Acórdão nº 51966941220218217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quarta Câmara Cível, 31-01-2022

Data de Julgamento31 Janeiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualAgravo de Instrumento
Número do processo51966941220218217000
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001526602
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

4ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Agravo de Instrumento Nº 5196694-12.2021.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Ambiental

RELATOR: Desembargador ANTONIO VINICIUS AMARO DA SILVEIRA

AGRAVANTE: MARMARA S.A.

AGRAVADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

RELATÓRIO

Trata-se de agravo de instrumento interposto por MÁRMARA S.A, nos autos da ação civil pública aforada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL, em face da decisão (Evento 14, DESPADEC1) que concedeu, em parte, a medida liminar, exarada nos seguintes termos:

"Vistos.

Recebo a emenda à inicial.

Trata-se de ação civil pública, com pedido de liminar, ajuizada pelo Ministério Público em face de MÁRMARA S.A, GEORGE BERTHOLDO KLASER, MARCIA JANE FOLTZ BLUMM, FEPAM - FUNDAÇÃO ESTADUAL DE PROTEÇÃO AMBIENTAL e MUNICÍPIO DE NOVO HAMBURGO. Sustenta que instaurou inquérito civil para apurar a existência de dano ambiental e a operação irregular de atividades potencialmente poluidoras, à revelia de licença ambiental, no imóvel localizado na Rua Chapecó, nº 120 e nº 61, Bairro São José, em Novo Hamburgo. Afirma que recebeu denuncia da Secretária Municipal do Meio Ambiente, informando que, em fiscalização no local, foi constatado que empresas estariam exercendo atividades potencialmente poluidoras, sendo autuadas e interditadas pelo órgão ambiental. Afirma que há resíduos sólidos industriais que precisam ser descartados. Requer, em liminar, que os demandados removam todos os resíduos depositados de forma irregular nos endereços indicados (Rua Chapecó, n.° 120 e Rua Chapecó, n.º 61, ambos no Bairro São José, em Novo Hamburgo, matrículas de nº 1930 e 1933 do CRI de NH), e que apresentem plano de ação e projeto de recuperação das áreas degradadas pela irregular deposição de resíduos, sob pena de multa diária, postula, ainda, que os demandados adotem medidas práticas e administrativas destinadas a impedir que, nos locais em questão, operem ou se estabeleçam empresas ou empreendimentos potencialmente poluidores sem que estejam respaldados nas licenças, autorizações e alvarás de rigor aplicáveis à espécie, bem como seja determinado ao Registro de Imóveis de Novo Hamburgo que averbe, junto às matrículas dos imóveis antes especificados, a existência da presente ação, de sorte a prevenir eventuais interesses de terceiros que possam intencionar adquiri-los.

É o breve relatório.

Decido.

Nos termos do art. 300 do Novo Código de Processo Civil, a tutela de urgência será concedida “quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo”.

Conforme se denota do Inquérito Civil os imóveis em questão estão sendo investigados desde o ano de 2015.

No relatório de constatação de ocorrência ambiental elaborado pela Brigada Militar em 22/06/2016, foi constatado o depósito de resíduos de couro sem possuir licença ambiental na área localizada na Rua Chapecó, 120, nesta Cidade - fls. 266/268 - ANEXO2, Ev. 01.

Em 04/01/2017 a Secretaria Municipal do Meio Ambiente do Município de NH fiscalizou o local e constatou que não havia mais atividade industrial, mesmo havendo passivos ambientais - fls. 280/284 - ANEXO2, Ev. 01.

Em 15/04/2021 a FEPAM compareceu no local e observou que se encontrava abandonado e que havia resíduos de couro, tonéis com resíduos diversos, transformador, máquinas abandonas, sucatas metálicas e resíduos de construção civil dispostos em local coberto, sem contenção, sobre piso de concreto, em condições razoáveis e que resíduos estão inadequadamente dispostos, havendo resíduos perigosos misturados com resíduos de construção civil, tendo concluído o seguinte (fls. 14/24):

Com base nas informações acima, concluímos que existe um passivo ambiental na área do antigo Curtume Sander S/A, composto por resíduos de couro dispostos irregularmente, misturado a resíduos diversos, tais como sucatas metálicas, máquinas e equipamentos abandonados, tonéis com produtos químicos diversos não identificados, resíduos de construção civil, entre outros. Em algumas porções estes resíduos estão dispostos sobre piso de concreto, em condições razoáveis, com cobertura em condições precárias e sem a devida contenção, e em outras partes estão dispostos a céu aberto, sem a menor garantia de impedir a contaminação do solo ou da água subterrânea, por lixiviação. Provavelmente estes resíduos se encontram ali depositados há vários anos, tendo em vista a vegetação que já se encontra entre e por sobre eles. Quanto ao tanque, não se tinha evidência de ali ser efluente ou somente água da chuva.

