Acórdão nº 51576548620228217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Oitava Câmara Cível, 01-12-2022

Data de Julgamento01 Dezembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualAgravo de Instrumento
Número do processo51576548620228217000
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoOitava Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002804612
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

8ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Agravo de Instrumento Nº 5157654-86.2022.8.21.7000/RS

PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5004444-53.2020.8.21.0026/RS

TIPO DE AÇÃO: União Estável ou Concubinato

RELATOR: Desembargador LUIZ FELIPE BRASIL SANTOS

RELATÓRIO

Na origem tramita ação para reconhecimento de união estável e partilha de bens em que contendem WERNER R.C. (autor) e FRANCINE D.K. (ré).

No evento 78, DESPADEC1 (e decisão dos embargos de declaração, evento 89, DESPADEC1) foi lançada a decisão objeto deste agravo, na qual foram indeferidos pedidos de produção de prova e de bloqueio de valores que o autor teria para receber em processos judiciais que tramitam na Justiça Federal.

FRANCINE, agravante, alega que: (1) é cabível a interposição do agravo de instrumento, considerando-se as previsões dos incs. II e VI do art. 1.015 do CPC e a previsão do Tema 988 do STJ; (2) a decisão fere os princípios constitucionais que garantem a isonomia processual e o dever de fundamentação; (3) há indícios concretos de desvio e/ou ocultação patrimonial; (4) ela utilizou suas economias para quitação do financiamento do imóvel às vésperas da saída do agravado da residência; (5) não teria efetuado tal quitação, que implica grave prejuízo na partilha, se tivesse conhecimento dos planos do varão de se retirar da vida conjugal; (6) não é razoável presumir o conhecimento mútuo da vida financeira e patrimonial do casal, até porque são comuns situações em que a esposa somente vem a tomar conhecimento da realidade dos fatos após a separação ou viuvez; (7) os ex-companheiros geriam contas bancárias separadas, administradas individualmente; (8) ela sempre manteve tudo às claras, enquanto o agravado tudo ocultava, como faz nos autos, recusando-se de apresentar documentação pessoal, pois ciente de que farão prova contrária às suas pretensões; (9) nos extratos referentes a 2020 constam supostas “transferências bancárias para a conta da Agravante”, as quais nunca foram enviadas para a sua conta bancária, mas para terceiros desconhecidos; (10) para realização de tais pagamentos ele associou, indevidamente, em seu internet banking, nome e CPF da agravante, de modo a ocultar o verdadeiro destino das transferências; (11) a quebra do sigilo bancário do agravado é necessária para comprovar o alegado, e somente pode ser obtida por decisão judicial; (12) na decisão recorrida também foi indeferido o pedido de resguardo de valores que o agravado tenha a receber no âmbito da Justiça Federal, cujos montantes são relativos ao período da convivência dos ex-companheiros; (13) há recente entendimento do STJ no sentido de que as verbas referentes a aposentadorias e FGTS, a serem recebidas em demanda judicial e decorrentes do período de convivência mútua, compõem o patrimônio partilhável; (14) uniformizando a jurisprudência nacional acerca da correta interpretação do art. 1.659, VI, do CC, o STJ possui entendimento no sentido de que os proventos do trabalho revertem ao ente familiar, em razão da presunção de colaboração, de esforço comum dos cônjuges e da comunicabilidade dos valores recebidos como fruto do trabalho de ambos; (15) todos os valores, recebidos ou a serem recebidos pelo agravado, relativos ao período de convivência, devem ser partilhados, pois se os tivesse recebido oportunamente estariam incluídos em seus investimentos; (16) o fundamento da decisão, nesse ponto, antecipa o mérito da demanda antes da instrução processual e esbarra no disposto nos incs. V e VI do art. 489, § 1º do CPC; (17) estão presentes os requisitos legais para o deferimento da tutela recursal antecipada. Requer a antecipação da tutela recursal para que seja determinada a realização de prova relativa à obtenção de (a) todos os dados bancários e fiscais do agravado e (b) o resguardo da meação quanto aos valores relativos ao período de união estável que o agravado tem a receber em demandas judiciais, ou, subsidiariamente, que seja concedido efeito suspensivo ao recurso para determinar a suspensão da tramitação do feito de origem, até o julgamento em definitivo do agravo de instrumento, pugnando pelo provimento do recurso.

Foi indeferida a antecipação da tutela recursal e deferido o efeito suspensivo típico, para sustar o andamento do feito, até decisão colegiada deste recurso (evento 6, DESPADEC1).

Em contrarrazões, o agravado sustenta o não conhecimento do recurso ou o não provimento (evento 12, CONTRAZ1).

O Ministério Público declinou de intervir no feito (evento 15).

É o relatório.

VOTO

De início lembro aos causídicos do projeto do Judiciário gaúcho "PETIÇÃO 10, SENTENÇA 10", visando ao exercício da concisão e objetividade nas peças jurídicas, propiciando a todos os operadores jurídicos a necessária economia de tempo, com decorrente maior agilidade na prestação jurisdicional, sem prejuízo da adequada exposição de suas teses.

Passando ao julgamento do agravo, no que diz com a alegação contrarrecursal de não conhecimento, o agravado sustenta que não cabe a interposição de recurso contra decisão que indefere a produção de provas, considerando a taxatividade do art. 1.015 do CPC.

