Acórdão nº 52122684120228217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Quinta Câmara Cível, 15-02-2023

Data de Julgamento15 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualAgravo de Instrumento
Número do processo52122684120228217000
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003077905
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

15ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Agravo de Instrumento Nº 5212268-41.2022.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Locação de imóvel

RELATOR: Desembargador ROBERTO CARVALHO FRAGA

AGRAVANTE: ARI FOPPA

AGRAVADO: VALMIR BENEDUZI

RELATÓRIO

Trata-se de agravo de instrumento, interposto por ARI FOPPA em face da decisão que, nos autos da fase de cumprimento de sentença ajuizada por VALMIR BENEDUZI, rejeitou a arguição de impenhorabilidade do veículo penhorado, nos seguintes termos: (evento 22 dos autos originários)

“Vistos.

O feito, antes físico, passou a tramitar eletronicamente.

Os executados manejaram pedido incidental por meio do qual defendem a existência de erro material nos cálculos apresentados pelo exequente concernente aos débitos dos locativos, tendo em conta não refletir os parâmetros estabelecidos pelo título judicial formado, o que importa em excesso de execução. Defenderam, outrossim, a impenhorabilidade do veículo Tracker, placa FQL-6959 de propriedade do executado Ari Foppa, sob o argumento de se tratar de seu instrumento de trabalho. Pugnam, assim, pela correção do crédito exequendo apurado e a impenhorabilidade do veículo que foi objeto de penhora (Evento 3, PROCJUDIC8, Páginas 34/46).

Intimado, o exequente reconheceu o equívoco na elaboração dos seus cálculos, apresentando nova planilha de acordo com o título judicial. Lado outro, refutou a pretensão atinente ao reconhecimento da impenhorabilidade do veículo, sob o fundamento de que o bem não é essencial ao labor e sustento do devedor, que, inclusive, é aposentado (Evento 3, PROCJUDIC9, Página 17/20).

Intimadas as partes a dizer acerca do interesse na produção de outras provas (Evento 3, PROCJUDIC9, Página 29 e Evento 11), nada requereram (eventos 17 e 18).

É o sucinto relato.

Passo a decidir.

Inicialmente, observo que os devedores pretendem sanar erro material detectado no cálculo apresentado pelo credor, diante da inobservância do valor do locativo fixado em sentença (R$ 220,00), além de ver reconhecida a impenhorabilidade do veículo Tracker, placa FQL-6959 de propriedade do executado Ari Foppa, sob o argumento de se tratar de seu instrumento de trabalho.

Tais questões podem ser arguidas por simples petição e objeto de análise após o término do prazo para apresentação da impugnação, a fim de extirpar eventuais irregularidades discutidas no curso do cumprimento de sentença, nos termos do disposto no §11º do art. 525 do CPC.

Disto isto, passo ao exame da matéria.

Do excesso de execução.

Com relação ao primeiro ponto, relativo ao excesso de execução por conta de erro material havido no cálculo do exequente, observo que após a manifestação dos devedores o credor readequou o seu cálculo, a fim de fazer incidir o valor correto do locativo estabelecido no título judicial (R$ 220,00), restando, pois, sanado o erro, achando-se o cálculo apresentado no Evento 3, PROCJUDIC9, Página 21/25, de acordo com as balizas estabelecidas pelo título judicial.

Assim, é caso de acolher o alegado erro apontado pelos devedores, cuja medida de correção já foi adotada pela parte credora.

Da impenhorabilidade do veículo constrito.

No que pertine à impenhorabilidade do automóvel Tracker, placa FQL-6959, de propriedade do executado Ari Foppa, dispõe o art. 833, inciso V, do CPC:

Art. 833. São impenhoráveis:

V - os livros, as máquinas, as ferramentas, os utensílios, os instrumentos ou outros bens móveis necessários ou úteis ao exercício da profissão do executado;

Com efeito, é preciso comprovar que o veículo se caracterize como efetivo instrumento de trabalho, o que não ocorre no caso sob exame, já que o executado apontou que utiliza o bem para o trabalho de motorista para viagens particulares, sem que haja prova escorreita de eventual habitualidade no desempenho de tal mister, servindo, conforme ele próprio menciona, como complemento de renda, pois é aposentado.

As alegações sobre a atividade profissional desenvolvida e sobre a essencialidade do veículo são genéricas e desacompanhadas de provas, não servindo as declarações que fez acompanhar à sua peça como prova bastante a demonstrar a efetiva utilidade e necessidade do bem constrito para o trabalho.

