Acórdão nº 52367419120228217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Nona Câmara Cível, 10-03-2023

Data de Julgamento10 Março 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualAgravo de Instrumento
Número do processo52367419120228217000
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoDécima Nona Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003342526
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

19ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Agravo de Instrumento Nº 5236741-91.2022.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Condomínio em edifício

RELATOR: Desembargador EDUARDO JOAO LIMA COSTA

AGRAVANTE: CONDOMINIO RESIDENCIAL QUINTA DO VALE

AGRAVADO: CONSTRUTORA ACPO LTDA

AGRAVADO: MARCIO SEBAJE PINHEIRO

RELATÓRIO

Trata-se de agravo de instrumento interposto por CONDOMÍNIO RESIDENCIAL QUINTA DO VALE em relação à decisão que reconheceu a ilegitimidade passiva da Construtora ACPO, nos autos do cumprimento de sentença nº 50293569220218210022 ajuizada contra MÁRCIO SEBAJE PINHEIRO.

Refere que o agravado Márcio Pinheiro não é mais proprietário do imóvel objeto da dívida condominial; e o fato de a Construtora ACPO não ter participado da fase de conhecimento não modifica seu direito de ver a penhora do imóvel gerador do débito exigido no cumprimento de sentença.

Sustenta que iniciar novo processo de conhecimento acarretará em prescrição do direito, destacando a natureza da dívida que é propter rem.

Cita o artigo 1.345 do Código Civil.

Colacionando jurisprudência.

Postula a modificação da decisão, requerendo seja a proprietária registral mantida no polo passiva da demanda.

Houve preparo (evento 4),

Intimada, a Construtora ACPO ofertou contrarrazões (evento 13), mas silenciando o executado Márcio Pinheiro.

Vieram os autos conclusos para julgamento.

É o relatório.

VOTO

O recurso preenche os requisitos da admissibilidade.

Objetiva o condomínio agravante reforma a decisão que reconheceu a ilegitimidade passiva da Construtora ACPO relativamente à dívida condominial executada. Transcrevo:

CONSTRUTORA ACPO LTDA apresentou impugnação ao cumprimento de sentença que lhe move CONDOMINIO RESIDENCIAL QUINTA DO VALE.

Analisando os autos, verifica-se que a impugnação não obedeceu o prazo previsto no artigo 525 do CPC haja vista que o mandado de intimação foi cumprido em 31/03/2022 (ev. 19), e a peça processual foi apresentada somente em 16/05/2022 ( ev. 28).

Em que pese a intempestividade mencionada, verifica-se ainda que a impugnante CONSTRUTORA ACPO LTDA não fez parte no processo de conhecimento.

Pois bem.

Considerando que na impugnação o tema alusivo à ilegitimidade passiva ad causam foi suscitado, impõe-se sua análise haja vista que tratar de matéria que pode ser objeto de análise em qualquer grau de jurisdição, podendo inclusive ser reconhecida de ofício.

Isso posto, reconheço a ilegitimidade passiva da Construtora ACPO Ltda, por não ter sido parte no processo de conhecimento, e por isso, não pode ser acionada na fase de cumprimento de sentença conforme regra do art. 513, § 5º do CPC.

Outrossim, diante da mencionada intempestividade da impugnação, recebo a mesma como simples petição nos autos, restando prejudicada a análise dos demais pedidos.

Proceda-se a exclusão do polo passivo da Construtora ACPO.

O processo prosseguirá somente em relação a Marcio Sebaje Pinheiro, devendo o condomínio credor se manifestar sobre o prosseguimento em 15 dias.

Diligências legais.

Reproduzo os fatos expostos pela parte agravante para justificar que a empresa agravada responda pela dívida condominial (evento 1, INIC1):

A) Não restam dúvidas que o agravado MARCIO não é mais proprietário do imóvel com dívida condominial;

B) Não há dúvidas que a atual proprietária do imóvel e da divida propter rem é a agravada ACPO; C) O fato da agravada ACPO não ter participado da fase de instrução processual, não altera o direito do ora agravante, ademais, caso seja reconhecida sua ilegitimidade passiva, teremos duas situações de grande insegurança jurídica, vejamos:

1 – Iniciar novo processo de conhecimento acarretaria em prescrição do direito a cobrança judicial de parte da dívida;

2 – Restaria juridicamente legalizada a prática de troca de propriedade sem observância da natureza da dívida (propter rem) bastando que o proprietário do imóvel seja alterado para a dívida não mais existir ou simplesmente prescrever.

