Acórdão nº 52003357120228217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Oitava Câmara Criminal, 14-12-2022

Data de Julgamento14 Dezembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualCorreição Parcial
Número do processo52003357120228217000
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoOitava Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003092573
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

8ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Correição Parcial Nº 5200335-71.2022.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Furto (art. 155)

RELATORA: Desembargadora FABIANNE BRETON BAISCH

CORRIGENTE: MÁRCIO RODRIGO PORTES DA SILVA

CORRIGIDO: Juízo da 2ª Vara Judicial da Comarca de Panambi

RELATÓRIO

MÁRCIO RODRIGO PORTES DA SILVA, por Defensora Pública, ingressou com a presente CORREIÇÃO PARCIAL em face de decisão proferida pela MMª. Juíza de Direito da 2ª Vara Judicial da Comarca de Panambi/RS, que indeferiu pedido de apresentação extemporânea de rol de testemunhas (evento 26 da ação penal originária).

Sustentou, em síntese, que a decisão corrigenda importou em ofensa aos princípios do devido processo legal, contraditório e ampla defesa, violando o art. 5º, inciso LV da CF/88, as peculiaridades concretas justificando a apresentação extemporânea do rol de testemunhas. Discorreu sobre as dificuldades rotineiras enfrentadas pela Defensoria Pública no atendimento a seus assistidos, alegando ausência do contato em tempo hábil com a parte ré. Requereu a concessão de liminar, ao efeito de cassar a decisão atacada, a fim, de que seja viabilizada a apresentação de rol de testemunhas de defesa a destempo (evento 1 - INIC1).

A liminar foi indeferida (evento 4).

A decisora singular prestou as informações pertinentes (evento 7).

Manifestou-se, a ilustre Procuradora de Justiça, Drª. Maria Cristina Cardoso Moreira de Oliveira, pelo não acolhimento da correição (evento 12).

Vieram conclusos.

É o relatório.

VOTO

Prima facie, cumpre anotar que, inexistindo, no ordenamento jurídico pátrio, previsão de recurso contra o pronunciamento judicial em tela, e, verificando-se que, do ato impugnado, em tese, poderia gerar tumulto processual, revela-se plenamente viável o manejo da medida prevista no art. 195 do COJE, razão pela qual conheço da presente correição.

Por ocasião da análise do pleito liminar, assim me manifestei, fundamentos que integro ao presente, como razões de decidir:

"(...)

A Defensoria Pública do Estado do Rio Grande do Sul ingressou com a presente CORREIÇÃO PARCIAL, com base no art. 195 do COJE, em face de decisão da MMª. Juíza de Direito da 2ª Vara Judicial da Comarca de Panambi/RS, que, nos autos da ação penal nº 50026379020208210060/RS, indeferiu pedido formulado em favor do réu MÁRCIO RODRIGO PONTES DA SILVA, de apresentação extemporânea de rol de testemunhas, com base no art. 396-A do CPP.

Sustentou, em síntese, que a decisão corrigenda importou em ofensa aos princípios do devido processo legal, contraditório e ampla defesa e ao art. 5º, inciso LV da CF/88. No caso, a defesa, na resposta à acusação, efetuou pedido expresso de apresentação extemporânea de rol de testemunhas, devido à dificuldade de contato com o réu, e não por desídia, sendo notórias as dificuldades enfrentadas pela Defensoria Pública em atuar nos processos criminais. Requereu, liminarmente, a emenda do error in procedendo apontado, para que seja determinado ao juízo a quo que permita a juntada do rol de testemunhas em momento posterior à resposta à acusação, confirmando-se-á ao final (evento 1 - INIC1).

Vieram conclusos.

É o breve relatório.

Decido.

Analisando os autos originários, verifico que, na ação penal originária, o Ministério Público ofereceu denúncia contra o corrigente Márcio Rodrigo Pontes da Silva, dando-o como incursos nas sanções do art. 155, §4º, I do CP, por delito ocorrido em 16.04.2018.

A denúncia foi recebida em 29.07.2020 (autos originários: evento 3 - PROCJUDIC2 - fl. 48), determinando-se a citação do denunciado.

O corrigente foi citado em 06.07.2022 e apresentou resposta à acusação por intermédio da Defensoria Pública em 19.09.2022, ocasião em que a defesa requereu a apresentação do rol de testemunhas após o contato direto com o réu (autos originários: evento 24).

O pleito defensivo restou indeferido, a decisão atacada assim dispondo, no que pertine (autos originários - evento 26):

“(...)

1.1 Em relação ao pedido da Defensoria Pública, para apresentação de rol extemporâneo, tenho que não colhe razão pelos fundamentos invocados.

Compulsando-se os autos, não há qualquer comprovação de prévia tentativa de contato (infrutífera) com o acusado que, por sinal, tem endereço certo declarado no feito. A tanto, por exemplo, bastava que comprovasse o envio de correspondência ou tentativa de contato telefônico com a parte. Ainda, sabe-se que a Defensoria Pública possui acesso ao sistema Consultas Integradas, de modo que poderia buscar, assim, uma rápida forma de contato com o seu assistido - consoante afere-se da OS nº 02/2019 do Defensor Público-Geral do RS. Todavia, assim não procedeu e, tampouco, comprovou diligência nos autos.

