Acórdão nº 52391394520218217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Segunda Câmara Cível, 31-01-2022

Data de Julgamento31 Janeiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualConflito de competência
Número do processo52391394520218217000
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoSegunda Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001563169
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

2ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Conflito de Competência (Câmara) Nº 5239139-45.2021.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Consulta

RELATOR: Desembargador JOAO BARCELOS DE SOUZA JUNIOR

SUSCITANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

SUSCITADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

Trata-se de conflito negativo de competência suscitado pela Juiz de Direito do Juizado Especial Cível do Foro da Comarca de Cachoeira do Sul em face da Juíza de Direito do Juizado da Infância e da Juventude do mesmo Foro (fls. 198-198v).

Em suas razões o Magistrado suscitante sustentou, resumidamente, que embora esteja pendente de julgamento o Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas nº 24, no mesmo restou evidenciado que o entendimento majoritário desta Corte e do STJ é no sentido de que os pedidos de tratamento médico de criança e adolescente são de competência do Juizado da Infância e Juventude. Disse que caso não seja julgado de plano o conflito de competência, deve ser determinado que as medidas de urgência sejam apreciadas pela Juíza suscitada. Concluiu requerendo seja reconhecida como competente para analisar e julgar os pedidos da parte autora a Juíza do Juizado da Infância e Juventude (adjunto á Segunda Vara Criminal).

A Juíza suscitada apresentou informações (evento nº 11). Esclareceu que, em razão da decisão proferida nos autos do recurso de apelação nº 5002618-86.2019.8.21.0006/RS, da 22ª Câmara Cível desta Corte, foi desconstituída a sentença exarada pelo Juizado da Infância e da Juventude do Foro de Cachoeira do Sul sob o fundamento de que a competência seria do Juizado Especial Cível do mesmo Município.

O Ministério Público exarou parecer opinando pela procedência do conflito negativo de competência (evento nº 14).

Vieram os autos conclusos.

É o relatório.

VOTO

Inicialmente verifico que André Nicolás Sortica Tavares, menor impúbere, representado por sua genitora, ajuizou em 24/08/2021 ação ordinária contra o Instituto de Assistência à Saúde dos Servidores Públicos do Rio Grande do Sul - IPE-Saúde. Pleiteou o seguinte (evento nº 01 dos autos de origem - INIC1):

a) a concessão de medida liminar em sede de tutela de urgência, determinando ao requerido que promova a autorização e custeio do tratamento multidisciplinar pelo método DENVER ao requerente, bem como a 3 (três) sessões semanais de fonoaudióloga, junto a profissional que já o acompanha e a qual o menor conhece e confia no prazo de 15 (quinze) dias, ou alternativamente seja responsabilizado pelo pagamento dos tratamentos, estabelecendo multa diária por descumprimento;

b) o início das terapias tão logo seja concedida a tutela pleiteada, vez que a demora em iniciá-las traz prejuízos unicamente ao menor;

c) a citação do requerido para querendo contestar a presente no prazo legal;

d) a apresentação do contrato entabulado entre as partes;

e) a PROCEDÊNCIA do pedido confirmando a liminar pleiteada, e condenando o requerido a fornecer o tratamento ao requerente, com a única profissional responsável pelo método Denver na cidade, bem como o custeio de fonoaudióloga 3 (três) vezes na semana com a profissional que o acompanha, ante a confiança adquirida nesta enquanto necessitar, ou alternativamente faça o custeio deste;

f) A PROCEDÊNCIA da ação compelindo o requerido ao custeio das consultas com o médico neuropediatra;

Foi deferido o pedido de concessão de tutela de urgência (evento nº 06 dos autos de origem).

Em 22/11/2021 a Juíza do Juizado da Infância e Juventude adjunto da 2ª Vara Criminal da Comarca de Cachoeira do Sul declinou da competência para o Juizado Especial da Fazenda Pública (evento nº 96 dos autos de origem), o que originou o conflito de competência em análise.

Dito isto, em pesquisa no sistema EPROC observo que o autor André Nicolás Sortica Tavares não é parte no processo nº 5002618-86.2019.8.21.0006/RS, citado pela Juíza suscitada como razão para declinada da competência.