Concluiu o condomínio agravante com o seguinte pedido:

Desta feita o agravante não concorda com a r. decisão, e requer a mesma seja reformada, para que seja deferida a manutenção da proprietária registral do imóvel ACPO e que seja reconhecida sua responsabilidade sobre a dívida condominial.

A solução do recurso aviado pelo condomínio credor requer distinção para compreensão das consequências de eventual responsabilidade da construtora agravada.

Em outubro de 2018 o Condomínio Quinta do Vale ajuizou ação de cobrança contra Márcio Sebaje Pinheiro, face dívida condominial de R$ 6.642.35, que foi gerada pelo apartamento 304, D, de propriedade daquele em fevereiro de 2016 (evento 1 - 3, fl. 03).

Após citado, foi decretada a revelia do proprietário do imóvel (evento 1 - 1, fl. 07) e julgado procedentes os pedidos (evento 1 - 1, fl. 09), cuja sentença transitou em julgado em 19 de novembro de 2019 (evento 1 - 1, fl. 10).

Pois bem.

Iniciado cumprimento de sentença, sobreveio informação de que o contrato de compra e venda firmado entre a Construtora ACPO e o comprador Márcio foi objeto de distratado em 25 de setembro de 2020, retornando à propriedade da construtora (evento 1 - 2, fl. 07).

Nesta circunstância, houve o pedido de direcionamento do cunprimento de sentença em desfavor da Construtora ACPO (evento 1, INIC1).

Sobreveio, o pronunciamento judicial recorrido que reconheceu da ilegitimidade passiva da construtora, eis que não participante da ação de cobrança.

Transparece que o pedido em cumprimento de sentença merece duplo olhar, conforme anteriormente alertado.

Evidentemente, a Construtora ACPO não poderá ser considerada parte legítima passiva para responder pela integralidade da dívida em discussão, pois o crédito em favor do condomínio se desdobra no débito condominial que acompanha o imóvel e a sucumbência relativa ao feito originário.

Portanto, em razão de não ter sido parte passiva na ação de cobrança, a construtora não poderá ser responsabilidade pelos encargos de sucumbência daquela lide, o que justifica sua alegação de parte ilegítima passiva. Aliás, não há título executivo judicial contra a agravada neste particular.

Noutro ponto, o valor da dívida condominial, face natureza propter rem, acompanha o imóvel gerador do encargo a ser quitado. E nisto o proprietário do imóvel se insere como parte interessada para defesa do bem e lisura do crédito em cobrança, inclusive em verdadeira legitimidade passiva.

Ocorre que a natureza da obrigação que é propter rem, ou seja, segue o bem originário, forma de impedir que sociedade condominial, composta por pessoas com obrigações idênticas, não sofra com alterações pelas quais não têm ingerência.

No caso, o distrato ocorreu após o trânsito em julgado da sentença apenas tomando conhecimento o condomínio quando do cumprimento de sentença. E considerando que a dívida segue o imóvel, necessário o reconhecimento de ser a construtora agravada legítima para intervir/figurar no pedido de cumprimento de sentença em razão da possibilidade de penhora do apartamento gerador da dívida condominial.

O Recurso Especial nº 1.696.704, julgado em setembro de 2020, pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, tendo como Relatora a Ministra Nancy Andrighi, admite da possível penhora de imóvel que esteja na propriedade de terceiro que não participou da lide originária em extensa fundamentação:

DIREITO PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE COBRANÇA. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO, CONTRADIÇÃO OU OBSCURIDADE. NÃO OCORRÊNCIA. DÉBITOS CONDOMINIAIS. PROPRIETÁRIA DO BEM QUE NÃO FIGUROU COMO PARTE NA AÇÃO DE COBRANÇA ORIGINÁRIA. LEGITIMIDADE PASSIVA NO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. ACORDO FEITO PELO MUTUÁRIO COM O CONDOMÍNIO. OBRIGAÇÃO PROPTER REM.

1. Ação ajuizada em 19/01/1998. Recurso especial concluso ao gabinete em 29/09/2017. Julgamento: CPC/73.

2. Ação de cobrança, já em fase de cumprimento de sentença, em virtude da inadimplência no pagamento de cotas condominiais.

3. O propósito recursal, a par de analisar acerca da ocorrência de negativa de prestação jurisdicional, é definir se a proprietária do imóvel gerador dos débitos condominiais tem legitimidade para figurar no polo passivo do cumprimento de sentença, ainda que alegue figurar apenas como promitente vendedora do imóvel e ainda que o mutuário/ocupante do imóvel tenha firmado acordo diretamente com o Condomínio, responsabilizando-se pelo pagamento da...

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