Acórdão nº 51831679020218217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Oitava Câmara Criminal, 23-02-2022

Data de Julgamento23 Fevereiro 2022
ÓrgãoOitava Câmara Criminal
Classe processualAgravo de Execução Penal
Número do processo51831679020218217000
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001668344
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

8ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Agravo de Execução Penal Nº 5183167-90.2021.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Latrocínio (art. 157, §3º, 2ª parte)

RELATORA: Desembargadora FABIANNE BRETON BAISCH

AGRAVANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

AGRAVADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

ELDER MIGUEL BRITZ DA CRUZ, por defensora constituída, ingressou com agravo em execução por inconformar-se com decisão proferida pela MMª. Juíza de Direito da VEC Regional da Comarca de Santa Cruz do Sul/RS, que reconheceu o cometimento de falta grave e aplicou os consectários legais (Evento 3 - AGRAVO1 - págs. 83/85).

Sustentou o agravante, preliminarmente, a nulidade do procedimento para apuração de falta grave, em virtude de problemas técnicos ocorridos durante a audiência de justificação, os pedidos de juntada da integralidade da solenidade aos autos do PEC não tendo sido apreciados pelo juízo. No mérito, afirmou, em síntese, ser impositivo o afastamento do reconhecimento da falta grave, porquanto não demonstrada nos autos, sendo insuficiente os elementos de convicção dispostos nos autos, porquanto o fato não fora visualizado por qualquer agente penitenciário, além de não ter sido apreendido nenhum aparelho de telefone na celular na cela na qual o apenado se encontrava. Ademais, a versão apresentada pelo agravante foi amparada pelas informantes ouvidas em juízo, restando demonstrado que a pessoa que utilizara o perfil criado em seu nome em rede social era sua ex-companheira, com o nítido intento de prejudicá-lo. Requereu a reforma da decisão recorrida, afastando a falta grave e os seus consectários legais (Evento 3 - AGRAVO1 - págs. 112/129).

O Ministério Público contra-arrazoou o recurso, pugnando pela manutenção da decisão recorrida (Evento 3 - AGRAVO1 - págs. 135/140).

O decisum foi mantido pela magistrada singular (Evento 3 - AGRAVO1 - pág. 145).

Nesta Corte, o ilustre Procurador de Justiça, Dr. Paulo Antonio Todeschini, manifestou-se pelo provimento do recurso (Evento 10).

Vieram conclusos em 27.09.2021.

É o relatório.

VOTO

Pelo que se depreende do relatório da situação processual executória atualizado, disponível no Sistema SEEU, o apenado restou condenado à pena total de 60 anos e 6 meses de reclusão, e multa, tendo iniciado o cumprimento da reprimenda em 29.07.2011.

Conforme Termo de Ocorrência (Evento 3 - AGRAVO1 - pág. 8), na Penitenciária Estadual de Venâncio Aires, FATO: "(...) o apenado Bruno Eduardo Mallmann, saiu da cela 08, galeria C, para cela Triagem 10, visto RI nº 16/20, revista item XX, para isolamento preventivo. O apenado ELDER MIGUEL BRITZ DA CRUZ, saiu da cela 06, galeria C, para cela Triagem 10, em isolamento preventivo, devido RI nº 017/2020. Trocas determinadas pela ASD (...)” -, razão pela qual foi instaurado o PAD nº 076/2020, para apuração do ato de indisciplina respectivo.

Ao ser ouvido no procedimento administrativo, o agente penitenciário Luciano Galvão Silveira de Souza referiu que "(...) chegou ao conhecimento da ASD, via relatório da 8ª DPR, da utilização de redes sociais pelo referido apenado, onde sugeria a busca devido utilização de equipamento proibido. No dia foi realizada intervenção em celas da galeria C, onde o primeiro apenado alvo foi BRUNO EDUARDO MALLMANN, sendo conduzido para cela de isolamento disciplinar. Após realização desse procedimento o apenado ELDER MIGUEL foi solicitado para também ser alojado em cela de isolamento disciplinar. O isolamento disciplinar nos dois casos foi de 10 dias. Nas celas revistadas foram encontrados apenados aparelho celulares" (Evento 3 - AGRAVO1 - pág. 11).

Em sentido semelhante as declarações do agente penitenciário Pablo Kozlowsky Rodrigues, segundo o qual "(...) foi convocado pela ASD para intervenção, tendo ocupado o posto da espingarda calibre .15, para contenção dos apenados. Que a revista ocorreu dentro do previsto, sem alterações. Que o motivo das revistas foi devido aos relatórios do setor de inteligência (ARIPEN) da 8ª DPR" (Evento 3 - AGRAVO1 - pág. 12).

O agravante negou a utilização de redes sociais no interior do estabelecimento prisional, atribuindo possível prática utilizando seu nome à sua ex-companheira, com quem não vinha mantendo bom relacionamento e poderia querer prejudicá-lo (Evento 3 - AGRAVO1 - pág. 13).

