Acórdão nº 51900805420228217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Câmara Cível, 15-02-2023

Data de Julgamento15 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualAgravo de Instrumento
Número do processo51900805420228217000
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoVigésima Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003202518
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

20ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Agravo de Instrumento Nº 5190080-54.2022.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Cédula de crédito rural

RELATOR: Desembargador GLENIO JOSE WASSERSTEIN HEKMAN

AGRAVANTE: ARCHIMEDIO TARTARI

AGRAVANTE: ELIZABETE TARTARI

AGRAVADO: LISIANE VANESSA GIRELLI

RELATÓRIO

Trata-se de agravo de instrumento interposto por ARCHIMEDIO TARTARI e ELIZABETE TARTARI contra decisão interlocutória que determinou o cumprimento da obrigação, nos autos da ação de execução de entrega de coisa incerta movida por LISIANE VANESSA GIRELLI.

A decisão agravada está assim redigida:

Vistos.

Cite(m)-se o(s) executado(s) para entregar 240 sacas de soja, representadas pela confissão de dívida de evento 01, em 15 dias, sob pena de multa de R$150,00, por dia, primeiramente até o limite de 35% do valor do débito, sem prejuízo de nova estimativa, oportunamente (§ 1º, artigo 806, CPC).

Do mandado deverá constar ordem para busca e apreensão, cujo cumprimento se dará de imediato, se o executado não satisfizer a obrigação no prazo que lhe foi designado, o que deverá ser apurado pelo Oficial de Justiça, antes de devolver o mandado.

Havendo a entrega da coisa, lavre-se o termo respectivo (art. 807, CPC), considerando-se satisfeita a obrigação, prosseguindo a execução tão somente para o pagamento de frutos ou o ressarcimento de prejuízos, se houver.

Para o caso de inadimplemento fixo honorários advocatícios de 10% sobre o valor da causa.

Intimem-se.

Diligências Legais.

Em suas razões, a parte agravante alega que a multa efetivamente fixada para o caso de descumprimento da obrigação se revela manifestamente excessiva, devendo ser imediatamente reduzida para patamar adequado. Salienta que há enriquecimento ilícito por parte do beneficiário das astreintes. Narra que os herdeiros do efetivo credor sequer buscaram os agravantes para se inteirarem acerca da origem do instrumento particular que vem sendo executado – já quitado –, mas tão somente ajuizaram a execução originária. Discorre sobre a natureza da fixação de multa cominatória. Afirma que, havendo justificativa plausível do descumprimento do comando judicial, há que ser afastada a astreinte fixada. Colaciona jurisprudência. Requer a concessão de AJG. Requer, no mérito, a reforma da decisão agravada, a fim de suspender a cobrança das astreintes ou, subsidiariamente, reduzi-las ao valor de R$ 50,00 por dia, limitadas ao patamar máximo de R$ 10.000,00 (dez mil reais).

O recurso foi recebido sem concessão de efeito suspensivo (Evento 4).

Transcorreu in albis o prazo para contrarrazões.

Vieram-me conclusos os autos.

É o relatório.

VOTO

Eminentes Colegas.

Conheço do agravo de instrumento, pois preenchidos todos os seus requisitos de admissibilidade recursal, nos termos dos arts. 1.015 e seguintes do Novo Código de Processo Civil.

A fixação de multa com caráter inibitório é medida atualmente consagrada pelo direito processual positivo e, ademais, decorrência lógica e natural da natureza instrumental do processo civil moderno, utilizada como medida a fim de imprimir celeridade no cumprimento da obrigação imposta.

Descumprida a determinação judicial de fazer ou não fazer, no prazo ajustado, a multa cominatória incidirá imediatamente (art. 537, §4º CPC), podendo ser fixa, periódica ou ainda, progressiva, in verbis:

Art. 537. A multa independe de requerimento da parte e poderá ser aplicada na fase de conhecimento, em tutela provisória ou na sentença, ou na fase de execução, desde que seja suficiente e compatível com a obrigação e que se determine prazo razoável para cumprimento do preceito.

§ 1º O juiz poderá, de ofício ou a requerimento, modificar o valor ou a periodicidade da multa vincenda ou excluí-la, caso verifique que:

I - se tornou insuficiente ou excessiva;

II - o obrigado demonstrou cumprimento parcial superveniente da obrigação ou justa causa para o descumprimento.

Cito o entendimento doutrinário1:

Para que a sentença mandamental tenha força persuasiva suficiente para coagir alguém a fazer ou não fazer, realizando assim a tutela prometida pelo direito material, permite-se ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, a imposição de multa coercitiva – astreintes (art. 537, CPC). A finalidade da multa é coagir o demandado ao cumprimento do fazer ou do não fazer, não tendo caráter punitivo. Constitui forma de pressão sobre a vontade do réu, destinada a convencê-lo a cumprir a ordem jurisdicional [...]. Para que a multa coercitiva possa constituir autêntica forma de pressão sobre a vontade do demandado, é fundamental que seja fixada com base em critérios que lhe permitam alcançar o seu fim. Assim é que o valor da multa coercitiva não tem qualquer relação com o valor da prestação que se quer observada mediante a imposição do fazer ou não fazer. As astreintes, para convencer o réu a adimplir, devem ser fixadas em montante suficiente para fazer ver ao réu que é melhor cumprir do que desconsiderar a ordem do juiz. Para o adequado dimensionamento do valor da multa, afigura-se imprescindível que o juiz considere a capacidade econômica do demandado. Se a multa não surte os efeitos que dela se esperam, converte-se automaticamente em desvantagem patrimonial que recai sobre o demandado desobediente. A decisão que a fixa, atendidos os pressupostos legais, pode ser executada para obtenção de quantia certa contra o demandado.

No ponto, entendo que não é caso de afastamento da cominação da multa.

Quanto ao pedido de minoração, passo a analisá-lo.

No caso sub judice, o Juízo de primeiro grau fixou o valor referente às astreintes em R$150,00 (cento e cinquenta reais) por dia, limitado em 35% (trinta e cinco por cento) do valor do débito (Evento 8).

Ante a natureza da obrigação, bem como considerando o elevado valor da causa - o qual ainda se acrescerá os devidos consectários legais -, entendo que desproporcionais os valores fixados a título de multa por descumprimento de ordem judicial, sendo necessária sua redução a fim de evitar o locupletamento ilícito de uma das partes.

Vou de encontro ao entendimento majoritário...

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