Acórdão nº 51588639020228217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Quinta Câmara Cível, 27-09-2022
Data de Julgamento | 27 Setembro 2022 |
Tribunal de Origem | Tribunal de Justiça do RS |
Classe processual | Agravo de Instrumento |
Número do processo | 51588639020228217000 |
Tipo de documento | Acórdão |
Órgão | Vigésima Quinta Câmara Cível |
PODER JUDICIÁRIO
Documento:20002679722
25ª Câmara Cível
Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906
Agravo de Instrumento Nº 5158863-90.2022.8.21.7000/RS
TIPO DE AÇÃO: Ausência de Vaga
RELATOR: Desembargador EDUARDO KOTHE WERLANG
RELATÓRIO
Trata-se de agravo de instrumento interposto por H. R. DAS S., menor de idade devidamente representada nos autos, na ação ordinária movida contra o MUNICÍPIO DE CAXIAS DO SUL, da decisão datada de 10/08/2022, como segue:
"Vistos.
1. Recebo a inicial.
Inicialmente, passo a apreciar o pedido liminar de concessão de vaga em escola de educação infantil próxima à residência da parte autora em turno integral.
Nesse passo, no que se refere à questão acerca do tempo de duração do dia letivo, meio turno ou turno integral, sublinhe-se que se trata de temática não contemplada no título judicial objeto da execução coletiva.
É forçoso o exame do panorama legislativo que versa sobre o assunto, a fim de verificar a eventual previsão cogente da qual advenham eventuais direitos a serem tutelados no bojo da citada execução de julgado.
Nesse norte, apenas na norma infraconstitucional de regência, a Lei de Diretrizes e Bases (Lei nº 9.394/1996), há a previsão quanto à duração do dia letivo, que ora se transcreve (sem grifos no original):
...
Constata-se, pois, que a baliza legal permite o desempenho das atividades típicas da Educação Infantil tanto em meio turno quanto em turno integral, daí desdobrando-se a forçosa conclusão de que qualquer das hipóteses constitui, em tese, alternativa juridicamente sustentável e que, por isso, não merece interferência judicial.
No entanto, no atual cenário normativo, as, agora, escolas de educação infantil, não mais as creches, destinam-se a concretizar o direito das crianças ao ensino e não unicamente ao cuidado pela momentânea impossibilidade de seus responsáveis, devendo ser inseridos, consoante as “Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil” (item 2.1), em “espaços institucionais não domésticos que constituem estabelecimentos educacionais públicos ou privados que educam e cuidam de crianças de 0 a 5 anos de idade no período diurno, em jornada integral ou parcial” (sem grifos no original).
Em outros termos, partindo-se da inelutável premissa de que a inserção de uma criança em uma escola vincula-se ao seu direito subjetivo à educação, a adequação de sua inclusão em meio turno ou em turno integral deve buscar esteio em parâmetros pedagógicos específicos e, também, em aspectos pessoais como por exemplo, a análise de sua eventual vulnerabilidade social e o seu grau.
Portanto, no que se refere à questão acerca do tempo de duração do dia letivo, se turno parcial ou integral, consigno que se trata de temática que demanda dilação probatória, a ser analisada por meio dos documentos juntados com a inicial e durante o andamento processual e/ou mediante estudo social do núcleo familiar, a ser elaborado pelo Município, se for o caso, quando da instrução.
Nesse contexto, DEFIRO PARCIALMENTE A LIMINAR apenas para determinar ao Município que disponibilize/garanta, no prazo de 20 dias, vaga em escola de educação infantil ao/à(s) requerente(s), em turno parcial, ou mediante a aquisição de vaga na rede privada, independente da duração do dia letivo, ficando a análise da pertinência ou não da concessão do turno integral para quando da prolação da sentença, após o exaurimento da fase instrutória.
2. Cite-se.
3. Cumprida a liminar, dê-se vista à parte autora.
4. Apresentada declaração negativa de vaga, a parte autora deverá apresentar três orçamentos de escolas, com vista ao Município para cumprimento da liminar.
5. Apresentada contestação, à réplica.
6. Em não sendo apresentada Defesa e indicada a vaga postulada, com a devida intimação da parte autora para que confirme a inclusão escolar, decretar-se-á a revelia do réu e a instrução será encerrada com vista ao MP para parecer final, retornando, após, conclusos para sentença.
7. Caso a parte autora desista do turno integral durante a fase instrutória, com vista ao Município, dispensar-se-ao novas provas, encerrando-se a instrução, com vista ao MP para parecer final e posterior conclusão dos autos para julgamento.
8. Apresentada Defesa e, em havendo eventual réplica, digam as partes acerca das provas que pretendem produzir, elencando-as, justificadamente.
9. Em relação as provas, solicitado o estudo social, o documento deverá ser apresentado em 60 dias pelo Município e, no aporte, dê-se vista à parte autora.
10. Caso não solicitadas mais provas, encerra-se a instrução, com vista ao MP para parecer final e posterior conclusão do feito para sentença.
Intimem-se desta decisão.
Diligências legais."
A parte agravante alega a necessidade de creche em turno integral em face do trabalho da genitora, o pai está separado e paga pensão.
A parte agravada apresentou contrarrazões.
O Ministério Público entendeu pelo provimento do recurso.
VOTO
Educação infantil
A educação constitui um direito de todos e um dever do Estado, é um direito formal e materialmente constitucional e, ainda que esse texto não se ache inserido no catálogo de direitos fundamentais, diz o disposto no art. 5º, § 2º, da Constituição Federal-CF:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
...
§ 2º Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.
O direito à educação é materialmente fundamental porque inerente à dignidade da pessoa humana pois a educação integra a vida humana digna:
Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.
Art. 208. O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de:
...
IV - educação infantil, em creche e pré-escola, às crianças até 5 (cinco) anos de idade; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 53, de 2006)
Art. 211. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios organizarão em regime de colaboração seus sistemas de ensino.
§ 1º A União organizará o sistema federal de ensino e o dos Territórios, financiará as instituições de ensino públicas federais e exercerá, em matéria educacional, função redistributiva e supletiva, de forma a garantir equalização de oportunidades educacionais e padrão mínimo de qualidade do ensino mediante assistência técnica e financeira aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 14, de 1996)
§ 2º Os Municípios atuarão prioritariamente no ensino fundamental e na educação infantil. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 14, de 1996)
§ 3º Os Estados e o Distrito Federal atuarão prioritariamente no ensino fundamental e médio. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 14, de 1996)
§ 4º Na organização de seus sistemas de ensino, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios definirão formas de colaboração, de modo a assegurar a universalização do ensino obrigatório. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 59, de 2009)
§ 5º A educação básica pública atenderá prioritariamente ao ensino regular. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 53, de 2006)
Art. 214 A lei estabelecerá o plano nacional de educação, de duração decenal, com o objetivo de articular o sistema nacional de educação em regime de colaboração e definir diretrizes e objetivos, metas e estratégias de implementação para assegurar a manutenção do desenvolvimento do ensino em seus diversos níveis, etapas e modalidades por meio de ações integradas dos poderes públicos das diferentes esferas...
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