Atendendo ao que determina o inciso I do § 2º do art. 118 da LEP, o apenado foi ouvido em juízo, quando reafirmou a mesma versão, oportunidade em que também foram ouvidas as informantes Fernanda Amorim da Silva e Francisca Ereni Matos Britz (Evento 3 - AGRAVO1 - pág. 57-60).

A magistrada singular, então, não acolhendo a justificativa apresentada, homologou o PAD, reconheceu o cometimento de falta grave, determinou a alteração da data-base à concessão de futuros benefícios (progressão de regime) para o dia 23/11/2020 (data da prática da falta), exceto para fins de livramento condicional (Súmula 441 do STJ), indulto e comutação (Súmula 535 do STJ), bem ainda para os demais benefícios que dependam do cumprimento de lapso temporal, já que possuem regramento próprio, bem como a perda de 1/3 dos dias remidos (Evento 3 - AGRAVO1 - págs. 83/85), com o que não se conformou a defesa.

PRELIMINAR DE NULIDADE. AUDIÊNCIA DE JUSTIFICATIVA. PROBLEMAS TÉCNICOS. AUSÊNCIA DE JUNTADA INTEGRAL.

Em preliminar, a defesa aduz a nulidade do procedimento para apuração de falta grave, em virtude de problemas técnicos ocorridos durante a audiência de justificação, os pedidos de juntada da integralidade da solenidade aos autos do PEC não tendo sido apreciados pelo juízo.

Entretanto, como bem pontuado pelo Ministério Público nas contrarrazões recursais, em análise ao conteúdo das mídias da referida solenidade, juntadas ao Sistema SEEU (Seq. 29), não se verifica falha técnica que não permita a oitiva dos depoimentos colhidos em juízo. Pelo contrário, esta Relatora conseguiu ouvir as mídias dispostas nos autos, de modo que, em princípio, não estou em identificar a mácula apontada.

Não obstante, tenho que deva ser superada a questão, porque o mérito é favorável ao agravante - art. 282, § 2º do CPC , aqui aplicado por analogia, como se verá a seguir.

MÉRITO.

FALTA GRAVE. CARACTERIZAÇÃO. INSUFICIÊNCIA DE PROVAS.

Nos termos do que dispõe o art. 50, VII da LEP, introduzido pela Lei nº 11.466 de 28 de março de 2007:

“Art. 50. Comete falta grave o condenado à pena privativa de liberdade que:
(...)
VII - tiver em sua posse, utilizar ou fornecer aparelho telefônico, de rádio ou similar, que permita a comunicação com outros presos ou com o ambiente externo.”

Com efeito.

O ambiente prisional, em razão da periculosidade dos sujeitos que estão nele inseridos, exige, por certo, observância severa das normas disciplinares, sob pena de pôr em risco a segurança necessária à sua manutenção.

Daí que à incidência da norma prevista no art. 50, VII da LEP, desimporta a plena funcionabilidade do aparelho, configurando-se a falta grave mesmo nos casos em que o celular é apreendido desprovido de chip e bateria, situação que inviabiliza apenas seu uso imediato.

Em casos tais, tem-se reconhecido a falta grave, porque não figura lógico que o preso mantenha consigo um aparelho celular, sem seus componentes, e, assim sendo, sem qualquer finalidade, sendo certo que a entrada na casa prisional, nessas situações, se dá de modo fracionado.

Aliás, compreensível que, para escapar da fiscalização e tentar furtar-se da aplicação das sanções cabíveis, os presos, justamente, guardem separadamente o próprio telefone celular dos respectivos componentes, como chip, carregador e bateria.

A título de ilustração, o seguinte julgado do E. STJ:

“HABEAS COUS IMPETRADO EM SUBSTITUIÇÃO AO RECURSO PREVISTO NO ORDENAMENTO JURÍDICO. 1. NÃO CABIMENTO. MODIFICAÇÃO DE ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL. RESTRIÇÃO DO REMÉDIO CONSTITUCIONAL. EXAME EXCEPCIONAL QUE VISA PRIVILEGIAR A AMPLA DEFESA E O DEVIDO PROCESSO LEGAL. 2. EXECUÇÃO PENAL. APURAÇÃO DE FALTA GRAVE. POSSE DE CELULAR SEM O CHIP NO INTERIOR DE ESTABELECIMENTO PRISIONAL. CONDUTA VERIFICADA APÓS A EDIÇÃO DA LEI N. 11.466/2007. ART. 50, VII, DA LEP. CARACTERIZAÇÃO DA FALTA GRAVE MESMO SE APREENDIDO APENAS O APARELHO DE TELEFONIA CELULAR. PRECEDENTES. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO EVIDENCIADO. 3. HABEAS COUS NÃO CONHECIDO. 1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, buscando a racionalidade do ordenamento jurídico e a funcionalidade do sistema recursal, vinha se firmando, mais recentemente, no sentido de ser imperiosa a restrição do cabimento do remédio constitucional às hipóteses previstas na Constituição Federal e no Código de Processo Penal. Nessa linha de evolução hermenêutica, o Supremo Tribunal Federal passou a não mais...

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