Acórdão nº 51450396420228217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Oitava Câmara Criminal, 31-08-2022

Data de Julgamento31 Agosto 2022
ÓrgãoOitava Câmara Criminal
Classe processualAgravo de Execução Penal
Número do processo51450396420228217000
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002604407
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

8ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Agravo de Execução Penal Nº 5145039-64.2022.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Roubo majorado (art. 157, § 2º)

RELATORA: Desembargadora ISABEL DE BORBA LUCAS

AGRAVANTE: ALISSON NOBRE XAVIER

AGRAVADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

RELATÓRIO

ALISSON NOBRE XAVIER interpôs agravo em execução penal contra a decisão que reconheceu o cometimento de falta grave, de sua parte, por fuga, determinando a regressão de seu regime carcerário e a alteração da data base para nova progressão.

Em suas razões (evento 3, DOC1, fls. 112/117), o agravante alegou, em síntese, a atipicidade da conduta que lhe foi imputada, pois o descumprimento da prisão domiciliar não configura fuga, falta grave somente configurada nos casos em que o apenado obtém a liberdade causando dano ou usando violência. Destacou, ademais, que a justificativa apresentada deve ser acolhida, pois somente deixou sua residência para intervir em uma briga familiar para evitar maiores consequências. Salientou já servir como punição o tempo de regressão cautelar, tornando-se desproporcional o reconhecimento da falta grave e a aplicação de seus consectários legais. Subsidiariamente, quanto à regressão de regime, referiu não ser aplicável ao caso concreto, por violação ao princípio da proporcionalidade, não sendo qualquer falta grave que admite sua adoção, notadamente diante da desproporção existente entre as causas ensejadoras da possibilidade de regressão. No concernente à alteração da data base para benefícios, sustentou inexistir previsão legal para sua imposição.

Com base nessas considerações, requereu o provimento do agravo.

Contrarrazões pelo desprovimento do recurso (evento 3, DOC1, fls. 119/121).

Mantida a decisão (evento 3, DOC1, fl. 128).

Em parecer, opinou o ilustre Procurador de Justiça, Dr. Aureo Rogério Gil Braga, pelo desprovimento do recurso (evento 8, DOC1).

Vieram conclusos.

É o relatório.

VOTO

O recurso, adianto, não merece provimento.

Na espécie, ALISSON NOBRE XAVIER cumpre pena total de 23 (vinte e três) anos, 04 (quatro) meses e 12 (doze) dias de reclusão, atualmente em regime fechado, pela prática de crimes de roubo majorado.

Em 14/11/2021, encontrando-se, o agravante, em prisão domiciliar, mediante inclusão no sistema de monitoramento eletrônico, sobreveio notícia dando conta da violação da integridade do equipamento, nos seguintes termos (evento 3, DOC1, 18/19):

1º contato telefônico: monitorado entrou em contato com o ipme5 na data de 14/11/2021 aproximadamente às 12:24hs, relatando que a tornozeleira estava vibrando na perna em ato continuo, foi verificado no sistema ocorrências de integridade e bateria descarregada na data e hora: 14/11/2021 às 11:54hs, de imediato foi agendado com o monitorado a inspeção do dispositivo no IPME5 para às 16hs desta mesma data. Operador responsável: 3821196

2º contato telefônico: o monitorado não compareceu à inspeção agendada neste IPME5. Realizado novo contato telefônico aproximadamente às 19hs, atendeu a mãe do apenado (sra ângela) e alegou que seu filho não estava em casa e havia saído sem dar satisfação. Operador responsável: 4474198

3º contato telefônico: realizado novo contato telefônico na mesma data às 23hs, onde novamente atendeu a mãe do monitorado(Sra. Ângela), alegou que seu filho ainda não retornou para a casa e nem faz ideia da localização do mesmo. Devido as ocorrências de integridade(rompimento) e bateria descarregada, a tornozeleira do apenado perdeu a comunicação com o sistema (sem localização) desde aproximadamente às 14hs do dia 14/11/2021. operador responsável: 4203992

4º contato telefônico: realizado novamente tentativa de contato telefônico na data de 15/11/2021 ás 09:30hs, atende a mãe do monitorado Sra. Ângela, a qual relata que seu filho não está em casa e também não sabe sua localização. Operador responsável: 4203364

5° contato telefônico: feito contato telefônico na data de 15/11/2021 ás 10:45hs para fins de obter alguma informação atualizada do caso em questão, porém sem sucesso. Por fim, permanecendo o incidente por mais de 24hs sem solução, registra-se que o monitorado permanece com as ocorrências ativas no sistema e consequentemente sem a efetiva monitoração. Operador responsável: 4203364

Diante disso, considerando o descumprimento das condições do benefício, a prisão domiciliar foi revogada, sendo determinado o recolhimento do apenado em regime cautelar fechado, até a apuração de eventual falta grave, com recaptura em 09/12/2021 (evento 3, DOC1, fls. 27/29 e 39/40).

