Acórdão nº 51217674120228217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Sexta Câmara Criminal, 03-08-2022

Data de Julgamento03 Agosto 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualAgravo de Execução Penal
Número do processo51217674120228217000
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoSexta Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002429878
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

6ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Agravo de Execução Penal Nº 5121767-41.2022.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Roubo majorado (art. 157, § 2º)

RELATOR: Desembargador Sérgio Miguel Achutti Blattes

AGRAVANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

AGRAVADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

Trata-se de Agravo em Execução interposto pelo MINISTÉRIO PÚBLICO, porquanto inconformado com a decisão proferida pelo Juízo do 2ª Vara de Execuções Criminais da Comarca de Novo Hamburgo/RS, que dispensou a realização das avaliações psicossociais, deferindo a progressão para o regime semiaberto ao apenado William Siqueira Guimarães.

Em suas razões, o Parquet sustenta que, apesar de satisfeito o requisito objetivo e do atestado de boa conduta carcerária, a análise da satisfação do requisito subjetivo depende de prévio exame criminológico. Afirma que se trata de apenado condenado por delitos graves, além de possuir elevado saldo de pena ainda a cumprir, bem como intercorrências no histórico de cumprimento da pena. Requer, assim, o provimento do recurso, para cassar a decisão que deferiu a progressão de regime, pois ausente o requisito subjetivo, condicionando nova analise do beneficio à realização dos exames. Subsidiariamente, requer seja alterada a data-base para a data do efetivo deferimento do benefício (16.05.2022), ou, alternativamente, se este não for o entendimento, para data em que foi elaborado o atestado de conduta carcerária do preso (16.03.2022).

Apresentadas as contrarrazões.

Decisão mantida em juízo de retratação.

Nesta instância, a Procuradoria de Justiça exara parecer opinando provimento do agravo ministerial.

Vêm os autos conclusos para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Eminentes Colegas:

Conforme relatado, trata-se de Agravo em Execução interposto pelo MINISTÉRIO PÚBLICO, porquanto inconformado com a decisão proferida pelo Juízo do 2ª Vara de Execuções Criminais da Comarca de Novo Hamburgo/RS, que dispensou a realização das avaliações psicossociais, deferindo a progressão para o regime semiaberto ao apenado William Siqueira Guimarães.

Preenchidos os pressupostos de admissibilidade, conheço do agravo ministerial.

Consoante o Relatório da Situação Processual Executória, William cumpre pena total de 17 anos e 06 meses de reclusão, atualmente no regime semiaberto, pela prática de roubos majorados e receptação.

Depreende-se dos autos que, após a obtenção do requisito objetivo para a progressão de regime, o juízo a quo, em 16.05.2022, após dispensar a produção das avaliações psicossociais, deferiu o referido benefício ao apenado, bem como alterou a data-base para o dia do implemento do requisito objetivo, sob os seguintes fundamentos:

[...]

O apenado implementou o requisito objetivo para a progressão de regime, conforme demonstrado no RESPE. Quanto ao requisito subjetivo, verifico que ele ostenta conduta carcerária plenamente satisfatória. Ademais, as avaliações psicossociais foram dispensadas, pelos fundamentos expostos no mov. 163. De outro lado, in casu, entendo que o histórico carcerário do reeducando não impede a concessão do benefício. Com a devida vênia à agente ministerial, as faltas graves registradas nos autos ocorreram há mais de um ano, por isso, à vista da proporcionalidade, entendo não serem elas motivos suficientes a ensejar o indeferimento da progressão de regime, uma vez que já foram objetos de análise judicial, com aplicação das consequências legais. Desde a última falta homologada, registre-se, nenhuma outra intercorrência consta no histórico do apenado. Ademais, consigno que o fato de o reeducando possuir saldo significativo de pena a cumprir não obsta a concessão do benefício no presente momento, porquanto restam preenchidos os requisitos objetivo e subjetivo para tanto, nos moldes da Lei de Execução Penal. Inexistindo, portanto, neste momento qualquer outro elemento concreto a justificar a necessidade da manutenção da segregação do apenado no regime mais severo, o deferimento da progressão de regime é medida que se impõe.

Assim, desacolho a promoção do Ministério Público e DEFIRO a progressão de regime de cumprimento da pena privativa de liberdade para o semiaberto.

[...]

Retifique-se o RESPE, inclusive alterando-se a data-base para o dia 21/06/2021

[...]

Contra essa decisão se insurge, sem razão, o Parquet.

Explico.

Com efeito, regra geral, a possibilidade de concessão de progressão de regime não está mais submetida à necessidade de realização do exame psicossocial, segundo se depreende da leitura do artigo 112 da Lei de Execução Penal, cuja redação foi alterada pela Lei nº 10.792/2003.

Entretanto, tal diligência não foi banida do ordenamento jurídico, tendo sido editada, inclusive, súmula vinculante1 no sentido de viabilizar a realização do exame. No mesmo viés, o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula nº 4392, impondo que a decisão a exigir a avaliação seja fundamentada.

