESA, sequer foi comprovada nos autos.

Sendo assim, não há nulidade a ser declarada, motivo pelo qual merece ser rejeitada a preliminar.

- MÉRITO.

Esta a fundamentação da sentença (abreviaturas ausentes no original, contrariando as recomendações do Of. Circ. 001/2016-CGJ, art. 25, XVIII da Cons. Normativa Judicial, e Resolução 01/2017-OE/TJRS):

Do Mérito

A existência dos fatos restou comprovada pelo laudo pericial n.º 58194/2018 - "INQ1", pelo auto de constatação e verificação de imagem -"INQ3", ambos do IP n.º 5100350-48.2020.8.21.0001 e pelo laudo pericial n.º 58975/2018 - evento 136.

A autoria, diante do conjunto probatório, é induvidosa. As provas produzidas sobre o contraditório convergem para um decreto condenatório.

Nesse sentido, a ofendida F. S. dos S. narrou que retornava da residência de sua genitora no domingo com seu filho. Falou que após descer do ônibus na Estrada Kanazawa, viu um veículo GM/Corsa, de cor prata, parar logo a frente, tendo uma pessoa começado a mexer no porta-mala do automóvel. Destacou que continuou a caminhada com o filho no colo até ser interpelada pelo indivíduo, que simulando pedir uma informação, e ordenou que entrasse dentro do carro, não gritasse ou chorasse, pois não se importava, visto já ter ficado preso por dez anos. Afirmou que foi colocada dentro do automóvel com seu filho tendo mantido os olhos fechados, por ordem do criminoso, por todo o trajeto até a residência com portão amarelo, onde estava escrito DMAE pintado. Referiu que a casa/peça era distante do portão, sendo que dentro do local havia facas e uma lareira. Informou que foram para o quarto onde foi abusada sexualmente, enquanto o filho chorava. Narrou que após a violência sexual pode colocar a roupa e foi deixada em uma rua deserta do Bairro Restinga. Revelou que o fato ocorreu por volta das 19 horas. Contou que ao descer do ônibus na parada estava sozinha com o filho. Destacou que quando da abordagem do criminoso este usava uma faca, a qual inclusive foi encostada em suas costas. Mencionou que durante o trajeto até o local do crime, foi no banco do carona chorando muito e pedindo para que a soltasse e não fizesse nada, inclusive com seu filho. Durante a violência sexual sofrida só não retirou a blusa. Ponderou que durante todo o ato de conjunção carnal sofrido, sem preservativo, e com ejaculação, foi presenciado pelo infante. Negou a existência de sexo oral, mas a existência da tentativa de sexo anal. Contou que após ser deixada em uma estrada asfaltada e com mato seguiu em direção oposta ao do agressor, visto a ameaça recebida. Falou que encontrou um indivíduo que indicou o local que estava e após pegou um ônibus para retornar para casa e quando chegava foi localizada pela polícia, visto que os familiares já teriam comunicado o seu desaparecimento. Descreveu o ocorrido aos policiais sendo conduzida para exames. Alegou que acredita que o agressor tenha sido preso no início do ano de 2021, pois compareceu na delegacia e efetuou o reconhecimento pessoal do acusado com certeza. Falou dos traumas suportados até o momento em decorrência do crime, bem como o fato de ter parado de amamentar o filho, o qual tinha 1 ano a época, visto os remédios que necessitou tomar em virtude do ato sexual ter ocorrido sem preservativo. Mencionou que gostaria de ajuda técnica para amenizar os traumas. Comentou que atualmente o filho possui quatro anos e aparentemente não ficou com traumas.

A informante S. R. G. C., esposa do acusado, contou que desde a prisão do réu não manteve mais contato com o acusado. Descreveu a rotina de conduta de trabalho do réu e os horários de intervalos para almoço. Mencionou que acreditava que o nervosismo do acusado era por preocupação em razão do fechamento da escolinha na qual trabalhava, em virtude da pandemia. Revelou que tinha o hábito de verificar o local em que o marido estava pelo GPS e quando indagava dos locais diferentes da sua rotina o réu desconversa e desligava o sinal de...

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