Acórdão nº 51193133620228210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Quinta Câmara Cível, 28-02-2023

Data de Julgamento28 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo51193133620228210001
ÓrgãoVigésima Quinta Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003259146
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

25ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5119313-36.2022.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: Cláusulas Abusivas

RELATOR: Desembargador LEO ROMI PILAU JUNIOR

APELANTE: DIEGO KANIEL RAIMUNDO (AUTOR)

APELANTE: OMNI S/A CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Trata-se de recursos interpostos por DIEGO KANIEL RAIMUNDO e por OMNI S/A CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO contra o seguinte comando judicial (evento 22, SENT1):

Cuidam os autos de ação revisional ajuizada por DIEGO KANIEL RAIMUNDO contra OMNI S/A CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO

Relatou a parte autora ter celebrado com o réu contrato bancário para financiamento de veículo com garantia de alienação fiduciária. Defendeu a aplicação do Código de Defesa do Consumidor, requerendo antecipação de tutela e a revisão contratual em razão da nulidade de cláusulas contratuais abusivas. Pediu, ainda, a descaracterização da mora e a restituição ou compensação dos valores pagos a maior. Juntou documentos.

Citada, a parte ré apresentou contestação. No mérito, alegou que as partes realizaram contratação sem vícios, sendo possíveis, lícitas e válidas as cláusulas entabuladas. Juntou documentos.

Sem mais provas, vieram os autos conclusos.

É O RELATÓRIO.

DECIDO.

Das Questões Prejudiciais à Análise do Mérito

Ausente litispendência ou coisa julgada na forma do artigo 337, §§ 1º a 4º, do Código de Processo Civil, porque não há repetição de ação idêntica a outra que se encontra em andamento ou já com decisão transitada em julgado, entre as mesmas partes e com o mesmo pedido e causa de pedir.

A impugnação à gratuidade judiciária apenas enseja a revogação do benefício se houver prova da alteração da situação econômica do beneficiário. Ausente essa prova, não é possível alterar a decisão concessiva do benefício.

O valor da causa deve corresponder ao valor total contratado ou ao valor controvertido do débito, ou seja, o produto da diferença entre o valor pactuado e aquele que a parte autora entende devido. É ônus do réu demonstrar a necessidade de alteração do valor atribuído à causa, indicando o numerário correto, não se admitindo impugnação genérica.

A inépcia da petição inicial nas ações de revisão decorrentes de empréstimo, de financiamento ou de alienação de bens somente se configura quando não estiverem discriminadas as obrigações contratuais que a parte pretende controverter e não houver quantificação do valor incontroverso do débito, nos termos do artigo 330, § 2º, do Código de Processo Civil. Ademais, o depósito das parcelas incontroversas não é requisito para recebimento da inicial, sendo apenas pertinente para manutenção de eventual tutela provisória concedida.

É desnecessário o prévio esgotamento da via administrativa para acesso ao Judiciário. Além disso, há previsão contratual da cobrança das cláusulas impugnadas. Por fim, saliento que pedidos que não sejam condizentes com o conteúdo do contrato dizem respeito ao mérito e como tal serão tidos por improcedentes.

Em se tratando de pedido de revisão contratual, não incide a decadência prevista no Código Defesa do Consumidor, mas sim o prazo prescricional genérico do artigo 205 do Código Civil, a contar da data da celebração do contrato.

Tratando-se de relação de consumo, aplica-se a teoria da aparência para fixar a legitimidade da instituição financeira e parceiras intervenientes na cadeia de fornecimento do produto ou serviço.

Em caso de revelia, a presunção de veracidade dos fatos é relativa, ou seja, não induz automaticamente à procedência do pedido, o que autoriza a análise do mérito da causa.

Do Mérito

Ausentes ou superadas as questões prejudiciais à análise do mérito, passo a expor o entendimento adotado por este juízo quanto a questões comuns às ações revisionais. Em segundo momento, farei a adequação do caso concreto aos entendimentos expostos.

Da Aplicação do Código de Defesa de Consumidor – Possibilidade de Revisão das Cláusulas Abusivas

O Superior Tribunal de Justiça pacificou o entendimento sobre a incidência do Código de Defesa ao Consumidor às instituições financeiras por meio da edição da Súmula nº 297 e Súmula 286, sendo viável a revisão judicial das cláusulas contratuais que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, na forma do artigo 51, IV, do CDC. Cabe, porém, à parte indicar as cláusulas que pretende revisar, pois vedada a revisão de ofício, na forma de sua Súmula 381.

Dos Juros Remuneratórios e CET

De acordo com o tema 27 do STJ, “é admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada — artigo 51, §1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do julgamento em concreto.

