Acórdão nº 51380218920228217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quinta Câmara Cível, 14-12-2022

Data de Julgamento14 Dezembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualAgravo de Instrumento
Número do processo51380218920228217000
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoQuinta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003002863
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

5ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Agravo de Instrumento Nº 5138021-89.2022.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Prestação de serviços

RELATORA: Desembargadora CLAUDIA MARIA HARDT

AGRAVANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

AGRAVANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

AGRAVADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

Trata-se de agravo de instrumento interposto por L.F.O.T., menor absolutamente incapaz, representado por sua genitora Juliana Garbachi de Oliveira, da decisão proferida na ação de obrigação de fazer que move contra a UNIMED - COOPERATIVA DE SERVIÇOS DE SAÚDE DOS VALES DO TAQUARI E RIO PARDO LTDA., indeferiu o pedido de tutela de urgência para que fosse determinado à ré que custeasse terapia multidisciplinar destinada a tramento de transtorno do espectro autista do qual o recorrente é portador.

A decisão agravada, de lavra do Dr. João Regert (Vara Judicial da Comarca de Arroio do Meio), dispôs (evento 8, DESPADEC1):

"Vistos.

Trata-se de ação de obrigação de fazer combinado com pedido de tutela de urgência proposta por LUIZ FERNANDO DE OLIVEIRA TELLIER em face UNIMED - COOPERATIVA DE SERVIÇOS DE SAÚDE DOS VALES DO TAQUARI E RIO PARDO LTDA, na qual sustenta que é portador de Transtorno do Espectro Autista

Relata que possui plano de saúde cuja cobertura é prestada pela ré. Aduz que foi diagnosticado com autismo (Transtorno do Espectro Autista - TEA - CID 11 602.0), sendo recomendado, por meio de laudo médico, o encaminhamento imediato do paciente para terapias multidisciplinares, quais sejam:

a) Intervenção comportamental embasada na Análise Aplicada do Comportamento (ABA), 20 horas semanais, em ambiente controlado (clínica), bem como 01 hora de supervisão semanal com psicologia com formação preconizada pela Associação Brasileira de Psicologia e Medicina Comportamental;

b) Psicoterapia semanal, realizada por psiquiatra infância e adolescência para alinhamento das estratégias comportamentais e orientação parental;

c) Terapia ocupacional para treino de habilidades da vida diária e redução dos sintomas relacionados ao distúrbio de processamento sensorial, duas (02) sessões por semana, com profissional com formação em Bobath e Certificação Internacinal em Integração Sensorial Ayres;

d) Terapia fonoaudiologia, com objetivo de estimulo da fala das habilidades comunicativas e planejamento motor da fala duas (02) sessões por semana;

e) Equoterapia uma (1) sessão por semana. A equoterapia utiliza o cavalo como um instrumento cinesioterapeutico, promotor de ganhos físicos, psicológicos e educacionais e busca aquisição e o desenvolvimento das funções motoras, psíquicas e sociais.

Inferiu que a empresa ré negou cobertura do plano de saúde ao tratamento indicado. Postulou, em sede liminar, seja determinado o fornecimento de cobertura aos tratamentos multidisciplinares na sua integralidade.

Pois bem, de acordo com o art. 300 do Código de Processo Civil, são requisitos essenciais para a concessão das tutelas provisórias de urgência, a demonstração da probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.

Os laudos médicos acostados (evento 1, LAUDO5, evento 1, LAUDO6,evento 1, LAUDO8 e evento 1, OUT14) fazem prova de que o autor sofre de autismo, em razão do que lhe foram prescritas as terapias multidisciplinares.

No entanto, em um juízo superficial da cognição sumária, próprio desssa fase processual, não se vilsumbra probabilidade do direito afirmado, em vista da julgamento recente do Supremo Tribunal de Justiça (STJ), que decidiu pelo rol taxativo de procedimentos da ANS. Isso significa que as operadoras dos planos de saúde são desobrigadas de cobrir procedimentos não incluídos na relação da agência reguladora. Desse modo, uma vez estabelecido que o rol é taxativo, os planos estão desobrigados de prestar cobertura de terapias de intervenção usadas para tratamento do TEA.

Observo que existente negativa da cobertura emitida pela empresa ré (evento 1, OUT9), em relação às terapias de Análise Aplicada do Comportamento (ABA) e Equoterapia. Por outro lado, as demais terapias são fornecidas em ambiente especial, de estrutura própria da ré, motivo pelo qual não houve a negativa e sim indicação e orientação à utilização deste espaço.

Desta forma, tendo havido a disponibilização de parte do tratamento através do serviço na rede assistencial na Região de Saúde Vale do Taquari e Rio Pardo, não resta evidenciada a probabilidade do direito invocado.

Assim, INDEFIRO a antecipação de tutela."

