Acórdão nº 51497597420228217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Câmara Cível, 14-12-2022
Data de Julgamento | 14 Dezembro 2022 |
Tribunal de Origem | Tribunal de Justiça do RS |
Classe processual | Agravo de Instrumento |
Número do processo | 51497597420228217000 |
Tipo de documento | Acórdão |
Órgão | Vigésima Câmara Cível |
PODER JUDICIÁRIO
Documento:20003100438
20ª Câmara Cível
Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906
Agravo de Instrumento Nº 5149759-74.2022.8.21.7000/RS
TIPO DE AÇÃO: Direito de Vizinhança
RELATOR: Desembargador GLENIO JOSE WASSERSTEIN HEKMAN
AGRAVANTE: CARMEN REGINA DA ROCHA
AGRAVANTE: VLADIMIR DA ROCHA
AGRAVADO: CRISTIANO BECHE
RELATÓRIO
Trata-se de agravo de instrumento interposto por CARMEN REGINA DA ROCHA e VLADIMIR DA ROCHA contra decisão interlocutória que indeferiu pedido liminar, nos autos da ação de obrigação de não fazer movida em face de CRISTIANO BECHE.
A decisão agravada está assim redigida:
Vistos.
Trata-se de ação ajuizada por VLADIMIR DA ROCHA e CARMEN REGINA DA ROCHA em face de CRISTIANO BECHE. Nos dizeres da inicial, o Réu, vizinho dos Autores, invadiu por diversas vezes a fronteira e destruiu dentro das imediações do terreno dos Autores, realizando desmate e destruição sem qualquer permissão. Requerem, em tutela de urgência, que seja determinado ao Réu que se abstenha de podar e invadir a propriedade dos Autores sem qualquer permissão e que não destrua nenhum patrimônio, sob pena de multa diária. Requerem, também, a concessão da gratuidade de justiça. Juntam documentos.
É O RELATÓRIO.
PASSO A DECIDIR.
1. Diante dos documentos de Evento 1, DECLPOBRE3/4, que comprovam auferir a parte renda inferior a 05 salários mínimos mensais, conforme orientação firmada pelo Enunciado nº 49 do Centro do Estudos do TJ-RS1, concedo a gratuidade de justiça postulada pelos Autores.
2. Por ter a presente ação pedido para que o Réu se abstenha de podar, invadir e destruir a propriedade dos Autores, tendo, assim, como objeto a defesa preventiva da posse diante de atos de turbação ou esbulho iminente, recebo a ação como interdito proibitório, forte no art. 554 do CPC2.
2.1. Da tutela de urgência.
No Livro V da Parte Geral do Processo Civil, cujo título é “Tutela Provisória”, regulam-se institutos diversos, a saber, (i.) a tutela cautelar, (ii.) a tutela antecipada e (iii.) a tutela de evidência.
Isso porque, segundo o art. 294 do CPC, a tutela provisória pode ser fundada em urgência ou evidência.
Ainda, a tutela provisória de urgência pode ter natureza cautelar ou antecipada, bem como ser concedida em caráter antecedente (antes, portanto, da propositura da ação principal) ou incidental (concomitante ou durante a tramitação da ação principal).
Analiso, então, os requisitos para cada um dos provimentos.
Segundo o art. 300 do Código de Processo Civil,
“Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.”
§ 1º Para a concessão da tutela de urgência, o juiz pode, conforme o caso, exigir caução real ou fidejussória idônea para ressarcir os danos que a outra parte possa vir a sofrer, podendo a caução ser dispensada se a parte economicamente hipossuficiente não puder oferecê-la.
§ 2º A tutela de urgência pode ser concedida liminarmente ou após justificação prévia."
A tutela de urgência – que pode ter natureza cautelar ou antecipatória – exige, para o seu deferimento, (i.) a probabilidade do direito (fumus boni iuris) e (ii.) o perigo de dano ou risco ao resultado útil ao processo (periculum in mora).
O que diferencia o tipo de provimento – se a tutela de urgência tem natureza antecipatória ou cautelar – é justamente o bem que se procura proteger.
Caso se procure assegurar o resultado útil do processo, trata-se de tutela de urgência de natureza cautelar.
Todavia, caso se procure antecipar o próprio bem da vida que se busca ao final do processo de conhecimento, trata-se de tutela de urgência de natureza antecipatória.
Já a tutela de evidência não exige, para a sua concessão, prova de urgência (perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo).
Conforme o art. 311 do Código de Processo Civil,
“Art. 311. A tutela da evidência será concedida, independentemente da demonstração de perigo de dano ou de risco ao resultado útil do processo, quando:
I - ficar caracterizado o abuso do direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório da parte;
II - as alegações de fato puderem ser comprovadas apenas documentalmente e houver tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em súmula vinculante;
III - se tratar de pedido reipersecutório fundado em prova documental adequada do contrato de depósito, caso em que será decretada a ordem de entrega do objeto custodiado, sob cominação de multa;
IV - a petição inicial for instruída com prova documental suficiente dos fatos constitutivos do direito do autor, a que o réu não oponha prova capaz de gerar dúvida razoável.
Parágrafo único. Nas hipóteses dos incisos II e III, o juiz poderá decidir liminarmente.”
