Acórdão nº 51243577020218210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Quarta Câmara Cível, 15-02-2023

Data de Julgamento15 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo51243577020218210001
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoVigésima Quarta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003254504
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

24ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5124357-70.2021.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: Empréstimo consignado

RELATOR: Desembargador JORGE ALBERTO VESCIA CORSSAC

APELANTE: SOLANGE DA SILVA RIBEIRO (AUTOR)

ADVOGADO(A): LISANDRO GULARTE MORAES (OAB RS043547)

ADVOGADO(A): JULIANA GULARTE MORAES (OAB RS060296)

ADVOGADO(A): CICERO DORIA VERAS CANABARRO (OAB RS089070)

APELANTE: BANCO BMG S.A (RÉU)

ADVOGADO(A): MARCO ANTONIO GOULART LANES (OAB BA041977)

APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

SOLANGE DA SILVA RIBEIRO e BANCO BMG S.A apelam da sentença que, nos autos da ação revisional ajuizada pela primeira em desfavor da última, assim julgou o pedido:

Pelo exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados pela parte autora para o fim de limitar os juros remuneratórios do contrato de empréstimo nº 1627638 à taxa média de mercado à época da contratação, de acordo com a taxa de juros estabelecida pelo Banco Central do Brasil na série 25465, condenando o réu à devolução dos valores cobrados em excesso, subtraindo-os, se for o caso, das parcelas vincendas, com a repetição simples do indébito caso exista crédito em favor da parte autora após a compensação dos valores, rejeitando os demais pedidos. O valor deverá ser corrigido monetariamente pelo IGP-M a partir de cada desembolso e acrescido de juros de mora de 1% ao mês a contar da data da citação.

Sucumbência parcial e recíproca, autoriza a divisão, metade para cada parte, das custas processuais. Honorários de cada patrono, fixados em R$ 1.000,00 (mil reais) custeados pela parte adversa. Suspensa a exigibilidade à parte autora em tendo havido o deferimento da gratuidade judiciária.

Opostos embargos de declaração, estes foram desacolhidos.

Em razões recursais, a parte autora ressaltou a existência de cobrança indevida, autorizando o deferimento da repetição em dobro do indébito. Postulou o provimento do recurso, com a majoração da verba honorária.

Por sua vez, a instituição financeira, requereu a manutenção dos juros remuneratórios pactuados ante a ausência de abusuvidade ou aplicação a taxa dos juros do crédito pessoal , o indeferimento da repetição do indébito e a redução da verba honorária.

Houve contrarrazões.

Subiram a esta Corte.

Vieram os autos conclusos, cumpridas as formalidades legais.

É o relatório.

VOTO

DA ADMISSIBILIDADE RECURSAL

O presente norteia-se pelas disposições processuais estabelecidas pelo Código de Processo Civil de 2015.

Com fundamento no art. 1010, §3º, in fine, presentes os pressupostos de admissibilidade intrínsecos e extrínsecos, recebo os apelos em ambos os efeitos.

Ausentes quaisquer das hipóteses previstas no art. 933 do CPC, passo ao exame do mérito.

DA RELAÇÃO CONTRATUAL

A presente ação tem por objeto o seguinte contrato:

- Contrato de empréstimo pessoal vinculado à composição de dívidas nº 1627638, firmado em 23/12/2019, prevendo juros remuneratórios no percentual de 18,01% ao mês e de 649,81% ao ano (evento 1, CONTR6).

RECURSO DA PARTE RÉ

JUROS REMUNERATÓRIOS

Com relação à revisão dos juros, embora não divirja propriamente quanto à possibilidade de alteração de dispositivos contratuais que se mostrem abusivos, vinha mantendo entendimento mais restritivo quando da identificação das hipóteses de abusividade, conforme reiteradamente sustentado em decisões anteriores, tanto em primeiro quanto em segundo grau. Não obstante isso, considerando as peculiaridades do trabalho colegiado e também com vistas a preservar a unidade do julgamento, nesse tópico passo a adotar o posicionamento dominante nesta Câmara conforme desenvolvimento que segue.