Logo, a Jurisprudência das Cortes Superiores3 tem firmado entendimento no sentido de que "a gravidade abstrata do delito pelo qual o apenado foi condenado é insuficiente à feitura da diligência pretendida".

Isso porque ainda que o delito pelo qual o apenado foi condenado tenha sido praticado com violência/grave ameaça (roubo majorado), o réu possui comportamento carcerário “plenamente satisfatório”, além de não haver apontamento de qualquer falta grave por ele praticada nos últimos 12 (doze) meses. Assim, ao efeito de cassar a decisão agravada e determinar a realizaçãodo do exame criminológico, remanesce como argumento ministerial apenas a gravidade abstrata dos delitos praticados pelo réu, bem como a pena fixada (expressiva) e o respectivo saldo ainda a cumprir, elementos estes que, isoladamente, não possuem o condão de obstar a concessão da benesse.

Quanto ao ponto, destaco que o Ministério Público, a fim de cassar a concessão do benefício, utiliza como argumento faltas graves (novo delito e fugas) cometidas há mais de 04 (quatro) anos.

Neste viés, implementado o lapso necessário e havendo atestado de bom comportamento carcerário, impositiva a manutenção da decisão que deferiu a progressão de regime ao apenado.

Em suma, se a nova lei reduziu as exigências ao deferimento de progressão de regime, entendo que o exame do requisito subjetivo baseado tão somente na conduta carcerária atende à exigência legal. Nesta senda, os laudos psicológicos e sociais são documentos acessórios à avaliação da progressão do apenado e à concessão de outras benesses ao longo da execução da reprimenda, podendo ser determinada sua realização em situações específicas e mediante decisão que indique a sua necessidade, a qual não se mostra pertinente ao caso concreto.

Portanto, como já explanado, verifico que o agravante não logrou em trazer quaisquer elementos concretos a embasar a necessidade da diligência em epígrafe - além das citadas circunstâncias que, por si só, não são capazes de afastar o deferimento da benesse -, de modo que, assim, resta infundada a cassação da decisão hostilizada, no caso específico dos autos.

Como consequência, a ausência de fundamentação idônea desautoriza a realização, em caráter de imprescindibilidade, do exame criminológico para fins de concessão de progressão de regime.

Subsidiariamente, o Ministério Público se insurge contra o marco em que foi fixada a nova data-base, argumentando, em síntese, que esta deve ser fixada no dia da decisão que concedeu o benefício – no caso, 16.05.2022 –, e não do implemento do requisito objetivo, por se tratar de decisão constitutiva de direito.

Em consonância ao que venho afirmando, o Supremo Tribunal Federal tem decidido, recentemente, no sentido de que o novo marco inicial deve ser a data em que o apenado implementar ambos os requisitos legais à progressão de regime – objetivo e subjetivo. Nesta linha, destaco excerto do voto do Ministro Gilmar Mendes, quando do julgamento do Habeas Corpus nº 115.254/SP, julgado em 15.12.2015, DJe 26.02.2016:

“[...] o marco para a progressão será a data que efetivamente corresponda ao preenchimento dos requisitos legais, e não a do início do cumprimento da reprimenda no regime anterior, sob pena de constrangimento ilegal. Essa é a melhor leitura da regra explicitada pelo artigo 112 da Lei de Execução Penal, entendendo a decisão judicial como declaratória do direito do apenado, com base no mesmo raciocínio aplicado à penalidades disciplinares decorrentes de falta grave, conforme previsão do artigo 118 do mesmo diploma legal. Dessa forma, faz-se um sistema lógico e justo.”. (p. 05).

Isso porque, segundo explica o Ministro, a decisão do juiz que deferir a progressão, sobrevinda, logicamente, ao preenchimento dos requisitos legais pelo apenado, é declaratória, e não constitutiva.” (p. 03). Aliás, interessante destacar o argumento por analogia lançado pelo Relator quando do referido precedente:

“[...] é de se reconhecer não pairar dúvida quanto ao reinício da contagem de prazo na situação de aplicação de punição disciplinar decorrente de falta grave pelo reeducando. Em caso de regressão, a data-base é o dia da prática da falta grave, e não do pronunciamento judicial posterior reconhecendo-a: em situações de progressão, a regra deve ser a mesma, o cumprimento dos requisitos legais é o marco. Não se pode admitir tratamento diverso para situações análogas. (p. 03).

Ademais, cumpre referir que o Superior Tribunal de Justiça já se alinhou a este entendimento, conforme precedentes que destaco:

PENAL. HABEAS COUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ESPECIAL. NÃO CABIMENTO. EXECUÇÃO PENAL. PROGRESSÃO DE REGIME. DECISÃO DE NATUREZA DECLARATÓRIA. ENTENDIMENTO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. NOVA ORIENTAÇÃO DA QUINTA TURMA. DATA-BASE PARA FUTURAS PROGRESSÕES. DATA NA QUAL IMPLEMENTADOS OS...

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