Acórdão nº 52028692220218217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quarto Grupo de Câmaras Criminais, 29-04-2022

Data de Julgamento29 Abril 2022
ÓrgãoQuarto Grupo de Câmaras Criminais
Classe processualEmbargos Infringentes e de Nulidade
Número do processo52028692220218217000
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001978717
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

4º Grupo Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Embargos Infringentes e de Nulidade Nº 5202869-22.2021.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Roubo majorado (art. 157, § 2º)

RELATOR: Juiz de Direito ALEXANDRE KREUTZ

EMBARGANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

EMBARGADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

Trata-se de embargos infringentes opostos por FERNANDO KAYSER, por intermédio da Defensoria Pública, em face do acórdão prolatado pela Sétima Câmara Criminal, que, por maioria, vencido o Desembargador Carlos Alberto Etcheverry, deu provimento ao recurso ministerial para desconstituir a decisão no ponto em que que concedeu o benefício do livramento condicional ao apenado, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado (evento 14, ACOR3).

Em suas razões, o embargante requereu a prevalência do voto mais benéfico, com a manutenção do livramento condicional (evento 21, EMBINFRI1).

O Ministério Público opinou pela rejeição dos embargos infringentes (evento 32, PARECER1).

É o relatório.

VOTO

Prezados Colegas.

O recurso atende aos pressupostos de admissibilidade, razão pela qual dele conheço.

A matéria trazida à apreciação deste Grupo diz respeito à divergência dos julgadores quanto à possibilidade de manutenção do livramento condicional concedido pelo Juízo de origem.

Passo a analisar as questões trazidas por sua interposição.

O Desembargador Carlos Alberto Etcheverry proferiu o voto vencido nestes termos (evento 14, VOTODIVERG1):

Rogando vênia ao eminente relator, divirjo do seu voto para manter a decisão recorrida.

Registro, inicialmente, que não há qualquer impedimento a que o apenado que cumpre pena no regime semiaberto venha a ser beneficiado com o livramento condicional, desde que cumpridos os requisitos legais.

O sistema progressivo da execução penal não se confunde com o livramento, que a ele não está correlacionado. Basta verificar que o apenado que, eventualmente, possua inúmeras faltas, alterações de data-base etc. ainda assim jamais perderá o direito ao livramento, cuja concessão está vinculada, exclusivamente, ao cumprimento de determinada parcela do total da pena e ao requisito subjetivo presente na oportunidade da análise do pleito.

Feita esta explanação, ressalto que o art. 83, incisos e parágrafo único, do CP, prevê os requisitos exigidos à concessão do livramento condicional, que ora reproduzo:

(...)

Pois bem.

Não há controvérsia sobre o implemento do requisito objetivo.

No tocante ao requisito subjetivo, o referido dispositivo legal prevê, entre outras coisas, a comprovação de bom comportamento durante a execução da pena (art. 83, III, “a”, do CP).

Em sua antiga redação, o art. 112 da LEP disciplinava não só a progressão de regime, mas também o livramento condicional (antiga redação do art. 112, § 2º, da LEP), o que foi alterado pela lei popularmente conhecida como Pacote Anticrime (Lei nº 13.964/19).

Com isso, deparamo-nos com um critério muito amplo acerca do que significa possuir um “bom comportamento carcerário durante a execução da pena”. Isso significa que o apenado pode ter tido uma falta grave reconhecida durante o cumprimento da pena? Duas? Três?

Diante disso, por analogia, adoto o critério estabelecido no art. 112 da LEP no sentido de que o bom comportamento carcerário é comprovado a partir de documento emitido pelo diretor do estabelecimento prisional (§ 1º).

E, no caso dos autos, o apenado ostenta bom comportamento carcerário, conforme seq. 179.1 do SEEU.

A Lei nº 13.964/19 também trouxe mudanças significativas quanto ao critério razoável de consideração de faltas graves pretéritas (art. 83, III, “b”, do CP).

Tenho referido nos meus votos que o cometimento de faltas graves já apreciadas e devidamente punidas não podem constituir óbice, por espaço de tempo indefinido, à concessão dos benefícios da progressão de regime e do livramento condicional.

O referido dispositivo legal veio consolidar este entendimento, na medida em que possibilita a concessão do livramento condicional a apenados que não tenham cometido falta grave nos últimos 12 meses. Ou seja, faltas pretéritas não podem servir indefinidamente como óbice para a concessão de benefícios.

No caso em tela, em consulta ao relatório da situação processual executória, a última falta grave reconhecida ocorreu em 08/06/2020 e consistiu em fuga, com recaptura em 10/06/2020, ou seja, há mais de um ano, tendo sido devidamente apuradas, com aplicação dos consectários legais.

Não se vê, portanto, absolutamente nenhum argumento para negar o livramento condicional ao apenado, até porque não há nada nos autos a indicar que o apenado não tenha bom desempenho no trabalho que lhe foi atribuído (art. 83, III, “c”, do CP), não é apto a prover a própria subsistência mediante trabalho honesto (art. 83, III, “d”, do CP), não tenha reparado o dano, salvo a impossibilidade de fazê-lo (art. 83, IV, do CP), ou, ainda, que as condições pessoais do liberado façam presumir que ele voltará a delinquir.