Trata-se, sem dúvida, de questão que desencadeou entendimentos diversos a partir da entrada em vigor do novo Código de Processo Civil, no que diz com o rol de decisões interlocutórias "atacáveis" por meio de agravo de instrumento.

A propósito, em 2018 o Eg. STJ, quando do julgamento dos Recursos Especiais 1.696.396 e 1.704.520, definiu a natureza do rol do art. 1.015 e verificou a possibilidade de interpretação extensiva, para admitir agravo de instrumento contra decisões que versarem sobre hipóteses não arroladas no dispositivo legal - sendo firmada a seguinte tese (TEMA 988):

O rol do art. 1.015 do CPC é de taxatividade mitigada, por isso admite a interposição de agravo de instrumento quando verificada a urgência decorrente da inutilidade do julgamento da questão no recurso de apelação.

Posteriormente, em julgamento de novembro de 2019, em REsp sob a relatoria da Ministra NANCY ANDRIGHI, ficou firmado o entendimento que segue:

CIVIL E CONSUMIDOR. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS. DECISÃO INTERLOCUTÓRIA QUE INDEFERE PEDIDO DE EXPEDIÇÃO DE OFÍCIO A TERCEIRO PARA APRESENTAÇÃO DE DOCUMENTOS EM SEU PODER. RECORRIBILIDADE IMEDIATA POR AGRAVO DE INSTRUMENTO COM BASE NO ART. 1.015, VI, DO CPC/15. POSSIBILIDADE. EXIBIÇÃO DE DOCUMENTO QUE TEM POR FINALIDADE PERMITIR QUE A PARTE SE DESINCUMBA DO ÔNUS PROBATÓRIO. INCLUSÃO NO PROCESSO JUDICIAL DE DOCUMENTOS EM PODER DA OUTRA PARTE OU DE TERCEIRO QUE PERMITE O CUMPRIMENTO DO ENCARGO. HIPÓTESE DE CABIMENTO QUE ABRANGE A DECISÃO QUE RESOLVE A EXIBIÇÃO NA MODALIDADE DE INCIDENTE, AÇÃO INCIDENTAL OU MERO REQUERIMENTO NO PRÓPRIO PROCESSO. IRRELEVÂNCIA DO MEIO UTILIZADO PARA SE BUSCAR A EXIBIÇÃO. PREPONDERÂNCIA DO CONTEÚDO DECISÓRIO.
1- (...)
2- O propósito recursal é definir se a decisão interlocutória que indeferiu a expedição de ofício para agente financeiro que é terceiro, a partir do qual se buscava a apresentação de documentos comprobatórios de vínculo entre os autores e o sistema financeiro de habitação e os riscos cobertos pela apólice de seguro, versa sobre exibição de documento e, assim, se é cabível agravo de instrumento com fundamento no art. 1.015, VI, do CPC/15.

3- O art. 1.015 do CPC/15, que regula o cabimento do recurso de agravo de instrumento em suas hipóteses típicas, é bastante amplo e dotado de diversos conceitos jurídicos indeterminados, de modo que o Superior Tribunal de Justiça ainda será frequentemente instado a se pronunciar sobre cada uma das hipóteses de cabimento listadas no referido dispositivo legal.

4- A regra do art. 1.015, VI, do CPC/15, tem por finalidade permitir que a parte a quem a lei ou o juiz atribuiu o ônus de provar possa dele se desincumbir integralmente, inclusive mediante a inclusão, no processo judicial, de documentos ou de coisas que sirvam de elementos de convicção sobre o referido fato probandi e que não possam ser voluntariamente por ela apresentados.

5- Partindo dessa premissa, a referida hipótese de cabimento abrange a decisão que resolve o incidente processual de exibição instaurado em face de parte, a decisão que resolve a ação incidental de exibição instaurada em face de terceiro e, ainda, a decisão interlocutória que versou sobre a exibição ou a posse de documento ou coisa, ainda que fora do modelo procedimental delineado pelos arts. 396 e 404 do CPC/15, ou seja, deferindo ou indeferindo a exibição por simples requerimento de expedição de ofício feito pela parte no próprio processo, sem a instauração de incidente processual ou de ação incidental.

6- (...).
7- Recurso especial conhecido e provido.

(REsp n. 1.798.939/SP, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 12/11/2019, DJe de 21/11/2019.)

Destaco, ainda, recente precedente de outra Turma do STJ, na mesma linha:

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. APLICABILIDADE. AGRAVO DE INSTRUMENTO. CABIMENTO. ART. 1.015, VI, DO CPC/2015. PROLAÇÃO DE SENTENÇA NO PROCESSO PRINCIPAL. (...). REQUERIMENTO DE EXPEDIÇÃO DE OFÍCIOS PARA APRESENTAÇÃO DE ARQUIVOS. NATUREZA DE EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
I - (...).
IV - O juízo de primeiro grau indeferiu requerimento de expedição de ofícios para apresentação e juntada de documentos, ensejando a interposição de Agravo de Instrumento o qual, contudo, não foi conhecido pelo tribunal de origem.

V - O art. 1.015, VI, do Código de Processo Civil de 2015 autoriza a interposição de agravo de instrumento contra decisão interlocutória que versa sobre exibição ou posse de documento ou coisa.

VI - O pleito que visa a expedição de ofício para apresentação ou juntada de
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