Acórdão nº 51958165320228217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Quinta Câmara Cível, 15-02-2023

Data de Julgamento15 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualAgravo de Instrumento
Número do processo51958165320228217000
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoDécima Quinta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002804590
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

15ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Agravo de Instrumento Nº 5195816-53.2022.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Empreitada

RELATOR: Desembargador LEOBERTO NARCISO BRANCHER

AGRAVANTE: DEBORA LETICIA BRIGO

AGRAVADO: JOTA CONSTRUTORA LTDA

RELATÓRIO

Inicialmente, adoto o relatório do Evento 5:

"Trata-se de agravo de instrumento interposto por DEBORA LETICIA BRIGO em face da decisão proferida pelo eminente magistrado Dr. Nasser Hatem, da 3º Vara Cível da Comarca de Ijuí, que, nos autos da ação em que litiga com JOTA CONSTRUTORA LTDA, assim dispôs:

"O exequente postula a desconsideração da personalidade jurídica da empresa JOTA CONSTRUTORA LTDA, para incluir no polo passivo os sócios e representantes da empresa executada, sob alegação de que a empresa executada não mantém ativos financeiros nem garantidores para cobrir seus compromissos.

A questão posta nos autos diz respeito à desconsideração da personalidade jurídica, hoje prevista em lei, através do art. 50 do Código Civil de 2002, que assim dispõe:

"Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica."

A referida teoria permite que se ignore a autonomia patrimonial da pessoa jurídica, ingressando-se no patrimônio pessoal dos sócios.

No caso sub judice, entretanto, o exequente não trouxe aos autos prova hábil a ensejar a aplicação da desconsideração em tela, ao menos no presente momento processual.

Seu pedido está amparado em alegação de que a empresa executada não mantém ativos financeiros nem garantidores para cobrir sues compromissos assumidos. Necessitava o exequente comprovar a observância de infringência, pelo sócio, ao estatuto social da empresa ou à lei, caracterizando-se o abuso da personalidade jurídica por meio do desvio das finalidades eleitas no objeto social ou da confusão patrimonial, conforme requer o artigo 50 do Código Civil, acima transcrito, o que não ocorreu nos autos.

Diante do exposto, não havendo, no caso concreto, prova consistente acerca da existência de qualquer dos elementos do artigo 50 do Código Civil, merece, por ora, ser indeferido o pedido de desconsideração da personalidade jurídica da empresa executada, o que, porém, não impede nova avaliação futura, a partir do surgimento de novas circunstâncias que venha a trazer ao feito.

Custas do incidente pela parte requerente

Publique-se. Registre-se. Intimem-se. "

A agravante opôs embargos declaratórios da referida decisão os quais restaram acolhidos apenas para suspender a exigibilidade das custas em razão da concessão do benefício da gratuidade judiciária.

Alega, em síntese, que na ação executiva, nenhum bem em nome da empresa agravada fora localizado, razão pela qual requereu a desconsideração da personalidade jurídica. Alude que, por tratar-se de relação de consumo, o juiz poderá desconsiderar a personalidade jurídica da sociedade quando, em detrimento do consumidor houver abuso de direito, excesso de poder, infração da lei , fato ou ato ilícito. Invoca o teor do art. 28 do Código de Defesa do Consumidor. Salienta que já formulou pedido de reconhecimento de sucessão empresarial, levando aos autos todas as provas necessárias quanto à sucessão ocorrida, uma vez que a agravada está desenvolvendo suas atividades através de outra empresa. Destaca que o CDC, adotando a teoria menor, exige menos requisitos específicos para concessão da medida postulada. Colaciona precedentes jurisprudenciais. Requer o provimento do recurso a fim de que seja deferida a desconsideração da personalidade jurídica da empresa agravada.

Vieram os autos conclusos para julgamento.

Decido.

Recebo o Agravo de Instrumento, pois tempestivo.

Conquanto o art. 1.019, I, do CPC/15 faculte ao relator receber o agravo de instrumento no duplo efeito, entendo que, em cognição sumária, não se verifica a necessária relevância da fundamentação a ensejar a concessão de efeito suspensivo e/ou ativo.

Desse modo, não se encontrando presentes os requisitos elencados no art. 995, § único, do CPC/15, indefiro o efeito suspensivo e/ou ativo requerido enquanto se aguarda julgamento pelo Colegiado.

Intime-se a parte agravada para, querendo, oferecer contrarrazões, na forma do art. 1.019, II, do CPC/15.

Comunique-se ao juízo “a quo”.

Após, voltem conclusos.

Diligências legais."

Intimada, a parte agravada deixou de apresentar contrarrazões.

Vieram os autos conclusos para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Eminentes Colegas.

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.

Cinge-se a controvérsia acerca do (des)cumprimento das obrigações oriundas do "contrato de construção de imóvel - empreitada" firmado entre as partes.

