Acórdão nº 51685578320228217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Terceira Câmara Cível, 24-11-2022

Data de Julgamento24 Novembro 2022
ÓrgãoTerceira Câmara Cível
Classe processualAgravo de Instrumento
Número do processo51685578320228217000
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002936465
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

3ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Agravo de Instrumento Nº 5168557-83.2022.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Classificação e/ou Preterição

RELATORA: Desembargadora MATILDE CHABAR MAIA

AGRAVANTE: LEONARDO PIRES SILVANO

AGRAVADO: FUNDACAO UNIVERSIDADE EMPRESA DE TECNOLOGIA E CIENCIAS - FUNDATEC

AGRAVADO: ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

RELATÓRIO

LEONARDO PIRES SILVANO interpõe agravo de instrumento contra decisão (evento 10, autos de origem) proferida no mandado de segurança impetrado contra ato do PRESIDENTE DA COMISSÃO DE CONCURSO PÚBLICO DA BRIGADA MILITAR DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL e do DIRETOR DA FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE EMPRESA DE TECNOLOGIA E CIÊNCIAS – FUNDATEC, nos termos que seguem:

Após, cumpra-se a decisão de evento 10.

Vistos.

Defiro a gratuidade judiciária ao impetrante.

Compulsando a documentação que instrui a petição inicial, afigura-se desarrazoada a supressão do devido contraditório, até porque inexistente probabilidade do direito.

A despeito da existência de divergência legislativa entre as Leis Estaduais n.º 15.266/19 e 13.664/11, o edital estabeleceu claramente todas as regras aplicáveis a todos os candidatos (doc. 13). Observa-se que a redação do Capítulo XII – Exame Psicológico prevê expressamente a possibilidade de apresentação do recurso (doc. 13, fl. 19).

Como é possível perceber, o edital prevê que não bastaria simples solicitação de novo exame (nem sequer admitido). No ponto, não há direito do candidato de se submeter a novo exame, conforme cogitava a Lei Estadual n.º 13.664/2011, que foi implicitamente revogada pela Lei Estadual n.º 15.266/2019, por ser esta incompatível, notadamente seu art. 83, com aquela. O ordenamento só "conviverá com mais de uma lei regulando a mesma esfera social [no caso, a avaliação psicológica em concurso público para servidores do Estado do Rio Grande do Sul], desde que as disposições não conflitem" (Sílvio de Salvo Venosa, Direito Civil, Parte Geral, Vol. I, Atlas, 12ª ed., 2012, p. 110). O aludido art. 83 conflita verticalmente com o único artigo da Lei Estadual n.º 13.664/2011.

Com todo o respeito a entendimentos contrários, a Lei Estadual n.º 15.266/2019, ao dispor "sobre o Estatuto do Concurso Público no âmbito do Estado do Rio Grande do Sul" e regular TODOS os aspectos que permeiam um concurso público no Estado, revogou implicitamente a Lei Estadual n.º 13.664/2011. A revogação não precisa ser expressa; basta que "a lei posterior" "seja com ela [lei anterior] incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior", nos termos do art. 2º, § 1º, da Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro.

Foi exatamente isso o que ocorreu em relação à avaliação psicológica. A lei nova reservou uma seção específica (V do Capítulo IV – Das Espécies das Provas) para cuidar "Da Avaliação Psicológica", onde disciplinou todas as etapas envolvendo o teste psicológico, não mais cogitando da "submissão a novo exame" prevista na Lei Estadual n.º 13.664/2011. Se estaria preservado o direito a novo exame, por que o legislador não o disse expressamente – isso era indispensável justamente por estar dando nova configuração jurídica a essa prova –, e qual seria, então, a razão do art. 83 da Lei Estadual n.º 15.266/2019?

Incide o § 2º do art. 2º da Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro apenas nas hipóteses em que a lei posterior não contradiz a anterior. Aí a antiga continua vigendo. Não foi o caso do exame psicológico em concursos públicos no Estado do Rio Grande do Sul, porque o art. 83 da novel legislação é inteiramente incompatível com a Lei n.º 13.664/2011.

Ora, se ao candidato não considerado apto em exame psicológico deva ser oportunizada nova avaliação, por princípio de equidade, a todos os reprovados em exame físico deveria ser também conferido o direito a um novo teste. O próprio Judiciário vem sistematicamente rechaçando essa possibilidade, capitaneado pelo Tema 335 da Repercussão Geral do Supremo Tribunal Federal.

Logo, considerando que os atos administrativos gozam da presunção de legalidade, não diviso a presença de vícios capazes de tornarem de plano ilegal o ato ora questionado.

Nessas circunstâncias, indefiro a medida liminar pretendida.

Intime-se.

Notifique-se a autoridade apontada para prestar suas informações, no prazo legal (dez dias).

Dê-se ciência do feito ao órgão de representação judicial da pessoa jurídica interessada (Procuradoria-Geral do Estado).

Após, ao Ministério Público.

Em suas razões, postula seja mantido o benefício da assistência judiciária gratuita. Menciona ter se inscrito no certame público para provimento de vagas no cargo de Praça de Polícia Ostensiva – Soldado de nível III do Estado do Rio Grande do Sul (EDITAL DA/DRESA nº SD-P 01/2021/2022), obtendo aprovação nas duas primeiras fases do concurso.

