Acórdão nº 51867447620218217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Quarta Câmara Cível, 30-03-2022

Data de Julgamento30 Março 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualAgravo de Instrumento
Número do processo51867447620218217000
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoVigésima Quarta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001447317
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

24ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Agravo de Instrumento Nº 5186744-76.2021.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Contratos Bancários

RELATOR: Desembargador JORGE MARASCHIN DOS SANTOS

AGRAVANTE: BANCO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL S/A - BANRISUL

AGRAVADO: BETTO E CIA LTDA

RELATÓRIO

BANCO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL interpôs agravo de instrumento em face da decisão interlocutória que determinou a juntada de documentos, sob pena de multa no valor de 10% do valor da casusa, em sede ação revisional de contrato que lhe move BETTO E CIA LTDA., da qual assim constou:

Vistos.

Intime-se a parte ré para que, no prazo de 10 (dez) dias, realize a juntada dos documentos requeridos, sob pena de multa no valor de 10% (dez porcento) do valor da causa.

Dra. DANIELA CONCEICAO ZORZI, Juíza de Direito da 1ª Vara Judicial da Comarca de Getúlio Vargas.

Em suas razões de recurso, a parte agravante sustenta ser descabida a fixação de multa em caso de determinação de juntada de documentos. Disse que a multa mostra-se desproporcional em relação à própria obrigação cominada, de modo que não pode implicar em enriquecimento sem causa, na medida em que não se justifica tal imposição. Assim, requer o provimento do recurso para efeito de ser afastada a penalidade ora imposta ou, subsidiariamente, seja reduzido tal montante.

Recurso recebido, com atribuição de efeito suspensivo.

Não foram apresentadas contrarrazões ao evento.

É o relatório.

VOTO

EXIBIÇÃO INCIDENTAL DE DOCUMENTOS. MULTA COMINATÓRIA. IMPOSSIBILIDADE. CASO CONCRETO.

Trata-se de ação revisional contratual na qual houve pedido incidental de exibição de documentos.

O banco requerido foi intimado para proceder a juntada dos documentos reclamados na inicial, em mais de uma oportunidade (evento 17, 31 e 44), sendo que nesta última foi determinada inclusive a aplicação de multa de 10% sobre o valor do débito.

Por sua vez, o banco agravante efetuou a juntada de documentos (eventos 49, 50 e 61), todavia, postula em seu recurso, o afastamento da penalidade aplicada ou, subsidiariamente, seja reduzida a montante não excessivo.

Insta destacar que se tratam de documentos comuns às partes e imprescindíveis à apreciação dos aspectos fáticos relevantes ao deslinde da causa, na forma do art. 399, III, do CPC, que assim prevê:

Art. 399. O juiz não admitirá a recusa se:

(...)

II - o requerido tiver aludido ao documento ou à coisa, no processo, com o intuito de constituir prova;

Por esses motivos, em que pese seja ônus da parte autora comprovar a existência da relação contratual, bem como os encargos que entende abusivos, an forma do artigo 330,§2º, do CPC, sob pena de indeferimento da inicial, não se pode desconsiderar que estando determinado documento/contrato sob a guarda e custódia do banco, pode o juiz ordenar a sua exibição em determinados casos, cabendo ao banco exibi-los ou provar que não os detém, a teor do que preceitua o artigo 396, do Código de Processo Civil:

Art. 330. A petição inicial será indeferida quando:

(...)

§ 2º Nas ações que tenham por objeto a revisão de obrigação decorrente de empréstimo, de financiamento ou de alienação de bens, o autor terá de, sob pena de inépcia, discriminar na petição inicial, dentre as obrigações contratuais, aquelas que pretende controverter, além de quantificar o valor incontroverso do débito.

Art. 396. O juiz pode ordenar que a parte exiba documento ou coisa que se encontre em seu poder

Na hipótese dos autos, não se mostra possível o arbitramento de multa diária para o caso de descumprimento da ordem de exibição de documentos, uma vez que o ordenamento processual já prevê pena própria para tal situação, qual seja, a de confissão do art. 400, I, do CPC:

Art. 400. Ao decidir o pedido, o juiz admitirá como verdadeiros os fatos que, por meio do documento ou da coisa, a parte pretendia provar se:

I - o requerido não efetuar a exibição nem fizer nenhuma declaração no prazo do art. 398 ;

E também assim dispõe a Súmula 372, do STJ:

Na ação de exibição de documentos, não cabe a aplicação de multa cominatória.

Aliás, de acordo com a jurisprudência do egrégio STJ, este entendimento aplica-se, pelos mesmos fundamentos, para afastar a cominação de multa diária para forçar a parte a exibir documentos em medida incidental no curso de ação ordinária.

Nesse sentido:

AGRAVO INTERNO. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. MULTA COMINATÓRIA. ASTREINTES. OBRIGAÇÃO DE FAZER. EXIBIÇÃO. DOCUMENTO. EXECUÇÃO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. EXCLUSÃO. REVISÃO. POSSIBILIDADE. 1. Não cabe a cominação de multa para forçar a exibição de documentos, seja incidental, seja em ação autônoma (cautelar).
Súmula 372/STJ. Precedentes. 2. Agravo interno a que se nega provimento. (Ministra Maria Isabel Gallotti (1145), Órgão Julgador, T4 - Quarta Turma, data do Julgamento 26/03/2019, data da Publicação/fonte DJE 29/03/2019.) grifei

A cominação de multa - astreintes, por sua vez, é medida adotada para garantir o cumprimento da ordem judicial, aplicável somente em caso de procrastinação da parte ré, devendo ser arbitrada em quantum razoável para ser efetivamente meio de coerção do obrigado no cumprimento da medida.

Entretanto, em que pese o parágrafo referido indique a possibilidade de medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias, dentre as quais está incluída a multa, inexiste qualquer previsão de "astreintes punitivas".

A respeito da questão, leciona a doutrina (Primeiros comentários ao Novo Código de Processo Civil: Artigo por Artigo/coordenação Teresa Arruda Alvim Wambier. 1. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015, pgs. 683-684):

A consequência da não exibição do documento ou coisa pela parte é eminentemente processual. Com efeito, a parte que está na posse de objeto relevante para a solução do litígio têm o ônus de apresentá-lo em juízo, quando o juiz assim determina de ofício ou por força de pedido formulado pela outra parte.

Não ocorrendo a exibição, o juiz admitirá como verdadeiro o fato que se pretenda provar com o documento ou com a coisa.

(...)

O incidente de exibição de documento ou coisa é meramente instrumental (não constitui um fim em si mesmo), voltado a demonstrar um fato tido por relevante à solução da lide. Assim, a "presunção" de veracidade desse fato, em regra, esgota o interesse na produção da prova, não havendo sentido na imposição de eventuais medidas coercitivas.

Por meio do documento ou coisa cuja exibição pediu, a parte quer provar um determinado fato. Se a parte adversária se negar a apresentá-los, e o contexto probatório assim o permitir, reputar-se-á o fato como provado, ou seja, a não exibição levará ao mesmo resultado da exibição, não havendo sentido em se aplicar multa coercitiva.

Nesse sentido, julgados desta Corte:

APELAÇÕES CÍVEIS....

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