Acórdão nº 51348423220218210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Quarta Câmara Cível, 20-04-2023

Data de Julgamento20 Abril 2023
ÓrgãoDécima Quarta Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo51348423220218210001
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003522670
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

14ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5134842-32.2021.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: Alienação fiduciária

RELATOR: Desembargador MÁRIO CRESPO BRUM

APELANTE: OMNI S/A CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO (RÉU)

APELADO: ANA BEATRIZ LOBO DE OLIVEIRA (AUTOR)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto por OMNI S/A CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO em face da sentença que, nos autos da ação de revisão contratual ajuizada por ANA BEATRIZ LOBO DE OLIVEIRA, julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados pela autora, decisão que contou com o seguinte dispositivo (Evento 98):

Assim, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a ação revisional ajuizada por ANA BEATRIZ LOBO DE OLIVEIRA contra OMNI S/A CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO, para:

1) determinar a revisão do(s) contrato(s) objeto(s) dos autos para:

- limitar os juros remuneratórios à taxa média de mercado, para o mês da contratação, permitida a capitalização, na forma da fundamentação.

2) condenar a parte ré a compensar o débito com o crédito da parte autora decorrente desta revisão, corrigindo-se monetariamente as parcelas pagas a maior pelo IGP-M, a contar de cada desembolso, com juros moratórios de 1% ao mês desde a citação e, remanescendo saldo credor em favor da parte autora, os valores deverão ser restituídos, na forma simples, com a mesma forma de atualização monetária e juros determinados na compensação;

3) descaracterizar a mora, razão pela qual o bem deve ficar na posse da parte autora e seu nome não deve ser negativado, ao menos enquanto não apurado o valor efetivamente devido;

4) rejeitar os demais pedidos, com fundamento no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil.

Condeno cada uma das partes ao pagamento de 50% das custas processuais, além de honorários advocatícios ao procurador da parte contrária, os quais fixo em 10% sobre o valor atualizado da causa. Suspensa a exigibilidade da parte autora em tendo havido o deferimento da AJG.

Interposta apelação, intime-se a parte adversa para contrarrazões no prazo legal. Com a juntada das contrarrazões, devolva-se à origem, para remessa de apelação ao Tribunal de Justiça.

Não havendo recurso, devolva-se à origem para providências finais, como apuração de custas, expedição de alvarás e baixa.

Subsistindo crédito em favor de uma das partes e/ou de seus procuradores, o cumprimento de sentença deverá ser promovido em procedimento eletrônico apartado, indicando-se o processo principal ao qual deve ser vinculado., conforme orientação posta no Ofício-Circular nº 077/2019-CGJ, item “6”.

Intimem-se.

Em suas razões (Evento 109), a instituição financeira impugna o valor atribuído à causa e aponta inépcia da inicial. No mérito, sustenta a regularidade dos juros remuneratórios pactuados. Defende a caracterização da mora contratual e a inexistência de valores a compensar ou restituir. Pede a revogação da tutela de urgência, considerando a inexistência de depósitos judiciais no valor incontroverso. Requer, assim, a reforma da sentença.

A parte autora apresentou contrarrazões (Evento 113).

Vieram os autos conclusos para julgamento.

Foram observadas as formalidades dos artigos 931 e seguintes do Código de Processo Civil, tendo em vista a adoção do sistema informatizado nesta Corte.

É o relatório.

VOTO

Inicialmente, com relação à aptidão da petição inicial, consigno que o artigo 330, §2º, do Código de Processo Civil, refere que esta será indeferida quando, nas ações que tenham por objeto a revisão de obrigação decorrente de empréstimo, de financiamento ou de alienação de bens, a parte autora não discriminar as obrigações contratuais que pretende controverter, assim como não quantificar o valor incontroverso do débito.