Nestas hipóteses, pode-se conceder a tutela provisória desde que (i.) esteja caracterizado o abuso de direito de defesa ou manifesto propósito protelatório da parte, (ii.) as alegações da parte estiverem comprovadas documentalmente e houver tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em súmula vinculante, (iii.) se trate de pedido reipersecutório, com base em prova documental de contrato de depósito, e (iv.) a petição inicial estiver instruída com prova documental suficiente dos fatos constitutivos do direito do autor, a que o réu não oponha prova capaz de gerar dúvida razoável.
Cumpre, então, examinar qual é a hipótese dos autos.
Os Autores pedem, liminarmente, que se proteja o resultado útil do processo, pois pedem que seja determinado ao Requerido que se abstenha de praticar atos de turbação ou de esbulho.
Trata-se, então, de tutela de urgência cautelar requerida incidentalmente.
Cumpre, então, examinar se estão presentes os requisitos para a concessão da tutela cautelar.
A tutela de urgência – que pode ter natureza cautelar ou antecipatória – exige, para o seu deferimento, (i.) a probabilidade do direito (fumus boni iuris) e (ii.) o perigo de dano ou risco ao resultado útil ao processo (periculum in mora).
Quanto à probabilidade do direito alegado, teço as seguintes considerações.
Na forma dos artigos 567 e 568 do CPC;
“Art. 567. O possuidor direto ou indireto que tenha justo receio de ser molestado na posse poderá requerer ao juiz que o segure da turbação ou esbulho iminente, mediante mandado proibitório em que se comine ao réu determinada pena pecuniária caso transgrida o preceito.
Art. 568. Aplica-se ao interdito proibitório o disposto na Seção II deste Capítulo.”
De acordo com o art. 568 do CPC, aplica-se ao interdito proibitório os artigos 560 e 561 do CPC, in verbis:
“Art. 560. O possuidor tem direito a ser mantido na posse em caso de turbação e reintegrado no de esbulho.
Art. 561. Incumbe ao autor provar:
I - a sua posse;
Il - a turbação ou o esbulho praticado pelo réu;
III - a data da turbação ou do esbulho;
IV - a continuação da posse, embora turbada, na ação de manutenção; a perda da posse, na ação de reintegração.”
As ações possessórias limitam-se à discussão sobre quem é o possuidor, isto é, aquele que tem, de fato e de forma legítima, o exercício, pleno, ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade (uso, disposição e gozo da coisa).
A ordem de interdito proibitório de posse é assegurada quando preenchidos os requisitos presentes no artigo 567 c/c o artigo 561 ambos do CPC, isto é, deve haver prova (i.) de posse prévia, (ii.) de ato que importe ameaça a esta posse e (iii.) a data deste último ato que coloque em risco a posse do Autor.
No caso dos autos, os Autores comprovaram que são titulares do imóvel descrito na inicial (Evento 1, CONTR40/41).
Há inquéritos policiais envolvendo as partes para apurar a suposta prática de (i.) disparo de arma de fogo, ameaça e esbulho possessório (Evento 1, AP-INQPOL44) e (ii.) ameaça (Evento 1, AP-INQPOL49).
Do inquérito policial, nota-se que há discussão acerca de quem é o possuidor da área em que estaria sendo derrubada a mata (Evento 1, AP-INQPOL44, Páginas 4 e 6).
Em que pese haja nos autos fotos e vídeos que demonstrem a poda ou o suposto corte irregular de arvores, não há qualquer prova de autoria do Réu, a fim de justificar o deferimento da liminar, dependendo a alegação de dilação probatória.
Portanto, não há, nos autos, provas de ato de ameaça à posse dos Autores.
Assim, não há como, ao menos em sede de cognição sumária, afirmar a existência de ato de ameaça ao livre exercício da posse dos Autores.
De outra parte, tem o Tribunal de Justiça recomendado, neste caso, a designação da audiência de justificação sem preterir a concessão da medida antecipatória de plano, o que se evidencia da leitura da ementa do Agravo de Instrumento nº 70047401435, Décima Oitava Câmara Cível, Relator o Des. Pedro Celso Dal Prá, datada de 08.02.2012, cujo teor transcrevo:
“AGRAVO DE INSTRUMENTO. POSSE (BENS IMÓVEIS). AÇÃO DE INTERDITO PROIBITÓRIO. LIMINAR. INDEFERIMENTO DE PLANO, SEM POSSIBILITAR A REALIZAÇÃO DE AUDIÊNCIA DE JUSTIFICAÇÃO. Ausentes elementos que demonstrem, de plano, os requisitos elencados no art. 932 do Código de Processo Civil, deve o juiz designar a audiência de justificação prevista no art. 928 do mesmo Código. Desaconselhável seja indeferida, ab initio, a liminar, sem oportunizar a realização dessa audiência, para não tolher o direito de a parte fazer prova do fato constitutivo de sua pretensão. Precedentes jurisprudenciais. AGRAVO DE INSTRUMENTO PARCIALMENTE PROVIDO POR DECISÃO MONOCRÁTICA DO RELATOR.”
Por isso, é necessário designar audiência de justificação, possibilitando à parte Autora a prova que entende necessária para comprovar a ameaça de esbulho e/ou turbação.
Ainda, designando-se audiência de justificação, deverá a parte Ré ser intimada também para que, querendo, traga testemunhas a fim de comprovar a legitimidade de sua posse.
Isso porque,...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO