Acórdão nº 52257725120218217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Sexta Câmara Cível, 31-03-2022

Data de Julgamento31 Março 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualAgravo de Instrumento
Número do processo52257725120218217000
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoSexta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001751791
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

6ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Agravo de Instrumento Nº 5225772-51.2021.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Fornecimento de insumos

RELATORA: Desembargadora ELIZIANA DA SILVEIRA PEREZ

AGRAVANTE: CENTRO CLINICO GAUCHO LTDA

AGRAVADO: MELISSA DUARTE ROSSI DE AVILA (Absolutamente Incapaz (Art. 3º CC))

RELATÓRIO

Cuida-se de Agravo de Instrumento interposto pela parte ré, CENTRO CLÍNICO GAÚCHO LTDA., contra decisão que deferiu o pedido de tutela de urgência e, após, aceitou o aditamento do pedido formulado nos autos da ação ajuizada por MELISSA DUARTE ROSSI DE ÁVILA, menor impúbere representada por seus genitores, na qual objetivava fosse a ré compelida a designar profissional para realizar avaliação no ambiente hospitalar, com a maior brevidade possível, bem como proceda ao fornecimento dos materiais necessários relacionados, em data anterior à alta hospitalar, para que seu tratamento tenha continuidade em seu domicílio.

Segue transcrição da decisão recorrida:

Defiro a gratuidade de justiça a MELISSA DUARTE ROSSI DE AVILA, porquanto menor impúbere.

Exclua-se AMANDA CHRISTIE DUARTE DA SILVA do polo ativo, considerando que atua apenas na qualidade de representante legal do menor.

Para a concessão de tutela provisória de urgência, deverão ser demonstrados nos autos a probabilidade do direito, o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo e a ausência de perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão.

No que se refere à probabilidade do direito, a requerente é beneficiária do plano de saúde, conforme evento 1 - OUT7, havendo laudos médicos informando o nascimento prematuro (26 semanas), necessitando, para possibilitar a alta do Hospital Divina Providência, de medicamentos e cuidados especiais (evento 1, DOC10 e evento 1, DOC11), com utilização de bolsa de ileostomia.

Alega a requerida, contudo, que as necessidades da autora serão avaliadas apenas após a alta hospitalar, em sua residência, por profissional vinculado ao demandado.

Os planos de saúde podem estabelecer as doenças que terão cobertura, mas não lhes cabe limitar o tipo de tratamento que será prescrito ou a quantidade de consultas e/ou modo de sua prestação, prerrogativas que são dos profissionais que tratam do paciente. Segue jurisprudência do TJRS acerca do tema:

APELAÇÕES CIVEIS. PLANO DE SAÚDE. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. MEDICAMENTO ANTINEOPLÁSICO. PRESCRIÇÃO DE USO EM AMBIENTE DOMICILIAR. COBERTURA DEVIDA. CASO CONCRETO. 1. Os planos de saúde estão submetidos às disposições do Código de Defesa do Consumidor, razão pela qual se aplica o disposto no art. 35 da Lei 9.656/98 ao caso em tela, decorrente de interpretação literal e mais benéfica ao aderente. 2. Reconhecido que o contrato entabulado entre as partes prevê a cobertura de tratamento da patologia apresentada pela parte autora, revela-se abusiva a cláusula contratual que exclui da cobertura os medicamentos correlatos. 3. O plano de saúde não pode se recusar a custear fármaco prescrito pelo médico, pois cabe a este definir qual é o melhor tratamento para o segurado, especialmente em se tratando de fármaco antineoplásico ministrado para ambiente domiciliar. 4. O descumprimento contratual, por si só, não dá ensejo ao reconhecimento de danos extrapatrimoniais. Hipótese em que a negativa decorreu de razoável interpretação de cláusula contratual. 5. Honorários advocatícios. Manutenção do percentual fixado na origem, ainda que abaixo do mínimo legal previsto no artigo 85, §2º do CPC, em razão do elevado valor atribuído à causa, do trabalho despendido pelos patronos e do deslinde célere da controvérsia. APELO DA RÉ DESPROVIDO, POR UNANIMIDADE. APELO DA PARTE AUTORA DESPROVIDO, POR MAIORIA.(Apelação Cível, Nº 70083655183, Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Isabel Dias Almeida, Julgado em: 07-08-2020)

De outra parte, em conformidade com o ART. 6º da Constituição Federal, são "direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição".

Também o art. 226 da Carta Magna estabelece que é "dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão". (o grifo é meu)

Neste contexto, o nosso constituinte originário inseriu, no art. 227, o princípio da prioridade absoluta à criança e ao adolescente.

Desse modo, considerando o inegável prejuízo que será suportado pela parte autora, caso saia do hospital sem a certeza de que receberá os cuidados necessários para sua frágil situação de saúde, imperativo que tal avaliação seja realizada ainda durante a internação.

