Acórdão nº 51997765120218217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Oitava Câmara Criminal, 23-02-2022

Data de Julgamento23 Fevereiro 2022
ÓrgãoOitava Câmara Criminal
Classe processualAgravo de Execução Penal
Número do processo51997765120218217000
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001562910
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

8ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Agravo de Execução Penal Nº 5199776-51.2021.8.21.7000/RS

PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 0078774-26.2016.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: Roubo majorado (art. 157, § 2º)

RELATORA: Desembargadora FABIANNE BRETON BAISCH

AGRAVANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

AGRAVADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

DIEGO NUNES BATISTA, por Defensor Público, interpôs o presente AGRAVO EM EXECUÇÃO por inconformar-se com decisão proferida pelo MM. Juiz de Direito da 2ª VEC de Porto Alegre/RS, que deferiu a progressão ao regime aberto, mas manteve a prisão domiciliar, sob monitoramento eletrônico (evento 3 - fl. 7).

Sustentou o agravante, em síntese, que estava cumprindo pena em regime semiaberto, em prisão domiciliar mediante monitoramento eletrônico, quando progrediu ao regime aberto, sendo mantido nas mesmas condições do regime anterior. Deferida a progressão de regime, deve ser alterado o tratamento dado ao recluso o que não se concretizou, porquanto mantida a sua prisão domiciliar sob monitoramento eletrônico, o que contraria a progressividade inerente ao cumprimento de pena, subvertendo-se o sistema de individualização penal, bem como prejudicando o agravante em relação a outros benefícios penais. Requereu o provimento do recurso para que seja permitido ao preso permanecer em regime domiciliar sem o uso de tornozeleira eletrônica (evento 3 - fls. 9/13).

O Ministério Público contra-arrazoou o recurso, pugnando pelo improvimento do recurso defensivo (evento 3 - fls. 15/20).

O decisum foi mantido pelo magistrado singular (evento 3 - fl. 21), subindo os autos a esta Corte.

O ilustre Procurador de Justiça, Dr. Glênio Amaro Biffignandi, manifestou-se pelo improvimento do agravo (evento 10).

Vieram os autos conclusos.

É o relatório.

VOTO

O apenado restou condenado à pena total de 15 anos, 10 meses e 11 dias de reclusão, e multa, tendo iniciado o cumprimento da reprimenda em 05.08.2015, segundo dados constantes do relatório da situação processual executória atualizado, disponível no Sistema SEEU.

Em 04.06.2021, foi deferida ao apenado a progressão de regime ao aberto, mantido o benefício da inclusão no sistema de monitoramento eletrônico, nas condições da prisão domiciliar, que fora concedido, quando em regime semiaberto (evento 3 - fls. 3/5), a defesa não se conformando com a preservação do monitoramento eletrônico.

Depreende-se da decisão atacada que a medida adotada, de concessão da prisão domiciliar, com inclusão no sistema de monitoramento eletrônico, tem como finalidade a liberação de vagas nos estabelecimentos carcerários e, especialmente no caso do regime aberto, evitar a permanência desses apenados com os submetidos ao regime semiaberto, dada a inexistência de albergues na região jurisdicionada.

Pois bem.

Dispõe o art. 117 da LEP que “somente se admitirá o recolhimento do beneficiário de regime aberto em residência particular quando se tratar de: I – condenado maior de setenta anos; II – condenado acometido de doença grave; III – condenada com filho menor ou deficiente físico ou mental; IV – condenada gestante.”

E quanto ao monitoramento eletrônico, a redação do art. 146-B da Lei de Execução Penal, acrescentado pela Lei nº 12.258/2010, prevê que “o juiz poderá definir a fiscalização por meio da monitoração eletrônica quando: I – (vetado); II – autorizar a saída temporária no regime semiaberto; III (vetado); IV – determinar a prisão domiciliar; V – (vetado).”

O sentenciado - indivíduo de 28 anos de idade - não se enquadra nas hipóteses legais que autorizam o cumprimento da reprimenda em prisão domiciliar, com ou sem monitoramento eletrônico, é verdade.

Ocorre que diante do abandono do sistema carcerário pelo Estado e as precárias condições das casas prisionais, absolutamente insalubres e superlotadas, subjugando os reclusos a uma condição indigna e deplorável, transformando a execução da pena, não raro, em uma execução cruel, os magistrados passaram a ver no cumprimento domiciliar a solução para tais percalços.

Inicialmente tímida, a medida, com o passar do tempo e agravamento do caos no sistema carcerário, tornou-se de ampla adoção pelos juízes de Primeiro Grau, chegando-se ao ponto de conceder-se a prisão domiciliar a indivíduos de altíssima periculosidade, condenados por crimes graves como latrocínio, estupro e tráfico de drogas, entre outros, muitas vezes sem que tivessem experimentado um único dia de prisão.

