Acórdão nº 51735983120228217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Sétima Câmara Cível, 06-12-2022

Data de Julgamento06 Dezembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualAgravo de Instrumento
Número do processo51735983120228217000
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoDécima Sétima Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002992751
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

17ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Agravo de Instrumento Nº 5173598-31.2022.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Mútuo

RELATORA: Desembargadora ROSANA BROGLIO GARBIN

AGRAVANTE: COOPERATIVA DE CREDITO RURAL COM INTERACAO SOLIDARIA DE GUARANI DAS MISSOES - CRESOL GUARANI DAS MISSOES

AGRAVADO: VALERIANO MALESZYK

AGRAVADO: LESTIM TEREZINHA LISBOA

RELATÓRIO

Trata-se de agravo de instrumento interposto por COOPERATIVA DE CREDITO RURAL COM INTERACAO SOLIDARIA DE GUARANI DAS MISSOES - CRESOL GUARANI DAS MISSOES, da decisão que, nos autos da ação de de execução de título extrajudicial ajuizada pela agravada, acolheu o incidente de impenhorabilidade suscitado pelo devedor ( evento 18, DESPADEC1, autos de origem).

Em suas razões, os agravantes alegam que merece reforma a decisão proferida pelo magistrado de origem, tendo em vista que não restou demonstrado que o imóvel é pequeno proprietário rural. Afirma que, mesmo que o agravado tenha juntados notas de produtor rural, estas estão em nome de terceiro e estão desatualizadas. Afirma que é um terceiro que labora no imóvel objeto de constrição, não havendo nenhuma prova de que o executado aufira renda com essa propriedade. Aduz que não há elementos mínimos a demonstrar que se trata de pequena propriedade rural destinada ao sustento do executado, razão pela qual deve ser afastada a impenhorabilidade do imóvel objeto de constrição. Por conta disso, requer seja dado provimento ao agravo de instrumento para reformar a decisão de origem, afastando a impenhorabilidade do imóvel objeto de constrição.

Recebido o recurso (evento 6, DESPADEC1).

A parte agravada não apresentou contrarrazões.

Remetidos os autos eletrônicos a esta Corte, estes vieram conclusos para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Preenchidos os requisitos de admissibilidade recursal quanto ao restante das matérias devolvidas a esta Colenda Câmara, passa-se, de plano, à análise das pretensões que sobejaram.

Insurge-se a parte agravante contra decisão que acolheu o incidente de impenhorabilidade apresentado pelo executado (evento 18, DESPADEC1), nos seguintes termos:

Vistos.

Trata-se de incidente de impenhorabilidade manejado pelo executado Valeriano Maleszyk, sustentando, em síntese, a impenhorabilidade do imóvel rural constrito, qual seja, 111.395,00 m² integrantes da matrícula nº 4.709 do CRI local, por ser área considerada pequena propriedade rural e por estar constituída no local a sua residência (evento 2, PET31). A excepta apresentou impugnação, aduzindo, em síntese, que o bem em questão foi oferecido como garantia hipotecária no contrato em execução, razão pela qual ocorreu a renúncia à proteção legal (evento 6).

As partes foram intimadas acerca do interesse na produção de provas (evento 8), mantendo-se, todavia, silentes.

É o breve relato. Passo a decidir.

Saliento, de pronto, que vislumbro êxito para a pretensão desconstitutiva do devedor.

Com efeito, destaco que o art. 5°, XXVI, da CF, estabelece que a pequena propriedade rural, assim definida em lei, desde que trabalhada pela família, não será objeto de penhora para pagamento de débitos, dispondo a lei sobre os meios de financiar o seu desenvolvimento. Esse dispositivo deve ser compreendido em consonância com a Lei n° 8.009/90, que dispõe sobre a impenhorabilidade do bem de família, mais precisamente com o art. 4°, § 2°, verbis:

Art. 4° - Não se beneficiará do disposto nesta lei aquele que, sabendo-se insolvente, adquire de má-fé imóvel mais valioso para transferir a residência familiar, desfazendo-se ou não da moradia antiga.

[…]

§ 2° - Quando a residência familiar constituir-se em imóvel rural, a impenhorabilidade restringir-se-á à sede de moradia, com os respectivos bens móveis, e, nos casos do art. 5º, inciso XXVI, da Constituição, à área limitada como pequena propriedade rural.”

Demais disso, faz-se mister lembrar que o parágrafo único, do art. , da Lei n° 8.009/90, dispõe que a impenhorabilidade compreende o imóvel sobre o qual se assentam a construção, as plantações, as benfeitorias de qualquer natureza e todos os equipamentos, inclusive os de uso profissional, ou móveis que guarnecem a casa, desde que quitados.

