Acórdão nº 51207402320228217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Oitava Câmara Criminal, 31-08-2022

Data de Julgamento31 Agosto 2022
ÓrgãoOitava Câmara Criminal
Classe processualAgravo de Execução Penal
Número do processo51207402320228217000
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002572103
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

8ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Agravo de Execução Penal Nº 5120740-23.2022.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Furto Qualificado (Art. 155, § 4º)

RELATORA: Desembargadora ISABEL DE BORBA LUCAS

AGRAVANTE: SILVESTRE PRESTES

AGRAVADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

RELATÓRIO

SILVESTRE PRESTES interpôs agravo em execução penal da decisão que indeferiu o seu pedido de isenção da pena de multa e das custas processuais.

Em suas razões (evento 3, DOC2), o agravante alegou, em síntese, que é assistido pela Defensoria Pública e não tem condições financeiras de adimplir as penas de multa, de prestação pecuniária e custas processuais, sem prejuízo do seu sustento e de sua família, porquanto pessoa economicamente hipossuficiente. Ressaltou, ademais, que a cobrança de multa e prestação pecuniária revela-se dispendiosa para o Estado e, via de regra, inócua, pois o condenado pobre não tem meios para pagá-la, daí porque desarrazoado que o Estado gaste tempo e dinheiro para, ao final, chegar ao nada. Referiu o caráter pessoal da pena, que, nos termos do art. 5º, XLV, da CF, e observado o princípio da intranscendência, não pode ultrapassar a pessoa do condenado, garantia que restaria violada, no presente caso, se mantida a exigência de pagamento, pois é bem provável que o agravante tenha que recorrer aos seus familiares para tentar adimplir a prestação pecuniária e custas processuais. Destacou a revisão do Tema 931 do STJ, firmando-se a tese de que os apenados hipossuficientes podem ter reconhecida a extinção da punibilidade, independente do pagamento da multa.

Com base nessas considerações, requereu o provimento do recurso, a fim de que seja concedida a isenção de pagamento da prestação pecuniária, pena de multa e custas processuais.

Contrarrazões pelo desprovimento do recurso (evento 3, DOC3, fls. 126/128).

Mantida a decisão (evento 3, DOC3, fl. 132).

Em parecer, opinou o ilustre Procurador de Justiça, Dr. Aureo Rogério Gil Braga, pelo desprovimento do agravo (evento 8, DOC1).

É o relatório.

VOTO

O recurso, adianto, não deve ser provido.

Na espécie, SILVESTRE PRESTES foi condenado pela prática de crimes de furto qualificado, às penas de 03 (três) anos e 06 (seis) meses de reclusão e 24 (vinte e quatro) dias-multa, à razão unitária mínima, substituída a privativa de liberdade por duas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária, no valor de dois salários mínimos (seq. 1.1 do SEEU). E, uma vez intimado a comparecer à central integrada de penas alternativas, para dar início à prestação de serviços à comunidade, bem como para realizar o pagamento da prestação pecuniária, da pena de multa e dos encargos processuais, sobreveio requerimento defensivo de isenção destes, em razão da hipossuficiência econômica do apenado.

O pedido defensivo foi indeferido pelo juízo a quo, nos seguintes termos (evento 3, DOC3, fl. 105):

(...)

Inviável a concessão da isenção pretendida pela defesa, por tratar-se a multa de pena cumulativa, prevista expressamente em lei, de aplicação cogente, assim como a pena privativa de liberdade. Entendimento diverso faria por violar o princípio da reserva legal, mormente porque inexiste previsão para a dispensa do débito.

De igual forma, também descabe, neste momento, a isenção de custas e taxas processuais, na medida em que o pagamento poderá ser efetivado até a conclusão da presente execução, havendo a possibilidade de modificação, até o termo, da situação financeira da apenada.

Em face disso, indefiro a pretensão formulada pela defesa no seq. 14.1

Lado outro, considerando a inteligência do art. 169, da LEP, este Juízo não vislumbra óbices ao parcelamento dos débitos, de acordo com as condições do condenado, cuja proposta poderá ser apresentada pela defesa.

Intimem-se

(Grifei)

E o decisum singular, adianto, não carece de qualquer reparo.

É que, conforme já sedimentado pela Suprema Corte, no julgamento da ADI 3.150/DF, a Lei nº 9.268/96, ao considerar a multa penal como dívida de valor, não lhe retirou o caráter de sanção criminal, que lhe é inerente, por força do art. 5º, XLVI, "c", da CF. Desse modo, porquanto sanção penal cominada cumulativamente com a reclusiva no tipo penal, não há como acolher o pleito defensivo voltado à sua isenção, em razão da situação financeira do agravante, o que representaria direta afronta ao princípio da legalidade. E o mesmo raciocínio se estende à prestação pecuniária, pena substitutiva que, inclusive, caso não adimplida, deverá ser convertida em privativa de liberdade.

Ademais, ao contrário do afirmado pela defesa, inexiste a propalada violação ao princípio da intranscendência das penas, consagrado no art. 5º, XLV, da CF. O que o dispositivo constitucional veda, em realidade, é a transmissão da obrigação de pagamento aos herdeiros do condenado, o que não ocorre, aqui, quando se imputa apenas a SILVESTRE o adimplemento da dívida, ausente ofensa a qualquer preceito constitucional.

De observar, além disso, que, justamente em atenção às hipóteses de incapacidade econômica do condenado, é que a própria legislação já traz, de antemão, o permissivo para o parcelamento do débito. É o que se extrai, tanto do art. 50 do CP quanto do art. 169 da LEP, ambos facultando o pagamento da pena de multa, em parcelas mensais, a pedido do interessado. E, no presente caso, a decisão recorrida até mesmo já endossou esta possibilidade, desde logo permitindo o parcelamento dos débitos, de acordo com as condições do condenado, em proposta a ser apresentada pela defesa, assim evitando maiores prejuízos à subsistência de SILVESTRE e de sua família.

Nesse contexto, não há qualquer possibilidade de acolher o pedido de isenção das penas de multa e de prestação pecuniária, porquanto sanções penais, decorrentes de expressa previsão em lei, inexistindo qualquer fundamento legal para sua exclusão.

Assim, aliás, já se manifestou, recentemente, este Órgão Fracionário:

AGRAVO EM EXECUÇÃO. 1. MULTA CUMULATIVA. ISENÇÃO DE PAGAMENTO. IMPOSSIBILIDADE. Pretensão de exclusão da multa pelas parcas condições financeiras do detento, que se mostra inviável, por sua natureza de pena, cominada cumulativamente com a reclusiva no tipo penal, de aplicação cogente, portanto. Intranscendência da pena preservada. Situação econômica desfavorável do condenado que não importa em causa de isenção da pena de multa, viabilizando, unicamente, o parcelamento – art. 50 do CP e art. 169 da LEP -, que, aliás, foi deferido pelo decisor singular (pagamento em 5x, em parcelas iguais e consecutivas, a primeira devendo ser paga no prazo de 30 dias, a contar do término do adimplemento da prestação pecuniária). A impossibilidade de pagamento acarreta o encaminhamento à Fazenda Pública, para execução, como dívida de valor, o Juiz da Execução Criminal sendo incompetente para declarar o desinteresse da Fazenda Pública, pelo pequeno valor – Lei nº 9.469/97. Decisão indeferitória mantida. 2. CUSTAS. SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE DO PAGAMENTO. COISA JULGADA. Tendo o acusado sido assistido pela Defensoria Pública, com suspensão da exigibilidade do pagamento das custas processuais no ato sentencial, justamente pela condição de necessitado, assistido pela Defensoria Pública, decisão transitada em julgado, deve ser afastada a determinação de expedição de guia para pagamento das custas processuais, pelo magistrado da VEC, à revelia do que fora decidido na sentença, decisão coberta pelo manto da coisa julgada. AGRAVO EM EXECUÇÃO PARCIALMENTE PROVIDO. AFASTADA A DETERMINAÇÃO JUDICIAL DE EXPEDIÇÃO DE GUIA PARA RECOLHIMENTO DAS CUSTAS PROCESSUAIS. DECISÃO MANTIDA QUANTO AO MAIS.(Agravo de Execução Penal, Nº 51852992320218217000, Oitava Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Fabianne Breton Baisch, Julgado em: 30-03-2022)

(Grifei)

Por fim, apenas registro não ignorar o atual entendimento adotado pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, que, após nova revisão do Tema Repetitivo nº 931, em 30/11/2021, fixou a seguinte tese: Na hipótese de condenação concomitante a pena privativa de liberdade e multa, o inadimplemento da sanção pecuniária, pelo condenado que comprovar impossibilidade de fazê-lo, não obsta o reconhecimento da extinção da punibilidade. E o acórdão foi assim ementado:

RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. EXECUÇÃO PENAL. REVISÃO DE TESE. TEMA 931. CUMPRIMENTO DA SANÇÃO COORAL. PENDÊNCIA DA PENA DE...

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