Acórdão nº 51883033420228217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Câmara Cível, 15-02-2023

Data de Julgamento15 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualAgravo de Instrumento
Número do processo51883033420228217000
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoVigésima Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003242996
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

20ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

AGRAVO INTERNO EM Agravo de Instrumento Nº 5188303-34.2022.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Cheque

RELATOR: Desembargador CARLOS CINI MARCHIONATTI

AGRAVANTE: ARNILDO RENE KIST

AGRAVADO: SERGIO DA SILVA

RELATÓRIO

ARNILDO RENE KIST interpõe agravo interno às decisões monocráticas em que, como Relator, neguei provimento ao agravo de instrumento e desacolhi os embargos de declaração opostos (Eventos 4 e 10 do 2º Grau).

O recorrente alega que o agravo de instrumento diz respeito ao uso da ferramenta disponibilizada pelo SISBAJUD para reiteração automática das ordens de bloqueio, conhecida como "teimosinha", e não a novo pedido de penhora on-line, demonstrando por meio de distinção (distinguishing) que as decisões utilizadas para lastrear o posicionamento adotado não se assemelham ao caso dos autos, como também refere que o fato de o veículo estar alienado fiduciariamente em favor da instituição bancária não impede a realização de penhora de direitos aquisitivos do devedor fiduciante advindos do contrato de alienação, entre eles, o de circulação. Colaciona jurisprudência. Pede provimento (Evento 16).

Não houve contrarrazões.

É o relatório.

VOTO

Reafirmo as decisões que proferi como Relator, reproduzindo a decisão proferida nos embargos de declaração, que contém a decisão proferida no agravo de instrumento:

[...]

ARNILDO RENE KIST, como exequente, opõe embargos de declaração à decisão monocrática constante do Evento 4 do 2º Grau, na qual, como Relator, neguei provimento ao seu agravo de instrumento. Alega que a decisão embargada foi omissa e contraditória quanto ao risco de excesso de execução quando é possibilitado ao próprio magistrado que lança a ordem de indisponibilidade corrigir eventuais excessos de constrições, referindo também acerca da ausência de fundamentação da decisão embargada, tendo em consideração que os acórdãos referidos como paradigma não guardam nenhuma relação com a pretensão recursal de deferimento de ordem de penhora, mediante o sistema SISBAJUD, na modalidade “teimosinha”, o que de forma alguma configura abuso de autoridade (Evento 8 do 2º Grau).

É o relatório. Decido monocraticamente.

Decido pelo desacolhimento dos embargos declaratórios.

A decisão que proferi como Relator no Evento 4 circunstanciou com exatidão, e são as circunstâncias determinantes do julgamento, assim sintetizadas:

[...]

Vistos.

Em execução de título extrajudicial (cheque) no valor de R$ 3.427,80 na data do ajuizamento (3-8-2015) e valor atualizado até junho de 2022 de R$ 14.118,46, a parte exequente agrava de instrumento da decisão que indeferiu o pedido de lançamento da ordem de bloqueio com reiteração automática (denominada de "teimosinha"), assim como o lançamento de restrição de circulação do veículo cujos direitos foram penhorados, tendo em vista que encontra-se alienado fiduciariamente.

Transcrevo a decisão agravada (Evento 10):

Vistos.

I- RESTRIÇÃO DE CIRCULAÇÃO

Tendo em vista que o veículo que originou a penhora dos direitos e ações encontra-se alienado fiduciariamente, nos termos do art. 7°, A, do Decreto-Lei 911/1969, INDEFIRO o lançamento de restrição de circulação.

II – OFICIAL DE JUSTIÇA

Expeça-se mandado nos termos do item "3" da decisão da fl. 43 do processo físico.

III - OFÍCIO BANCO ABN AMRO REAL S/A.

Oficie-se a instituição financeira indicada no item C da fl. 48 dos autos físicos, conforme determinado na decisão da fl. 26 dos autos físicos.

IV – SISBAJUD.

Como consabido, a forma mais usual e eficaz de se garantir o pagamento de uma dívida ao credor é através da penhora, que é feita, preferencialmente, em dinheiro, na forma do disposto no art. 835, I, do CPC. Para possibilitá-la, a legislação autorizou o Magistrado, a requerimento do exequente, sem necessidade de oitiva da parte devedora, determinar a indisponibilidade de ativos financeiros existentes em nome do executado, por sistema eletrônico, via sistema SISBAJUD. Tal operação é recorrente na prática forense e de grande eficácia na obtenção do crédito buscado pelo exequente.

Contudo, a partir da vigência da Lei n.º 13.869/2019, não se mostra prudente a utilização de tal recurso, na medida em que o artigo 36 tipificou como crime de abuso de autoridade, punido com pena de detenção de 01 (um) ano a 04 (quatro) anos e multa “decretar, em processo judicial, a indisponibilidade de ativos financeiros em quantia que extrapole exacerbadamente o valor estimado para a satisfação da dívida da parte e, ante a demonstração, pela parte, da excessividade da medida, deixar de corrigi-la”.

