Acórdão nº 52254205920228217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Sétima Câmara Cível, 23-01-2023

Data de Julgamento23 Janeiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualAgravo de Instrumento
Número do processo52254205920228217000
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoDécima Sétima Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002977985
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

17ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Agravo de Instrumento Nº 5225420-59.2022.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Empréstimo consignado

RELATOR: Desembargador PAULO SERGIO SCARPARO

AGRAVANTE: BANCO BMG S.A

AGRAVADO: LILI BRUM DA MOTTA

RELATÓRIO

BANCO BMG S.A .interpõe agravo de instrumento em razão da decisão proferida na ação declaratória de inexistência de débito ajuizada por LILI BRUM DA MOTTA (evento 3), nos seguintes termos:

Trata-se de ação movida por LILI BRUM DA MOTTA contra BANCO BMG S.A, todos qualificados na inicial, alegando a parte Autora que tomou conhecimento de descontos em seus benefícios previdenciários, mas nega ter realizado com o demandado contrato de empréstimo com reserva de margem consignável, tendo contratado, na verdade, empréstimo consignado.

Preliminarmente, defiro a inversão do ônus da prova por ser a parte Autora hipossuficiente na relação de consumo, a teor do art. 6°, VIII, do Código de Defesa do Consumidor – CDC, aplicável ao caso em comento.

A tutela provisória requerida pela parte Autora corresponde com o previsto no art. 294 do CPC, em cognição sumária, em razão da urgência.

A antecipação dos efeitos da tutela é medida excepcional, deferida, apenas se, existindo prova inequívoca, estiver comprovada a ocorrência simultânea da verossimilhança das alegações da parte autora e do perigo de dano irreparável ou de difícil reparação, de modo que o provimento jurisdicional tenha de ser deferido antes da dilação probatória.

Assim, conforme expressa negativa da Autora da existência da contratação, portanto, da dívida, resta consolidada a prova inequívoca do quanto alegado, propiciatória ao pleno convencimento da presença da probabilidade do direto, exigida pelo art. 300 do CPC.

Quanto ao perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo, é presumível, por conta dos transtornos que causam os descontos indevidos de serviços supostamente não contratados.

Saliente-se, por derradeiro, que inexiste o perigo de irreversibilidade, previsto §3º do art.300 do CPC, porquanto não trará prejuízo ao demandado a cobrança ao final da demanda da dívida que gerou o ajuizamento da ação, acaso seja reconhecida judicialmente sua exigibilidade.

Isso posto, DEFIRO A TUTELA DE URGÊNCIA, determinado ao demandado que, no prazo de 15 (quinze dias), se abstenha de debitar valores no benefício previdenciário da parte Autora, referente ao contrato em debate, sob pena de aplicação de multa diária no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais).

Ressalto que, no entendimento desta magistrada, para se estipular a fixação das astreintes são considerados: a capacidade econômica e a resistência da parte, o valor da obrigação e importância do bem jurídico tutelado e os prejuízos causados ao autor em decorrência do não cumprimento da obrigação pela parte contrária.

Em seu recurso de agravo, a parte ré defende a regularidade da contratação entretida com a parte autora. Alega que o agravado firmou contrato de cartão consignado, pois não detinha margem para empréstimo consignado. Refere que as condições contratuais foram devidamente informadas ao autor, que recebeu o cartão e sacou o valor disponibilizado. Pede sejam mantidos os descontos e, subsidiariamente, afastada ou minorada a multa coercitiva.

Não foram oferecidas contrarrazões.

É o relatório.

VOTO

Cuida-se de ação declaratória de nulidade de contratação movida por beneficiário do INSS contra Banco que está lançando, em seus proventos de aposentadoria, descontos decorrentes de pagamento mínimo de fatura de cartão de crédito, por meio do qual o autor obteve empréstimo.

