Acórdão nº 51203151220208210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Nona Câmara Cível, 08-04-2022

Data de Julgamento08 Abril 2022
ÓrgãoDécima Nona Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo51203151220208210001
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001845780
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

19ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5120315-12.2020.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: Práticas Abusivas

RELATOR: Desembargador MARCO ANTONIO ANGELO

APELANTE: BRUNA DESIREE RODRIGUES DOS SANTOS (AUTOR)

APELADO: TIM S.A. (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto por BRUNA DESIREE RODRIGUES DOS SANTOS em face da sentença prolatada na ação declaratória de inexistência de débito cumulada com pedido de indenização que move contra TIM S.A., com o seguinte dispositivo (Evento 64 do processo de origem):

Ante o exposto, com fulcro no art.355, inciso I, julgo IMPROCEDENTE a presente Ação Declaratória de Nulidade de Cláusula Contratual ajuizada por BRUNA DESIREE RODRIGUES DOS SANTOS contra TIM S.A., extinguindo o feito com resolução de mérito.

Condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios ao patrono da parte adversa, fixada a verba honorária em 10% sob o valor atualizado da causa, levando-se em consideração a natureza e o valor da ação e o trabalho despendido pelo profissional. Suspensa a exigibilidade da verba de sucumbência, pois a parte autora litiga ao abrigo da assistência judiciária gratuita.

A parte-autora BRUNA DESIREE RODRIGUES DOS SANTOS, por suas razões de apelação (Evento 70 do processo de origem), preliminarmente, suscita prescrição decenal. Em relação ao mérito, aponta que sua fatura de serviços telefônicos sofreu significativa majoração em razão da inclusão de serviços não solicitados. Aponta que o valor dos serviços que reputa não solicitados é discriminado nas faturas e majora o valor do plano contratado. Alega que se trata de prática ilegal e abusiva, além de ser reiterada pela companhia telefônica mesmo diante das reclamações realizadas pelo consumidor. Aduz venda casada. Suscita direito à repetição de indébito em dobro e indenização por dano moral. Ao final, pugna pelo provimento do recurso para o fim de julgar procedentes os pedidos da inicial.

Foram apresentadas contrarrazões (Evento 73 do processo de origem).

Cumprido o disposto nos artigos 931, 934 e 935 do CPC.

É o relatório.

VOTO

PRELIMINAR CONTRARRECURSAL. IMPUGNAÇÃO AO BENEFÍCIO DA GRATUIDADE DA JUSTIÇA.

Nos termos do art. 100 do CPC:

Art. 100. Deferido o pedido, a parte contrária poderá oferecer impugnação na contestação, na réplica, nas contrarrazões de recurso ou, nos casos de pedido superveniente ou formulado por terceiro, por meio de petição simples, a ser apresentada no prazo de 15 (quinze) dias, nos autos do próprio processo, sem suspensão de seu curso.

Parágrafo único. Revogado o benefício, a parte arcará com as despesas processuais que tiver deixado de adiantar e pagará, em caso de má-fé, até o décuplo de seu valor a título de multa, que será revertida em benefício da Fazenda Pública estadual ou federal e poderá ser inscrita em dívida ativa

Em princípio, a simples afirmação da parte no sentido de que não está em condições de pagar as custas do processo e os honorários de advogado, sem prejuízo próprio ou da família, é suficiente para o deferimento da gratuidade da justiça.

Com efeito, nos termos do § 3º do art. 99 do CPC/2015, presume-se verdadeira a alegação de insuficiência deduzida exclusivamente por pessoa natural.

No entanto, a declaração de insuficiência implica presunção relativa, motivo pelo qual o pedido de gratuidade da justiça pode ser indeferido se houver nos autos elementos capazes de afastá-la.

Nesse sentido a redação do § 2º do art. 99 do CPC/2015, in verbis:

§ 2o O juiz somente poderá indeferir o pedido se houver nos autos elementos que evidenciem a falta dos pressupostos legais para a concessão de gratuidade, devendo, antes de indeferir o pedido, determinar à parte a comprovação do preenchimento dos referidos pressupostos.

Sobre a dúvida fundada quanto à pobreza, cumpre transcrever lição de Nelson Nery Júnior1:

O juiz da causa, valendo-se de critérios objetivos, pode entender que a natureza da ação movida pelo interessado demonstra que ele possui porte econômico para suportar as despesas do processo. A declaração pura e simples do interessado, conquanto seja o único entrave burocrático que se exige para liberar o magistrado para decidir em favor do peticionário, não é prova inequívoca daquilo que ele afirma, nem obriga o juiz a se curvar aos seus dizeres se de outras provas e circunstâncias ficar evidenciado que o conceito de pobreza que a parte invoca não é aquele que justifica a concessão do privilégio. Cabe ao magistrado, livremente, fazer juízo de valor acerca do conceito do termo pobreza, deferindo ou não o benefício.

