Acórdão nº 51174840920218217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Sétima Câmara Cível, 27-01-2022

Data de Julgamento27 Janeiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualAgravo de Instrumento
Número do processo51174840920218217000
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoDécima Sétima Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001523389
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

17ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Agravo de Instrumento Nº 5117484-09.2021.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Mútuo

RELATOR: Desembargador GIOVANNI CONTI

AGRAVANTE: JULIANE SILVEIRA LIMA

AGRAVADO: CLAUDIO DE SOUZA LIMA

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de agravo de instrumento interposto por JULIANE SILVEIRA LIMA, contrário a decisão proferida nos autos da ação de busca e apreensão ajuizada em desfavor de CLÁUDIO DE SOUZA LIMA.

A fim de evitar tautologia, colaciono a decisão ora recorrida:

"Vistos etc.

I. Recebo a inicial com os documentos que a instruem, uma vez que preenchidos os requisitos legais.

II. Defiro a gratuidade de justiça à parte autora.

Há declaração de insuficiência de recursos para prover as custas e despesas processuais, corroborada por documentos acerca da situação econômica da parte, sem que exista, por ora, qualquer elemento probatório em sentido diverso.

Saliento que a questão poderá ser reexaminada a qualquer momento, frente a elementos probatórios que indiquem que o benefício era indevido.

III. Postula a parte autora a concessão de medida liminar de busca e apreensão de veículo que alega ter emprestado ao réu, o qual não teria restituído o bem.

Em sede de cognição sumária, entendo que o pedido não merece guarida, eis não evidenciada a probabilidade do direito invocado, já que nada veio a demonstrar o alegado empréstimo do veículo, tampouco a que título houve a entrega.

A transferência de bens móveis se dá pela tradição, de forma que o fato de ter o bem sido entregue ao réu com o intuito de transferir a propriedade afastaria condição de proprietária da autora. E, nesta hipótese, sem que houvesse pactuação expressa prevendo a reserva de domínio, inviável a busca e apreensão.

Desse modo, ausentes os requisitos previstos no artigo 300 do Código de Processo Civil, INDEFIRO a medida liminar.

Intimem-se.

IV. Cite-se a parte ré para contestar o feito no prazo legal de 15 (quinze) dias.

Diligências legais."

Em suas razões recursais, a agravante relatou que no dia 16/07/2021 interpôs ação de busca e apreensão de veículo c/c pedido de liminar em face do agravado. Pontuou, ainda, que no evento 1 foi anexado aos autos o documento do veículo (CRLV) Fiat Uno Mille Fire de cor Branca, Ano 2003/2004, com Chassi n.° 178D90115834437, CMT 2.0 e placas ILK9120 (anexo OUT06), o qual comprova que a agravante é proprietária legítima do referido veículo objeto da lide. Referiu que o agravado é seu genitor e que valendo-se do vínculo familiar, pediu-lhe o referido veículo emprestado e até a presente data não realizou a devolução do mesmo. Enfatizou que se não bastasse tal situação, o agravado vem cometendo infrações de trânsito (evento 01, OUT9 e NOT10) com o veículo e, por óbvio, todos esses autos de infrações e penalidades são expedidos em nome da agravante e encaminhados à sua residência. Salientou que analisando os autos de infrações, é possível observar que estas foram cometidas pelo condutor, o ora agravado, provando, assim, que o veículo está em posse deste, bem como que o periculum in mora resta cristalino. Por tais razões, pugnou pelo provimento do recurso.

Distribuído a minha relatoria, o agravo de instrumento foi recebido sem a concessão do efeito suspensivo postulado (evento 5), tendo o agravado silenciado quando intimado para apresentar contrarrazões (evento 11).

Vieram os autos conclusos para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Eminentes colegas.

Conheço do recurso porquanto preenchidos os pressupostos de admissibilidade.

Da análise dos elementos trazidos à colação, tenho que não se mostra possível o acolhimento da pretensão recursal.

O julgador de primeiro grau indeferiu o pedido de tutela de urgência sob o argumento de que inexistem elementos suficientes à comprovação dos requisitos previstos no art. 300 do CPC.

Por oportuno, destaco que tutela provisória, que pode ser de urgência (exige a presença do perigo na demora da prestação jurisdicional) e de evidência (não exige o perigo de demora), e pode ser antecedente ou incidental, cautelar (conservativa) ou antecipada (satisfativa), mas sempre será sumária e não definitiva (salvo a hipótese da estabilização da tutela antecipada antecedente).

Para a concessão da tutela provisória de urgência, que pode ser cautelar ou antecipada é necessário que estejam reunidos os dois pressupostos ditados pelo art. 300 do CPC1, isto é, na própria dicção do referido diploma legal, i) a presença da probabilidade do direito; e, ii) do perigo de dano ou do risco ao resultado do processo.