Em suas razões, sustenta que a probabilidade do direito afirmado na causa de pedir da ação que move contra a administradora do plano de saúde contratado encontra suporte em virtude da atual ampliação do rol dos procedimentos obrigatórios que possuem cobertura, constante na Resolução n. 465/2021 do ANS, que incluiu o tratamento para os segurados portadores de transtornos globais do desenvolvimento, dentre eles o do espectro autista. Outrossim, o perigo de dano resta configurado em face de que, havendo a interrupção do tratamento multidisciplinar ao qual o paciente já se submete, haverá prejuízo ao seu desenvolvimento e de consequente melhora no futuro. Diz que, dos cinco tratamentos postulados na esfera administrativa, dois foram negados pela ré UNIMED (Intervenção comportamental embasada na Análise Aplicada do Comportamento - ABA, e Equoterapia), enquanto que os três restantes (Psicoterapia semanal, Terapia ocupacional com profissional com formação em Bobath e Certificação Internacional em Integração Sensorial Ayres e Terapia fonoaudiologia) foram disponibilizados, porém para serem prestados por profissionais credenciados perante o plano de saúde.

Argumenta que a troca da equipe multidisciplinar que já atende ao ora agravante irá causar retrocesso na melhora do seu desenvolvimento até então atingida. Assevera que o progresso obtido decorre da estreita relação criada entre paciente e profissional. Alude que consoante demonstrou em laudo médico, o recorrente se encontra em idade mais propícia para adquirir e desenvolver habilidades que normalmente não terá por força da doença que lhe aflige.

Pugna pela atribuição de efeito ativo e, no mérito, pelo provimento do recurso.

O agravo de instrumento foi recebido no duplo efeito.

Intimada, a agravada apresentou contrarrazões.

A Dra. Procuradora de Justiça exarou parecer pelo provimento do recurso.

Os autos vieram conclusos para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Eminentes Colegas: Conforme já referido no evento 7, DESPADEC1 dos autos eletrônicos, o recurso é cabível, amoldando-se à hipótese contida no art. 1.015, I, do CPC. Outrossim, restaram preenchidos os pressupostos de admissibilidade previstos no art. 1.017 do mesmo estatuto processual.

No caso, o agravante postulou que a agravada custeasse o tratamento prescrito a ser executado por uma equipe multidisciplinar - Intervenção comportamental embasada na Análise Aplicada do Comportamento - ABA, Equoterapia, Psicoterapia semanal, Terapia ocupacional com profissional com formação em Bobath e Certificação Internacional em Integração Sensorial Ayres e Terapia fonoaudiologia -, já iniciado em clínica não conveniada.

Realizada a solicitação no âmbito administrativo, a operadora do plano de saúde demandada negou cobertura para o tratamento de Intervenção comportamental embasada na Análise Aplicada do Comportamento - ABA e Equoterapia, enquanto que no concernente às três restantes, colocou à disposição os profissionais capacitados de sua rede credenciada e um espaço específico para prestar o atendimento reclamado, criado especialmente para pacientes portadores de transtornos globais de desenvolvimento.

Consigno, de início, que as relações contratuais que envolvem planos de saúde se submetem às regras do Código de Defesa do Consumidor, conforme sedimentado pelo STJ na Súmula n. 608:

Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde, salvo os administrados por entidades de autogestão.

Sendo assim, as cláusulas contratuais deverão ser interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor (CDC, art. 47).

Daí o entendimento, igualmente consolidado, de que, havendo cobertura contratual para a doença, as operadoras estão obrigadas a custear o tratamento respectivo, não podendo se sobrepor à prescrição médica.

Destaco:

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PLANO DE SAÚDE. VIOLAÇÃO DO ARTIGO 1.022 DO CPC/2015. NÃO OCORRÊNCIA. LIMITAÇÃO DE SESSÕES. IMPOSSIBILIDADE. ANS. ROL EXEMPLIFICATIVO. TRATAMENTO MÉDICO. COBERTURA. RECUSA INDEVIDA. DANOS MORAIS. CARACTERIZAÇÃO.
1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ).
2. Não há falar em negativa de prestação jurisdicional se o tribunal de origem motiva adequadamente sua decisão, solucionando a controvérsia com a aplicação do direito que entende cabível à hipótese, apenas não no sentido pretendido pela parte.
3. A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça reafirmou a jurisprudência no sentido do caráter meramente exemplificativo do rol de procedimentos da ANS, reputando abusiva a negativa da cobertura pelo plano de saúde do tratamento considerado apropriado para resguardar a saúde e a vida do paciente.
4. A jurisprudência desta Corte Superior reconhece a possibilidade de o plano de saúde estabelecer as doenças que terão cobertura, mas não o tipo de tratamento utilizado para a cura de cada uma delas.
5. É abusiva a negativa da cobertura pelo plano de saúde de tratamento/medicamento considerado apropriado para resguardar a saúde e a vida do paciente.
6. Esta Corte Superior firmou entendimento no sentido de que, tendo se caracterizado a recusa indevida de cobertura pelo plano de saúde, deve ser reconhecido...

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