Nesse sentido, o STJ afirmou que não há nulidade na recusa do juiz. Em respeito à ordem dos atos processuais, fulcro no art. 396-A do CPP, não configura cerceamento de defesa o indeferimento da apresentação extemporânea do rol de testemunhas:

Inexiste nulidade na desconsideração do rol de testemunhas quando apresentado fora da fase estabelecida no art. 396-A do Código de Processo Penal STJ. 5ª Turma.AgRg no RHC 161.330-RS, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 05/04/2022 (Info 738).

Em relação a eventuais réus presos, também há fácil acesso a esses pela Defensoria Pública, sendo caso de se registrar o que prevê a Lei Complementar nº 80/94:

Art. 108. Aos membros da Defensoria Pública do Estado incumbe, sem prejuízo de outras atribuições estabelecidas pelas Constituições Federal e Estadual, pela Lei Orgânica e por demais diplomas legais, a orientação jurídica e a defesa dos seus assistidos, no âmbito judicial, extrajudicial e administrativo. (Redação dada pela Lei Complementar nº 132, de 2009).

Parágrafo único. São, ainda, atribuições dos Defensores Públicos Estaduais: [...]

IV – atuar nos estabelecimentos prisionais, policiais, de internação e naqueles reservados a adolescentes, visando ao atendimento jurídico permanente dos presos provisórios, sentenciados, internados e adolescentes, competindo à administração estadual reservar instalações seguras e adequadas aos seus trabalhos, franquear acesso a todas as dependências do estabelecimento independentemente de prévio agendamento, fornecer apoio administrativo, prestar todas as informações solicitadas e assegurar o acesso à documentação dos assistidos, aos quais não poderá, sob fundamento algum, negar o direito de entrevista com os membros da Defensoria Pública do Estado.

Assim sendo indefiro o pedido de apresentação extemporânea do rol de testemunhas defensivas.

(...)".

Pois bem.

Nos termos do art. 396-A do CPP, na resposta, o acusado poderá arguir preliminares e alegar tudo o que interesse à sua defesa, oferecer documentos e justificações, especificar as provas pretendidas e arrolar testemunhas, qualificando-as e requerendo sua intimação, quando necessário.

De modo que, o momento processual adequado para a apresentação do rol de testemunhas, pela defesa, é o da resposta à acusação, sob pena de preclusão.

Ilustrando, o seguinte julgado, oriundo do E. STJ:

PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL. HABEAS CORPUS. FURTO QUALIFICADO. OITIVA DE TESTEMUNHA. PEDIDO EXTEMPORÂNEO. PRECLUSÃO. NULIDADE. INVIABILIDADE DE ANÁLISE NOS LIMITES DO WRIT. REVOLVIMENTO DA MATÉRIA. RECURSO DESPROVIDO.
1. Na linha dos precedentes desta Corte, "o direito à prova não é absoluto, limitando-se por regras de natureza endoprocessual e extraprocessual. Assim é que, na proposição de prova oral, prevê o Código de Processo Penal que o rol de testemunhas deve ser apresentado, sob pena de preclusão, na própria denúncia, para o Ministério Público, e na resposta à acusação, para a defesa. No caso vertente, não há ilegalidade na desconsideração do rol de testemunhas da defesa, apresentado fora do prazo legalmente estabelecido, ante a preclusão temporal desta faculdade processual" (HC n. 202.928/PR, relator Min. SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, relator p/ acórdão Min. ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, DJe 8/9/2014).
2. Na hipótese, além do fato de se tratar de pedido serôdio, o testigo a ser ouvido seria, segundo o próprio réu UMILSON, "meio-irmão de sua mulher, não possuindo assim o afastamento necessário para conferir credibilidade às suas declarações".
3. Quanto à nulidade referente à ilicitude da busca e apreensão, bem como à tese absolutória, porquanto a confissão teria sido extraída a partir de tortura, é cediço que o acatamento das referidas teses implica o necessário revolvimento do acervo fático-probatório disposto nos autos, providência vedada na angusta via do remédio constitucional, marcado pela celeridade e pela sumariedade na cognição.
4. Agravo regimental a que se nega provimento.
(AgRg no HC 270.814/DF, Rel.
Ministro ANTONIO SALDANHA PALHEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 13/12/2018, DJe 04/02/2019)

Portanto, primeiramente, mostra-se descabida a apresentação do rol de testemunha quando ultrapassado o prazo à que alude o art. 396-A, sem que isso implique cerceamento de defesa.

Entendimento diverso, admitindo-se a inobservância de prazo legal, implicaria afronta a outro princípio constitucional, vigente de forma soberana no âmbito do Direito Penal: o da legalidade, consagrado no art. 5º, XXXIX da CF/88 e no art. 1º do CP.

É certo que eventual situação excepcional pode vir a justificar a relativização da regra do art. 396-A do CPP, de modo a garantir que a oferta do rol de testemunhas, inviabilizada por alguma peculiaridade concreta, venha a se perfectibilizar no curso do processo.

Mas, a meu juízo, não é essa a situação dos autos.

Sequer há menção na resposta à acusação apresentada, de que a Defensoria Pública não tenha conseguido contatar o assistido antes da apresentação da peça defensiva, não havendo...

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