Segundo Jaqueline Mielke Silva2:

“(...) a probabilidade do direito nada mais é do que a verossimilhança, também denominada pela doutrina de fumus boni juris. O conhecimento das matérias para a concessão da tutela provisória (antecipatória ou cautelar) é perfunctório, superficial, não havendo a necessidade do exaurimento do conhecimento. A verossimilhança, por sua vez, deve considerar: (a) o valor do bem jurídico ameaçado; (b) a dificuldade de o autor provar a sua alegação; (c) a credibilidade, de acordo com as regras de experiência, da alegação e (d) a própria urgência descrita. (...)”

Acerca do tema, oportunos os comentários de Guilherme Rizzo do Amaral3:

“O atual CPC, em seu art. 300, vale-se da expressão elementos que evidenciem a probabilidade do direito, que substituiu os requisitos do fumus boni juris e da prova inequívoca que convença o juiz da verossimilhança. Deixa claro, com isso, a opção por uma maior abertura de um dos requisitos para a concessão da tutela de urgência cautelar ou satisfativa. A demonstração da probabilidade do direito pode, em alguns casos, prescindir de prova. É o que ocorre quando a narrativa feita pelo requerente da medida revestir-se de plausibilidade ou verossimilhança suficientes para autorizar, ainda que em caráter temporário ou provisório, a concessão da tutela de urgência cautelar ou antecipada, respectivamente.

Em suma, o juiz deverá valorar todos os elementos disponíveis no momento da análise do requerimento da tutela cautelar ou satisfativa – afirmações, provas, contexto, direito aplicável – e empreender um juízo de probabilidade, indagando-se quem, provavelmente, possui razão: o requerente ou o requerido?

Se a conclusão for a de que, provavelmente, o requerente não possui razão, deverá o juiz indeferir a medida postulada. Se, por outro lado, concluir que o requerente provavelmente possui razão, então deverá passar à análise do segundo requisito para a concessão da tutela de urgência cautelar ou antecipada, que vem a ser o “perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo”

Deve o requerente da medida demonstrar que há perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo com a não concessão da tutela pretendida. Este risco é o mesmo que já vinha previsto na sistemática do CPC revogado. É, assim, atual a lição de Teori Zavascki acerca do tema: “O risco de dano irreparável ou de difícil reparação e que enseja a antecipação assecuratória é o risco concreto (e não o hipotético ou eventual), atual (ou seja, o que se apresenta iminente no curso do processo) e grave (vale dizer, o potencialmente apto a fazer perecer ou a prejudicar o direito afirmado pela parte). Se o risco, mesmo grave, não é iminente, não se justifica a antecipação da tutela. É consequência lógica do princípio da necessidade, (…)”.

Por outro lado, a tutela provisória de evidência, prevista no art. 301 do CPC4, não necessita dos pressupostos da probabilidade ou perigo de dano ou risco de dano, mas exige os requisitos dos incisos I a IV do artigo antes referido, de forma que é fundada em um juízo de “alta probabilidade” ou “quase certeza” do direito alegado e, sendo assim, até prescinde da urgência.

No caso dos autos, a toda evidência estamos diante de uma tutela provisória de urgência, razão de se exigir para sua concessão os requisitos do art. 300 do CPC, ou seja, da presença da probabilidade do direito e da demonstração ou do perigo de dano ou do risco ao resultado do processo, cumulativamente.

Impende frisar, também, que é do juiz singular a competência originária para deferir o pedido de antecipação de tutela, e a concessão ou não da medida liminar está respaldada na sua convicção.

À vista disso o Segundo Grau deve se munir de toda a parcimônia possível ao analisar a decisão que aprecia pedido da espécie, não podendo deixar de levar em consideração que aquele juízo, ante o ângulo privilegiado de visão (rente aos fatos e em contato direto com os envolvidos no litígio), está em melhores condições de avaliar os elementos de convicção carreados.

Sobre o tema, esta é a lição de Cândido Rangel Dinamarco5:

(...) “As antecipações de tutela projetam efeitos para fora do processo e atingem a vida dos sujeitos litigantes em suas relações recíprocas e em suas relações com os bens da vida – caracterizando-se por isso - como medidas de tutela direta às pessoas e não ao processo.”.

Por outro lado, a antecipação de tutela, regida pelo art. 300 do Código de Processo Civil, exige (a) prova inequívoca, (b) convencimento pelo juízo da verossimilhança das alegações e (c) uma de duas circunstâncias: fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação; ou abuso do direito de defesa ou manifesto propósito protelatório.

Teori Abino 6Zavascki assim refere sobre a verossimilhança e a prova inequívoca, como requisitos para a antecipação da tutela:

“Atento, certamente, à gravidade do ato que opera restrição a direitos fundamentais, estabeleceu o legislador, como pressupostos genéricos, indispensáveis à qualquer das espécies de antecipação da tutela, que haja (a) prova inequívoca e (b) verossimilhança da alegação. O fumus boni iuris deverá estar, portanto, especialmente qualificado: exige-se que os...

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