A parte autora, na petição inicial, alega que, ao contrair empréstimo junto à parte ré, acreditava que os valores que lhe foram creditados provinham de operação de mútuo, para pagamento mediante consignação em folha de pagamento, com prestações fixas. Argumenta que tem sido descontado indevidamente parcelas de reserva de margem RMC, desde fevereiro de 2017, no valor de R$ 97,53. Assevera que, na modalidade pagamento mínimo de cartão de crédito, não há amortização da dívida, inexistindo prazo para que os descontos cessem. Busca, assim, o reconhecimento da nulidade da contratação de reserva da margem consignável, via cartão de crédito e requer a restituição dos valores pagos em excesso.

Em síntese, a parte autora aduz não ter pretendido firmar contrato de cartão de crédito consignado junto ao réu, objetivando a contratação apenas de empréstimo consignado. Pede a declaração de nulidade do contrato e, subsidiariamente, a adequação do contrato à operação de empréstimo. Pleiteou, a título de tutela de urgência, a suspensão dos descontos por meio de reserva de margem consignável em cartão de crédito.

De todo modo, é importante considerar que houve a celebração de uma operação financeira. A parte demandante admite expressamente que pretendia contratar empréstimo consignado em folha de pagamento. Como consequência do recebimento do valor mutuado, tem-se o dever do pagamento da dívida.

Com base nessas premissas, passo a examinar a presença de urgência (risco ao resultado útil do processo) e probabilidade do direito.

Quanto à urgência, ao contrário do alegado na petição inicial, o fato de haver consignação em folha de pagamento, por si só, não caracteriza abusividade nem autoriza o cancelamento imediato (como defendido na inicial). Era essa a modalidade de pagamento pretendida pela parte. O resultado útil do processo consiste na adequação dos encargos e da modalidade de amortização da dívida (pretensão de passagem de crédito rotativo em cartão de crédito para empréstimo simples), e não com a modalidade de pagamento por desconto em folha.

Por isso, não há risco ao resultado útil do processo.

De outra banda, o pretenso direito de cessação das cobranças depende da verificação da probabilidade do direito alegado.

No caso, a parte ré anexou o contrato (evento 11, CONTR2 e evento 11, CONTR3 e evento 11, CONTR4 e evento 11, OUT5 ), dando conta de que a autora efetuou a contratação e o saque do valor disponibilizado .

Ainda, não há também verossimilhança na alegação de que os pagamentos totais realizados pela parte autora teriam quitado ou superado o valor do saldo devedor, atualizado mediante aplicação dos encargos aplicáveis aos contratos de empréstimo consignado.

É importante destacar que - sobre o contrato de crédito pessoal, o simples empréstimo - incidem, de regra, os encargos de capitalização mensal e juros remuneratórios. Daí porque é descabida a pretensão da parte autora, exposta na inicial, de ver quitado o mútuo mediante simples pagamento do valor nominal da dívida.

Observo que em demandas semelhantes à presente (Nº 5170761-03.2022.8.21.7000/RS), inclusive em valores e tempo de contratação, com vista a apurar a probabilidade de já ter havido quitação do débito, determinei remessa dos autores à Contadoria Judicial, obtendo-se informações no sentido de que o somatório dos pagamentos reconhecidos pela parte não é suficiente para quitar o saldo atualizado do valor mutuado.

Por isso, não se vislumbra a indispensável probabilidade do direito para que o autor tenha suspensos os pagamentos. De resto, a paralisação das amortizações da dívida contraída só faria aumentar seu saldo devedor, com o acúmulo da correção monetária e dos juros incidentes.

Daí porque impõe-se o provimento do recurso com a revogação da medida liminar deferida.

Diante do exposto, voto por dar provimento ao recurso.



Documento assinado eletronicamente por PAULO SERGIO SCARPARO, Desembargador Relator, em 27/1/2023, às 15:28:49, conforme art. 1º, III, "b", da Lei 11.419/2006. A autenticidade do documento pode ser conferida no site https://eproc2g.tjrs.jus.br/eproc/externo_controlador.php?acao=consulta_autenticidade_documentos, informando o código...

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