Necessário dizer que, quando do exame da admissibilidade do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas - IRDR nº 23 (processo nº 70084442060), que busca definir a competência da Vara Cível (onde não há especialização)/Vara de Fazenda Pública, ou do Juizado da Infância e Juventude para analisar e julgar os casos em que se discute o direito à saúde de crianças e adolescentes, restou constatada a existência de precedentes desta Corte divergentes quanto à competência absoluta para analisar processos envolvendo a matéria.

No entanto, o fato de existir alguma decisão judicial desta Corte, sem efeito vinculante, não torna obrigatória a declinação de competência.

A ementa do acórdão que admitiu referido IRDR nº 23 restou assim redigida:

INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS. JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE. PROCESSOS ENVOLVENDO DIREITO À SAÚDE E À EDUCAÇÃO DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES. COMPETÊNCIA.

1. Conforme vem entendendo o Superior Tribunal de Justiça (AgInt no CC 147.784/PR), o IRDR segue o procedimento chamado modelar, que não existe a necessidade de vínculo a um caso concreto ou procedimento de casos-padrão.

Ademais, o disposto no parágrafo único do art. 978 do CPC somente é aplicável caso o IRDR seja admitido antes do julgamento do recurso que o originou, o que não é o caso dos autos. Enquanto não admitido, a mera interposição do IRDR não gera qualquer efeito.

Ainda, cabe ressaltar que o enunciado da Súmula nº 46 desta Corte Estadual de Justiça foi cancelado em 20/08/2019, pela Primeira Turma Cível. Assim, ainda que o recurso que originou o IRDR em análise (agravo de instrumento nº 70084299874) tenha sido julgado em 05/02/2021, tal fato não obsta sua admissão.

2. No caso, a parte proponente comprovou a existência de um número representativo de demandas individuais discutindo a mesma questão de direito controvertida, relativa à competência para analisar e julgar processos envolvendo direito à saúde de crianças e adolescentes. Assim, restou atendido o requisito do art. 976, I, do CPC.

3. O mesmo não se verificou quanto aos casos envolvendo direito à educação de crianças e adolescentes, sendo pacífico nas Câmaras deste Tribunal e Turmas Recursais que a competência seria do Juizado da Infância e Juventude.

4. Também restou demonstrado que as questões a serem debatidas (envolvendo direito à saúde) são capazes de causar insegurança jurídica, caso venham a coexistir decisões conflitantes em processos idênticos.

5. Embora as questões objeto do Tema Repetitivo nº 1058 do STJ e das Controvérsias nº 93 e 164 daquela Corte Superior se aproximem da matéria dos autos, não se verifica incidir no caso o óbice do parágrafo 4º do art. 976 do CPC.

6. Importante ressaltar que em 12/03/2021 foi admitido o IRDR nº 70083806190, cuja discussão envolve a “necessidade de uniformizar a jurisprudência desta Corte quanto à possibilidade de incapazes figurarem como parte autora perante o Juizado Especial da Fazenda Pública”. Assim, como as crianças e adolescentes menores de 16 anos são consideradas incapazes e os menos de 18 anos são considerados relativamente incapazes, nos termos dos artigos e do CC, referido IRDR abrange parte da discussão destes autos.

Por consequência, o debate sobre a competência dos Juizados Especiais da Fazenda Pública para analisar e julgar processos envolvendo matéria atinente à saúde de criança e adolescente não pode ser objeto do presente IRDR.

7. Presentes os pressupostos exigidos pelo art. 976 do CPC, deve ser admitido em parte o Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas em exame, somente para fins de definir a competência da Vara Cível (onde não há especialização)/Vara da Fazenda Pública, ou do Juizado da Infância e Juventude para analisar e julgar os casos em que se discute o direito à saúde de crianças e adolescentes.

INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS ADMITIDO EM PARTE. UNÂNIME.

No dispositivo do acórdão restou determinado o seguinte:

a) seja informada a egrégia Presidência, solicitando-lhe que sejam adotadas as providências necessárias para a ampla divulgação e publicação exigidas no art. 979 do CPC, com a respectiva transmissão da informação ao Colendo Conselho Nacional de Justiça, também para divulgação e inclusão no respectivo cadastro eletrônico;

b) concomitantemente, ainda por determinação da egrégia Presidência, sejam adotadas as providências para a comunicação eletrônica a todos os juízos vinculados ao Tribunal do sobrestamento, pelo prazo de até um ano, dos processos que tenham por fundamento o “direito da criança e do adolescente à saúde”, ainda que cumulado com outros pedidos.

Na referida comunicação deverá constar...

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