Acórdão nº 52245467420228217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Oitava Câmara Criminal, 17-02-2023

Data de Julgamento17 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualHabeas Corpus
Número do processo52245467420228217000
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoOitava Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003085424
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

8ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Habeas Corpus (Câmara) Nº 5224546-74.2022.8.21.7000/RS

PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5015551-95.2022.8.21.0003/RS

TIPO DE AÇÃO: Crimes de Tortura(Lei 9.455/97)

RELATORA: Desembargadora NAELE OCHOA PIAZZETA

PACIENTE/IMPETRANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

IMPETRADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

Trata-se de habeas corpus impetrado em favor de LILIAN DIAS DA SILVA, nascida em 04-05-1998, com 24 anos de idade, presa preventivamente em razão da suposta do crime de tortura qualificada pelo resultado morte, ação penal nº 5015551-95.2022.8.21.0003.

Em suas razões, alega a nulidade da prisão em razão na inocorrência de audiência de custódia. Sustenta a ausência dos requisitos e fundamentos autorizadores da medida extrema. Aponta a existência de condições pessoais favoráveis, das quais destaca primariedade, residência fixa e emprego lícito. Refere que a paciente é genitora de criança que conta com 08 (oito) anos de idade. Tece considerações acerca de questões fático-probatórias, imputando a autoria do delito ao então companheiro, padrasto da vítima. Acusa excesso de prazo na formação da culpa, a refletir na segregação da beneficiária. Menciona ofensa ao que dispõe regra inserta no parágrafo único do artigo 316 do Código de Processo Penal. Pugna liminarmente pelo trancamento da ação penal nº 5015551-95.2022.8.21.0003, a alternativa substituição da preventia por medidas cautelares diversas e, ao final, a concessão da ordem.

Indeferido o pleito liminar (Ev. 04, DESPADEC1).

Prestadas as informações (Ev. 10, INF_HABEAS_CORP1).

O ilustre Procurador de Justiça, Luiz Henrique Barbosa Lima Faria Corrêa, manifesta-se pela denegação da ordem (Ev. 13, PARECER1).

Conclusos para julgamento.

Breve relato.

VOTO

A ordem impetrada em favor de LILIAN DIAS DA SILVA, pois ausente indicativo de manifesta ilegalidade em sua prisão preventiva pela suposta prática do crime de tortura qualificada pelo resultado morte1.

Decretada a prisão preventiva em 10-06-2022 e cumprido o respectivo mandado em 11-06-2022, encontra-se detida há pouco mais de 06 (seis) meses.

Através do presente habeas corpus, insurge-se da medida arguindo a tese a seguir examinada.

1 - Trancamento da ação penal por ausência de justa causa

O pedido de trancamento da ação penal é medida excepcional a ser adotada quando houver comprovação, de plano e estreme de dúvida, da atipicidade da conduta em tese praticada, da incidência de causa de extinção da punibilidade ou da ausência de indícios de autoria ou de prova da materialidade do delito, na trilha da orientação do Egrégio Superior Tribunal de Justiça2.

Tanto não ocorre na espécie, inexistindo prova pré-constituída de comportamento atípico, superveniência de causa extintiva da punibilidade ou ausência de indícios mínimos de autoria ou de prova da materialidade de delito, o que inviabiliza o acolhimento da tese aventada no writ.

Tocante ao conceito de justa causa, trata-se do suporte probatório mínimo em que se deve lastrear a acusação, sem o qual não se admite a instauração do processo-crime, tendo em vista que a tramitação de uma ação penal, por si só, atinge o status dignitatis do imputado3.

Acresço que a análise sumária dos documentos anexados aos autos eletrônicos, que subsidiaram o oferecimento da exordial acusatória e o seu recebimento pelo juízo de Primeiro Grau, não indica ausência de lastro mínimo e, por conseguinte, de justa causa à persecução penal, razão pela qual rechaço a pretensão defensiva.

2 - Nulidade da prisão preventiva em razão da inocorrência de audiência de custódia

De plano, destaco que a regra contida no artigo 310 do Estatuto Penal Adjetivo consiste no dever imposto ao magistrado de que, no prazo máximo de 24 (vinte e quatro) horas após o recebimento do auto de prisão em flagrante, promova a realização de audiência de custódia na presença do acusado, de seu defensor e do membro do Ministério Público.

Ocorre que, na hipótese dos autos, a paciente não foi presa em flagrante, conforme informação constante no relatório final de investigação lavrado pela autoridade policial, razão pela qual não incidente ao caso o dispositivo legal invocado, cumprindo registrar que, ainda que se estivesse diante de situação em que ocorrida prisão em flagrante, a jurisprudência deste Órgão Fracionário e do Superior Tribunal de Justiça é assente no sentido de que “A conversão do flagrante em prisão preventiva torna superada a alegação de nulidade relativamente à falta de audiência de custódia”.

3 - Irregularidade da prisão preventiva

Não colhe.

Conforme minuciosa investigação realizada pela Polícia Civil, Lilian Dias da Silva e seu então companheiro, Anderson Borba Carvalho Júnior, em diversas oportunidades, manifesta comunhão de esforços e conjugação de vontades entre ambos, submeteram a filha da paciente, M. D. F., com três anos de idade à época, a intenso sofrimento físico e mental, com emprego de violência física, como forma de lhe aplicar castigo pessoal, produzindo-lhe as lesões descritas nos boletins de atendimentos médicos (Ev. 03, OUT3, fls. 10-22; OUT16; OUT17; e OUT32) e resultando em seu óbito, consoante laudo de necropsia nº 144.538/2022 (Ev. 03, AUTO50).

As diligências levadas a efeito no curso do inquérito policial revelaram que, de maneira sistemática, a vítima era agredida fisicamente no interior da residência onde coabitava com os agressores, que se utilizavam de instrumentos contundentes e diferentes métodos de tortura, tais como amarrar a menor de idade, causando-lhe equimoses, fraturas, escabiose, queimaduras e lesões outras descritas na farta documentação que instrui o expediente inquisitorial.

Os robustos substratos reunidos na etapa pré-processual demonstram a materialidade dos fatos e os indícios suficientes de autoria, caracterizado o fumus comissi delicti autorizador da custódia, reforçado pelo recebimento, em 04-07-2022, da denúncia oferecida pelo Ministério Público, dando a suplicada como incursa nas sanções do artigo 1º, inciso II, §3º, última parte, e §4º, inciso II, da Lei 9.455/97, combinado com o artigo 29, caput, do Código Penal, nos termos do artigo 2º da Lei nº 8.072/90.

Em relação ao periculum libertatis, traduzido no risco à ordem pública, consiste na gravidade concreta das condutas em tese perpetradas, praticadas pela paciente em concurso de pessoas com seu então companheiro contra sua filha, com apenas 03 (três) anos de idade à época, envolvendo reiterados episódios...

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