Acórdão nº 51339894120228217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quinta Câmara Criminal, 31-08-2022

Data de Julgamento31 Agosto 2022
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal
Classe processualHabeas Corpus
Número do processo51339894120228217000
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002461872
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

5ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Habeas Corpus (Câmara) Nº 5133989-41.2022.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Favorecimento da prostituição ou outra forma de exploração sexual de vulnerável CP art. 218-B

RELATOR: Desembargador IVAN LEOMAR BRUXEL

RELATÓRIO

Trata-se de habeas corpus em favor de ELIZANGELA K. F. DA S., presa desde 16 de dezembro de 2021, dada como incursa no artigo 218-B, c/c artigo 226, II, (1º fato) e 217-A, c/c artigo 226, II, (2º fato), do Código Penal. Denúncia recebida em 26/01/2022. E ainda em favor de ALISSON R. L., FELIPE G. Q. (menor) e GUSTAVO R. L. (menor)

Em síntese, aponta o constrangimento ilegal acerca da ilicitude da prova oral colhida em fase instrutória e determinar a renovação do ato, visto que os depoentes foram impedidos de exercer o seu direito de permanecerem em silêncio.

Liminar indeferida.

Prestadas informações.

Parecer pela denegação da ordem.

VOTO

Esta é a decisão atacada (abreviaturas ausentes no original):

TERMO DE AUDIÊNCIA

Presentes, o Juiz de Direito Gilberto Pinto Fontoura, o Ministério Público na pessoa do Promotor de Justiça André Luiz Tarouco Pinto; os advogados Vitor Zimermann RS120753 e Aline Zimermann RS060389, que defendem a ré ELIZANGELA K. F. S.. Presente a ré, na sala de videoconferências do Presídio Estadual Feminino Madre Pelletier. Fica consignado que a ré permaneceu com algemas, por questão da segurança, pois acompanhada por apenas uma agente penitenciária. Audiência realizada pelo sistema de videoconferência Pexip Infinity. ABERTA A AUDIÊNCIA com as formalidades legais, pelo Juiz foi dito que passa à instrução. Inquiridas as testemunhas de acusação Erika V. K. F. R., essa por meie de depoimento especial através da Assistente Social Mariana Rodrigues, do Foro de Novo Hamburgo, em consonância com o regramento previsto na Lei 13.431/17; Adriana S. R., Gustavo R. L., Gabriele G. Q., Felipe G. Q. e Alisson R. L.. Fica consignado que os depoimentos de Gustavo R. L. e Felipe G. Q., ambos menores de idade (15 e 16 anos), foram colhidos na presença de suas genitoras Adriana S. R.s e Cátia V. A. G.. Na sequncia, a defesa desistiu dos depoimentos das testemunhas Elisete N. B. e Joraci F. M., assim como já havia desistido do depoimento da testemunha Loini T. L., conforme evento 147. A desistência é homologada. Na sequencia, passo ao interrogatório, ficando consignado que a defesa entrevistou-se reservadamnente com a ré antes do interrogatório. Fica consignado a manifestação da defesa quanto das coletas dos depoimentos das testemunhas de acusação, Gustavo R. L. e Felipe G. Q., a pretensão de não serem ouvidos em razao de envolvimento de ambos no fato propriamente dito e que respondem a processo por ato infracional; A pretensão foi desacolhida pelo juizo na medida em que prestam depoimento na condição de informantes, não havendo previsão legal para se manterem em silêncio; A mesma colocação foi feita com relação ao depoimento de Alisson R. L., conforme já consignado na própria coleta do depoimento, por responder a investigaão crimninal pelo fato, o que também foi desacolhido, pelo mesmo fundamento. Com tal colocação, encerro a instrução. Oportunizo o debate, e por razão do adiantado da hora, sendo agora 17h22min e a audiência seguinte estar prevista para as 16h45min, portanto com regular atrazo, será procedido por memoriais, para o que assino o prazo sucessivo de 05 dias, à iniciar pelo MP; Após retornem conclusos para sentença. Eventual pedido pela defesa deverá, ser formalizado por escrito, em razão do adiantado da hora. Presentes intimados. Nada mais. - GRIFO NOSSO

Documento assinado eletronicamente por GILBERTO PINTO FONTOURA, Juiz de Direito, em 18/5/2022, às 18:2:50, conforme art. 1º, III, "b", da Lei 11.419/2006. A autenticidade do documento pode ser conferida no site https://eproc1g.tjrs.jus.br/eproc/externo_controlador.php?acao=consulta_autenticidade_documentos, informando o código verificador 10019237625v11 e o código CRC 3bcbc136.

E a justificativa do parecer (abreviaturas ausentes no original):

A presente ordem de Habeas Corpus não merece ser concedida.

A paciente foi presa preventivamente e denunciada pela prática dos seguintes delitos (evento 1 do processo originário):

(...)

1º FATO

Em data não precisada nos autos, mas até o dia 15 de dezembro de 2021, na Rua Sapoti, 352, Albatroz, Imbé/RS, a denunciada submetia Érika V. K. F. R., sua filha, adolescente de 13 anos, à prostituição.

2º FATO

No dia 15 de dezembro de 2021, por volta das 23h, na Avenida Mariluz, n.º 1.453, Mariluz, Imbé/RS, a denunciada, por omissão penalmente relevante de seu dever legal decorrente do poder familiar, teve conjunção carnal, por três vezes, por intermédio dos adolescentes Gustavo R. L. e Felipe G. Q. e do imputável Alisson R. L., com a vítima Érika V. K. F. R., sua filha, menor com 13 anos.

