Acórdão nº 51900943820228217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Quinta Câmara Cível, 28-02-2023

Data de Julgamento28 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualAgravo de Instrumento
Número do processo51900943820228217000
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoVigésima Quinta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002871723
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

25ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Agravo de Instrumento Nº 5190094-38.2022.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Programas de Assistência Estudantil - Alimentação, Moradia, Creche, Transporte

RELATORA: Desembargadora HELENA MARTA SUAREZ MACIEL

RELATÓRIO

Trata-se de agravo de instrumento interposto por O. G. P. P. contra decisão proferida na ação ajuizada em desfavor do MUNICIPIO DE CANOAS.

A decisão recorrida foi proferida nos seguintes termos:

"Vistos.

Trata-se de ação pelo rito ordinário visando à obtenção de vaga em creche ou pré-escola municipal em favor de criança, ante omissão do Município no cumprimento do dever constitucional de disponibilizar ensino infantil aos munícipes.

É o breve relato.

Decido.

Considerando que vige a gratuidade do acesso à justiça nas ações em tramitação no Juizado da Infância e Juventude, postergo o exame da AJG para sentença.

Nos termos do art. 205, CRFB/88: a educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho, norma esta repetida no art. 2º, da Lei 9.394/96.

Estatui o art. 227, CRFB/88: é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los à salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

Ainda, consoante o art. 208, I, CRFB/88, a educação básica é obrigatória e gratuita dos 04 aos 17 anos e, segundo dispõe o art. 211, §2º, CRFB/88, é atribuição dos Municípios a disponibilização do ensino infantil e fundamental.

Segundo o art. 30, da Lei 9.394/96, a educação infantil é oferecida em creches ou entidades equivalentes para crianças de até três anos de idade e em pré-escolas para crianças de quatro a cinco anos de idade.

Ainda, para fins de deferimento da tutela de urgência, deve a parte demonstrar, com fulcro no art. 300, CPC/15, a probabilidade do direito e o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo.

Embora a educação seja direito público subjetivo, entendo que, tratando-se, também, de obrigação dos pais, inserida dentre aquelas decorrentes do poder familiar, tendo em vista, outrossim, a notória limitação dos recursos públicos e a impossibilidade material de disponibilização de vagas em creches e escolas públicas, ou conveniadas, a todos os cidadãos residentes em Canoas, devem essas ser reservadas às pessoas que demonstrem, de modo efetivo, a necessidade de implemento da política sob exame pela via judicial.

Isto porque a concessão irrestrita de tutelas de urgência, obrigando o Município a disponibilizar vagas a pessoas com capacidade econômica para custeio do ensino particular, acaba por vir em prejuízo de outras que optam, pelas mais variadas razões, por não ingressar em Juízo buscando a satisfação do direito.

Deste modo, somente com a prova, nos autos, de que a renda familiar é insuficiente para manutenção do filho em escola privada, resta preenchido o pressuposto ora analisado.

Neste sentido, entendimento do TJ/RS:

APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DIREITO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. ENSINO PÚBLICO. MUNICÍPIO DE PORTO ALEGRE. QUESTÕES PRELIMINARES: NULIDADE DA DECISÃO AFASTADA. OBSERVÂNCIA DAS DISPOSIÇÕES DA LEI Nº 13.655/18. EXTINÇÃO E/OU SUSPENSÃO DO PROCESSO. PENDÊNCIA DO JULGAMENTO DO TEMA 548-STF. AUSÊNCIA DE DETERMINAÇÃO DE SOBRESTAMENTO PELO STF. INOCORRÊNCIA DE HIPÓTESES DE EXTINÇÃO DO FEITO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. PREFACIAIS REJEITADAS. Afastada alegação de nulidade da sentença por ofensa aos arts. 20 e 22 da Lei n. 13.655/2018, pois o Município recorrente não pode pretender que o magistrado, na sentença, aponte especificamente no orçamento do ente público de onde sairão as verbas para atender a determinação judicial que impõe ao gestor público cumprir judicialmente aquilo que a lei já lhe determina seja cumprido, como é o caso do dever de disponibilizar acesso à educação infantil às crianças que dela necessitam, obrigação, aliás, que a lei exige seja atendida com absoluta prioridade, tanto que determina, em disposição expressa (art. 4º do ECA), destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com proteção à infância e à juventude. Sentença que, ademais, atentou para as possíveis dificuldades do gestor no cumprimento da condenação e suas consequências práticas. Suspensão do trâmite e/ou extinção da demanda, por força da pendência de julgamento do recurso em que reconhecida, pelo STF, a repercussão geral da questão controvertida (Tema 548). Descabimento, quer por ausência de determinação por parte do STF no sentido do sobrestamento, quer porque ausente hipótese de extinção do feito sem resolução de mérito por conta de tal questão. MÉRITO: EDUCAÇÃO INFANTIL. DEVER DO MUNICÍPIO. DISPONIBILIZAÇÃO DE VAGAS ÀS CRIANÇAS DE 0 (ZERO) A 5 (CINCO) ANOS. REDE PÚBLICA OU CONVENIADA, OU, SE INVIÁVEIS ESTAS, ATENDIMENTO NA REDE PARTICULAR. ANÁLISE A PARTIR DA ÓTICA CONSTITUCIONAL E DAS LEIS QUE REGEM A MATÉRIA. DISTINÇÃO ENTRE PRÉ-ESCOLA E CRECHE. VAGAS EM PRÉ-ESCOLA: OBRIGATORIEDADE E GRATUIDADE. ART. 208, I, CF E ART. 4º, I, E 30, II, DA LDB. VAGAS EM CRECHES: CRITÉRIOS E REQUISITOS PARA SUA CONCESSÃO. HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA E/OU VULNERABILIDADE SOCIAL. ART. 208, IV c/c 214 CF E ART. 4, II E 30, I, DA LDB. EC 59/2009. PLANO NACIONAL DE EDUCAÇÃO. LEI 13.005/14. PRINCÍPIO DA RESERVA DO POSSÍVEL. A par da indiscutível universalidade do direito social à educação, não há no texto constitucional e nas normativas que tratam da matéria determinação expressa que obrigue o ente público a fornecer ensino infantil, na modalidade creche (0 a 3 anos de idade), a todas as crianças, em caráter universal e gratuito. Interpretação a ser feita a partir do disposto no art. 208, incisos I e IV, da Constituição Federal, consideradas, ainda, as definições da Lei de Diretrizes e Bases e as metas estabelecidas pelo Plano Nacional de Educação. Balizas de idade, fixadas pelo próprio Constituinte, objetivando situar a educação infantil, diversa da educação básica, e, a partir de tais pressupostos, instituir o que deve ser simplesmente oferecido daquilo que é obrigatório e gratuito. Obrigatória e gratuita deve ser a educação infantil na pré-escola às crianças de 4 (quatro – 1ª etapa) a 5 (cinco – 2ª etapa) anos de idade, em relação a quem a CF e a própria Lei 13.005/2014 asseguram a sua imediata universalização, obrigatoriedade e acesso gratuito. Observância, na disponibilização de vagas em creche (0 a 3 anos), etapa inicial da “educação infantil”, ao disposto no PNE, que estabelece atendimento universal progressivamente até 2024. Destarte, crianças de 0 a 3 anos de idade que demandam creches devem ser atendidas na medida da necessidade/possibilidade, autorizando análise da situação concreta a partir de critérios como da hipossuficiência econômica familiar, vulnerabilidade, dentre outros. Aplicação dos Princípios da Isonomia, Solidariedade, Proporcionalidade e Razoabilidade. EXIGÊNCIA DE PRÉVIA INSCRIÇÃO ADMINISTRATIVA. ADMISSIBILIDADE. Sentença que apresenta conformidade com o posicionamento deste Colegiado, no tópico, por inadmissível o ajuizamento de processo judicial no intuito de obter vaga em creche sem que antes tenha, no mínimo, demonstrado que diligenciou concretamente na esfera administrativa. O pedido administrativo não implica violação ao acesso à justiça, mas serve para demonstrar a efetiva existência de pretensão resistida, requisito que diz com o próprio interesse de agir (art. 17 do CPC/15). Precedente do STJ (RE 631240/MG). TURNO PARCIAL OU INTEGRAL. ANÁLISE DA SITUAÇÃO DA FAMÍLIA EM QUE INSERIDA A CRIANÇA. EXIGÊNCIA DA COMPROVAÇÃO DO TRABALHO/OCUPAÇÃO DOS GENITORES DO MENOR. ADMISSIBILIDADE. A disponibilização de vaga em creche pública e em turno integral depende da comprovação da necessidade familiar, seja quanto à impossibilidade financeira de custear escola privada, seja em relação à ocupação de turno integral dos pais, de forma a compatibilizar sua convivência com a família em outro turno, ressalvada possibilidade de ampliação para turno integral, na dependência de prova concreta da necessidade, a partir da realidade da família do infante. Orientação que coincide com a posição até então firme deste Colegiado. HABILITAÇÕES. FORMA DE CUMPRIMENTO DA SENTENÇA. MEDIDAS DETERMINADAS NA DECISÃO RECORRIDA QUE ATENDEM PRINCÍPIOS DA RACIONALIDADE, ECONOMICIDADE E TRANSPARÊNCIA. MANUTENÇÃO DA LIMINAR CONCEDIDA. Na hipótese de inexistir vaga na rede pública ou conveniada, viável o pagamento da mensalidade da escola privada por parte do Município, diretamente, desde que juntados três orçamentos e sejam submetidos ao contraditório. A permissão para acerto diretamente junto às escolas vem ao encontro da jurisprudência até então pacífica nesta Câmara, facilitando ao ente público a gestão de seus próprios recursos, sem restrição de diversas contas bancárias tituladas pelo Município, evitando bloqueios judiciais de valores e sua disponibilização às partes, com risco de desvios e necessidade de eternas prestações de contas nos autos do processo, o que a sentença quis afastar, no interesse da própria municipalidade. MAJORAÇÃO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. Descabe a majoração dos honorários sucumbenciais postulados pela DPE em face do entendimento do STJ no sentido de não serem devidos nas Ações Civis Públicas quando inexistente má-fé, mantida a imposição da verba, no caso, diante da ausência de...

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