Inviável, porém, o pronto indeferimento da petição inicial, sem, antes, facultar que a requerente a emende, a fim de sanar eventual irregularidade, nos termos do artigo 321 do Código de Processo Civil, que ora transcrevo:

Art. 321. O juiz, ao verificar que a petição inicial não preenche os requisitos dos arts. 319 e 320 ou que apresenta defeitos e irregularidades capazes de dificultar o julgamento de mérito, determinará que o autor, no prazo de 15 (quinze) dias, a emende ou a complete, indicando com precisão o que deve ser corrigido ou completado.

Parágrafo único. Se o autor não cumprir a diligência, o juiz indeferirá a petição inicial.

No caso concreto, a demandante apontou, na petição inicial, os encargos que pretendia ver revisados e, posteriormente, na réplica, indicou o valor incontroverso da parcela mensal (R$ 897,12), conforme cálculo acostado no Evento 90.

Nesse contexto, ainda que apenas por ocasião da réplica, tenho que a parte autora logrou se adequar ao disposto no artigo 330 do Código de Processo Civil, não havendo falar em inépcia da petição inicial e, consequentemente, em extinção do processo.

No que se refere ao valor da causa, destaco o que dispõe o artigo 292, inciso II, do Código de Processo Civil:

Art. 292. O valor da causa constará da petição inicial ou da reconvenção e será:

(...)

II - na ação que tiver por objeto a existência, a validade, o cumprimento, a modificação, a resolução, a resilição ou a rescisão de ato jurídico, o valor do ato ou o de sua parte controvertida;

Na hipótese sob comento, postula a consumidora a revisão do contrato de financiamento de veículo com garantia de alienação fiduciária pactuado com a instituição financeira ré (Documento 3 do Evento 84), o qual ostenta valor total de R$ 52.418,40 (cinquenta e dois mil quatrocentos e dezoito reais e quarenta centavos).

Desse modo, em atenção ao disposto no referido artigo 292, inciso II, do Código de Processo Civil, o valor da causa deve corresponder à subtração do valor total da avença com a sua parte incontroversa (R$ 43.061,76 - quarenta e três mil sessenta e um reais e setenta e seis centavos -, conforme cálculo acostado no Evento 90), isto é, à sua parte controvertida (R$ 9.3560,64 - noventa e três mil quinhentos e sessenta reais e sessenta e quatro centavos), e não ao valor total do pacto, como indicou a parte autora, merecendo guarida, desse modo, a pontual irresignação da instituição financeira.

Dito isso, passo ao exame da matéria devolvida a esta Corte, que diz respeito aos seguintes tópicos: (a) juros remuneratórios; (b) mora contratual; (c) inscrição em cadastros restritivos de crédito; (d) manutenção da posse do bem financiado; e (e) devolução de valores.

Inicialmente, consigno que os negócios jurídicos bancários encontram-se sujeitos às disposições do CDC, consoante orientação jurisprudencial consolidada e descrita na Súmula 297 do Egrégio STJ:

O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras.

De outra parte, não há óbice à revisão das cláusulas inscritas em contratos bancários, em caso de abusividade, com consequente relativização do ato jurídico perfeito e do princípio pacta sunt servanda.

A respeito dos juros remuneratórios, o Superior Tribunal de Justiça, ao examinar o REsp n. 1.061.530/RS, submetido ao regime dos recursos repetitivos (Temas 24 a 27 do STJ), fixou sua orientação jurisprudencial nos seguintes termos:

DIREITO PROCESSUAL CIVIL E BANCÁRIO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIONAL DE CLÁUSULAS DE CONTRATO BANCÁRIO. INCIDENTE DE PROCESSO REPETITIVO. JUROS REMUNERATÓRIOS. CONFIGURAÇÃO DA MORA. JUROS MORATÓRIOS. INSCRIÇÃO/MANUTENÇÃO EM CADASTRO DE INADIMPLENTES. (...) ORIENTAÇÃO 1 - JUROS REMUNERATÓRIOS a) As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros...

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