Diante da crueldade do cenário e porque o tratamento dado aos presos, sem dúvida alguma, feria indelevelmente o princípio da dignidade da pessoa humana, a concessão da prisão domiciliar foi corroborada pelo E. STJ, mas apenas quando ausente local compatível com as normas legais para o cumprimento da pena ou, quando existente, por tal ausência de vagas.

Contudo, impossível negar que, se, de um lado, estava-se paliativamente resolvendo o problema da superlotação dos presídios, de outro, a sensação de impunidade, aliada a outros fatores de ordem social, levou a índices alarmantes do aumento da criminalidade, como vem amplamente sendo noticiado nos meios de comunicação, sendo de conhecimento de todos.

Debatiam-se a defesa, na busca da preservação dos direitos daqueles que sofreram condenação criminal e que, como tal, passaram à tutela do Estado, e o Ministério Público, este último na pretensão da efetiva execução da pena imposta e salvaguarda da sociedade ordeira.

Inúmeros, aliás, os recursos que passaram a aportar nesta Corte discutindo a questão, sendo que sempre me posicionei pela taxatividade do art. 117 da LEP, negando prisão domiciliar fora daquelas hipóteses legais.

Todavia, curvando-me ao entendimento cristalizado na Súmula Vinculante nº 56 do E. STF, tive de rever minha posição sobre o tema, passando a admitir a prisão domiciliar em determinados casos que não aqueles proclamados no art. 117 da LEP, sempre tendo em vista o ambiente caótico que vivencia o Estado do Rio Grande do Sul no campo da segurança pública, nacionalmente reconhecido.

É que a questão foi levada ao âmbito do E. STF que, através do julgamento do Recurso Extraordinário nº 641.420/RS, confirmando a prisão domiciliar como instrumento de política criminal, disciplinou, contudo, sua utilização, que, até aqui, não possuía critérios bem definidos, dado que, diante da finalidade a que passou a servir – correção da omissão Estatal na manutenção das casas prisionais -, não mais se enquadrava nas situações restritivas do art. 117 da LEP, refugindo, em muito, da ideia inicial do legislador de beneficiar somente os presos com idade avançada, acometidos de doença grave ou gestantes e presas com filhos menores ou deficientes físicos ou mentais.

Sedimentando seu entendimento, o Pretório Excelso publicou a Súmula vinculante nº 56, dispondo que A falta de estabelecimento penal adequado não autoriza a manutenção do condenado em regime prisional mais gravoso, devendo-se observar, nessa hipótese, os parâmetros fixados no RE 641.320/RS”.

De modo que não é mais possível a manutenção de presos em regime mais gravoso, por conta da ausência de estabelecimento penal adequado.

Em casos tais, deverão ser tomadas medidas saneadoras da situação, as quais se encontram elencadas no recurso paradigma, citado na súmula vinculante nº 56, medidas estas direcionadas, essencialmente, ao realocamento de presos.

Dos parâmetros constantes no Recurso Extraordinário em questão visualizam-se duas situações bem específicas: a própria ausência de estabelecimento penal adequado e o déficit de vagas na unidade prisional adequada.

A respeito da primeira situação, dispõe o Código Penal o seguinte:

Art. 33 (...)

§ 1º - Considera-se:

b) regime semiaberto a execução da pena em colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar;

c) regime aberto a execução da pena em casa de albergado ou estabelecimento adequado” - grifei.

Não há, na lei, qualquer indicativo do que seja estabelecimento similar ou estabelecimento adequado.

Diante disso, o E. STF delegou aos magistrados a avaliação do enquadramento ou não dos locais de cumprimento de pena ao que seja estabelecimento similar e estabelecimento adequado, dispondo que Os juízes da execução penal podem avaliar os estabelecimentos destinados aos regimes semiaberto e aberto, para qualificação como adequados a tais regimes. São aceitáveis estabelecimentos que não se qualifiquem como ‘colônia agrícola, industrial’ (regime semiaberto) ou ‘casa de albergado ou estabelecimento adequado’ (regime aberto) (art. 33, § 1º, ‘b’ e ‘c’ do CP). No entanto, não deverá haver alojamento conjunto de presos dos regimes semiaberto e aberto com os presos do regime fechado” (STF. Plenário. RE 64130/RS, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 11/05/2016).

Desse modo, os presos dos regimes semiaberto e aberto podem cumprir a pena em estabelecimentos diversos da colônia agrícola ou industrial e casa de albergado, desde que se tratem de locais que possam atender às regras desses regimes, vedada, unicamente, a convivência com os presos do regime fechado, porquanto, cediço, destinado aos reclusos de maior periculosidade.

A segunda hipótese diz com casos nos quais a colônia agrícola ou industrial ou estabelecimento adequado e a Casa de Albergado ou estabelecimento similar existem, mas há...

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