E, quando ouvido, em juízo, nos moldes do determinado no § 2º do artigo 118 da LEP, ALISSON assim se manifestou (seq. 205.1 do SEEU):

(...) No caso eu residia no endereço, na Rua (...), no qual foi emitido a carta (...), que era casa locada. Aí eu fui pra residência da minha irmã, no qual ela mora embaixo, num sobrado, e a minha mãe foi (...) por causa que eu perdi meu pai de acordo com a pandemia. Aí resumindo: meu cunhado se embebedava direto aos finais de semana, ele agredia a minha irmã, no qual eu desci do segundo andar pra tentar evitar um problema maior entre meus familiares, que era minha irmã e meu cunhado, eles não se sentiram bem e me pediram pra eu me deslocar do endereço deles. No qual eu já tinha feito uma mudança de endereço no lugar onde eu residia, que foi aonde que eu consegui meu benefício, aí eu não tive como... eu liguei pro monitoramento e eles me pediram mais noventa dias para mim trocar pra um novo endereço e infelizmente eu não sabia o que fazer. Infelizmente numa atitude precipitada, uma atitude bem dizer uma das piores que eu tomei em minha vida... eu tava trabalhando no PAC urbano para poder dar uma ajuda para minha família (...) sendo que esta atitude que eu tomei só me prejudiquei a mim mesmo. Aí eu fiquei perambulando, ficando num local e noutro, com medo de ser preso, por causa que eu sabia que isso aí uma hora isso aí eu teria que pagar pelo meu erro. Infelizmente hoje estou aqui para tentar me redimir desse erro. Eu peço para o senhor ajuda o máximo possível. (...)

Nesse contexto, não há como afastar o cometimento da falta grave, pela fuga, admitida pelo próprio agravante. E a justificativa apresentada não tem qualquer possibilidade de acolhimento, não cabendo ao apenado escolher a conduta que mais lhe beneficie, divorciando-se do cumprimento de sua reprimenda, em total discordância com o dever jurídico que lhe foi imposto pela pena aplicada. Aliás, não só nada veio aos autos a fim de corroborar a versão apresentada, como também sequer teria o condão de justificar o descarregamento da bateria e rompimento da tornozeleira. Em realidade, diante da situação narrada, a ALISSON caberia manter contato com a administração prisional, inclusive comparecendo à inspeção agendada, explicando sua situação e solicitando as providências pertinentes, inclusive eventual troca de endereço, inexistindo motivos para a retirada do dispositivo eletrônico. Entretanto, em conduta absolutamente contrária aos deveres decorrentes do cumprimento da pena que lhe foi imposta, optou por se livrar da monitoração eletrônica, permanecendo nesta condição por aproximadamente um mês, até posterior recaptura, pela força policial.

Oportuno ressaltar, ademais, em atenção ao constante do arrazoado recursal defensivo, que não há falar em atipicidade da conduta faltosa, consistente na violação da zona de inclusão do monitoramento eletrônico, na medida em que o agravante permaneceu fora dessa, à qual sua liberdade estava restringida, caracterizando-se a fuga. Efetivamente, ALISSON encontrava-se em cumprimento de pena, ainda que em liberdade eletronicamente monitorada, oportunidade na qual violou a zona de inclusão, claramente evidenciada a fuga, sem justificativa plausível. Nesse sentido, a exigência do artigo 50 da LEP é de que o apenado esteja cumprindo a pena privativa de liberdade, independentemente do regime, seja fechado, semiaberto ou aberto ou, ainda, mediante o benefício do monitoramento eletrônico. Assim, não se trata de simples descumprimento das regras do monitoramento eletrônico, conforme artigos 146-B e seguintes da LEP, mas verdadeira infração disciplinar, em razão da fuga empreendida.

Por outro lado, a alegação de que não teria havido fuga propriamente dita, porquanto o agravante não se evadiu do cárcere por burla à vigilância que o cercava, pois se encontrava em local sem vigilância permanente, não merece acolhida. Na verdade, não se pode utilizar um conceito restrito de fuga, a fim de beneficiar o agravante, pois não lhe cabe escolher outra conduta que não a de cumprir sua pena, pouco importando, portanto, se escapou do estabelecimento prisional burlando ou não a vigilância.

De igual sorte, embora se admita a fuga como ínsita à natureza humana, não há falar em atipicidade da falta, na medida em que, se assim não se procedesse, o apenado faltoso permaneceria em situação idêntica a do cumpridor de todas as sanções que lhe são impostas, em verdadeira violação ao princípio da individualização da pena. Aliás, a punição daquele que foge limita-se ao âmbito da execução penal justamente por se reconhecer o direito fundamental de liberdade e se considerar a sua busca inerente ao homem. Ocorre que o agravante se encontra tolhido de sua liberdade...

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