Deste modo, no caso, o executado Ari não comprova que o veículo objeto da penhora lhe é útil ou necessário para o exercício da profissão de motorista, a qual, aliás, sequer veio devidamente comprovada nos autos, não podendo a necessidade ser presumida, a fim de caracterizar a sua impenhorabilidade, o que lhe cabia em termos de ônus da prova.

Nesse sentido:

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. IMPENHORABILIDADE DE BEM. ART. 649, V, DO CPC. AUSÊNCIA DE PROVA. SÚMULA 7/STJ. ART. 332 DO CPC. PROVA TESTEMUNHAL. OBJEÇÃO DE IMPENHORABILIDADE. DILAÇÃO PROBATÓRIA. DESCABIMENTO.
1. As diversas leis que disciplinam o processo civil brasileiro deixam claro que a regra é a penhorabilidade dos bens, de modo que as exceções decorrem de previsão expressa em lei, cabendo ao executado o ônus de demonstrar a configuração, no caso concreto, de alguma das hipóteses de impenhorabilidade previstas na legislação, como a do art. 649, V, do CPC, verbis: "São absolutamente impenhoráveis (...) os livros, as máquinas, as ferramentas, os utensílios, os instrumentos ou outros bens móveis necessários ou úteis ao exercício de qualquer profissão".
2. Cabe ao executado, ou àquele que teve um bem penhorado, demonstrar que o bem móvel objeto de constrição judicial enquadra-se nessa situação de "utilidade" ou "necessidade" para o exercício da profissão. Caso o julgador não adote uma interpretação cautelosa do dispositivo, acabará tornando a impenhorabilidade a regra, o que contraria a lógica do processo civil brasileiro, que atribui ao executado o ônus de desconstituir o título executivo ou de obstruir a satisfação do crédito.
3. Assim, a menos que o automóvel seja a própria ferramenta de trabalho, como ocorre no caso dos taxistas (REsp 839.240/CE, Rel. Min. Eliana Calmon, Segunda Turma, DJ de 30.08.06), daqueles que se dedicam ao transporte escolar (REsp 84.756/RS, Rel. Min. Ruy Rosado, Quarta Turma, DJ de 27.05.96), ou na hipótese de o proprietário ser instrutor de auto-escola, não poderá ser considerado, de per si, como "útil" ou "necessário" ao desempenho profissional, devendo o executado, ou o terceiro interessado, fazer prova dessa "necessidade" ou "utilidade". Do contrário, os automóveis passarão à condição de bens absolutamente impenhoráveis, independentemente de prova, já que, de uma forma ou de outra, sempre serão utilizados para o deslocamento de pessoas de suas residências até o local de trabalho, ou do trabalho até o local da prestação do serviço.
4. No caso, o aresto recorrido negou provimento ao agravo do ora recorrente, porque ele não fez prova da "utilidade" ou "necessidade" do veículo penhorado para o exercício profissional. Assim, para se infirmar a tese adotada no aresto recorrido - de que o recorrente não fez prova da "utilidade" ou "necessidade" do bem penhorado para o exercício de sua profissão - será necessário o reexame de matéria fática, o que é incompatível com a natureza do recurso especial, nos termos da Súmula 7/STJ.
5. Tendo sido a discussão sobre a impenhorabilidade do bem travada no âmbito da própria execução, por meio de objeção de impenhorabilidade, não cabia, como não cabe, dilação probatória, não havendo que se falar em cerceamento de defesa pela não realização da prova testemunhal. Ademais, se o ora recorrente sabia da necessidade de produzir provas em juízo, deveria ter recorrido da decisão que cancelou a autuação dos embargos à penhora, convertendo-o em objeção de impenhorabilidade inclusa nos próprios autos da execução.
Ausência de violação do art. 332 do CPC.

6. Recurso especial conhecido em parte e não provido, divergindo da nobre Relatora.
(REsp 1196142/RS, Rel.
Ministra ELIANA CALMON, Rel. p/Acórdão Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 05/10/2010, DJe 02/03/2011). Grifado.

No mesmo embalo, o TJRS:

(...) UTILIZAÇÃO DE VEÍCULO AUTOMÓVEL COMO INSTRUMENTO DE TRABALHO. IMPENHORABILIDADE. Para que seja reconhecida a impenhorabilidade, com fundamento no art. 833, V, do Código de Processo Civil, sob o argumento de que o veículo é essencial e indispensável para o exercício de atividade laboral, é necessária a demonstração da utilidade do bem à atividade profissional, para que se possa, então, aferir a existência de vinculação entre este...

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