Acórdão nº 51109015320218210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Primeira Câmara Cível, 01-06-2022

Data de Julgamento01 Junho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo51109015320218210001
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoVigésima Primeira Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002212131
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

21ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5110901-53.2021.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: ICMS/ Imposto sobre Circulação de Mercadorias

RELATOR: Desembargador MARCELO BANDEIRA PEREIRA

APELANTE: GRANJA PINHEIROS LTDA. (IMPETRANTE)

APELADO: ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (INTERESSADO)

RELATÓRIO

GRANJA PINHEIROS LTDA. apela da sentença de improcedência proferida nos autos do mandado de segurança impetrado contra ato do SUBSECRETÁRIO DA RECEITA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. A pretensão contida na inicial é de aproveitamento dos créditos de ICMS relativos a mercadorias destinadas ao uso e consumo por seu estabelecimento na proporção de sua receita das operações de exportação.

Sustenta que a restrição temporal contida no art. 33, inciso I, da Lei Complementar nº 87/96 somente é aplicável à operações internas, uma vez que a Constituição deu tratamento favorável àquelas que destinam bens e serviços ao exterior. Sustenta que os arts. 20, § 3º, e 21, § 2º, da Lei Kandir excepciona as operações de exportação da regra geral de incidência do imposto, determinando que não sejam estornados os créditos pela entrada de bens destinados a uso e consumo, sendo tal regra reforçada no art. 32, inciso II. Aqueles dispositivos permitem a manutenção dos créditos na proporção das operações que destinem mercadorias ao exterior. Salienta que, com a entrada em vigor da Emenda Constitucional nº 42/2003, que alterou o art. 155, § 2º, inciso X, "a", da CF, não mais se pode onerar as exportações com impostos, tratando-se de regra de imunidade, não estando sujeita a limitação temporal imposta por lei complementar. A Constituição assegura expressamente a manutenção e aproveitamento do ICMS pago nas operações anteriores à exportação. Tece considerações acerca da forma de cálculo do percentual das receitas de exportações. Requer a procedência da pretensão contida na inicial.

Foram apresentadas contrarrazões pugnando pela manutenção da sentença.

O Ministério Público opina pelo desprovimento do recurso.

É o relatório.

VOTO

Busca a impetrante seja autorizada a manutenção e o aproveitamento dos créditos de ICMS relativos a mercadorias destinadas ao uso e consumo por seus estabelecimentos na proporção de sua receita das operações de exportação, sem que lhe seja oposta a limitação temporal prevista no art. 33, inciso I, da Lei Complementar nº 87/96.

Sua fundamentação tem como base os seguintes dispositivos da Lei Kandir:

Art. 20. Para a compensação a que se refere o artigo anterior, é assegurado ao sujeito passivo o direito de creditar-se do imposto anteriormente cobrado em operações de que tenha resultado a entrada de mercadoria, real ou simbólica, no estabelecimento, inclusive a destinada ao seu uso ou consumo ou ao ativo permanente, ou o recebimento de serviços de transporte interestadual e intermunicipal ou de comunicação.
(...)
§ 3º É vedado o crédito relativo a mercadoria entrada no estabelecimento ou a prestação de serviços a ele feita:
I - para integração ou consumo em processo de industrialização ou produção rural, quando a saída do produto resultante não for tributada ou estiver isenta do imposto, exceto se tratar-se de saída para o exterior;
II - para comercialização ou prestação de serviço, quando a saída ou a prestação subseqüente não forem tributadas ou estiverem isentas do imposto, exceto as destinadas ao exterior.

Art. 21. O sujeito passivo deverá efetuar o estorno do imposto de que se tiver creditado sempre que o serviço tomado ou a mercadoria entrada no estabelecimento:
(...)
II - for integrada ou consumida em processo de industrialização, quando a saída do produto resultante não for tributada ou estiver isenta do imposto;
(...)
§ 2o Não se estornam créditos referentes a mercadorias e serviços que venham a ser objeto de operações ou prestações destinadas ao exterior ou de operações com o papel destinado à impressão de livros, jornais e periódicos.

