Acórdão nº 52068713520218217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Segunda Câmara Cível, 23-02-2022

Data de Julgamento23 Fevereiro 2022
ÓrgãoSegunda Câmara Cível
Classe processualAgravo de Instrumento
Número do processo52068713520218217000
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001572082
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

2ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Agravo de Instrumento Nº 5206871-35.2021.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Indenização por dano material

RELATOR: Desembargador JOAO BARCELOS DE SOUZA JUNIOR

AGRAVANTE: CARLOS F. DA SILVA

AGRAVADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

RELATÓRIO

Trata-se de agravo de instrumento, apresentado por CARLOS F. DA SILVA, contra decisão que, em ação civil pública por dano ambiental interposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO, deferiu em parte a antecipação de tutela no sentido de determinar a imediata interdição/cessação das atividades desenvolvidas pela empresa CARLOS F. DA SILVA – ME, com nome fantasia RUSTIKALE, nos seguintes termos (evento 03):

Trata-se de Ação Civil Pública ajuizada pelo Ministério Público em face de TRANSCAI COMERCIO DE MADEIRAS LTDA. - EPP., MARIO ANTÔNIO DE MELLO, CARLOS F. DA SILVA, por supostas infrações ambientais, ao argumento de teriam sido constatadas irregularidades pela PATRAM, porque a empresa estaria em funcionamento sem licença de operação pelo órgão ambiental; as atividades produtivas seriam realizadas em pavilhão sem paredes laterais, sendo possível que a emissão de poeira e o ruído causassem perturbações aos vizinhos, notadamente pela utilização de diversas máquinas, além da apreensão de madeiras nobres sem nota fiscal de compra e DOF. Relatou que era realizada pintura com filtro de retenção de partículas fora de operação e não foi comprovado o destino final dado a resíduos perigosos, como tintas, solventes e demais componentes utilizados na pintura. Ainda, argumentou que a empresa atuava no segmento de fabricação de móveis e esquadrias, situada em área com característica residencial. Aduziu que a empresa CARLOS F. DA SILVA – ME, nome fantasia RUSTIKALE, pertencia à empresa MÁRIO ANTÔNIO DE MELLO – ME, nome fantasia TRANSCAÍ, de acordo com as cópias das matrículas de nº 20.394 e nº 20.395, ambas do Registro de Imóveis da Comarca de São Sebastião do Caí. Postulou, em sede de tutela de urgência, a imediata interdição das atividades desenvolvidas pela empresa CARLOS F. DA SILVA – ME, com nome fantasia RUSTIKALE, até a obtenção do devido licenciamento ambiental, sob pena de multa diária no valor de R$ 3.000,00 (três mil reais) e a indisponibilidade dos imóveis matriculados sob nº 20.394 e nº 20.395, ambos do Registro de Imóveis da Comarca de São Sebastião do Caí, onde eram exercidas as atividades da empresa. Juntou documentos.

Pois bem.

A fim de evitar tautologia, segue transcrição de parte do Auto de Constatação de Ocorrência Ambiental juntado ao feito (evento 1 - anexo 3, pg. 12 e seguintes):

[...] A atividade de fabricação de móveis e esquadrias em madeira e venda de madeira exótica e nativa beneficiada, encontra-se operando sem a licença de operação, conforme afirmou o responsável ao ser questionado sobre o este documento[...] No processo de produção são utilizadas diversas máquinas, como plaina, serra circular, plaina 4 fases, lixadeira, dentre outras, o maquinário encontra-se instalado em local coberto, porém aberto em uma das laterais, sendo que possivelmente a poeira e ruído gerado pela atividade cause algum tipo de perturbação aos vizinhos [...] Constatamos ainda que no empreendimento ocorre a pintura de móveis e esquadrias em local que possui um filtro para retenção das partículas geradas pela atividade, mas não estava sendo usada no momento da fiscalização, inclusive solicitamos qual destinação estavam tendo os resíduos gerados e o responsável não soube nos dizer, não tendo sido apresentado nenhum Manifesto de Transporte de Resíduo (MTR) das tintas, solventes e demais componentes utilizados na atividade de pintura. [...] 3. Conclusão: Diante das evidências apresentadas, nós abaixo assinados, constatamos crime ambiental, por parte do Sr. Mário Antônio de Mello, por fazer funcionar atividade potencialmente poluidora sem autorização do órgão ambiental competente, deixando de adotar as medidas necessárias na correta gestão de resíduos. - grifei

Conforme consta no anexo 2, há insurgência de vizinhos próximo ao local, em decorrência de poluição sonora e dispersão de resíduos sólidos, como poeira e tinta, que invadem as residências, advindos das atividades realizadas pela empresa, que opera em pavilhão aberto (evento 1. anexo 2, pg. 4/14, 32/50, anexo 4, pg. 17/36 ). Inclusive, consta nos autos abaixo assinado dos moradores da região (evento 1, anexo 2, pg. 27/29).

