Acórdão nº 51902701720228217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quinta Câmara Cível, 14-12-2022

Data de Julgamento14 Dezembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualAgravo de Instrumento
Número do processo51902701720228217000
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoQuinta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003108201
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

5ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Agravo de Instrumento Nº 5190270-17.2022.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Indenização por dano moral

RELATORA: Desembargadora LUSMARY FATIMA TURELLY DA SILVA

AGRAVANTE: TAMIRES SOARES CORREA

AGRAVADO: FUNDO DE INVESTIMENTO EM DIREITOS CREDITORIOS MULTSEGMENTOS NPL IPANEMA VI - NAO PADRONIZADO

RELATÓRIO

Trata-se de agravo de instrumento interposto por TAMIRES SOARES CORREA contra decisão (evento 3 do processo originário) que indeferiu o pedido de gratuidade da justiça articulado nos autos da ação declaratória e indenizatória ajuizada em face de FUNDO DE INVESTIMENTO EM DIREITOS CREDITORIOS MULTSEGMENTOS NPL IPANEMA VI - NAO PADRONIZADO, nos seguintes termos:

Vistos.

O acesso à justiça, previsto no artigo 5º, XXXV e LXXIV, constitui uma das principais garantias fundamentais asseguradas pela Constituição Federal, inclusive aos que comprovarem não possuir recursos financeiros para tanto.

Sucede que o acesso à justiça não pode ser considerado um "super direito', que se sobrepõe a todos os deveres imputados àqueles que pretendem acionar o Poder Judiciário.

Com o intuito de facilitar o acesso à justiça e driblar a morosidade decorrente sobretudo do ajuizamento massificado de novas ações, o legislador constitucional criou mecanismos processuais e os colocou à disposição das partes, dentre os quais destacam-se os Juizados Especiais Cíveis, instituídos pelo art. 98 da Constituição Federal:

Art. 98. A União, no Distrito Federal e nos Territórios, e os Estados criarão:

I - juizados especiais, providos por juízes togados, ou togados e leigos, competentes para a conciliação, o julgamento e a execução de causas cíveis de menor complexidade e infrações penais de menor potencial ofensivo, mediante os procedimentos oral e sumaríssimo, permitidos, nas hipóteses previstas em lei, a transação e o julgamento de recursos por turmas de juízes de primeiro grau;

(...)

§ 2º As custas e emolumentos serão destinados exclusivamente ao custeio dos serviços afetos às atividades específicas da Justiça.

Para regulamentar o dispositivo constitucional, foi editada a Lei n. 9.099/95, estabelecendo as regras de regência dos Juizados Especiais Cíveis, norteados pelos princípios da "oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade, buscando, sempre que possível, a conciliação ou a transação" (art. 2ºda Lei nº 9.099/95), nos quais a própria parte pode formular sua pretensão, de forma totalmente gratuita.

Diferentemente do que ocorre com os Juizados Especiais Federais, cuja competência é absoluta, a propositura de determinada ação no Juizado Especial Cível, conforme estendimento dominante, é facultativa para as causas cujo valor não exceda a 40 salários-mínimos.

Não obstante o ajuizamento perante o Juizado Especial Cível seja facultativo, é chegada a hora de clamar ao bom-senso e chamar os operadores do direito a assumirem, também, papel contributivo para que seja assegurada, a todos, uma duração razoável do processo.

Com efeito, não se revela minimamente razoável que, dispondo de meios que possam satisfazer sua pretensão de forma célere, informal e gratuita – pelo rito sumaríssimo -, a parte insista em demandar na Justiça Comum, na qual, além de precisar comprovar que faz jus à gratuidade judiciária, verá sua demanda tramitar de forma morosa pelo procedimento comum, ao lado de centenas de demandas urgentes, cuja análise, sabidamente, lhe é prioritária.

Se de um lado está o Estado-Juiz buscando formas de agilizar a resposta ao jurisdicionado que se socorre do Poder Judiciário, de outro está o próprio jurisdicionado, que deve cooperar, pelos meios que lhe estão disponíveis, para que tal desiderato seja efetivamente alcançado.

