Acórdão nº 51301856520228217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quarta Câmara Criminal, 01-09-2022

Data de Julgamento01 Setembro 2022
ÓrgãoQuarta Câmara Criminal
Classe processualHabeas Corpus
Número do processo51301856520228217000
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002604712
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

4ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Habeas Corpus (Câmara) Nº 5130185-65.2022.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Crimes do Sistema Nacional de Armas (Lei 9.437/97 e Lei 10.826/03)

RELATOR: Desembargador NEWTON BRASIL DE LEAO

PACIENTE/IMPETRANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

IMPETRADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

1. Trata-se de Habeas Corpus, impetrado em favor de MAICON RIBEIRO VICENTE, preso em flagrante, auto homologado, com posterior decretação de preventiva, e denunciado pela prática do ilícito de disparo de arma de fogo e porte ilegal de arma de fogo com numeração suprimida, ocorridos em Gravataí/RS.

Alegam, os impetrantes, estar o paciente sofrendo constrangimento ilegal face ausência dos requisitos autorizadores da segregação cautelar, bem como por faltar ao decreto preventivo de fundamentação idônea. Ademais, afirma que o paciente possui trabalho lícito e um filho menor de idade que depende de seu sustento para sobreviver. Pugna pela concessão de liberdade, e, alternativamente, pela aplicação de medidas cautelares (evento 1, INIC1).

A liminar foi indeferida (evento 4, DESPADEC1).

Sobreveio parecer da Dra. Procuradora de Justiça, em que opina pela denegação da ordem (evento 11, PARECER1).

É o relatório.

VOTO

2. O pleito não merece acolhida.

A prisão preventiva, por introduzir o agente prematuramente no sistema prisional, deve ser decretada em decisão fundamentada (artigo 93 inciso IX da CF) com observância aos requisitos previstos nos artigos 312 e 313 do CPP, e somente quando impossível a aplicação de medidas cautelares diversas da custódia (artigo 282 §6º do CPP).

Na hipótese, tenho que todos os pressupostos restaram satisfeitos.

Pelo que se extrai do inquérito policial nº 5012982-85.2022.8.21.0015, vinculado à impetração, o paciente foi preso em flagrante, em 17.06.2022, pela prática dos crimes de disparo de arma de fogo e porte ilegal de arma de fogo com numeração suprimida, pois conforme consta no registro de ocorrência (fls. 03/05 do evento 1, OUT1):

Em patrulhamento de rotina, próximo ao campo do Bagé, fomos informados por popular que um indivíduo estaria armado na via pública na rua Montenegro 719, e no local informado foi realizado contato com Sr Adair Cruz da Costa, RG 2025780401, o qual nos repassou que um indivíduo teria chegado no local e efetuado um disparo de arma contra ele e outros que estavam no local, na posse das características de atirador efetuamos buscas nas imediações, quando no local citado foi localizado Maicon Ribeiro Vicente RG 7096758698, com o qual, ao ser abordado em revista pessoal, foi localido um Revólver cal. 38 Taurus 6 tiros, 3 munições intactas e 1 deflagrada. Sendo assim foi encaminhado a UPA e a DPPA como de praxe.

Remetidos os autos do APF, o Juízo singular dispensou a audiência de custódia em razão de dificuldades técnicas em realizá-la (evento 8, DESPADEC1), e após oportunizar vista dos autos às partes, homologou o auto, acolheu a representação formulada pela autoridade ministerial, decretando a prisão preventiva em desfavor do paciente, e designou audiência de custódia (evento 22, DESPADEC1):

"O auto de prisão em flagrante, oriundo do registro de ocorrência policial de nº 3319/2022, imputa a MAICON RIBEIRO VICENTE a prática, em tese, dos crimes previstos nos arts. 15 e 16, § 1º, inciso IV, da Lei nº 10.826/03, em estado de flagrância, na forma do art. 302 do CPP, com observância de todos os requisitos formais. Com efeito, as hipóteses de flagrante previstas no art. 302 do CPP, mais especificamente as expressões “logo após” e “logo depois” devem ser lidas a partir da densificação estabelecida no art. 250 do mesmo diploma legal, pelas quais se considera flagrante a situação em que os responsáveis pela detenção, cientes das características físicas do agente, forem ao seu encalço, sem interrupção, como ocorreu no presente caso concreto.

Tão logo recepcionado em juízo, foi dada vista do auto ao Ministério Público e à defesa, fixando-lhes prazo de oito horas para manifestação.

E, de toda sorte, já adianto que é o caso de conversão em preventiva, conforme requerido tanto pela autoridade policial como pela representante do Ministério Público, o que torna superada qualquer arguição de nulidade quanto ao flagrante, uma vez que a prisão passará a subsistir com base em outro título (cf., a propósito, art. 310, §4º, in fine, do CPP e AgRg no HC 561.160/MG, rel. min. Nefi Cordeiro, 6ª Turma, DJe de 16/03/2020).

Homologo-o, então.

Passo à motivação quanto à necessidade da custódia cautelar.

A imputação amolda-se à hipótese do art. 313, inciso I, do CPP, em razão do patamar máximo da pena prevista para os delitos em questão.