Isso posto, voto por negar provimento ao agravo.

O Desembargador Jose Conrado Kurtz de Souza, que era o Relator, proferiu o voto vencedor nestes termos (evento 14, RELVOTO2):

Trata-se de agravo em execução penal interposto pelo Ministério Público contra decisão do Juizado da Vara de Execução Criminal Regional de Santa Cruz do Sul que deferiu ao apenado FERNANDO KAYSER (PEC nº 0037094-41.2015.8.21.0019) o livramento condicional (ev. 3 - AGRAVO1, p. 195-197 e seq. 187 do SEEU).

Fernando Kayser foi condenado à pena total de 12 (doze) anos e 06 (seis) meses de reclusão pela prática de crimes de roubo e de receptação, tendo iniciado o cumprimento da pena em 16/02/2016, em regime semiaberto. Atualmente o apenado possui saldo de pena em torno de 05 (cinco) anos e 07 (sete) meses a cumprir.

O reeducando cumpria pena em regime fechado, quando em 01/09/2021 lhe foi concedida a progressão para o regime semiaberto, bem como o benefício do livramento condicional, in verbis:

"Vistos.

Cuida-se da análise do deferimento ao apenado no benefício do livramento condicional.

Parecer ministerial contrário ao benefício em razão do apenado encontrar-se em cumprimento da pena no regime fechado.

Decido:

Inicialmente, cumpre salientar que não há qualquer disposição legal que exija do apenado estar em determinado regime para que possa ser agraciado com a benesse do livramento condicional, desde que preenchidos os requisitos objetivos e subjetivos. O fato de se encontrar em regime fechado não configura óbice para seu deferimento.

Nesse sentido:

(...)

No presente caso, o apenado já implementou o lapso temporal necessário à concessão do livramento condicional, possui conduta carcerária classificada como plenamente satisfatória .

Ainda, depreende-se da GEC que o apenado implementa, também o lapso temporal para a progressão de regime.

Nesse sentido, tenho que o apenado, além dos requisitos legais objetivos, também satisfaz os subjetivos, motivo pelo qual defiro-lhe a progressão de regime do fechado para o semiaberto, bem como o benefício do livramento condicional, mediante o compromisso de cumprimento das seguintes condições:

a) dedicar-se, no prazo de trinta (30) dias, ao exercício de atividade laboral lícita ou, em igual prazo, comprovar a impossibilidade de fazê-lo;

b) não mudar de endereço sem prévia comunicação a este Juízo, bem como obter a autorização deste, em caso de transferência para outra Comarca;

c) recolher-se à sua residência até às 22h, desde que não esteja prestando serviço ou frequentando curso, hipóteses em que deverá comprovar tais situações;

d) não se embriagar;

e) apresentar-se junto a VEC da Comarca onde reside, munido da presente decisão e documentação de identificação, a partir do 10º dia útil de sua liberação, a fim de informar endereço atualizado e outros dados necessários ao cumprimento do benefício, sob pena de revogação imediata do benefício ora deferido.

f) apresentar-se, trimestralmente, junto ao Juízo da VEC de sua residência, comunicando suas ocupações;

Fica, por ora, suspenso o cumprimento das alíneas “e” e “f” enquanto persistir o fechamento dos Fóruns ao público, determinado em razão da pandemia.

A presente decisão valerá como guia de livramento condicional, com cópia ao NPI-SUSEPE (Núcleo de Pesquisa do Interior), que deverá ser imediatamente cumprida, inexistindo óbice, sendo que, caso existente, deverá a administração prisional comunicá-la a este Juízo em 24 horas.

Deverá, ainda, a SUSEPE, no ato da liberação do apenado colher endereço atualizado e telefone do apenado, inclusive para contato, comunicando o Juízo da VEC Regional, no prazo de 24 horas, via e-mail, devendo orientar o apenado quanto a necessidade do fiel cumprimento das condições acima impostas especialmente quanto a alínea “e”. Sendo informado endereço diverso da Comarca de Santa Cruz do Sul, desde já defiro a imediata remessa do PEC à Comarca de destino.

Retifique-se a guia de recolhimento.

Intime-se o apenado, ainda, para no prazo de dez (10) dias satisfazer a multa e custas processuais, caso incidentes, sob as penas legais.

Comunique-se.

A presente decisão dispensa expedição de ofício à casa prisional, valendo como tal, devendo a segunda via entregue àquela casa ser arquivada junto ao prontuário do apenado nesta casa prisional, já contendo a assinatura do apenado com a data em que colhida a sua cientificação.

Outrossim, certifique-se periodicamente a respeito do trânsito em julgado da condenação do processo-crime nº 019/2.14.0006273-4, conforme determinado no item ''I'' da decisão da seq. 125.1.

Dil. Int."

Insurge-se o Parquet contra essa decisão alegando que a concessão do livramento condicional, no caso, vai contra o sistema progressivo de...

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