Acórdão nº 51458571620228217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Sétima Câmara Cível, 26-01-2023

Data de Julgamento26 Janeiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualAgravo de Instrumento
Número do processo51458571620228217000
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoDécima Sétima Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003009883
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

17ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Agravo de Instrumento Nº 5145857-16.2022.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Arrendamento rural

RELATOR: Desembargador ICARO CARVALHO DE BEM OSORIO

AGRAVANTE: ANTONIO MOISES DOS SANTOS MOREIRA

AGRAVANTE: ARTUR CRESTANI DE OLIVEIRA

AGRAVADO: CARLOS MACIEL NUNES DOS SANTOS (Espólio)

RELATÓRIO

Trata-se de agravo de instrumento interposto por ANTONIO MOISES DOS SANTOS MOREIRA e ARTUR CRESTANI DE OLIVEIRA, em combate à decisão proferida na ação anulatória de ato jurídico e rescisão de contrato cumulada com despejo agrário, que o ESPÓLIO DE CARLOS MACIEL NUNES DOS SANTOS lhe move perante a 2ª Vara Judicial da Comarca de Lagoa Vermelha, que deferiu o pedido liminar, para reintegrar o agravado na posse dos imóveis descritos nas matrículas de nº 23.129 e 23.130, do Registro de Imóveis da Comarca de Lagoa Vermelha, proibindo, por consequência, os agravantes de praticarem qualquer ato de esbulho, sob pena de multa pecuniária no valor de R$ 1.000,00 por dia de atraso no cumprimento da ordem judicial.

Em suas razões, os agravantes sustentam que devem ser mantidos na posse, para permitir o manejo da lavoura implantada até a colheita, além da finalização da engorda do gado, sendo equivocada a reintegração de posse concedida ao agravado, pois não foram consideradas estas questões na decisão recorrida. Requerem a atribuição de efeito suspensivo ao recurso, para permitir aos agravantes concluir o plantio, manejo e colheita da cultura de trigo implantada na área, bem como da engorda dos bovinos, bem como requerem que se torne indisponíveis as áreas rurais de matricula nº 23.130 e o de matricula nº 23.129, anotando no Registro de Imóveis de Lagoa Vermelha, RS a indisponibilidade, até o final do processo, como forma de garantia patrimonial a futura indenização que por ventura seja compelido o agravado a indenizar os agravantes, pelas perdas de cultura, dos investimentos e das benfeitorias realizadas. Por fim, requerem a concessão do benefício da gratuidade da justiça e o provimento do agravo para reformar a decisão do juízo a quo e suspender a reintegração de posse deferida aos agravados em relação às matrículas nº 23.130 e nº 23.129 até o final do processo de discussão da validade ou não do contrato de arrendamento e os seus efeitos.

Indeferido o benefício da gratuidade judiciária, os agravantes foram intimados para efetuarem o preparo.

Na sequência, o preparo foi providenciado.

Recebido o agravo e indeferido o efeito suspensivo.

Intimado, o agravado apresentou contrarrazões, evento 22, CONTRAZ1.

Vieram os autos conclusos para julgamento.

VOTO

Preenchidos os pressupostos de admissibilidade, conheço do agravo interposto.

A decisão agravada possui o seguinte teor:

Vistos.

1. Defiro a gratuidade judiciária à parte autora.

2. Dada a urgência que reveste o caso em testilha, os requisitos da inicial e/ou eventual necessidade de emenda serão analisados por ocasião da audiência de conciliação.

3. Retifique-se o polo ativo da demanda a fim de constar somente o Espólio de Carlos Marciel Nunes dos Santos.

4. Trata-se de ação anulatória de ato jurídico e/ou extinção/rescisão de contrato cumulada com despejo agrário e cobrança com pedido de medida liminar de reintegração de posse ajuizada pelo Espólio de Carlos Marciel Nunes dos Santos em face de Artur Crestani de Oliveira e Antonio Moises dos Santos Moreira.

Narra a inicial que os réus firmaram contrato de arrendamento rural com o de cujus Carlos Marciel Nunes dos Santos, com 74 anos de idade na época e de parca instrução, de área de terra rural; que há má-fé contratual nas cláusulas avençadas, pois o prazo de validade é de 25 anos, quando a praxe é de 5 anos, e o preço do arrendo de 4 sacas de soja por hectare é vil, comparado com a prática agrícola.

