Acórdão nº 52464829220218217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Nona Câmara Cível, 24-06-2022

Data de Julgamento24 Junho 2022
ÓrgãoDécima Nona Câmara Cível
Classe processualAgravo de Instrumento
Número do processo52464829220218217000
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002240290
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

19ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Agravo de Instrumento Nº 5246482-92.2021.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Direito de Vizinhança

RELATOR: Desembargador MARCO ANTONIO ANGELO

AGRAVANTE: RESIDENCIAL MONTANA

AGRAVADO: SAMUEL GOLIN TOME

AGRAVADO: HUMBERTO VALERIO TOME (Espólio)

AGRAVADO: MARIA TERESA GOLIN TOME (Sucessor)

RELATÓRIO

Trata-se de agravo de instrumento interposto por RESIDENCIAL MONTANA, contra a decisão prolatada nos autos da ação demolitória ajuizada em face de SAMUEL GOLIN TOME, HUMBERTO VALERIO TOME e MARIA TERESA GOLIN TOME, com o seguinte conteúdo (Evento 96 do processo de origem):

Requereu a parte autora o deferimento de tutela de urgência para que o réu Samuel libere o acesso à unidade 901, na data de hoje, para que haja o atendimento aos chamados da direção do condomínio e se efetive a instalação do sistema de ancoramento dos cabos de segurança para o uso do jau para realização de obras de manutenção aprovada na assembleia de condôminos (evento 94 - ATA3). Requereu, também, a tutela inibitória, para que Samuel se abstenha de praticar qualquer ação impeditiva ao acesso à respetiva unidade nas datas ajustadas para a instalação do equipamento.

O pedido formulado pela autora no evento 94 é totalmente estranho à causa de pedir e pedidos da inicial, de sorte que não pode ser apreciado nesta ação, sob pena de decisão ultra petita, lembrando que a inicial (causa de pedir e pedidos) delimita a atuação jurisdicional no processo, inclusive em atenção ao princípio da correlação e da estabibilidade da demanda.

Assim, não conheço do pedido do evento 94, porquanto o pleito é estranho aos pedidos da inicial.

A parte-agravante RESIDENCIAL MONTANA, declinando suas razões de agravo de instrumento, insurge-se contra o pedido de tutela provisória incidental para que a parte-ré forneça acesso ao seu imóvel para instalação dos equipamentos de manutenção da fachada do edifício. Alega que o pedido está atrelado à causa de pedir formulada à inicial. Relata ter formulado pretensão demolitória em face dos réus diante da execução de reformas internas em sua unidade imobiliária sem a apresentação de estudos técnicos. Refere ter indicado, à inicial, que sua pretensão demolitória também se assenta no fato de que a estrutura construída pelos réus impede a instalação de equipamentos de segurança sobre o parapeito para manutenção externa do edifício. Aponta ter salientado, em sede de réplica à contestação, a ocorrência de fato superveniente, decorrente da impossibilidade de realizar obras reparadoras na fachada do edifício. Indica o aparecimento de infiltrações em imóveis situados abaixo do dos réus na área em que por eles instalada a estrutura objeto da pretensão demolitória, sendo necessária a realização de reparos na fachada do edifício. Refere que houve aprovação da ação reparatória em assembleia condominial, mas que os réus não franqueiam acesso ao imóvel para fixação dos equipamentos de segurança em razão da necessidade de que as esquadrias indevidamente instaladas permaneçam abertas durante o procedimento. Aduz que, se as alterações não houvessem sido realizadas ou se já houvessem sido desfeitas, não haveria problema e impedimento à realização dos reparos. Reitera que o pedido formulado está intrinsecamente ligado à causa de pedir da pretensão demolitória, sendo viável sua apreciação e solução neste mesmo procedimento. Aponta já ter adquirido os materiais para realização dos reparos, os quais possuem prazo de validade. Ao final, pugna pelo provimento do recurso para o fim de reformar a decisão agravada, determinando que a parte-ré se abstenha de impedir acesso ao seu imóvel nas datas ajustadas para instalação dos equipamentos de segurança necessários aos reparos da fachada do edifício mediante fixação de multa por descumprimento.

Recebido o recurso, houve indeferimento da antecipação da tutela recursal (Evento 07 deste recurso).