Relativamente ao fumus comissi delicti, pelo auto de apreensão, exame preliminar quanto à funcionalidade da arma de fogo e depoimentos dos policiais Leonel e Jonatan, que participaram da detenção, assim como da testemunha presencial Adair, todos harmoniosos entre si, resta comprovada a existência do fato. Há, igualmente, indícios suficientes de autoria, na medida em que o agente foi apanhado na posse de um revólver com uma das munições deflagradas, além de ter sido reconhecido pela testemunha Adair como sendo o autor do disparo.

Já no que concerne ao periculum libertatis, há de se observar que o autuado, sem explicar por quê, portava uma arma de fogo municiada, cuja numeração encontrava-se suprimida, vindo a efetuar um disparo na direção de pessoas que estavam em um bar, o que pode, inclusive, no decorrer da instrução criminal, levar à conclusão de que agiu com dolo homicida. Está-se, pois, diante de situação gravíssima, a denotar a periculosidade do autuado.

Com efeito, tanto este tribunal como as cortes superiores reconhecem a existência de gravidade concreta em situações semelhantes, com risco à ordem pública, a partir da análise tão somente do modus operandi empregado, ainda que a parte imputada seja tecnicamente primária:

HABEAS COUS. PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO E DISPARO DE ARMA DE FOGO. ARTS. 14 E 15, AMBOS DA LEI Nº 10.826/03. PRISÃO PREVENTIVA. GRAVIDADE EM CONCRETO DOS FATOS. REITERAÇÃO DELITIVA. LEGALIDADE DA CUSTÓDIA.

Considerando os crimes, em tese, praticados, houve o cumprimento do requisito constante do art. 313, inc. I, do CPP. Quanto aos pressupostos do art. 312, do CPP, igualmente estão devidamente preenchidos no caso, pois as circunstâncias demonstram-se aptas a fundamentar a medida extrema, já que o acusado foi preso em flagrante logo depois de realizar disparos de arma de fogo, próximo a campo de futebol onde havia crianças jogando, sendo preso na sequência com o artefato bélico em punho, momento em que foi flagrado pelos policiais militares. Isso tudo ocorreu quando o paciente recém havia sido posto em liberdade, tendo permanecido preso cautelarmente por quase 1 (um) ano, em processo no qual se apura o crime de associação para o tráfico de drogas. Assim, obtida a liberdade há poucos dias, novamente voltou a delinquir, revelando que a sua liberdade coloca em risco efetivo a ordem pública, e a ineficiência das medidas cautelares alternativas.

ORDEM DENEGADA. (Habeas Corpus Criminal, Nº 51915323620218217000, Quarta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Rogerio Gesta Leal, Julgado em: 24-11-2021)

AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS COUS. PROCESSUAL PENAL. ARTS. 33 E 35 DA LEI N. 11.343/2006, 15 E 16 DA LEI N. 10.826/2003 E 329 DO CÓDIGO PENAL. NEGATIVA DE AUTORIA. NECESSIDADE DE ANÁLISE DE PROVAS. VIA INADEQUADA. PRISÃO PREVENTIVA. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. GRAVIDADE CONCRETA. MOTIVAÇÃO IDÔNEA. SUPOSTA EXISTÊNCIA DE CONDIÇÕES PESSOAIS FAVORÁVEIS. IRRELEVÂNCIA, NO CASO. MEDIDAS CAUTELARES DIVERSAS DA PRISÃO. INSUFICIÊNCIA, NA HIPÓTESE. ALEGADA DESPROPORCIONALIDADE DA CUSTÓDIA. IMPOSSIBILIDADE DE AFERIÇÃO. SUBSTITUIÇÃO PELA PRISÃO DOMICILIAR PARA CUIDAR DE FILHOS MENORES DE DOZE ANOS. IMPOSSIBILIDADE. EXCEPCIONALIDADE DEMONSTRADA. PRECEDENTES DESTA CORTE E DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.

1. Constatada pelas instâncias ordinárias a existência de prova suficiente para instaurar a ação penal, reconhecer que os indícios de materialidade e autoria do crime são insuficientes para justificar a custódia cautelar implicaria afastar o substrato fático em que se ampara a acusação, o que, como é sabido, não é possível na estreita e célere via do habeas corpus.

2. A custódia cautelar foi suficientemente fundamentada, nos termos do art. 312 do Código de Processo Penal, tendo em vista a gravidade concreta da conduta - consubstanciada na apreensão de razoável quantidade de maconha, após fuga em alta velocidade e perseguição policial em via pública, sobretudo em razão de disparos de arma de fogo contra os agentes de segurança e do comportamento agressivo da Agravante, bem como à vida dos filhos dos Autuados, duas crianças de pouca idade, que se encontravam dentro do carro em fuga, tendo sido uma delas foi baleada -, o que justifica a necessidade da prisão cautelar como garantia da ordem pública.

3. A existência de condições pessoais favoráveis - tais como primariedade, bons antecedentes, ocupação lícita e residência fixa - não tem o condão de, por si só, desconstituir a custódia antecipada, caso estejam presentes outros requisitos que autorizem a decretação da medida extrema, como ocorre na hipótese em tela.

4. Consideradas, no caso, a gravidade concreta da conduta, não se mostra suficiente a imposição de medidas cautelares diversas da prisão.

5. Não há como prever, nesta fase processual, a quantidade de pena que eventualmente poderá ser imposta, caso seja condenada a Paciente, menos ainda se iniciará o cumprimento da reprimenda em regime diverso do fechado, de modo que não se torna...

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