Com base nas Súmulas 296 e 382, bem como com fundamento no julgamento do Recurso Especial Repetitivo nº 1.061.530/RS, entendo possível a revisão de cláusulas contratuais somente em circunstâncias nas quais a taxa pactuada ou aplicada no contrato ultrapassar sobremaneira a taxa média cobrada pelas instituições financeiras em operações da espécie.

Saliento que este entendimento não se aplica ao CET, que é mera tradução de todos os encargos financeiros que incidem sobre o valor das parcelas, com caráter meramente informativo.

Da Comissão de Permanência e dos Encargos Moratórios

Entendo que se aplica à Comissão de Permanência e aos encargos moratórios os termos das Súmulas 30, 296, 294 e 472 do Superior Tribunal de Justiça.

Logo, tem-se que é válida a cobrança de comissão de permanência quando não cumulada com juros remuneratórios, juros moratórios, multa moratória ou correção monetária, e quando o seu valor não ultrapassar a soma dos encargos remuneratórios e moratórios previstos no contrato, ou seja: a) juros remuneratórios à taxa média de mercado; b) juros moratórios até o limite de 12% ao ano; c) multa contratual limitada a 2% do valor da prestação, nos termos do artigo 52, § 1º, do CDC; d) além da correção monetária.

Dos Juros Moratórios

Havendo previsão contratual deve prevalecer a cobrança de juros moratórios, limitados a taxa de 1% ao mês, de acordo com o disposto no artigo 406 do Código Civil c/c artigo 161, § 1º, do CTN, e desde que não cumulados com comissão de permanência, conforme Súmula 379 do STJ.

Da Multa Contratual

Com relação à multa, o artigo 52 do CDC estabelece que as multas de mora decorrentes do inadimplemento de obrigação no seu termo não poderão ser superiores a 2% do valor da prestação, taxa esta que restou observada pela instituição financeira ao contratar.

Da Capitalização de Juros

Entendo admissível a capitalização mensal ou diária de juros nos contratos celebrados com instituição financeira após a edição da Medida Provisória nº 1.963-17/2000, de 30/03/2000, reeditada sob o nº 2.170-36, de 23/08/2001, entendimento que foi confirmado pelo Superior Tribunal de Justiça no Recurso Especial Repetitivo nº 973.827/RS.

Da Tabela Price

Quanto ao pedido de aplicação da Tabela Price, entendo admissível a sua utilização quando prevista contratualmente, por ausente abusividade por sua mera previsão.

Do Índice de Correção Monetária

Não há qualquer vedação na utilização de índices como a TR, IGP-M, INPC ou outro índice oficial para a correção monetária dos contratos.

Do Imposto Sobre Operações Financeiras – IOF

A incidência de IOF em contratos de financiamento é admitida na forma do Tema 621 do Superior Tribunal de Justiça.

Da Cláusula que Prevê Cobrança de Honorários Advocatícios

Entendo que não há abusividade na cláusula que prevê a cobrança de valores a título de cobranças extrajudiciais ou honorários advocatícios como uma das consequências da mora, por se tratar de despesa extraordinária causada pelo inadimplemento que pode ser repassada ao consumidor, desde que prevista.

Da Venda Casada de Seguro

A contratação do seguro deve ser uma liberalidade do consumidor. Todavia, a sua contratação é válida, em princípio, se houver a anuência do contratante. Contudo, se não ficar assegurada ao consumidor a possibilidade de escolha na contratação do encargo, e, ainda, da seguradora, sendo impostas pela instituição financeira, estaria configurada a venda casada, e, por consequência, abusividade.

Havendo cópia do contrato anexada ao feito que comprove a contratação do seguro ou não havendo indícios de que a concessão do crédito tenha sido condicionada à contratação do seguro, não é abusiva a cláusula.

Das Tarifas de Avaliação do Bem e do Registro do Contrato

De acordo com o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o Tema nº 958, é válida a cláusula que prevê cobrança de tarifa referente a prestação de serviço, desde que tal serviço tenha sido necessário e efetivamente prestado.

Especificamente em relação à tarifa de avaliação do bem, tendo em vista que o contrato de financiamento se destina à aquisição do próprio bem objeto da garantia, a avaliação é inerente à própria natureza do negócio jurídico, não havendo abusividade na sua cobrança.

Via de regra, a comprovação da devida prestação do serviço de registro do contrato ocorre através apresentação do CRLV. Seja pela juntada da CRVL aos autos, seja pela ausência de evidências de que o serviço não tenha sido prestado, a instituição financeira tem a faculdade de efetuar a cobrança.

Da Tarifa Cadastro

Com relação à tarifa de cadastro, o Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no julgamento dos Recursos Especiais nº 1.251.331/RS e nº 1.255.573/RS, os quais seguiram o rito dos recursos repetitivos, pela legalidade nas hipóteses em que expressamente prevista, desde que sua incidência ocorra somente no início do relacionamento entre o consumidor e a instituição...

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