No tocante ao Código de Processo Civil, o art. 833, VIII, trata como impenhorável a pequena propriedade rural, assim definida em lei, desde que trabalhada pela família. A definição legal da pequena propriedade rural está no art. 4°, da Lei n° 8.629/93, compreendida esta como a área entre um e quatro módulos fiscais, sendo que o módulo fiscal, por sua vez, é estabelecido para cada Município; no caso de Guarani das Missões, é de 20 hectares, como de conhecimento comum.

Portanto, de acordo com a lei, tanto a propriedade rural, quanto a plantação, podem ser consideradas impenhoráveis, desde que aquela esteja nos limites definidos em lei e se destine à moradia da família, devendo o cultivo ser efetuado no solo do imóvel impenhorável e destinado ao sustento da família.

No caso dos autos, restou comprovado, a partir da análise do título executivo (Cédula Rural Hipotecária - evento 2, INIC E DOCS6), que os executados deram em garantia ao cumprimento da obrigação o imóvel penhorado, em hipoteca cedular de 1º grau.

No entanto, a pequena propriedade rural não perde a sua impenhorabilidade mesmo quando oferecida em garantia hipotecária.

Veja-se a orientação do Superior Tribunal de Justiça:

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL - AGRAVO DE INSTRUMENTO - DECISÃO MONOCRÁTICA QUE NEGOU PROVIMENTO AO RECLAMO. INSURGÊNCIA RECURSAL DA PARTE AGRAVANTE. 1. Não há falar em ofensa ao art. 1022 do CPC/15, porquanto todas as questões fundamentais ao deslinde da controvérsia foram apreciadas pelo Tribunal a quo, sendo que não caracteriza omissão ou falta de fundamentação a mera decisão contrária ao interesse da parte, tal como na hipótese dos autos. 2. O STJ firmou orientação no sentido de que a pequena propriedade rural trabalhada pela entidade familiar é impenhorável, mesmo quando oferecida em garantia hipotecária pelos respectivos proprietários. Incidência da Súmula 83/STJ. 3. Agravo interno desprovido. (AgInt no AREsp 1968844 / SC AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL 2021/0267942-2) - Destacou-se.

Ainda, cabível transcrever julgados do eTJRS sobre o tema:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO PRIVADO NÃO ESPECIFICADO. INCIDENTE DE IMPENHORABILIDADE. PEQUENA PROPRIEDADE RURAL. Em se tratando de pequena propriedade, trabalhada pela família, a sua impenhorabilidade é matéria constitucional e deve ser observada inclusive quando dada em garantia de dívida consistente de Cédula Rural Pignoratícia e Hipotecária. RECURSO PROVIDO.(Agravo de Instrumento, Nº 70085308799, Décima Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Deborah Coleto Assumpção de Moraes, Julgado em: 30-09-2021)

AGRAVO INTERNO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. INCIDENTE DE IMPENHORABILIDADE. BEM IMÓVEL OFERECIDO EM GARANTIA HIPOTECÁRIA. PEQUENA PROPRIEDADE RURAL TRABALHADA PELA ENTIDADE FAMILIAR. IMPENHORABILIDADE. MANUTENÇÃO DA DECISÃO RECORRIDA. TESE VINCULANTE FIXADA PELO TRIBUNAL PLENO DO STF NO JULGAMENTO DEFINITIVO DO TEMA 961/RG DO STF. PARADIGMAS DO STJ E PRECEDENTES DO TJRS. A pequena propriedade rural - extensão inferior ou igual a quatro módulos fiscais - é impenhorável, mesmo quando oferecida em garantia hipotecária. No caso, o imóvel constrito enquadra-se no conceito de pequena propriedade rural e a prova produzida atesta que se trata de minifúndio agropecuário de produção de milho de subsistência familiar. Por fim, averbe-se que o Tribunal Pleno do STF, na sessão virtual de 21/12/2020, sob a relatoria do Min. Edson Fachin, proferiu julgamento definitivo nos lindes do ARE nº 1.038.507/PR (Tema 961/RG), tendo fixado a seguinte tese vinculante, verbis: "É impenhorável a pequena propriedade rural familiar constituída de mais de 01 (um) terreno, desde que contínuos e com área total inferior a 04 (quatro) módulos fiscais do município de localização." Na toada da referida tese vinculante, vai rechaçada de plano a tese da agravante, de que a pequena propriedade rural reste limitada a um único módulo fiscal municipal. JULGADO MONOCRÁTICO MANTIDO. RECURSO DESPROVIDO. M/Ag 3.770 - S 23.04.2021 – P A38(Agravo Interno, Nº 70084997501, Décima Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Aymoré Roque Pottes de Mello, Julgado em: 10-05-2021) - Destacou-se.

De ressaltar, ademais, que, inobstante devidamente intimado para a produção de provas, o executado Valeriano manteve-se silente. Porém, os elementos carreados aos autos, tais como, bloco de produtor rural e notas fiscais referentes a produção agrícola, indicam que, efetivamente o referido devedor reside sobre o...

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