Acórdão nº 52326023320218217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Segunda Câmara Criminal, 03-02-2022

Data de Julgamento03 Fevereiro 2022
ÓrgãoSegunda Câmara Criminal
Classe processualConflito de Jurisdição
Número do processo52326023320218217000
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001655097
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

2ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Conflito de Jurisdição (Câmara) Nº 5232602-33.2021.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Ameaça (art. 147)

RELATORA: Desembargadora GISELE ANNE VIEIRA DE AZAMBUJA

SUSCITANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

SUSCITADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

O JUÍZO DO JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL ADJUNTO À 4ª VARA CRIMINAL suscitou conflito negativo de competência em face do JUÍZO DO JUIZADO DA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA ambos da Comarca de Canoas, nos autos do termo circunstanciado n.º 5032192-80.2021.8.21.0008, que apura a prática dos crimes de ameaça, injúria racial e da contravenção penal de vias de fato.

Em suma, o Juízo Suscitante apontou ser competente o Juízo Suscitado, alegando que em se tratando de violência contra a mulher em contexto de relações domésticas, há incidência da Lei Maria da Penha, razão pela qual deve o feito tramitar na vara especializada (evento 1, DESPDECOFIC1).

A questão foi submetida à apreciação desta Corte.

Em parecer, o ilustre Procurador de Justiça, Dr. Luiz Carlos Ziomkowski, opinou pela improcedência do conflito, para fixar a competência do Juizado Especial Criminal adjunto à 4ª Vara Criminal (evento 15, PARECER1).

Vieram os autos conclusos para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Eminentes colegas:

No caso em análise, tenho que não assiste razão ao juízo suscitante.

E, a fim de evitar indevida e desnecessária tautologia, peço vênia para transcrever parte do augusto parecer, de lavra do Dr. Luiz Carlos Ziomkowski, ilustre Procurador de Justiça, que muito bem apreciou a questão, adotando-o como razão de decidir, in verbis:

"[...]

Rogando vênia, o presente conflito negativo de competência não procede.

Com efeito, ao exame, constata-se que, ao registrar a ocorrência, a ofendida Alessandra Green relatou “que costumeiramente vai até a residência de sua mãe, Luciane, para ajudá-la, já que a mesma está acamada. Que no mesmo pátio onde reside sua mãe, também reside sua avó Ione, e suas tias Lisamara, Lisandra e Inajara. Que sempre teve problemas de relacionamento com Lisamara e que agressões, ameaças e ofensas são constantes. Que sempre que vai até a casa da mãe, entra em conflito com Lisamara. Que na data de hoje, estava com sua mãe quando se iniciou uma discussão com Lisamara. Que Lisamara ameaçou a depoente dizendo que a pegaria na rua. que também a injuriou, a chamando de "negra, macaca, chipanzé" na frente das pessoas. Que além disso partiu para cima da depoente desferindo-lhe empurrões. Que a depoente estava com sua bebê no colo e quase caiu ao solo. Que suas tias Inajara e Lisandra a ajudaram, contendo Lisamara. Que Lisamara tenta proibir a depoente de frequentar a residência da mãe. que deseja representar criminalmente e solicitar as medidas protetivas de urgência” 5 . (sic).

A vítima Inajara Green, por sua vez, relatou à autoridade policial que “toda a família possui uma desavença com a irmã Lisamara. Que ninguém da família "aguenta" as palavras e atitudes de Lisamara. Que inclusive se mudou de endereço para não ter que conviver com a irmã. Que na tarde de hoje, sua sobrinha Alessandra foi até a casa da avó para ajudar a mãe a tomar banho, pois é deficiente física. Que Lisamara tenta proibir Alessandra de frequentar a casa. Que viu quando Lisamara tentou empurrar Alessandra com a bebê do colo. Que neste momento foi até local questionar Lisamara sobre o empurrão, momento em que entraram em vias de fato. Que sua irmã Lisandra chegou para separar a depoente e Lisamara. Que Lisamara acabou lesionando a depoente com arranhões. Que foi acionada a brigada militar que compareceu no local. Que somente estava visitando sua mãe no momento do fato. Assevera que Lisamara começou a inventar mentiras contra a depoente e disse que iria "ferrar com a vida" da depoente. Que além de tudo isso costuma ofender a depoente a chamando de "nega podre e aidetica, pedreira"6 . (sic)

Por fim, a vítima Lisandra Green declarou que “na tarde do dia 30, estava no pátio de casa quando viu Lisamara empurrando sua sobrinha Alessandra, que estava com o bebê no colo. Que sua irmã Inajara achou um absurdo e foi questionar Lisamara, oportunidade em que entraram em vias de fato. Que foi tentar separar as irmãs, momento em que Lisamara começou a ameaçar e ofender a depoente, dizendo que iria mandar matá-la, e a chamando de vagabunda prostituta, cadela. Que também jogou pedras contra a casa da depoente. Que as desavenças com Lisamara são constantes e que todos da família tem problemas com a mesma”7 .(sic)

Diante desse cenário, depreende-se que as vítimas Isamara e Lisandra residem no mesmo terreno da agressora Lisamara, porém, em residências distintas e, segundo as ofendidas, o relacionamento com sua irmã Lisamara é conturbado e “todos da família tem problemas com a mesma”, sendo inúmeras as desavenças ocorridas entre elas, bem como com a sobrinha Alessandra Green, consistentes em ofensas verbais, ameaças e agressões físicas.

Nessas condições, conquanto presente o liame parental entre a agressora e as vítimas, não se vislumbra no caso elemento essencial à configuração do fato à Lei n.º 11.340/06, uma vez que falece a condição de vulnerabilidade das ofendidas relativamente à agressora.

Com efeito, o artigo 5.º da Lei n.º 11.340/2006 dispõe que:

“Art. 5º Para os efeitos desta Lei, configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial:

I – no âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas;

II - no âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa;

III – em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independente de...

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