Acórdão nº 52283098320228217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Quinta Câmara Cível, 15-02-2023

Data de Julgamento15 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualAgravo de Instrumento
Número do processo52283098320228217000
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoDécima Quinta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003131036
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

15ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Agravo de Instrumento Nº 5228309-83.2022.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Empréstimo consignado

RELATOR: Desembargador ROBERTO CARVALHO FRAGA

AGRAVANTE: FACTA FINANCEIRA S.A. CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO

AGRAVANTE: ASS BENEF MOTORISTAS SERV PUBL EST RIO GRANDE SUL

AGRAVADO: NILDA DA SILVA GASPARETTO

RELATÓRIO

Trata-se de agravo de instrumento interposto por FACTA FINANCEIRA S.A e ASSOCIAÇÃO BENEFICIENTE DOS MOTORISTAS E SERVIDORES PÚBLICOS DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL em face da decisão que, nos autos da ação revisional de contrato de empréstimo consignado c/c danos morais movida por NILDA DA SILVA GASPARETTO, deferiu a tutela antecipada para limitar os descontos até o limite consignável legal, nos seguintes termos (evento 34 dos autos originários):

“Vistos.

Verifico que os réus SINAPERS – SINDICATO DOS SERVIDORES PÚBLICOS APOSENTADOS E PENSIONISTAS DO RIO GRANDE DO SUL, ASSOCIAÇÃO BENEFICENTE DOS MOTORISTAS E SERVIDORES PÚBLICOS DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL – ABEMOSE e CÍRCULO OPERÁRIO FERROVIÁRIO DO RIO GRANDE DO SUL – COFRS suscitaram preliminar de ilegitimidade passiva nas suas respectivas contestações.

Além disso, o BANCO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL S.A sustentou a inépcia da inicial e o COFRS pediu a denunciação da lide à Portocred S/A.

Passo, portanto, a analisar as preliminares suscitadas.

a) Da ilegitimidade passiva.

Quanto à ilegitimidade para integrar o polo passivo do presente feito, levantada pelos réus SINAPERS, ABEMOSE e COFRS, destaco que, não obstante os demandados sejam, de fato, meros intermediadores dos descontos, o entendimento jurisprudencial é no sentido de que, em se tratando de ação que envolve a limitação dos descontos realizados diretamente em folha de pagamento, a intermediadora também integra a relação jurídica de direito material exposta na inicial, em razão de ser a responsável por operacionalizá-los. Nesse sentido:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. PENSIONISTA DO IPE. TUTELA DE URGÊNCIA. PEDIDO DE LIMITAÇÃO DOS DESCONTOS FACULTATIVOS A 30% DA REMUNERAÇÃO DA PARTE AUTORA. DESCONTOS CONSIGNADOS. OS EMPRÉSTIMOS CONSIGNADOS NA FOLHA DE PAGAMENTO DA PARTE AGRAVANTE ULTRAPASSAM O LIMITE DE 30% DE MARGEM CONSIGNÁVEL, CONSOANTE JURISPRUDÊNCIA DO E. STJ. PRESENTE A PROBABILIDADE DO DIREITO (ART. 300 DO CPC) E O RISCO DE DANO, IMPÕE-SE A REFORMA DA DECISÃO AGRAVADA. LEGITIMIDADE PASSIVA. INTERMEDIADORA. QUANDO A AÇÃO VERSA SOBRE DESCONTO EM FOLHA DE PAGAMENTO EFETUADO PELA INTERMEDIADORA, TANTO A INSTITUIÇÃO FINANCEIRA QUE CONTRATOU O EMPRÉSTIMO PESSOAL COM A AUTORA, QUANTO A ENTIDADE INTERMEDIADORA ENCONTRAM-SE LEGITIMADAS A INTEGRAR O POLO PASSIVO DA DEMANDA. ASSIM, OS RÉUS ABEMOSE, COFRGS E SINDICATO DOS SERVIDORES PÚBLICOS APOSENTADOS E PENSIONISTAS DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL - SINAPERS DETÊM LEGITIMIDADE PASSIVA. RECURSO PROVIDO NO PONTO. AGRAVO DE INSTRUMENTO PROVIDO. UNÂNIME.(Agravo de Instrumento, Nº 52495029120218217000, Vigésima Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jorge Alberto Vescia Corssac, Julgado em: 27-04-2022)

Afasto, portanto, a alegada ilegitimidade passiva.

b) Da inépcia da inicial

Afasto, também, a alegação de inépcia da petição inicial por suposta ausência de indicação das cláusulas controvertidas e não quantificação do valor incontroverso.

Como se vê, conquanto não haja identificação, por número, das cláusulas que a parte autora controverte, a peça inicial descreve de modo inequívoco o que pretende revisar, permitindo a perfeita identificação do objeto da demanda e o exercício do contraditório pelos réus. Está satisfeita, portanto, a exigência do artigo 330, § 2º, do Código de Processo Civil, até porque, no caso concreto, a autora menciona não ter acesso aos contratos.

c) Da denunciação da lide

Por fim, considerando que a Portocred S/A é a contratante do empréstimo (evento 29, DOC1), o caso é de sua inclusão no polo passivo na condição de litisconsorte, o que determino seja feito nesse momento.

d) Da tutela de urgência.

