Acórdão nº 52363342220218217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Nona Câmara Cível, 24-06-2022

Data de Julgamento24 Junho 2022
ÓrgãoDécima Nona Câmara Cível
Classe processualAgravo de Instrumento
Número do processo52363342220218217000
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002185854
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

19ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Agravo de Instrumento Nº 5236334-22.2021.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Compra e venda

RELATOR: Desembargador MARCO ANTONIO ANGELO

AGRAVANTE: HOSPITAL SÃO VICENTE DE PAULO

AGRAVADO: ORTOMEDIC - COMERCIO E IMPORTACAO DE PROD. MEDICOS HOSPITALARES LTDA.

RELATÓRIO

Trata-se de agravo de instrumento interposto por HOSPITAL SÃO VICENTE DE PAULO em face de decisão prolatada na ação monitória movida por ORTOMEDIC - COMERCIO E IMPORTACAO DE PROD. MEDICOS HOSPITALARES LTDA., com o seguinte conteúdo (Evento 59 do processo de origem):

Vistos.

Afasto a alegação de prescrição arguida pela parte ré (Evento 13), haja vista que, em que pese o aduzido pela parte, o fato é que, após a emissão das notas fiscais objeto da ação, a parte autora esteve diligenciando na cobrança extrajudicial dos débitos, o que ocorreu entre os anos de 2017 a 2020, tendo as partes, inclusive, entrarado em tratativas visando o pagamento dos valores, consoante documentação acostada com a inicial, o que, todavia, não se consumou.

Assim, pois, tem-se que houve a interrupção do prazo prescricional, à luz do disposto no art. 202, inc. VI, do CC, de modo que, desde tal período até o ajuizamento da ação não decorreu o prazo prescricional.

Já no que diz respeito à impugnação ao valor cobrado, tem-se que tal diz respeito ao mérito da ação, devendo, assim, ser objeto de análise quando do julgamento da ação.

Nesse tocante, aliás, consigno, por oportuno, que a parte ré/embargante, em que pese tal alegação, não postulou a produção de provas, em que pese lhe tenha sido oportunizada a produção, não tendo a parte se manifestado a respeito, consoante certidão do Evento 37.

Intimem-se.

Após, cadastre-se o feito para sentença.

Dil. legais.

A parte ré-embargante HOSPITAL SÃO VICENTE DE PAULO, por suas razões de agravo de instrumento, insurge-se contra a rejeição da prejudicial de prescrição. Aduz que inexiste ato de reconhecimento do débito a ensejar interrupção do prazo prescricional. Suscita incidência de prazo quinquenal, referindo que as notas fiscais que embasam a ação monitória datam de 2014 e 2015 e a ação foi ajuizada em 20.09.2020, quando já transcorrido o lapso de 05 (cinco) anos. Ao final, pugna pelo provimento do recurso para o fim de reconhecer a prescrição.

Foram apresentadas contrarrazões (Evento 13 deste recurso).

Cumprido o disposto nos artigos 931, 934 e 935 do CPC.

É o relatório.

VOTO

PRESCRIÇÃO. INTERRUPÇÃO.

Conforme a lição de Araken de Assis1, a respeito da liquidez dos títulos:

“Note-se que liquidez, nos títulos extrajudiciais e judiciais, se traduz na simples determinabilidade do valor (quantum debeatur) mediante cálculos aritméticos. Como se infere do art. 475-B, caput, do CPC, a liquidez se configurará mediante simples apresentação de planilha explicitando principal e assessórios”.

No mesmo sentido, José Augusto Delgado e Luiz Manoel Gomes Júnior2, ao tratar da prescrição, refere:

“Tal requisito – liquidez – é “(...) predicativo intimamente relacionado com o de certeza, seu pré-requisito necessário. (...) No dizer de Pontes de Miranda, ‘o crédito diz-se líquido (ou diz-se líquida a dívida) quando, além de claro e manifesto (= efficere claram et manifestam probationem debiti), dispensa qualquer elemento extrínseco para se lhe saber o importante (non requiratur aliquot extrinsecus ad probandum). Sabe-se que é e o que é (...)”.

Na lição de Humberto Theodoro Júnior 3:

“Considera-se líquida a obrigação certa quanto à sua existência e determinada quanto ao seu objeto. Quando o crédito consta de instrumento público ou de documento particular e é líquida, porque sua existência e seu objeto se acham definidos documentalmente, a prescrição é aplicável à pretensão do respectivo titular sujeita-se ao prazo de cinco anos (art. 206, §5º, I)”.

Na hipótese dos autos, as partes celebraram negócio jurídico consubstanciado na compra e venda de próteses para aplicação nos pacientes da entidade hospitalar demandada.

Os valores estão expressos em notas fiscais, com datas de emissão entre 16.09.2014 e 11.05.2015 (doc. "NFISCAL6" do Evento 01 do processo de origem).

Assim, incide ao caso o prazo prescricional de cinco anos, conforme dispõe expressamente o inciso I do §5º do art. 206 do CCB:

Art. 206. Prescreve:

[...]

