Acórdão nº 52350931320218217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Oitava Câmara Criminal, 27-04-2022

Data de Julgamento27 Abril 2022
ÓrgãoOitava Câmara Criminal
Classe processualAgravo de Execução Penal
Número do processo52350931320218217000
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002042467
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

8ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Agravo de Execução Penal Nº 5235093-13.2021.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Roubo majorado (art. 157, § 2º)

RELATORA: Desembargadora ISABEL DE BORBA LUCAS

AGRAVANTE: FLADEMIR LIMA DE FREITAS

AGRAVADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

RELATÓRIO

FLADEMIR LIMA DE FREITAS interpôs agravo em execução penal da decisão que reconheceu o cometimento de falta grave, de sua parte, fuga, determinando a regressão de seu regime carcerário, a alteração da data base para novos benefícios e a perda de 1/3 dos dias remidos, incluídos aqueles eventualmente ainda não reconhecidos judicialmente, relativo ao período trabalhado até a data do cometimento da falta grave.

Em razões acostadas ao evento 3, DOC4, fls. 49/57, o agravante afirmou que deve ser acolhida a justificativa apresentada, levando-se em consideração as penalidades administrativas já experimentadas e o tempo em que permaneceu recolhido, em regime mais gravosos, até a audiência de justificativa. Subsidiariamente, requereu a manutenção dos dias remidos, porquanto direito adquirido do apenado, sua perda significando violação ao princípio da proporcionalidade e transformando o seu labor em trabalho forçado, bem como tornando mais gravosa a execução penal ao apenado que trabalha. Alegou, ademais, que a perda da remição não pode ser automática, afirmando que as condições do apenado e a sua conduta no cumprimento da pena não justificam a aplicação no patamar máximo, pugnando pela modificação da correspondente fração, para patamar mínimo, não superior a 1/10, a incidir, ademais, apenas sobre os dias já declarados remidos ao tempo da falta grave, sob pena de interpretação extensiva em prejuízo do apenado. Afirmou, ainda, a nulidade da decisão recorrida, no ponto em que determinou a perda da remição, em grau máximo, por ausência de fundamentação.

Com base nessas considerações, requereu o provimento do agravo.

Contrarrazões pelo desprovimento do recurso (evento 3, DOC4, fls. 59/61).

Mantida a decisão (evento 3, DOC4, fl. 64).

Em parecer, opinou a ilustre Procuradora de Justiça, Dra. Maria Cristina Cardoso Moreira de Oliveira, pelo parcial provimento do agravo em execução, tão somente para excluir, da decisão objurgada, a declaração de perda dos dias por remir (evento 8, DOC1).

Vieram conclusos.

É o relatório.

VOTO

Trata-se de analisar recurso interposto contra decisão que reconheceu o cometimento de falta grave, por parte de FLADEMIR LIMA DE FREITAS, fuga, determinando a regressão de seu regime carcerário, a alteração da data base para novos benefícios e a perda de 1/3 dos dias remidos, incluídos aqueles eventualmente ainda não reconhecidos judicialmente, relativo ao período trabalhado até a data do cometimento da falta grave.

O recurso, adianto, merece apenas parcial provimento.

Na espécie, FLADEMIR cumpre pena total de 13 (treze) anos, 02 (dois) meses e 23 (vinte e três) dias de reclusão, atualmente em regime semiaberto, pela prática de crimes de roubo majorado, ameaça e descumprimento de medidas protetivas de urgência. Sobreveio aos autos a informação de que, em 18/02/2021, quando se encontrava em regime semiaberto, sob monitoramento eletrônico, teria bloqueado intencionalmente o sinal do dispositivo, entre às 13h e às 15h56min. Em contato telefônico, teria alegado que estava em casa. No entanto, foi registrada a seguinte ocorrência, junto à DPPA de Vacaria (evento 3, DOC3, fls. 336/337):

Comunica que a Guarnição se deparou com SD Coelho, que estava de folga, correndo atrás do indivíduo Flademir e logo o abordando. O mesmo estava em fuga, depois de ter arremessado pacotes para o interior do presídio. Flademir, foi conduzido com uso de algemas devido fundado receio de fuga até o HNSO para laudo médico e depois até a delegacia para providências. Que o indivíduo está com papel alumínio enrolado na tornozeleira, para bloquear o sinal. Que os pacotes foram localizados na rede de segurança do presídio, contendo aparelhos de celular, chip, carregadores e uma balança de precisão. Nada mais.

(Grifei)

Na mesma data, de acordo com informação extraída do Sistema Consultas Integradas, registrada em ocorrência policial junto à DPPA de Caxias do Sul (Ocorrência - 15.10.08/2021/6020):

COMUNICOU QUE O ACUSADO APÓS FORAGIR DO MONITORAMENTO ELETRONICO, DANIFICOU OS SEGUINTES EQUIPAMENTOS QUE COMPÕEM A TORNOZELEIRA ELETRONICA:PEÇA PRINCIPAL C76F9U7R, PEÇA AUXILIAR C78K8H7Y E CARREGADOR EXTERNO C24G4F5N. CALCULA UM PREJUÍZO EM TORNO DE R$ 679,90.

Diante de tais circunstâncias, o agravante passou à condição de foragido, sendo recapturado em 12/03/2021, após arremessar um pacote para o interior do Presídio de Vacaria1 (evento 3, DOC3, fls. 340/341).