Art. 32. A partir da data de publicação desta Lei Complementar:
(...)
II - darão direito de crédito, que não será objeto de estorno, as mercadorias entradas no estabelecimento para integração ou consumo em processo de produção de mercadorias industrializadas, inclusive semi-elaboradas, destinadas ao exterior;

A pretensão da impetrante parte de interpretação equivocada os referidos dispositivos, confundindo os conceitos de "integração ou consumo em processo de industrialização" e "mercadorias destinadas ao uso ou consumo do estabelecimento".

A própria impetrante, em seu recurso, traz exemplo que bem ilustra essa diferença de conceitos:

"É o que ocorre, por exemplo, em relação aos créditos provenientes da entrada de energia elétrica.

Os contribuintes não podem se aproveitar da totalidade dos créditos de energia elétrica, mas tão somente do montante proporcional à energia consumida pelas máquinas e equipamentos utilizados no processo de industrialização. Não podem manter os créditos relativos à energia elétrica consumida para iluminar as instalações e parques industriais."

Quando a energia elétrica é utilizada por máquinas e equipamentos de fabricação, ela é classificada como entrada de bem para "integração ou consumo em processo de industrialização", enquanto aquela usada na iluminação de instalações é bem destinado a "consumo pelo estabelecimento".

O aproveitamento de créditos de ICMS foi estruturado pela Constituição Federal de forma que somente as mercadorias incorporadas ao processo produtivo deem direito ao creditamento pelo contribuinte. Já os insumos e mercadorias consumidas na execução das atividades, fazendo parte como instrumento, sem incorporação ao produto final, não geram créditos a serem compensados.

Excepcionalmente, previu o art. 20 da Lei Complementar nº 87/96 que é assegurado ao sujeito passivo o direito de creditar-se do imposto anteriormente cobrado em operações de que tenha resultado a entrada de mercadoria, real ou simbólica, no estabelecimento, inclusive a destinada ao seu uso ou consumo ou ao ativo permanente, ou o recebimento de serviços de transporte interestadual e intermunicipal ou de comunicação.

Seu art. 33, inciso I, entretanto, trouxe limitação temporal que foi objeto de sucessivas leis complementares prorrogando o marco inicial a partir do qual poderiam ser aproveitados tais créditos. A última delas, a Lei Complementar nº 171/2019, estabeleceu que somente darão direito de crédito as mercadorias destinadas ao uso ou consumo do estabelecimento nele entradas a partir de 1º de janeiro de 2033.

Como a Constituição delegou à lei complementar a disciplina acerca da compensação de créditos de ICMS (art. 155, § 2º, XII, “c”), cabe a esta norma também estabelecer limitações relativas à matéria, não se tratando de direito absoluto.

O argumento de que a imunidade do art. 155, § 2º, inciso X, "a", não comporta limitação por norma infraconstitucional, embora seja de fato verdadeiro, não pode atingir situações outras que não aquelas enquadradas na regra imunizante.

Referido dispositivo estabelece que o imposto não incidirá "sobre operações que destinem mercadorias para o exterior, nem sobre serviços prestados a destinatários no exterior, assegurada a manutenção e o aproveitamento do montante do imposto cobrado nas operações e prestações anteriores".

Sua aplicação é limitada às operações que destinem bens e serviços ao exterior, bem como àquelas mercadorias integradas ou consumidas em processo de industrialização, com o intuito de evitar a chamada "exportação de tributos" e tornando o produto brasileiro mais competitivo no mercado externo.

Assim, tanto a regra imunizante, quanto os arts. 20, § 3º, 21, § 2º, e 32, inciso II, da Lei Kandir não são aplicáveis a bens de uso e consumo pelo estabelecimento, mas apenas àqueles integrados ou consumidos no processo de industrialização.

No mesmo sentido, julgados desta Corte:

APELAÇÃO CÍVEL. TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. ICMS. MANDADO DE SEGURANÇA. EXPORTAÇÃO. FUNDIÇÃO...

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