§ 5o Em cinco anos:

I - a pretensão de cobrança de dívidas líquidas constantes de instrumento público ou particular;

Nesse sentido, transcrevo:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO MONITÓRIA. CÉDULA DE PRODUTO DE CRÉDITO. AGRAVO RETIDO. CDC. ILEGITIMIDADE PASSIVA. AVALISTA. DEVEDOR SOLIDÁRIO. EXPRESSA PREVISÃO NO TÍTULO. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. ART. 700, CPC. PROVA ESCRITA SEM EFICÁCIA DE TÍTULO EXECUTIVO. SENTENÇA REFORMADA. SUCUBÊNCIA. AGRAVO RETIDO: APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR: É possível considerar a relação existente entre as partes como de consumo na medida em que o débito tem origem em dívida não quitada de Cédula de Crédito emitida junto à Cooperativa autora para fins de financiamento e aquisição de produtos para a lavoura. Logo, a relação existente autoriza seja aplicado o que dispõe a regra contida no Código de Defesa do Consumidor, cuja condição de cooperado não mascara uma compra e venda que se iguala com a de terceiras pessoas estranhas à cooperativa. Agravo retido não provido. APELAÇÃO: CÉDULA DE PRODUTO RURAL. LEGITIMIDADE PASSIVA DO AVALISTA E DEVEDOR SOLIDÁRIO: No caso concreto, a Sucessão de Nélio Antônio Frigo subscreveu a Cédula de Produto Rural na qualidade de avalista e responsável solidário pelo crédito nela consubstanciado, devido à Cooperativa apelante. A utilização do conectivo "E" - expressamente disposto no texto da cláusula transcrita - leva a inarredável conclusão de que a parte apelada responde pela dívida na qualidade de avalista e devedor solidário, razão pela qual ostenta legitimidade passiva ad causum. Precedentes do STJ desta Corte. Recurso provido. Sentença reformada. PRESCRIÇÃO: A parte autora ajuizou ação monitória buscando a constituição de título executivo judicial em 16.07.2012, dentro do prazo de cinco anos de que dispunha a contar da data do vencimento da última parcela (art. 206, §3º, III, do CCb), fato ocorrido em 31.03.2009, razão pela qual não se implementou o prazo quinquenal (GRIFEI). AÇÃO MONITÓRIA: Apreciação do mérito da lide com base no art. 1.013, §3º, do CPC, face causa madura. A ação monitória pode ser instruída com qualquer documento que constitua prova escrita da obrigação exigida, desde que apta a assegurar sua existência e autenticidade e seja o título apresentado desprovido de eficácia executiva. Restou demonstrada prova escrita a que alude o artigo 700 do CPC, correspondente aos serviços prestados, via notas fiscais anexados aos autos (GRIFEI). Incumbe à parte requerida demonstrar prova mínima de fato impeditivo do direito da autora, a despeito da aplicação do CDC ao caso dos autos, ônus que não se incumbiu. A parte demandada/apelada limitou-se a tecer argumentos no sentido da dificuldade da quitação do débito em razão da crise no setor orizícola, mais especificamente em relação a "dificuldade de comercialização dos produtos", "frustração de safras por fatores adversos" e "ocorrências prejudiciais ao desenvolvimento das explorações", formulando pedido de parcelamento, mas tais fundamentos não são idôneos a afastar a responsabilidade pela dívida, em especial quando não há nenhuma alegação de irregularidade na constituição do título que consubstancia a dívida. Ação monitória julgada procedente. SUCUMBÊNCIA: Invertida e redimensionada, de responsabilidade exclusiva da parte ré/apelada. Exigibilidade suspensa em razão do benefício da gratuidade judiciária. NEGARAM PROVIMENTO AO AGRAVO RETIDO E DERAM PROVIMENTO AO APELO. (Apelação Cível, Nº 50004411120128210002, Décima Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Eduardo João Lima Costa, Julgado em: 08-04-2022)

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO MONITÓRIA. NOTAS FISCAIS. Gratuidade judiciária concedida ao embargante. O prazo para o ajuizamento de ação monitória fundada em nota fiscal é de cinco anos, consoante art. 206, § 5º, I, do Código Civil brasileiro. Prescrição da pretensão reconhecida, salvo quanto a um dos títulos, cujo débito não é negado. Ação parcialmente procedente. Sucumbência carreada à autora. APELAÇÃO PARCIAMENTE PROVIDA.(Apelação Cível, Nº 70081320988, Décima Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Antônio Maria Rodrigues de Freitas Iserhard, Julgado em: 23-10-2019)

Outrossim, a existência de ato inequívoco do devedor que importe reconhecimento do direito enseja interrupção do prazo prescricional.

Consoante prevê o inciso VI do art. 202 do Código Civil:

Art. 202. A interrupção da prescrição, que somente poderá ocorrer uma vez, dar-se-á:

[...]

VI - por qualquer ato inequívoco, ainda que extrajudicial, que importe reconhecimento do direito pelo devedor.

Na lição de Silvio Rodrigues4:

Mostrei que a suspensão da prescrição independe de um comportamento ativo das partes, poiss é a lei que a determina, de maneira que opera automaticamente. Os casos de interrupção da prescrição, entretanto, envolvem, em regra, uma atitude deliberada do credor. Essa atitude só é dispensada quando, em virtude de um comportamento inequívoco do devedor, reconhecendo a plenitude do direito daquele, torna-se supérfluo interromper a prescrição.

O art. 202 do Código Civil enumera seis diferentes atos pelos quais se interrompe a prescrição. Os cinco primeiros dependem da iniciativa do credor e o derradeiro a dispensa, por supérflua, em virtude do reconhecimento induvidável da relação jurídica do devedor.

E continua o autor5:

Finalmente, interrompe a prescrição qualquer ato inequívoco, ainda que...

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