Assevera que não foi pago o arrendo vencido no mês de maio e, em razão do falecimento o proprietário do imóvel, o Espólio tem o interesse em vender a área de terras para o encerramento do inventário ou tomar posse para o cultivo em economia familiar; que no dia 09/06/2022 aconteceu reunião com o inventariante, o seu procurador, o corretor de imóveis e os réus para cientificá-los do interesse na rescisão do contrato, formulando proposta para a venda do bem, fixando prazo para manifestação de vontade até o dia 19/06/2022. Além da reunião, o procurador do autor notificou os réus por whatsapp acerca do direito de preferência na compra e cientificando-os para rescisão contratual para a desocupação do imóvel.

Diante do silêncio dos réus, o inventariante tomou posse do bem e estava preparando-a para o cultivo da safra agrícola. No dia 06/07/2022, o inventariante saiu do imóvel, fechando os portões com cadeado e quando retornou encontrou o réu Artur e duas pessoas realizando o plantio; que disse para pararem com a plantação, oportunidade em que foi ameaçado.

Postula, em sede de tutela de urgência, a expedição de mandado de despejo agrário dos requeridos, com a reintegração do inventariante na posse dos imóveis.

É o relato.

Decido.

Para fins de concessão da tutela possessória compete ao autor produzir provas nos termos do art. 561 do CPC:

Art. 561. Incumbe ao autor provar:

I - a sua posse;

II - a turbação ou o esbulho praticado pelo réu;

III - a data da turbação ou do esbulho;

IV - a continuação da posse, embora turbada, na ação de manutenção, ou a perda da posse, na ação de reintegração.

No caso em apreço, ao que se percebe dos autos, os requisitos legais estão preenchidos.

A propriedade registral da terra está comprovada através da cópia das matrículas nº 23.129 e 23.130 (Evento 1, MATRIMÓVEL7 e Evento 1, MATRIMÓVEL8). O contrato de arrendamento firmado entre o falecido Carlos e os réus comprovado pelo documento do 'Evento 1, CONTR5', o qual corrobora o deduzido pelo autor no que pertine ao prazo excessivo de validade do contrato agrário - 25 anos, quando o Estatuto da Terra prevê o mínimo de três anos e a prática agrária recomenda o tempo máximo de 5 anos, consoante comprovam os contratos anexados nos arquivos 'Evento 1, COMP12, COMP13 e COMP14'.

Outro fator que não está em consonância com o mercado agrícola é o preço pago pelo arrendo. A cláusula quinta do contrato prevê:

CLÁUSULA QUARTA - Ao término do prazo de arrendamento . caso haja interesse das partes na renovação deste contrato, ele poderá ser renovado, mediante a fixação de novo preço do arrendamento, se isto for necessório.

Correlacionando-se o total da área arrendada de 58ha (cláusula primeira do contrato), tem-se que o valor por hectare é pouco superior a 4 sacas de soja por hectare. Comparativamente, o preço é muito aquém daquele utilizado em similares, conforme muito bem demonstram os arquivos acima identificados.

De considerar, também, que a intenção do espólio em retificar toda a situação, restabelecendo o equílibrio contratual, está desmontrada através da reunião com os réus, corretor de imóveis e advogado, consoante comprova a declaração do ' Evento 2, OUT2'. Não obstante, os réus foram cientificados pelo procurador do espólio, via whatsapp, de que teriam o prazo de 10 dias, a contar de 09/06/2022 para manifestarem o interesse na compra do imóvel e, no caso de desinteresse, da rescisão contratual, ou seja, até o dia 19/06/2022, conforme Ata Notarial (Evento 1, NOT9). Transcorreu o lapso decenal sem nenhum aceno dos requeridos, o que demonstra o desinteresse no direito de preferência, e, por conseguinte, autoriza o inventariante a retomar a posse da terra em face da dissolução do contrato.

Já, a posse da parte autora se dá pelo princípio saisine, nos termos do previsto no art. 1.784 do Código Civil. Embora de início tenha-se posse precária, de registrar que a partir do momento em que os réus silenciaram à proposta de compra e venda do imóvel, isto é, desde 20/06/2022 o inventariante imediatamente retomou o exercício da posse direta do bem, inclusive preparando-se para a realização do plantio da safra.

De igual sorte, o esbulho está caracterizado pelas fotografias dos arquivos do 'Evento 2, OUT3 e OUT4', bem como pela declaração do 'Evento 2, OUT7' e Boletim de Ocorrência do 'Evento 2, OUT8'.

A data do esbulho é evidenciada no registro do Boletim de Ocorrência. Portanto, o esbulho possessório data de menos de ano e dia, o que autoriza a análise da tutela sob o...

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