Explico.

Na medida em que é realizada a determinação judicial de indisponibilidade de certo valor, o sistema SISBAJUD bloqueia todas as contas bancárias vinculadas ao devedor que possuam ativos financeiros e o retorno da ordem judicial emanada apenas ocorre passadas 48h úteis após a determinação de bloqueio. Desta forma, o Magistrado somente poderá verificar as contas constritas após tal interregno e, a partir de então, constatar eventual excesso de penhora ou impenhorabilidade, por se tratar de conta-salário, por exemplo, podendo corrigir o vício, que não pode ser previsto e coibido anteriormente a tal prazo, o qual pode se estender no caso de inconsistência do sistema.

Portanto, ressai evidente que o Magistrado não possui qualquer ingerência nas contas do devedor durante o período acima citado e, diante da novel legislação alhures referida, fica à mercê de ser responsabilizado criminalmente pela ordem de indisponibilidade proferida.

A par disso, o artigo 36 da Lei 13.869/2019 não esclarece terminologias tais como: “exacerbadamente” e “excessividade da medida”, se tratando de tipo penal aberto, sujeito a interpretações da mais diversa ordem, o que afeta a tranquilidade do julgador no exercício de sua atividade jurisdicional, que pode ser acusado de prática de conduta criminosa.

Nessa toada, segue ementa do eminente Desembargador Luiz Felipe Silveira Difini, que colaciono:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. ISSQN. PENHORA ONLINE. SISTEMA BACENJUD. LEI DE ABUSO DE AUTORIDADE. IMPOSSIBILIDADE DE DETERMINAÇÃO ATÉ POSIÇÃO DO E. STF ACERCA DA MATÉRIA. ADI’S Nº 6238 E Nº 6239. 1. A Lei de Abuso de Autoridade, no seu art. 36, criminaliza a seguinte conduta “Decretar, em processo judicial, a indisponibilidade de ativos financeiros em quantia que extrapole exacerbadamente o valor estimado para a satisfação da dívida da parte e, ante a demonstração, pela parte, da excessividade da medida, deixar de corrigi-la”. 2. A lei não esclarece qual o alcance das expressões “exacerbadamente” e “excessividade da medida”. Também não refere qual o prazo para que reste configurada a omissão do julgador disposta na parte final do tipo penal. 3. A norma, portanto, contrariando a técnica legislativa penal, é aberta, admitindo interpretação nos mais variados sentidos. Criminaliza conduta atrelada à atividade-fim do julgador, responsável pela condução dos processos e pela determinação do bloqueio on line. 4. Até que haja posicionamento da Corte Suprema nas ADI’s 6238 e 6239, considerando os termos da Lei de Abuso de Autoridade, recentemente aprovada, não se mostra possível, por ora, a determinação de bacenjud. AGRAVO DE INSTRUMENTO DESPROVIDO, EM DECISÃO MONOCRÁTICA.(Agravo de Instrumento, Nº 70083459925, Vigésima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz Felipe Silveira Difini, Julgado em: 06-12-2019)

Por certo, tais definições emanarão do Supremo Tribunal Federal, onde tramitam duas ADINs (n.º 6.238 e 6.239), que aguardam decisões.

Não obstante, até que sejam esclarecidos esses pontos relevantes e diante da incompatibilidade de utilização do sistema SISBAJUD com a tipificação prevista no artigo 36 da Lei de Abuso de Autoridade, INDEFIRO a realização de penhora de ativos financeiros pelo sistema SISBAJUD solicitado no Evento 8.

Intime-se, inclusive a parte exequente para, em 15 dias, indicar bens à penhora, sob pena de extinção.

Diligências legais.

FERNANDA PINHEIRO TRACTENBERG, Juíza de Direito, em 18/8/2022,

Comarca de São Leopoldo.

Essencialmente, a parte agravante alega, no que concerne ao pedido de restrição de circulação do veículo em relação ao qual já houve anterior deferimento de penhora dos direitos e ações, como também de restrição de transferência, que o fato de o veículo estar alienado fiduciariamente à instituição financeira não obsta a realização de penhora de direitos aquisitivos do devedor fiduciante advindos do contrato de alienação, dentre eles, o direito de circulação. Quanto à utilização do sistema SISBAJUD na modalidade conhecida como "teimosinha", com permanência mínima de 30 dias, alega que não configura abuso de autoridade. Requer o provimento do recurso com o deferimento da restrição de circulação sobre o veículo em alienação fiduciária cujos direitos e ações já foram objeto de penhora, assim como a utilização do sistema SISBAJUD, na modalidade "teimosinha" com permanência mínima de 30 dias.

Decido.

Primeiramente, reafirma-se o indeferimento do pedido de restrição de circulação do veículo...

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