Jurisprudência do Egrégio STJ sobre a matéria:

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DECISÃO DA PRESIDÊNCIA. RECONSIDERAÇÃO. AÇÃO MONITÓRIA. APELAÇÃO. PEDIDO DE JUSTIÇA GRATUITA. [...] PESSOAS FÍSICAS (SÓCIOS/GARANTIDORES). PRESUNÇÃO NÃO AFASTADA. PEDIDO DE DIFERIMENTO DAS CUSTAS. SÚMULA 281/STF. AGRAVO INTERNO PROVIDO PARA CONHECER DO AGRAVO E DAR PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO ESPECIAL. [...] 3. Para as pessoas físicas, a simples declaração de pobreza tem presunção juris tantum, bastando, a princípio, o simples requerimento, sem nenhuma comprovação prévia, para que lhes seja concedida a assistência judiciária gratuita. Na hipótese, a Corte estadual não apresentou justificativa concreta para afastar a presunção de hipossuficiência alegada pelos sócios/garantidores da devedora principal. [...] 5. Agravo interno provido para conhecer do agravo e dar parcial provimento ao recurso especial, a fim de deferir o benefício da justiça gratuita aos recorrentes pessoas físicas. (AgInt no AREsp 1647231/SP, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 08/06/2020, DJe 25/06/2020).

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. TEMPESTIVIDADE DO RECURSO. RECONSIDERAÇÃO DA DECISÃO AGRAVADA. JUSTIÇA GRATUITA. INDEFERIMENTO PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTO SUFICIENTE. DECLARAÇÃO DE HIPOSSUFICIÊNCIA. PRESUNÇÃO IURIS TANTUM. ART. 99, §§ 2º E 3º, DO CPC/2015. RECURSO PROVIDO. 1. Agravo interno contra decisão da Presidência que não conheceu do recurso especial, por intempestividade. Tempestividade comprovada. Reconsideração. 2. Há presunção juris tantum de que a pessoa física que pleiteia o benefício da assistência judiciária gratuita não possui condições de arcar com as despesas do processo sem comprometer seu próprio sustento ou de sua família. Tal presunção, embora relativa, somente pode ser afastada pelo magistrado quando houver, nos autos, elementos que evidenciem a ausência dos pressupostos para a concessão do benefício (CPC/2015, art. 99, §§ 2º e 3º). 3. Agravo interno provido para reconsiderar a decisão agravada e, em novo julgamento, conhecer do agravo para dar provimento ao recurso especial. (AgInt no AREsp 1478886/SP, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 10/03/2020, DJe 31/03/2020).

Outrossim, nos termos da Conclusão 49ª do Centro de Estudos do TJ/RS:

49ª - O benefício da gratuidade judiciária pode ser concedido, sem maiores perquirições, aos que tiverem renda mensal bruta comprovada de até (5) cinco salários mínimos nacionais.

Na hipótese dos autos, a parte-ré (ora apelada), reitera sua impugnação à concessão da gratuidade da justiça em favor do autor formulada em sede de contestação (Eventos 10 e 73 do processo de origem).

Trata-se de ação envolvendo declaração de inexistência de débito relativa a contrato de telefonia móvel, com valor da causa apontado à inicial em R$15.000,00 (quinze mil reais - fl. 13 do doc. "INIC1" do Evento 01 do processo de origem).

A parte-autora declarou-se à inicial com o "auxiliar de escritório", sendo que inexiste qualquer indicativo de condição financeira a infirmar a presunção de pobreza decorrente de sua declaração (doc. "DECLPOBRE7" do Evento 01 do processo de origem).

Pelo contrário.

A parte-autora comprovou auferir rendimentos mensais de em torno de 01 (um) salário mínimo em média, o que implica o deferimento da gratuidade judiciária sem maiores indagações, conforme pacífica jurisprudência deste Tribunal de Justiça (fl. 09 do doc. "DECLPOBRE7" do Evento 01 do processo de origem).

Além disso, notório o fato de que, com a edição da Instrução Normativa da Receita Federal n. 864, de 25 de julho de 2008, deixou de existir a Declaração Anual de Isento. Por isso, os documentos de fls. 02-08 do doc. "DECLPOBRE7" do Evento 01 do processo de origem servem como indicativos de que a parte-autora não possui renda suficiente para declarar imposto de renda.

Outrossim, a companhia telefônica não trouxe qualquer elemento probatório apto a infirmar tal conclusão, ônus que lhe incumbia.

Diante de tal quadro, impositiva a rejeição da preliminar contrarrecursal de impugnação ao benefício da gratuidade da justiça.

PRESCRIÇÃO. AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL.

O interesse recursal é um dos requisitos intrínsecos de admissibilidade dos recursos.

Na lição de Fredie Didier Jr.2:

Para que o recurso seja admissível, é preciso que haja utilidade – o recorrente deve esperar, em tese, do julgamento do recurso, situação mais vantajosa, do ponto de vista prático, do que aquela em que o haja posto a decisão impugnada – e necessidade – que lhe seja preciso usar as vias recursais para alcançar este objetivo.

Na hipótese dos autos, a parte-autora pretende, em seu recurso de apelação, seja reconhecida prescrição decenal de sua pretensão de repetição de indébito.

Ocorre que a preliminar de prescrição não foi suscitada em contestação (Evento 10 do processo de origem), tampouco foi objeto de pronunciamento pelo juízo a quo (Evento 64 do processo de origem).

Dessa forma, não se verifica possibilidade de situação jurídica vantajosa em favor da parte-autora o exame do...

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