A parte autora reitera, em sede de réplica, a necessidade de concessão da tutela de urgência, arguindo que os descontos consomem percentual acima do limite legal permitido.

Reexaminando o processo, verifico que assiste razão à parte autora.

Ainda que a legislação estadual determine que “a soma mensal das consignações facultativas e obrigatórias de cada servidor não poderá exceder a setenta por cento (70%) do valor de sua remuneração mensal bruta”, entendo que não há discrepância entre o tratamento concedido aos servidores públicos estaduais e aos servidores da União, na medida em que o Decreto no 6.386/2008, do Presidente da República, prevê, em seu art. 9, § 1º, que “não será permitido o desconto de consignações facultativas até o limite de trinta por cento, quando a sua soma com as compulsórias exceder a setenta por cento da remuneração do consignado".

Vê-se, portanto, que, tanto na esfera estadual como na federal, há garantia de que a remuneração mensal efetivamente paga ao servidor não poderá ser inferior a 30% de seus rendimentos brutos.

Ademais, há decisão do Superior Tribunal de Justiça entendendo que “não há antinomia entre a norma estadual e a federal, pois aquela impõe limitação ao percentual de 70% à soma das consignações facultativas e obrigatórias, enquanto a última impõe limitação ao percentual de 30% apenas à soma das consignações facultativas, podendo, pois, coexistir no âmbito administrativo estadual, já que é princípio basilar de direito administrativo que as normas atinentes à administração pública federal aplicam-se subsidiariamente às administrações estaduais e municipais” (Resp no 1.169.334-RS).

A mesma decisão também menciona que a norma estadual não renegou a norma federal, uma vez que sequer disciplinou limitação específica no que tange às consignações facultativas.

O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul também possui entendimento nesse sentido:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS. TUTELA DE URGÊNCIA DEFERIDA. LIMITAÇÃO DE DESCONTO EM FOLHA DE PAGAMENTO E CONTA CORRENTE. SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES DESTA CORTE E DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. PRESENÇA DOS REQUISITOS DO ARTIGO 300 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. DECISÃO AGRAVADA MANTIDA. I. PARA A CONCESSÃO DA TUTELA DE URGÊNCIA DEVEM ESTAR PRESENTES OS REQUISITOS INSCULPIDOS NO ART. 300 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL, QUAIS SEJAM, A PROBABILIDADE DO DIREITO ALEGADO E O PERIGO DE DANO OU O RISCO AO RESULTADO ÚTIL DO PROCESSO. II. PARA OS SERVIDORES PÚBLICOS ESTADUAIS EXISTEM DOIS BALIZADORES A SEREM RESPEITADOS: O PERCENTUAL DE 70% À SOMA DAS CONSIGNAÇÕES FACULTATIVAS E OBRIGATÓRIAS E O DE 30%, APENAS À SOMA DAS CONSIGNAÇÕES FACULTATIVAS. III. OS DESCONTOS DE EMPRÉSTIMOS NA FOLHA DE PAGAMENTO SÃO LIMITADOS EM RAZÃO DA NATUREZA ALIMENTAR DOS VENCIMENTOS E DO PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE. EM SUMA, SÃO PERMITIDOS OS DESCONTOS EM FOLHA DE PAGAMENTO, DESDE QUE OBSERVADO O LIMITE DE 30% DOS VENCIMENTOS BRUTOS, APÓS A DEDUÇÃO DOS DESCONTOS OBRIGATÓRIOS. IV. NO CASO, VERIFICADA A IRREGULARIDADE PERPETRADA PELAS RÉS AO PROCEDEREM DESCONTOS EM PERCENTUAL ACIMA DO LEGALMENTE PERMITIDO, MANTIDA A DECISÃO QUE DEFERIU PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA PARA LIMITAR OS DESCONTOS EM FOLHA DE PAGAMENTO E CONTA CORRENTE. AGRAVO DE INSTRUMENTO DESPROVIDO, COM BASE NO ARTIGO 932, IV E VIII, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL E ARTIGO 206, XXXVI, DO REGIMENTO INTERNO DO TJRS.(Agravo de Instrumento, Nº 51308057720228217000, Décima Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Liege Puricelli Pires, Julgado em: 18-07-2022)

Por esse motivo, considerando que os descontos seguem comprometendo mais de 30% da renda mensal da autora, possível a concessão da tutela de urgência para que sejam limitados.

No caso concreto, a juntada dos contratos pelos demandados permite concluir que esse limite foi ultrapassado em razão da celebração dos contratos de números 3813780383 (Portocred), 7241050003 e 70306840006 (ambos da Facta), pois foram os últimos pactuados pela parte autora.

Pelo expostos, defiro a tutela de urgência pleiteada para determinar às corrés FACTA FINANCEIRA S/A, CRÉDITO, FINANCIAMENTO e INVESTIMENTO e PORTOCRED S/A para que que procedam à suspensão dos descontos referentes aos contratos de números 3813780383 (Portocred), 7241050003 e 70306840006 (ambos da Facta), a fim de...

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