A parte-agravada apresentou contrarrazões (Evento 12 deste recurso).

Cumprido o disposto nos artigos 931, 934 e 935 do CPC.

É o relatório.

VOTO

O deferimento de tutela provisória de urgência é medida excepcional, motivo pelo qual pelo qual deve ser utilizada com a devida cautela.

A probabilidade do direito alegado associada ao perigo de dano ou ao risco ao resultado útil do processo são requisitos que devem ser preenchidos para o deferimento da referida medida.

A probabilidade do direito remete a sua plausibilidade de existência e suas chances de êxito de ser reconhecido – verossimilhança fática e plausibilidade jurídica.

Na lição de Fredie Didier Jr.1:

A probabilidade do direito a ser provisoriamente satisfeito/realizado ou acautelado é a plausibilidade de existência desse mesmo direito. O bem conhecido fumus boni iuris (ou fumaça do bom direito). O magistrado precisa avaliar se há “elementos que evidenciem” a probabilidade de ter acontecido o que foi narrado e quais as chances do êxito do demandante (art. 300, CPC). Inicialmente, é necessária a verossimilhança fática, com a constatação de que há um considerável grau de plausibilidade em torno da narrativa dos fatos trazida pelo autor. É preciso que se visualize, nessa narrativa, uma verdade provável sobre os fatos, indepentendemente da produção de prova. Junto a isso, deve haver uma plausibilidade jurídica, com a verificação de que é provável a subsunção dos fatos à norma invocada, conduzindo aos efeitos pretendidos.

Outrossim, necessária a existência de elementos que permitam inferir o perigo que a demora na prestação jurisdicional (periculum in mora) acarretará na efetividade da jurisdição e na eficaz realização do direito.

Especificamente acerca da urgência necessária ao deferimento da tutela prevista no art. 300, CPC, lecionam Luiz Guilherme Marinoni, Daniel Francisco Mitidiero e Sérgio Cruz Arenhart2:

4. Perigo na Demora. [...] A tutela provisória é necessária simplesmente porque não é possível esperar, sob pena de o ilícito ocorrer, continuar ocorrendo, ocorrer novamente, não ser removido ou de dano não ser reparado ou reparável no futuro. Assim, é preciso ler as expressões perigo de dano e risco ao resultado útil do processo como alusões ao perigo na demora. Vale dizer: há urgência quando a demora pode comprometer a realização imediata ou futura do direito.

Na hipótese dos autos, os requisitos legais para o deferimento da tutela de urgência não foram suficientemente preenchidos.

Pelo princípio da estabilidade objetiva da demanda as partes não podem alterar o pedido nem as questões e os fatos suscitados na petição inicial e na contestação.

Acerca do princípio da estabilidade objetiva da demanda, o jurista Rui Portanova refere o seguinte:

O princípio da consubstanciação é um desses limites que o interesse público que rege o processo impõe às partes. A liberdade das partes quanto aos fatos e aos pedidos constantes do processo sofre as limitações impostas em lei [...] tanto a consubstanciação como a adstrição do juiz ao pedido da parte se referem aos termos da ação, mas um é conseqüência do outro. A consubstanciação impede que as partes alterem a causa pedir e o pedido. Já a adstrição constrange o juiz aos limites que a imutabilidade impõe ao processo [...] Entendemos o princípio da substanciação como estabilidade objetiva da lide que opera seus efeitos tanto para o autor quanto para o réu [...] Em verdade, depois da citação as partes mantém plena disponibilidade, mas devem estar de acordo. Essa liberdade vai até o saneamento do processo. Depois desse ato, incide interesse público na estabilidade objetiva e material da demanda. Logo, em nenhuma hipótese serão permitidas alterações. [...] Quanto ao réu, o princípio geral do acesso à justiça (também chamado disponibilidade) informa a ampla defesa. Na contestação, o réu pode alegar o que entender conveniente para defender-se. Depois disso, os termos da lide estabilizam-se 3(grifo meu).

Ora, conforme o Princípio da Eventualidade, as partes têm obrigação de produzir, de uma só vez, todas as alegações e requerimentos nas fases processuais correspondentes, ainda que as razões sejam excludentes e incompatíveis umas com as outras4.

Em relação ao dever de indicar os fatos a partir dos...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT