Acórdão nº 51214944420218210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Primeira Câmara Cível, 02-03-2023

Data de Julgamento02 Março 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo51214944420218210001
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoVigésima Primeira Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002421132
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

21ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5121494-44.2021.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: Concessão

RELATORA: Desembargadora LISELENA SCHIFINO ROBLES RIBEIRO

APELANTE: MARISA TRINDADE (AUTOR)

APELADO: INSTITUTO DE PREVIDÊNCIA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL - IPERGS (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação cível de MARISA TRINDADE MENEGHETTI, pretendendo a reforma da sentença que julgou improcedente a ação de concessão de benefício previdenciário de pensão por morte movida em face do INSTITUTO DE PREVIDÊNCIA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (Evento 45).

Sustenta que manteve união estável com Clóvis Jesus Severo, ex-servidor público estadual, durante o período de maio de 2015 a maio de 2020, quando este veio a falecer, sendo o relacionamento público, contínuo e duradouro. Alega que dependia economicamente do companheiro, tendo postulado a habilitação à pensão por morte do falecido, negado administrativamente pela autarquia estadual (processo SPI nº 113163-2442/20- 6 do IPE-Prev). Argumenta que o fato de a Escritura Pública Declaratória de União Estável ter sido lavrada quando o falecido servidor Clóvis já se encontrava gravemente enfermo, por si só, não tem o condão de descredibilizar o documento público, que sequer fora impugnado pelo IPE Prev. Assevera que o conjunto probatório demonstra a convivência do casal durante anos, destacando as fotografias e publicações datadas da rede social juntadas, além de contas de luz em nome do ex-servidor na residência do casal e matérias jornalísticas noticiando o trabalho do casal na organização dos eventos da Associação dos Santo-angelenses em Porto Alegre. Refere, igualmente, a prova oral colhida.

Pede, por isso, o provimento do recurso, e a concessão do benefício de pensão por morte para a autora, na cota de 60% do valor da aposentadoria recebida pelo ex-servidor, nos termos do disposto no art. 30 da Lei Complementar Estadual nº 15.142/2018, devendo retroagir os efeitos patrimoniais à data do óbito, além da condenação do réu ao pagamento das diferenças mensais resultantes da sentença (parcelas vencidas e vincendas), com todas as vantagens auferidas pelo ex-servidor, a contar da data do óbito, com atualização monetária desde o vencimento de cada parcela devida, acrescidas de juros de mora de 6% ao ano a contar da citação, bem como a condenação da ré ao pagamento de honorários advocatícios de sucumbência e das custas processuais.

Apresentadas contrarrazões pelo IPERGS, postula o desprovimento do recurso.

Não há intervenção do Ministério Público (evento 20).

Vieram os autos.

É o relatório.

VOTO

Como se vê, do contido nos autos, pretende a parte autora a concessão de pensão por morte, sob alegação de ser companheira do ex-servidor público estadual falecido, Clóvis Jesus Severo.

Nos termos do artigo 9º, inciso II, da Lei Estadual nº 7.672/82, são dependentes do segurado, “a companheira, mantida como se esposa fosse há mais de cinco anos, desde que se trate de solteira, viúva, desquitada, separada judicialmente ou divorciada, e solteiro, viúvo, desquitado, separado judicialmente ou divorciado seja o segurado”.

É o caso.

A prova juntada evidencia que o ex-servidor Clóvis e a autora conviveram em união estável, sendo o relacionamento público, contínuo e duradouro, com a intenção de constituir família, entre maio de 2015 a 12 de maio de 2020, data do óbito do ex-servidor.

Registro que os documentos demonstram que as partes conviviam no mesmo endereço - rua Barão de Ubá, 50, apartamento 201, bairro Bela Vista, nesta capital, até a data do óbito de Clóvis.

Há, ainda, fotografias e postagens em rede social que mostram a convivência do casal, não só em reuniões com amigos, mas sozinhos em locais públicos.

Fundamental, ademais, como meio de prova, a Escritura Pública de União Estável, lavrada na presença das testemunhas Lisiane e Sabrina, filhas do próprio segurado, na data de 28/04/2020 (Evento 1, Escritura 4, origem), sendo reconhecida a união no período de 2015 até aquela data (Evento 1 Escritura 4). Não obstante tenha sido lavrada quando o ex-servidor público já se encontrava gravemente enfermo, é uma prova importante e de presumida legalidade, não tendo havido qualquer impugnação. Ademais, inexiste qualquer indício de ocorrência de simulação ou falta de discernimento por parte do falecido ao firmar a escritura.

Nesse sentido:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ANULATÓRIA DE ESCRITURA PÚBLICA DE RECONHECIMENTO DE UNIÃO ESTÁVEL. SIMULAÇÃO. VÍCIO DE CONSENTIMENTO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO. PROVAS ACERCA DA EXISTÊNCIA DO RELACIONAMENTO ESTÁVEL. IMPROCEDÊNCIA. 1. O conjunto probatório carreado aos autos não dá sustentação à tese dos autores acerca da ocorrência de simulação (declaração não verdadeira) ou falta de discernimento por parte do falecido genitor ao firmar escritura pública de união estável com a ré, ocasião em que estava internado em nosocômio em decorrência de doença cardíaca que o levou a óbito. 2. Caso em que a prova dos autos, além de não confortar a tradução dos autores, também indica a existência do relacionamento nos moldes de uma entidade familiar entre a ré e o genitor falecido, corroborando o teor da declaração contida em documento público, que goza de relativa presunção de veracidade. Sentença mantida. APELO DESPROVIDO.(Apelação Cível, Nº 70081686131, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ricardo Moreira Lins Pastl, Julgado em: 22-08-2019)

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RECONHECIMENTO DE UNIÃO ESTÁVEL. PARTILHA. INTERDITO. PROCURAÇÃO POR INSTRUMENTO PARTICULAR. Sendo o réu interdito, e representado nos autos pela Curadora, é válida a procuração outorgada a advogado, por instrumento particular. Apelação conhecida. Preliminar rejeitada. MATÉRIA INCONTROVERSA. Não se conhece do recurso na parte onde o réu postula a improcedência da fixação de alimentos ao menor, se não houve decaimento quanto ao ponto, não concedido na sentença. MÉRITO. Demonstrada por prova inequívoca nos autos a existência da união estável entre os litigantes, iniciada anteriormente a doença a que foi acometido o réu, impõe-se manter a sentença, bem como a partilha dos bens e das dívidas adquiridos no período. Inexistindo prova da incapacidade do réu por ocasião da lavratura da escritura pública de reconhecimento de união estável, não cabe declarar a nulidade do documento (art. 166, I, do CC). Existência de outras provas - prova documental e oral - nos autos , demonstrando o reconhecimento da entidade familiar. PRELIMINAR REJEITADA. APELAÇÃO CONHECIDA EM PARTE E DESPROVIDA.(Apelação Cível, Nº 70038083085, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: André Luiz Planella Villarinho, Julgado em: 23-03-2011)

E, para corroborar, a filha do extinto, Sabrina, foi declarante da Certidão de Óbito, averbando que Clovis convivia em união estável com Marisa Meneguetti (Evento 1 Certidão de óbito 6).

Além disso, há declaração autenticada em cartório da filha do segurado, Fabiana, declarando que Marisa residiu com Clóvis de 2015 a 2020 (Evento 12 Processo Administrativo 4, fl. 31, origem).

Ainda, conforme descrito na sentença, a testemunha Marcelo M. T. "informa que conheceu a autora em 2019, pois ela e o Sr. Clóvis faziam fisioterapia na clínica em que trabalhava. Que a autora começou a fazer fisioterapia em 2018 e o Sr. Clóvis na metade de 2019. Que o Sr. Clóvis tinha um problema na perna que foi o motivo de ter iniciado a fisioterapia e realizado por volta de 6 meses. Não tem certeza do motivo do óbito do Sr. Clóvis, mas alega que ele tinha um câncer. Relata que os dois se apresentavam como companheiros, que chegavam e saíam juntos da clínica. Não sabe se tiveram filhos. Afirma que tiveram relacionamento anterior e que tinham filhos desse relacionamento".

Já, a informante Aurora Carmen J. M. diz "que em Santo Ângelo o Sr. Clóvis era casado, teve filhas e que foi casado até ficar viúvo. Relata que o falecido conheceu a autora em Santo Ângelo mas começaram a se encontrar em Porto Alegre e que os dois moravam juntos. Não sabe o endereço que os dois moravam. Alega que os dois começaram a viver juntos por volta de 2014 e 2015. Que o Sr. Clóvis faleceu em 2021. Que a autora tem um filho. Que os dois frequentavam uma associação. Não moravam juntos desde que os dois começaram a se encontrar".

Ademais, não mais importa a comprovação do tempo de convivência para fins de dependência econômica, tendo em vista que a Constituição Federal, em seu artigo 226, §3º, reconheceu a união estável como entidade familiar, igualando-a ao casamento, desde que haja convivência pública, duradoura e contínua estabelecida com o objetivo de constituição de família, não há que se falar em diferenciação das duas instituições para a concessão da pensão por morte, estabelecida por lei infraconstitucional.

Esse é o entendimento do nosso Tribunal de Justiça:

APELAÇÃO CÍVEL. REMESSA NECESSÁRIA. PREVIDÊNCIA PÚBLICA. PENSÃO POR MORTE. HABILITAÇÃO DE COMPANHEIRA COMO DEPENDENTE PREVIDENCIÁRIA. COMPROVAÇÃO DE DEPENDÊNCIA ECONÔMICA. DESNECESSIDADE. LEI ESTADUAL Nº 15.142/2018. TERMO INICIAL. PEDIDO ADMINISTRATIVO. ISENÇÃO DA TAXA ÚNICA DE SERVIÇOS JUDICIAIS. 1. Inicialmente, destaca-se a aplicabilidade da Lei Estadual n. 15.142/2018, considerando a data do óbito do instituidor. Condição de companheira evidenciada, o que enseja a concessão da pensão previdenciária por morte de servidor público estadual. Com efeito, não se há mais falar em prova de dependência econômica do companheiro(a) supérstite ou necessidade de comprovação de relação por cinco anos para fins de comprovação da união estável. De qualquer sorte, antes mesmo da alteração legislativa acerca do tema, já se posicionava este órgão fracionário nesse sentido, eis que em...

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