Assim, defiro a tutela de urgência pleiteada, determinando:

a) que a requerida realize a avaliação da Autora, no prazo máximo de 7 dias, ainda em ambiente hospitalar;

b)posteriormente à avaliação, forneça os materiais e medicamentos prescritos pelo médico assistente da autora na dosagem e quantidade constante do receituário médico atualizado (10 unidades de bolsa de colostomia drenável de 32 mm, 10 unidades de placa infantil de 32 mm, 10 unidades de clamp para bolsa infantil de 32 mm , - 240 pacotes de gase estéril (10 unidades por pacote), 240 flaconetes de soro fisiológico 0,9% 10 ml, 01 frasco de Cavelon spray 280 ml, 01 frasco de Sensi Care spray 50 ml, 10 unidades de Película Hidrocolóide extra fino), sob pena de bloqueio de valores para a aquisição dos materiais e fármacos pelo tempo que forem necessários suas utilizações.

Em caso de não cumprimento da ordem pela requerida, havendo necessidade de bloqueio em conta, a parte autora deverá apresentar três orçamentos atualizados dos medicamentos e materiais requeridos.

Diante das especificidades da causa e de modo a adequar o rito processual às necessidades do conflito, deixo para momento oportuno a análise da conveniência da audiência de conciliação.(CPC, art.139, VI).

As partes devem ser advertidas de que deverão especificar as provas que pretendem produzir na contestação e réplica, apresentando quesitos e rol de testemunhas, se for o caso, sob pena de preclusão.

Intimem-se.

Cite(m)-se.

E após o pedido de emenda da inicial:

O objeto da ação é o tratamento da autora, e a parte ré não pode se negar a fornecer os materiais e medicamentos indicados pelo médico assistente da parte autora, constantes em Receita Médica atualizada, sob o argumento de que não constam no rol elencado na petição inicial.

No caso, desnecessária a emenda da petição inicial, uma vez que é consabido que, em se tratando de tratamento da saúde, as necessidades do paciente se modificam com o transcurso do tempo, constando expressamente na decisão que deferiu a medida liminar que a parte ré deve fornecer os materiais e medicamentos prescritos pelo médico assistente da autora na dosagem e quantidade constante do receituário médico atualizado.

Cabe salientar que a referida decisão mencionou expressamente o rol de materiais e medicamentos elencados pela parte na exordial apenas para fins informativos, no intuito de facilitar o cumprimento da medida liminar.

Assim, intime-se com urgência a parte ré para que cumpra integralmente a medida liminar deferida, devendo fornecer os materiais e medicamentos prescritos pelo médico assistente na dosagem e quantidade constante do receituário médico atualizado, necessários ao tratamento da patologia que acomete a parte autora, conforme já havia sido determinado evento 3, DESPADEC1.

Em suas razões recursais a parte demandada alegou, inicialmente, a nulidade processual, porquanto o pedido de aditamento do pedido inicial ocorreu após a apresentação da contestação, abrangendo tratamento não previsto no Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde da ANS. Ressaltou, no mérito, que o rol da ANS é taxativo, consoante atual posicionamento do STJ, o qual inclusive, tem entendimento de que é descabida a cobertura de medicamentos para uso domiciliar. Nesse contexto, postulou seja atribuído efeito suspensivo ao recurso, para impedir a ordem de concessão de tratamento e medicamentos. Por fim, requereu o provimento do recurso.

O recurso foi recebido apenas no efeito devolutivo.

A parte agravada apresentou contrarrazões.

O Ministério Público ofertou parecer opinando pelo desprovimento do recurso.

É o relatório.

VOTO

Eminentes Colegas.

Presentes os pressupostos de admissibilidade recursal, conheço do Agravo de Instrumento.

Conforme relatado, a matéria controvertida nos autos, devolvida a este grau de jurisdição, refere-se ao pedido de tutela de urgência, no qual a operadora do plano de saúde restou compelida a custear o tratamento domiciliar necessário à preservação da vida da autora, nascida prematuramente.

No caso dos autos, a autora nasceu em 05 de junho de 2021, prematuramente, tendo permanecido hospitalizada no Hospital Divina Providência, até 17/09/2021, quando a presente ação já havia sido ajuizada.

Ocorreu que, quando do ajuizamento da ação, a despeito de ser beneficiária do plano de saúde comercializado pelo réu, este teria informado que, após a alta médica, a menor seria avaliada em sua residência para verificação das suas necessidades e procedimentos de recuperação.

Contudo, a demandante asseverou que os materiais necessários para sua recuperação deveriam ser oferecidos antes da alta hospitalar, o que originou o pedido de tutela de urgência, ora discutido.

Na petição...

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