Acórdão nº 52171201120228217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Primeira Câmara Cível, 22-02-2023

Data de Julgamento22 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualAgravo de Instrumento
Número do processo52171201120228217000
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoDécima Primeira Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003071987
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

11ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Agravo de Instrumento Nº 5217120-11.2022.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Nota promissória

RELATOR: Desembargador FERNANDO ANTONIO JARDIM PORTO

AGRAVANTE: RIZZI & CIA LTDA

AGRAVADO: VICENTE MAZURANA DEMENIGUI

RELATÓRIO

Cuida-se de agravo de instrumento interposto por RIZZI & CIA LTDA., contra a decisão proferida nos autos da execução de título extrajudicial que move em desfavor de VICENTE MAZURANA DEMENIGUI, que indeferiu o pedido de penhora de 50%, referente a meação dos bens de propriedade da esposa do requerido.

Em suas razões, o agravante pugnou pela penhora de ativos financeiros da esposa do agravado, Sra. Andréia Micke, haja vista que estes teriam contraído matrimônio em regime de comunhão parcial de bens. Arguiu que a decisão recorrida iria de encontro às disposições dos artigos 1.658 e 1.664, do Código Civil e artigo 843, do Código de Processo Civil, porquanto seriam incontroversos a existência do matrimônio e o regime de bens adotado. Sinalou que o título executivo que deu origem à demanda foi firmado já na constância do casamento. Sustentou, ainda, que o débito contraído fora revertido em favor da entidade familiar, na medida em que ambos seriam agricultores e que as duplicatas executadas teriam sido emitidas para aquisição de insumos e defensivos agrícolas. A partir disso, pediu a reforma da decisão agravada e o provimento do recurso (evento 1, INIC1).

Satisfeito o preparo recursal (evento 4, DOC1), ocasião em que foi determinada a intimação da parte agravada (evento 6, DESPADEC1).

Regularmente intimado, o agravado justificou a necessidade de manutenção da decisão recorrida, referindo não haver provas de que o débito contraído teria sido revertido em proveito do seu cônjuge, o que impossibilitaria a constrição pretendida. Colacionou jurisprudência para amparar sua tese. Sustentou que sua companheira tampouco integraria a demanda. Ao final, requereu a manutenção da decisão (evento 13, CONTRAZ1).

Vieram-me os autos conclusos para julgamento.

É o breve relatório. Passo ao voto.

VOTO

No caso em concreto, a parte agravante se insurge contra a decisão interlocutória que, em sede de embargos de declaração, indeferiu o pedido penhora de ativos financeiros pertencentes ao cônjuge do agravado, cujo teor transcrevo (evento 135, DESPADEC1):

"Diante da alegada omissão apresentada nos embargos de declaração, opostos, passo a apreciar o pedido.

A esposa do executado não é parte na ação executiva, sendo que a parte credora não comprovou o regime de casamento, bem como não há prova de que o débito executado tenha sido contraído na constância do casamento, nem que o tenha sido em proveito da entidade familiar.

Dessa forma, recebo os embargos de declaração e rejeito pelos argumentos referidos."

De plano, entendo como importante esclarecer que a existência do matrimônio e regime de bens (comunhão parcial) são fatos incontroversos, igualmente ao fato de que o débito executado foi adquirido quando o executado já estava casado.

Assim, a controvérsia reside na hipótese da constrição da meação na conta da esposa do requerido, em face dos efeitos do próprio regime bens e pela hipótese de reversão do débito em favor do proveito familiar.

Em regra, o Código Civil dispõe que os bens da comunhão, ressalvada a meação, respondem pelas obrigações contraídas para atender aos encargos da família e às despesas de administração (artigo 1.6641); comunicando a ambos os bens adquiridos na constância do casamento (artigo 1.6582).

Nesse viés, atento às demandas onde havia a pretensão de constrição dos bens do cônjuge não integrante da ação/execução com fundamento na normativa civil, o Superior Tribunal de Justiça passou a ter o entendimento de que a penhora em conta de terceiro somente poderia ser autorizada em situações excepcionais, dado o procedimento exigido para arguição da impenhorabilidade:

RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE COBRANÇA. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. PENHORA. ATIVOS FINANCEIROS. CONTA-CORRENTE. TERCEIRO. CÔNJUGE. INADMISSIBILIDADE. CASAMENTO. REGIME DA COMUNHÃO PARCIAL DE BENS. SOLIDARIEDADE. EXCEÇÃO. DEVIDO PROCESSO LEGAL. CONTRADITÓRIO. AMPLA DEFESA. OBSERVÂNCIA. NECESSIDADE. 1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ). 2. Não se admite a penhora de ativos financeiros da conta bancária pessoal de terceiro, não integrante da relação processual em que se formou o título executivo, pelo simples fato de ser cônjuge da parte executada com quem é casado sob o regime da comunhão parcial de bens. 3. O regime de bens adotado pelo casal não torna o cônjuge solidariamente responsável de forma automática por todas as obrigações contraídas pelo parceiro (por força das inúmeras exceções legais contidas nos arts. 1.659 a 1.666 do Código Civil) nem autoriza que seja desconsiderado o cumprimento das garantias processuais que ornamentam o devido processo legal, tais como o contraditório e a ampla defesa. 4. Revela-se medida extremamente gravosa impor a terceiro, que nem sequer participou do processo de conhecimento, o ônus de, ao ser surpreendido pela constrição de ativos financeiros bloqueados em sua conta corrente pessoal, atravessar verdadeira saga processual por meio de embargos de terceiro na busca de realizar prova negativa de que o cônjuge devedor não utiliza sua conta-corrente para realizar movimentações financeiras ou ocultar patrimônio. 5. Recurso especial não provido. (RECURSO ESPECIAL Nº 1.869.720 - DF, Relatora MINISTRA NANCY ANDRIGHI, julgado em 27 de abril de 2021).

Logo, o entendimento é de que não basta a existência do matrimônio ou a aquisição do bem na constância do casamento para que seja reconhecida a solidariedade entre os cônjuges. Para tanto, em situações análogas, é necessário ou que seja comprovada a reversão em favor do casal, ou seja demonstrado que o devedor originário estaria dispensando o patrimônio em favor do terceiro para frustrar a execução.

Nesse contexto, a hipótese dos autos demonstra que o agravado e sua companheira são agricultores familiares, de modo que qualquer valor destinado ao exercício da atividade laboral reverteria em proveito do casal. No entanto, inexiste no feito a comprovação de que o título que deu azo à execução (fls. 12 e v.) ou, até mesmo as notas promissórias, teriam sido emitidas com vias de fomentar o negócio familiar.

Assim, o ônus...

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