DAS CIRCUNSTÂNCIAS COMUNS A AMBOS OS FATOS

Na ocasião, a denunciada agenciava a sua filha Érika, menor de idade, para que, mediante retribuição financeira, realizasse programas sexuais com terceiros.

No dia 15 de dezembro, a denunciada intermediou um programa sexual da vítima com os adolescentes Gustavo R. L. e Felipe G. Q. pelo valor de R$ 20,00 (vinte reais). Após isto, a vítima foi até o local combinado, oportunidade em que manteve relações sexuais com os dois adolescentes acima mencionados e com o imputável Alisson R. L..

Posteriormente, o Conselho Tutelar tomou conhecimento dos fatos ocorridos, indo até a Delegacia de Polícia registrar a respectiva ocorrência, momento em que, após investigações prévias, a denunciada foi presa em flagrante.

(...)

Durante a instrução processual foram ouvidas, dentre outras pessoas, os adolescentes Felipe e Gustavo e o maior Alisson.

Na solenidade a defesa da paciente postulou que fossem advertidos os adolescentes e o maior acima indicado sobre o direito de não se autoincriminar, eis que também estão sendo investigados pelo crime de estupro de vulnerável da vítima dos fatos aqui apurados, o que restou indeferido conforme se observa do termo de audiência (evento 157 do processo originário):

(...)

Com efeito, em que pese o argumento do impetrante, tem-se que não restou demonstrado qualquer constrangimento ilegal no procedimento adotado.

Conforme a doutrina de Guilherme de Souza Nucci1 , o depoimento de menor infrator comparsa do réu é perfeitamente admissível:

10.6 Depoimento do menor inimputável comparsa do réu

É admissível o depoimento do inimputável, comparsa do réu, afinal, o menor de 18 anos, penalmente irresponsável (art. 27, CP), pode tomar parte ativa no cometimento de uma infração penal, associando-se ao maior. É o que se chama de concurso impropriamente dito ou pseudoconcurso de agentes.

Nessa hipótese, deve ele ser arrolado, normalmente, como testemunha, porque, na esfera penal, não pode ser considerado parte na relação processual estabelecida. Tem, pois, o dever de dizer a verdade. Nem se diga que ele precisa ter o mesmo tratamento do corréu, tendo direito ao silêncio e não sendo considerado testemunha, porque estaria respondendo – ou poderia vir a responder – pelo que fez na Vara da Infância e Juventude. Ora, segundo a legislação brasileira, busca-se, em caso de aplicação de medida socioeducativa, um melhor preparo do menor para a vida adulta, formando-o e reeducandoo apenas. Não se trata de punição, porque ele, segundo alei, não conseguia compreender o caráter ilícito do que praticou. Assim, exige-se-lhe narração fiel do que houve. Se mentir, caso esteja sob juramento, pode-se tomar providências para outro procedimento no foro competente. O maior de 14 anos será compromissado, enquanto o menor de 14 anos, por força do disposto do artigo 208 do CPP< de ser ouvido como informante. (sublinhei)

No mesmo sentido já se manifestou o Tribunal de Justiça do Paraná:

APELAÇÃO CRIMINAL. CORRUPÇÃO ATIVA DE TESTEMUNHAS. FIGURA QUALIFICADA. FINALIDADE DE SE PRODUZIR EFEITO EM PROCESSO PENAL. ART. 343, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CP. PROVA IDÔNEA A CARACTERIZAR O DELITO. IRRELEVÂNCIA DE A TESTEMUNHA SER ADOLESCENTE QUE TENHA PARTICIPADO DO DELITO. RECURSO DESPROVIDO. 1- O crime do art. 343 do CP se consuma com a dação, oferta ou promessa, independentemente da aceitação pela testemunha. 2- O fato do adolescente ser co-autor de crime não significa restrição à sua oitiva como testemunha, posto que, nos termos do art. 202 do CPP, com as ressalvas previstas nos arts. 206 e 207, do mesmo diploma, toda pessoa poderá ser testemunha. (TJPR - 2ª C.Criminal - AC - 120832-0 - Engenheiro Beltrão - Rel.: DESEMBARGADOR JOSÉ MAURICIO PINTO DE ALMEIDA - Unânime - J. 29.08.2002) – grifei

Por fim, quanto ao maior Alisson, igualmente não se verifica qualquer mácula a gerar nulidade, pois além de ter sido ouvido como informante, durante a sua oitiva, negou a prática do crime, não tendo, portanto, se autoincriminado. Ademais, até onde se tem conhecimento, inexiste processo criminal em andamento contra Alisson.

Assim, não se vislumbra qualquer constrangimento ilegal a ser corrigido em sede de Habeas Corpus.

Diante do exposto, o Ministério Público manifesta-se pelo conhecimento e denegação da ordem de Habeas Corpus.

Porto Alegre, 18 de julho de 2022.

Renato Vinhas Velasques,

Procurador de Justiça.

Inicialmente, cabe mencionar que foi impetrado habeas corpus versando a respeito de idêntico processo-crime originário e paciente - ELIZANGELA-, autuado sob o nº 5007956-06.2022.8.21.7000, sendo denegada a ordem:

HABEAS COUS. CÓDIGO PENAL. CRIMES CONTRA O A DIGNIDADE SEXUAL. ARTIGO 218-B, C/C ARTIGO 226, II, (1º FATO). FAVORECIMENTO DA PROSTITUIÇÃO OU DE OUTRA FORMA DE EXPLORAÇÃO SEXUAL DE CRIANÇA OU ADOLESCENTE OU DE VULNERÁVEL.ARTIGO 217-A, C/C ARTIGO 226, II. ESTUPRO DE VULNERÁVEL. ARTIGO 13, § 2º, “A”,...

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