A insurgência da parte recorrente diz respeito à improcedência do incidente de desconsideração da personalidade jurídica formulado com base no disposto no art. 28 do Código de Defesa do Consumidor.

Inicialmente, acerca da aplicabilidade do referido Diploma Legal ao caso, não há dúvida de que a relação entre a autora e a ré versa relação de consumo, visto que ambas se enquadram, respectivamente, nos artigos e do Código de Defesa do Consumidor.

Ademais, é flagrante que a autora encontra-se em situação de hipossuficiência técnica em relação à empresa construtora.

Presente a relação de consumo, portanto, mostra-se cabível a aplicação do Código de Defesa do Consumidor a situação posta entre as partes.

Assim já decidiu esta Corte:

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PRIVADO NÃO ESPECIFICADO. AÇÃO DE RESCISÃO DE CONTRATO DE EMPREITADA COM PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. INEXECUÇÃO DA OBRA. RESCISÃO DO CONTRATO COM RESTITUIÇÃO DOS VALORES PAGOS. DANOS MORAIS. SENTENÇA MANTIDA. I. AUSENTE PROVA DE QUE O CONTRATO DE EMPREITADA TENHA SIDO EFETIVAMENTE CONCLUÍDO E PRESTADO NA FORMA COMO PACTUADO, DEVE SER MANTIDA SENTENÇA QUE RESCINDIU O AJUSTE POR CULPA DA EMPREITEIRA, COM A CONSEQUENTE DEVOLUÇÃO DOS VALORES PAGOS PELO CONTRATANTE. II. O DANO MORAL INDENIZÁVEL PRESSUPÕE OCORRÊNCIA DE ATO ILÍCITO CAPAZ DE ATINGIR DIREITOS DA PERSONALIDADE DO PRETENSO PREJUDICADO. NO CASO, O DANO MORAL RESTOU COMPROVADO, UMA VEZ QUE O CASO ULTRAPASSA O MERO DISSABOR. O ATRASO CONSIDERÁVEL E INJUSTIFICADO, NÃO TENDO O FORNECEDOR CONCLUÍDO O CONTRATO EM MAIS DE TRÊS ANOS, CONFIGURA SITUAÇÃO EXCEPCIONAL QUE AUTORIZA A INDENIZAÇÃO PELOS DANOS MORAIS EXPERIMENTADOS. III. QUANTUM INDENIZATÓRIO DE ACORDO COM AS PECULIARIDADES DO CASO E EM CONSONÂNCIA AOS PARÂMETROS DA CÂMARA. À UNANIMIDADE, NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO.(Apelação Cível, Nº 50003603720188210104, Décima Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Liege Puricelli Pires, Julgado em: 25-11-2021)

AGRAVO DE INSTRUMENTO. RESPONSABILIDADE CIVIL. VÍCIO CONSTRUTIVO. CONTRATO DE EMPREITADA DE IMÓVEL RESIDENCIAL. DECISÃO QUE REJEITOU A IMPUGNAÇÃO AO BENEFÍCIO DA AJG. NÃO CONHECIMENTO. APLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR AO CASO. DECADÊNCIA E PRESCRIÇÃO AFASTADAS. 1) A decisão que rejeitou o incidente de impugnação ao benefício da AJG e manteve a benesse da gratuidade ao autor por não se encontrar dentre aquelas elencadas no rol taxativo do artigo 1.015 do CPC, razão pela qual o presente recurso não pode ser conhecido no ponto. Inaplicabilidade da tese da taxatividade mitigada, firmada pelo Superior Tribunal de Justiça (Tema 988). Precedentes. 2) A relação jurídica entabulada entre as partes é de relação de consumo vez que a autora figura como consumidora e os demandados como fornecedores de produtos e serviços na área da construção civil, conforme expressa previsão nos artigos 2º e 3º do Código de Defesa do Consumidor. 3) Tratando-se de pretensão indenizatória, não se aplica prazo decadencial, mas sim o prazo prescricional decenal previsto no artigo 205, do Código Civil, que não restou implementado no caso. AGRAVO DE INSTRUMENTO PARCIALMENTE CONHECIDO E NA PARTE CONHECIDA, DESPROVIDO. (Agravo de Instrumento, Nº 50821310520218217000, Décima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Thais Coutinho de Oliveira, Julgado em: 26-08-2021)

Dito isso, evidenciada a relação de consumo havida entre as partes, está regular, no caso, a responsabilização pessoal dos sócios mediante aplicação da chamada “Teoria Menor da Desconsideração da Personalidade Jurídica”, preconizada pelo artigo 28 do CDC, in verbis:

Art. 28. O juiz poderá desconsiderar a personalidade jurídica da sociedade quando, em detrimento do...

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