O Ministério Público também apresentou parecer técnico, cuja conclusão foi a seguinte (anexo 6, pgs. 09/10):

[...] Com base na análise técnica realizada, conclui-se que:

i. A empresa investigada atua no segmento de processamento de madeira, cuja natureza dos impactos ambientais foi discutida na seção 2.1 deste parecer técnico.

ii. As condições observadas no local durante a vistoria evidenciam potencial para a dispersão de pó e ruído excessivo para a atmosfera, com consequentes incômodos à vizinhança, como foi discutido na seção 4 deste parecer técnico.

iii. O valor econômico associado às degradações ambientais promovidas pela empresa investigada foi estimado em R$ 110.186,38, conforme o método de custo de controle evitado, discutido na seção 5 deste parecer técnico.

iv. As medidas de adequação aplicáveis ao caso foram elencadas na seção 6 deste parecer técnico, contemplando, prioritariamente, a regularização da atividade junto ao órgão ambiental competente, o fechamento lateral do pavilhão industrial e o isolamento acústico de máquinas responsáveis por produzir intenso ruído.

Dispõe o art. 300 do Código de Processo Civil que a tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito alegado e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.

Em se tratando de atividade potencialmente nociva ao meio ambiente, conforme explicado na pg. 46, do parecer técnico do anexo 5, "[...] a Resolução Consema nº 372/2018 estabelece que as indústrias de fabricação de móveis apresentam de médio a alto potencial poluidor, dependendo da natureza das atividades desenvolvidas no local, como mostra o Quadro 1", de modo que necessários os devidos licenciamentos ambientais para operar, como determina o art. 8º da Resolução CONAMA n. 237/97:

Art. 8º - O Poder Público, no exercício de sua competência de controle, expedirá as seguintes licenças:

I - Licença Prévia (LP) - concedida na fase preliminar do planejamento do empreendimento ou atividade aprovando sua localização e concepção, atestando a viabilidade ambiental e estabelecendo os requisitos básicos e condicionantes a serem atendidos nas próximas fases de sua implementação;

II - Licença de Instalação (LI) - autoriza a instalação do empreendimento ou atividade de acordo com as especificações constantes dos planos, programas e projetos aprovados, incluindo as medidas de controle ambiental e demais condicionantes, da qual constituem motivo determinante;

III - Licença de Operação (LO) - autoriza a operação da atividade ou empreendimento, após a verificação do efetivo cumprimento do que consta das licenças anteriores, com as medidas de controle ambiental e condicionantes determinados para a operação.

Parágrafo único - As licenças ambientais poderão ser expedidas isolada ou sucessivamente, de acordo com a natureza, características e fase do empreendimento ou atividade.

Desse modo, ao que se depreende da documentação trazida aos autos, a parte ré funciona sem a devida licença ambiental, considerando, ainda, as denúncias feitas pelos moradores locais, cujas reclamações são embasadas pelo Auto de Constatação de Ocorrência Ambiental e pelo parecer técnico, anteriormente mencionados.

Dessa forma, presente a probabilidade do direito e efetivamente relevante o fundamento da demanda.

Outrossim, considerando que se trata de questão ambiental, o perigo de dano decorre do próprio fato, diante risco ao meio ambiente.

Como se observa, a operação da atividade do réu parte de longa data, ao que se depreende, ao menos desde outubro de 2019, quando da notícia do fato ao Ministério Público, não podendo ser desconsiderado a circunstância de que a empresa estaria exercendo atividade no mesmo local há 20 anos, importando possível e grave risco ambiental, caso não deferida a tutela nesta contenda.

Assim, necessário o deferimento das medias liminares postuladas pelo Ministério Público, a fim de obstar a continuidade da atividade nociva ao meio ambiente, motivo pelo qual DEFIRO, em parte, A TUTELA DE URGÊNCIA para determinar:

a) a imediata INTERDIÇÃO/CESSAÇÃO das atividades desenvolvidas pela empresa CARLOS F. DA SILVA – ME, com nome fantasia RUSTIKALE, localizada na Rua Guarani, nº 260, Bairro Quilombo, Município de São Sebastião do Caí/RS, ou em qualquer outro endereço que o réu venha a se estabelecer, envolvendo o exercício de atividade que ocasionou o ajuizamento da presente ação, até que obtenha o devido licenciamento ambiental, sob pena de multa diária no valor de R$ 3.000,00 (três mil reais), limitada em R$ 300.000,00 (trezentos mil reais);

b) quanto ao pedido de indisponibilidade de bens imóveis, por ora vai INDEFERIDO, não havendo, em sede de cognição sumária, elementos suficientes a respaldar o deferimento do pleito. Apenas o risco de dissipação de bens, em tese, não justifica a indisponibilidade de bens dos demandados e não há comprovação de que não possuam outros bens. Tal medida pressupõe atos de dilapidação do patrimônio dos réus, o que não restou demonstrado no caso em análise. Além disso, nesse primeiro momento, quanto à extensão do dano, prudente aguardar-se o contraditório.

Citem-se e intimem-se.

Diligências legais.

Em razões, a parte agravante sustenta, em suma, que em momento algum a ora recorrente, na...

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