O gerenciamento ambiental da área deve incluir:

1. a remoção de todos os resíduos ali presentes e do solo contaminado agregado, e a correta destinação considerando sua classificação conforme disposto na ABNT NBR 10004:2004;

2. análise da qualidade da água no tanque de acúmulo, com posterior esgotamento e correta destinação, conforme os resultados analíticos;

3. realização de investigação ambiental em solo e água subterrânea para caracterização da existência de contaminação devido à disposição irregular dos resíduos perigosos.

Nesse passo, há verossimilhança nas alegações postas na petição inicial, porquanto a prova documental que a instrui demonstra a existência de resíduos sólidos industriais que necessitam ter destinação apropriada.

Com efeito a Resolução nº 313/2002 do CONAMA, no seu artigo 1º deixa claro que cabe ao gerador dar a destinação correta aos resíduos sólidos, mediante apresentação de inventário de resíduos industriais. Veja-se

Art. 1o Os resíduos existentes ou gerados pelas atividades industriais serão objeto de controle específico, como parte integrante do processo de licenciamento ambiental.

Por sua vez, a Lei Federal nº 6938/81 que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, no seu artigo 3º, inciso IV, considera como poluidor a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável direta ou indiretamente , por atividade causadora de degradação ambiental, in verbis:

Art 3º - Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por:

(...)

IV - poluidor, a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável, direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental;

Este mesmo diploma legal, no artigo 4º, inciso VII, estabelece que a Política Nacional do Meio Ambiente visará à imposição, ao poluidor e ao predador, da obrigação de recuperar e (ou) indenizar os danos causados, e ao usuário, de contribuição pela utilização de recursos ambientais com fins econômicos:

Art 4º - A Política Nacional do Meio Ambiente visará:

(...)

VII - à imposição, ao poluidor e ao predador, da obrigação de recuperar e/ou indenizar os danos causados e, ao usuário, da contribuição pela utilização de recursos ambientais com fins econômicos.

A Constituição da República, em seu art. 225, impôs tanto ao Poder Público quanto à própria coletividade o dever de defender e preservar o meio ambiente para as presentes e futuras gerações, estabelecendo, ainda, normas obrigatórias de atuação da Administração Pública e dos particulares, uma vez que as condutas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores – sejam eles pessoas físicas ou jurídicas – às sanções penais e administrativas, independentemente de reparação do dano ocasionado:

Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

(...)

§ 3º - As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão aos infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.

Vê-se, portanto, que, na espécie, incide a força normativa do princípio do poluidor-pagador, cuja norma estabelece que o causador do dano ambiental é o responsável pela sua reparação.

Além disso, a responsabilidade pelo dano é objetiva e solidária, o que afeta a todos os agentes que obtiveram proveito da atividade de que resultou a lesão ambiental, sendo pacífica a compreensão, ainda, de que a responsabilidade civil pela reparação dos danos ambientais adere à propriedade, como obrigação propter rem.

No caso, o proprietário dos imóveis é a demandada MARMARA S.A., tendo como sócios GEORGE BERTHOLDO KLASER e MARCIA JANE FOLTZ BLUMM.

Assim, demonstrado que há resíduos sólidos poluidores no imóvel de propriedade da empresa demandada, necessário que sejam retirados e descartados de forma correta pelo proprietário registral.

Quanto à responsabilidade dos sócios, o artigo 4º da Lei nº 9.605/98 permite desconsiderar a pessoa jurídica sempre que sua personalidade for obstáculo ao ressarcimento de prejuízos ambientais.

No caso, inexiste qualquer indício de que a empresa esteja dilapidando seu patrimônio, ou buscando, de alguma outra forma, frustrar a reparação pecuniária buscada pelo Ministério Público e, portanto, necessário verificar a responsabilidade dos sócios do decorrer da demanda.

Nesse passo, neste momento, entendo que apenas a empresa, em razão de ser proprietária do imóvel, deve ser responsável pelo descarte dos resíduos.

Além disso, não evidencio omissão dos entes públicos, uma vez que realizaram vistorias no local, emitindo inclusive multas, por se tratar de área particular.

Dessa forma, os demandados FEPAM e MUNICÍPIO DE NOVO HAMBURGO são responsáveis pelos danos ambientais apenas subsidiariamente.

Por fim, desnecessária a análise do pedido 4.4, uma vez que no local não possui mais empresa em atividade.

Isso posto, DEFIRO, EM PARTE, a liminar pleiteada, para o fim de determinar que os demandados, de forma solidária,...

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