Ouvido em juízo, nos moldes do que determina o § 2º do artigo 118 da LEP, com o propósito de explicar e afastar o reconhecimento da falta grave, o agravante negou a prática da falta grave, afirmando que estava em sua casa, na data dos fatos. Acrescentou estar trabalhando e ter família constituída. Ao receber a informação de que estava na condição de foragido, em razão do bloqueio do sinal, dias após o fato, foi orientado, por servidor da Divisão de Monitoramento, que rompesse a tornozeleira, para poder ficar uns dias a mais fora do estabelecimento, caso contrario, seria recolhido. Retirou a tornozeleira, pois sua esposa estava grávida, prestes a ter filho, rompendo-a com uma faca de cortar metal. Relatou que estava com tornozeleira há mais de dez meses e teve apenas uma intercorrência, por ter dormido fora de casa um dia, em razão de estar sendo perseguido por membros de uma facção. Disse que a conduta foi orientada por servidor da Divisão de Monitoramento Eletrônico. Por fim, narrou que estava indo buscar remédio para sua esposa, quando foi recapturado, em abordagem de rotina, próximo ao presídio, sendo preso e encaminhado à casa prisional (mídia seq. 183.2, SEEU).

No entanto, a justificativa apresentada não possui qualquer possibilidade de afastar o cometimento da falta grave, pela fuga, não cabendo ao apenado escolher a conduta que mais lhe beneficie, divorciando-se do cumprimento de sua reprimenda, em total discordância com o dever jurídico que lhe foi imposto pela pena aplicada. Ressalta-se que, embora FLADEMIR negue ter bloqueado intencionalmente o sinal do dispositivo de monitoramento eletrônico, não há nos autos qualquer indicativo de que os policiais militares atuantes na ocorrência possuam contra ele qualquer animosidade, a ponto de imputar-lhe falsamente tal conduta. Outrossim, admitiu ter rompido a tornozeleira, o que, conforme registro policial, se deu na mesma data, restando plenamente caracterizada a fuga, diante da ausência de vigilância estatal sobre o apenado.

De outra parte, tanto a ocorrência que registra o seu flagrante com papel alumínio enrolado na tornozeleira, quanto a que dá conta de sua recaptura, após rompimento do dispositivo, relatam situação análoga, em que teria sido avistado lançando pacotes para o interior da casa prisional, indicando a reiteração de um comportamento alheio às normas legais.

De notar, ademais, que o agravante permaneceu, por mais de vinte dias, na condição de foragido, somente retornando ao regular cumprimento de sua pena, porque recapturado por força policial, assim evidenciando, sem qualquer dúvida, sua intenção de frustrar a execução penal.

Além disso, diante da independência das esferas administrativa e judicial, bem como de suas diferentes funções, no curso da execução da pena, desimporta, para o reconhecimento da falta grave ou para a aplicação de seus consectários lógicos e legais, que ao apenado tenham sido aplicadas sanções administrativas, assim como o fato de ter permanecido em regime mais severo, desde sua recaptura, porquanto tal período será considerado, quando do cálculo para a concessão de novos benefícios, na execução penal.

Assim, praticada a falta grave, afastada a justificativa do agravante, devem incidir sobre ele as consequências jurídicas de sua conduta, conforme artigo 50 da LEP. Esse é o entendimento uníssono desta Corte e, a título de exemplificação, dentre tantos outros, colaciono os seguintes precedentes:

AGRAVO EM EXECUÇÃO. RECURSO DEFENSIVO. MANUTENÇÃO DO RECONHECIMENTO DA FALTA GRAVE. FUGA. REGRESSÃO DE REGIME PRISIONAL. ALTERAÇÃO DA DATA-BASE. PERDA DOS DIAS REMIDOS. - FALTA GRAVE. ART. 50, INC. II, DA LEP. Irrepreensível o reconhecimento da prática da falta grave, consistente em fuga, empreendida pelo apenado que, no gozo do benefício da saída temporária, não retornou ao presídio no dia 26.02.2019, passando à condição de foragido até a sua recaptura em 05.03.2019. Justificativa não acolhida. - REGRESSÃO DE REGIME. A partir do reconhecimento da falta grave, a regressão a regime mais severo é consequência necessária considerando o que preleciona com clareza o art. 118, inc. I, da LEP. - ALTERAÇÃO DA DATA-BASE. Ocorrendo a regressão de regime prisional, a interrupção do prazo para nova progressão é simples decorrência da interpretação sistemática da LEP, que, em seu art. 112, estabelece como requisito para a transferência a regime menos rigoroso, o cumprimento pelo apenado de ao menos 1/6 (um sexto) da pena no regime anterior. Jurisprudência pacífica do STF e do STJ. - PERDA DOS DIAS REMIDOS. A remição não constitui direito adquirido do apenado, mas mera expectativa de direito sujeita à cláusula rebus sic stantibus, passível de revogação. Constitucionalidade do art. 127 da LEP assentada pelo STF. Súmula Vinculante nº 9. Mantida a decretação de perda de 1/3 dos dias remidos. Agravo desprovido. (Agravo de Execução Penal, Nº 70083607317, Oitava Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Dálvio Leite Dias...

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