Em que pese ainda predomine o entendimento doutrinário e jurisprudencial de que a propositura de ação perante o Juizado Especial é mera faculdade, opção da parte, há que se considerar que essa orientação consolidou-se em realidade diversa e é passada a hora de revê-la.

Nesse contexto, tem-se que, ao optar pelo ajuizamento de determinada demanda perante o Juízo Comum, sem qualquer justificativa para tanto, a parte autora opta também por arcar com as custas daí decorrentes. Vale dizer, a opção pelo procedimento ordinário e pela via comum determina que a parte autora suporte os custos decorrentes da opção exercida, mediante regular pagamento das custas e despesas. A opção pelo juízo comum acarreta, pois, automática renúncia à gratuidade da justiça (que é legal em sede de juizados especiais).

Nesse sentido, inclusive, a novel orientação do TJRS:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. AÇÃO DE REVISÃO CONTRATUAL C/C DEVOLUÇÃO DE VALORES. GRATUIDADE JUDICIÁRIA. PESSOA FÍSICA. CASO CONCRETO. INDEFERIMENTO, PRESENTE ALTERNATIVA DA PARTE DEMANDAR GRACIOSAMENTE NO SISTEMA DOS JUIZADOS ESPECIAIS. DECISÃO MANTIDA. Não obstante a agravante pudesse fazer jus, em tese, à gratuidade, a matéria versada no feito é de natureza singela, recorrente e largamente sedimentada na jurisprudência, pelo que não mostra complexidade a justificar a necessidade da opção pela justiça comum. Aliás, dado seu reduzido valor, dispensaria até mesmo a constituição de advogado caso ajuizada no Juizado Especial Cível. Nessas condições, a concessão do benefício da gratuidade não reveste condição de acesso à Justiça, prerrogativa constitucional já assegurada graciosamente à parte através do Sistema dos Juizados Especiais. Assim também porque o direito à opção pela justiça comum não pode ser compreendido como potestativo ou incondicional, podendo ser relativizado, no caso concreto, considerando que a matéria em causa tampouco reveste exigência de maior indagação jurídica ou complexidade na instrução. Consequentemente, respeitada a opção da parte pelo acesso à justiça comum, há que se considerar que tal opção implica renúncia tácita ao benefício da gratuidade que lhe seria conferido automaticamente se ajuizasse o pedido no Juizado Especial. AGRAVO DESPROVIDO.(Agravo de Instrumento, Nº 51760530320218217000, Décima Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Leoberto Narciso Brancher, Julgado em: 06-10-2021) [grifado]

Diante disso, considerando que a parte autora, ao distribuir esta demanda perante o Juízo Comum, abriu mão de um rito mais célere, gratuito, com métodos autocompositivos do litígio postos à sua disposição como ato inaugural do procedimento, deverá efetuar o pagamento das custas decorrentes da sua escolha.

Isto posto, indefiro a gratuidade judiciária postulada pela parte autora na petição inicial.

Assim, intime-se para que recolha as custas iniciais, no prazo de 15 (quinze) dias, sob pena de cancelamento na distribuição (art. 290 do CPC) ou, alternativamente, para que promova a distribuição do feito perante o Juizado Especial Cível desta Comarca.

Em suas razões recursais, a parte autora sustenta que a concessão do benefício da justiça gratuita está vinculada ao preenchimento dos requisitos legais, conforme prevê o artigo 99 do CPC. Refere que o acesso à justiça é um direito fundamental previsto no inciso XXXV do Artigo da Constituição Federal de 1988, motivo pelo qual as razões elencadas para indeferimento da benesse pelo Juízo de Origem não devem ser mantidas. Pontua ser isente de declaração de imposto de renda. Requer a concessão de efeito suspensivo ativo e, ao final, o provimento do recurso.

Recebido o recurso, oportunidade em que restou deferida a antecipação de tutela recursal (Evento 5).

A parte ré apresentou suas contrarrazões (Evento 14).

Vieram os autos conclusos para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Eminentes Colegas.

A admissibilidade do recurso restou aferida quando do seu recebimento, estando superada a questão.

No mérito, razão assiste à parte recorrente.

Com...

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