Embora a questão da incidência do Código de Defesa do Consumidor se encontre superada pela edição do verbete 297 do STJ, tal não significa que a revisão de cláusulas contratuais seja medida imperativa, senão nos casos de comprovada abusividade.

Nessa linha, persiste o princípio da liberdade na fixação dos juros remuneratórios nos contratos de mútuo e negócios bancários em geral, a exceção daqueles regidos por legislação especial.

Confira-se a Súmula n. 382 do STJ:

“A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade.”

A orientação emanada pelo Superior Tribunal de Justiça pauta-se no sentido de que, comprovada a abusividade na pactuação dos juros, aplica-se a taxa média de mercado divulgada pelo BACEN para o mês de celebração do instrumento.

"CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. BANCÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. JUROS REMUNERATÓRIOS. ABUSIVIDADE NÃO CONSTATADA. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. SÚMULAS N. 5 E 7 do STJ. DECISÃO MANTIDA.

1. As taxas de juros remuneratórios devem ser fixadas à taxa média de mercado quando verificada, pelo Tribunal de origem, a abusividade do percentual contratado.

2. No caso concreto, o acórdão recorrido afastou a alegada abusividade da taxa contratada. Dessa forma, não há como conhecer do recurso especial ante o óbice das Súmulas n. 5 e 7 do STJ.

3. A análise da extensão da sucumbência das partes para fins de aplicação do art. 21, parágrafo único, do CPC revela-se inviável em recurso especial, em virtude do óbice erigido pela Súmula n. 7/STJ. Precedentes.

4. Agravo regimental a que se nega provimento".

(AgRg no AREsp 393782 / MS, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, Quarta Turma, 16/09/2014, DJe 22/09/2014)

Nesse contexto, a redução dos juros depende de comprovação da onerosidade excessiva - capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada - em cada caso concreto, tendo como parâmetro a taxa média de mercado para as operações equivalentes.

No caso concreto, considerando os percentuais de juros pactuados no contrato nº 1627638, firmado em 23/12/2019, prevendo juros remuneratórios no percentual de 18,01% ao mês (evento 1, CONTR6), enquanto as taxas médias de mercado divulgadas pelo BACEN, à época da contratação para a operação do crédito pessoal não consignado vinculado à composição de dívidas era 3,32% (série 25465), resta caracterizada a abusividade.

Ainda, cabe ressaltar que a limitação deve observar a operação efetivamente pactuada pelas partes, no caso, crédito pessoal não consignado vinculado à composição de dívidas, na quantia de R$ 2.085,61 e a liberação somente do valor de R$ 255,31, como segue :

Logo, nego provimento ao apelo do réu.

RECURSO DE AMBAS PARTES

REPETIÇÃO DO INDÉBITO

Estabelece o art. 876, caput, do CC:

Todo aquele que recebeu o que lhe não era devido fica obrigado a restituir (...).

Portanto, havendo pagamento a maior, considerando a solução tomada no processo judicial, são devidas a compensação e a repetição do indébito, nos termos dos artigos 368 e 876 do CCB.

Refira-se, inclusive, que tal possibilidade restou sumulada pelo STJ:

Súmula 322 – Para a repetição de indébito, nos contratos de abertura de crédito em conta-corrente, não se exige a prova do erro.

Em respeito aos princípios que vedam o enriquecimento sem causa e a restituição integral, cabe, na hipótese, a compensação, a ser efetivada entre as parcelas prestadas ineficazmente pelo consumidor e o eventual débito pendente em razão dos negócios jurídicos celebrados com o fornecedor.

Assinale-se, ainda, que estão preenchidos os requisitos do instituto, pois os objetos das prestações recíprocas têm igual natureza, decorrendo a compensação de causa legal, evitando-se o enriquecimento sem causa do fornecedor que recebeu indevidamente quantias decorrentes de cláusulas inválidas.

Tal repetição, no entanto, é cabível na forma simples.

Ressalto que não obstante a recente decisão da Corte Especial do STJ aprovou tese no sentido de que a restituição em dobro do indébito (parágrafo único do...

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