Informa que ao ser submetido ao exame psicológico foi considerado não indicado, tendo interposto recurso administrativo ao qual juntou parecer técnico da psicóloga Valquíria Rodrigues Rosa, Especialista em Avaliação Psicológica e Psicodiagnóstico, que apurou que a avaliação realizada pela banca examinadora apresenta irregularidades. Narra que o laudo realizado pela FUNDATEC não seguiu as resoluções do Conselho Federal de Psicologia, em especial, no que se refere à falta de integração dos testes, dinâmica de grupo e entrevista individual utilizados para sua elaboração, bem como não seguiu as recomendações previstas no Edital de abertura do concurso público.

Assevera que em resposta ao recurso administrativo, a Banca Examinadora apresentou laudo genérico e impediu o certamista de realizar nova avaliação psicológica, em desrespeito à Lei nº 13.664/2011. Nega que a Lei nº 13.664/2011 tenha sido revogada pela Lei nº 15.266/19.

Aduz que o juízo a quo desconsiderou as previsões contidas na Lei nº 13.664/2011, que garante a submissão a novo teste psicológico se postulado peo certamista em recurso administrativo. Discorre sobre o Tema 335 do Supremo Tribunal Federal.

Informa que o Estatuto do Concurso Público foi criado para evitar abusos e proteger os candidatos contra ilegalidades, falta de isonomia e demais atrocidades que acontecem nos certames públicos. Sustenta que a própria Lei nº 15.266/2019 aduz que suas regras são GERAIS e não específicas para o caso de avaliação psicológica em concurso público.

Indica a existência de documento junto à Assembléia Legislativa apontando que a Lei n° 13.664/2011 está em vigor. Afirma a existência de decisões judiciais concedendo liminares em demandas semelhantes. Requer seja deferida a antecipação da tutela recursal, sendo determinada a sua submissão a novo teste psicológico e, ao final, o provimento do recurso.

O agravo de instrumento foi recebido no efeito devolutivo (evento 4).

Contra-arrazoando (evento 14), o Estado do Rio Grande do Sul nega estejam presentes os pressupostos autorizadores da antecipação de tutela. Refere que não há risco de demora a justificar a concessão da liminar.

Aduz que o certame público foi realizado de acordo com o estabelecido nas Leis Complementares nºs 10.990/94, 10.992/97, 10.993/97, Leis nºs 12.307/05, 4.375/64, Decretos nºs 57.654/66, 43.911/05 e 36.175/95. Discorre sobre a regularidade e legalidade do certame público em debate e pugna pelo improvimento do recurso.

A FUNDATEC, por sua vez, apresenta contrarrazões recursais no evento 17, refutando as alegações do agravante e pugnando pela manutenção da decisão recorrida.

Em parecer (evento 20), o Ministério Público manifesta-se pelo improvimento do agravo de instrumento.

Vieram os autos conclusos para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Eminentes Colegas.

A matéria objeto do presente recurso foi analisada à saciedade na decisão que apreciou o pedido de agregação de efeito suspensivo, razão pela qual a transcrevo:

2. Inicialmente, registro que na decisão recorrida já restou deferida a benesse legal ao autor.

Destaco que a concessão da liminar no mandado de segurança tem cabimento, segundo dispõe o inciso III do art. 7º da Lei nº 12.016/2009, quando houver fundamento relevante e do ato impugnado puder resultar a ineficácia da medida, caso seja finalmente deferida.

Assim, dois pressupostos devem concorrer para a concessão da medida liminar, quais sejam, que os motivos que embasam o pedido sejam relevantes e que haja possibilidade de ocorrência de lesão irreparável ao direito do impetrante se vier a ser reconhecido apenas ao final – trata-se, pois, do “fumus boni iuris” e do “periculum in mora”.

Preleciona o ilustre Hely Lopes Meirelles que

“a medida liminar não é concedida como antecipação dos efeitos da sentença final, é procedimento acautelador do possível direito do impetrante, justificado pela iminência de dano irreversível de ordem patrimonial, funcional ou moral se mantido o ato coator até a apreciação definitiva da causa. Por isso mesmo, não importa prejulgamento; não afirma direitos; nem nega poderes à Administração. Preserva, apenas, o impetrante de lesão irreparável, sustando provisoriamente os efeitos do ato impugnado.”

No caso vertente, de ser mantido o indeferimento da liminar.

O impetrante participou do concurso público aberto pelo Edital DA/DRESA nº SD-P 01/2021/2022 - Soldado de Nível III da Brigada Militar e obteve aprovação nas três primeiras fases do certame – exames intelectual, de saúde e físico.

Contudo, foi considerado não indicado ao cargo na quarta fase (exame psicológico), requerendo administrativamente a submissão a novo teste, com fulcro no art. 1º da Lei Estadual nº 13.664/2011, que assim dispõe:

Art. 1º - Fica assegurado ao candidato reprovado em exame psicológico, ou similar, em concurso para a investidura em cargo ou emprego público, o direito de acesso ao conteúdo da...

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