Acórdão nº 52476641620218217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Primeira Câmara Criminal, 27-01-2022

Data de Julgamento27 Janeiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualHabeas Corpus
Número do processo52476641620218217000
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001533311
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

1ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Habeas Corpus (Câmara) Nº 5247664-16.2021.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Crimes de Tráfico Ilícito e Uso Indevido de Drogas (Lei 11.343/06)

RELATOR: Desembargador HONORIO GONCALVES DA SILVA NETO

PACIENTE/IMPETRANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

IMPETRADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

Trata-se de habeas corpus com pedido liminar impetrado em prol de MARIELE DE OLIVEIRA, presa preventivamente, acusada da prática dos delitos de tráfico de drogas e associação para o tráfico.

Alega, preliminarmente, a não realização de audiência de custódia. No mérito, em síntese, constrangimento ilegal em decorrência da ausência dos requisitos da prisão preventiva. Refere que a decisão que decretou a medida não trouxe fundamento concreto apto a justificar-lhe a necessidade. Menciona condições pessoais favoráveis da paciente, apontando ser primária e ostentar residência fixa e trabalho lícito.Sustenta a possibilidade de aplicação de medidas cautelares diversas. Ao final, requer a concessão da ordem para que seja a paciente posta em liberdade.

Indeferida a liminar e dispensadas as informações, manifestou-se o Ministério Público pela denegação da ordem.

VOTO

Vê-se suscitar o impetrante, por primeiro, a nulidade da prisão ao argumento da não realização de audiência de custódia.

Ocorre que a prisão preventiva constitui título executivo autônomo, cujos fundamentos e requisitos de validade não incluem a prévia realização daquele ato, vinculados, por força de lei, ao que dispõem os arts. 312 e 313 do Código de Processo Penal (STJ; HC 598.525/BA)1, de modo que a conversão do flagrante em prisão preventiva torna superada a alegação de nulidade relativamente à falta de audiência de custódia (STJ; RHC 117.991/RS)2.

De salientar que tal orientação foi recentemente positivada pela Lei n.º 13.964/2019, que alterou o artigo 310 do Código de Processo Penal, para fazer constar, no § 4º, que a não realização de audiência de custódia não prejudica “a possibilidade de imediata decretação de prisão preventiva”3.

Nesse sentido, confira-se trecho do voto condutor do HC 605.317/SC, de Relatoria do Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, julgado no dia 19 de setembro de 2020:

Quanto à alegação de ilegalidade pela não realização de audiência de custódia, não se ignora que a alteração promovida pela Lei nº 13.964/19 ao art. 310 do Código de Processo Penal fixou o prazo máximo de 24 horas da prisão para a realização da formalidade, sob pena de tornar a segregação ilegal. Entretanto, a nova redação do § 4º do referido artigo ressalva a possibilidade de que, constatada a ilegalidade da custódia, seja imediatamente decretada nova prisão.

A previsão legal converge, portanto, em termos práticos, com o entendimento jurisprudencial pacífico nesta Corte, no sentido de que "a conversão do flagrante em prisão preventiva torna superada a alegação de nulidade relativamente à falta de audiência de custódia" (RHC 117.991/RS, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 17/12/2019, DJe 19/12/2019).

Ademais, convém atentar que a norma foi suspensa por decisão liminar proferida pelo Exmo. Min. Luiz Fux ,nos autos da Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 6.305, do Distrito Federal, prevalecendo, portanto, por ora, entendimento jurisprudencial estabelecido.

Afigura-se evidente, pois, que a ausência de audiência de custódia constitui irregularidade que não tem o efeito de afastar a prisão preventiva imposta (STF; HC 1608.65/RS)4.

Anoto, por segundo, que a questão atinente ao envolvimento - ou não -da paciente com o crime que lhe é imputado, ventilada pelo impetrante, não é passível de exame na via estreita do habeas corpus, de sumária cognição, merecendo registro que, no caso vertente, os suficientes indícios de autoria encontram-se consubstanciados nas declarações prestadas pelos policiais responsáveis pelo flagrante.

Quanto ao mais, colhe-se que agentes policiais, em cumprimento a mandado de busca e apreensão na residência de número 43 da Vila Verde, judicialmente expedido, após investigação apontar se tratar de ponto de traficância, dirigiram-se ao local, onde se encontravam a paciente e os coflagrados Daniela e Giovane, e apreenderam quarenta e duas porções de maconha, pesando aproximadamente 122g; quinze porções de cocaína, pesando aproximadamente 10g; quatro porções de crack, pesando aproximadamente 0,5g; cinco aparelhos de telefonia móvel; cadernos com anotações de tráfico; e a importância de R$829,90, fracionada em notas diversas.

Nesse contexto, recebidos os autos (5001825-07.2021.8.21.0127/RS), a autoridade inquinada de coatora homologou o flagrante e, com representação da autoridade policial e requerimento do Ministério Público, converteu a prisão em flagrante de MARIELE DE OLIVEIRA em preventiva (EVENTO 12), na forma do artigo 310, inciso II, do Código de Processo Penal, em decisão que traz adequada fundamentação, fazendo alusão às circunstâncias que envolveram a prática do crime e trazendo argumentos plausíveis para a implementação da medida, como forma de garantia da ordem pública, verbis:

Vistos em regime de plantão.

1. De acordo com o artigo 310 do Código de Processo Penal, com a redação que lhe foi dada pela Lei n. 13.964/2019, o juiz, após receber o auto de prisão em flagrante, no prazo máximo de 24 horas após a realização da prisão, deverá realizar audiência de custódia, ato no qual deverá, fundamentadamente: “I - relaxar a prisão ilegal; II - converter a prisão em flagrante em preventiva, quando presentes os requisitos constantes do artigo 312 deste Código, e se revelarem inadequadas ou insuficientes as medidas cautelares diversas da prisão; ou III - conceder liberdade provisória, com ou sem fiança”.

Registre-se, nos termos do que estabelece a Recomendação n. 07/2020-CGJ, que, diante do teor do informado pela SUSEPE, através do Ofício n. 086/2020-PESM, resta, por ora, inviabilizada a realização de audiência de custódia presencial.

A realização de audiência de custódia por videoconferência tampouco exsurge viável durante o plantão regional, em virtude da impossibilidade de observância aos requisitos técnicos previstos na resolução 357/2020-CNJ, na forma do que estabelece a Resolução 1321/2020-COMAG, ainda, diante da insuficiência da estrutura prisional para que haja deslocamento de presos no interior do estabelecimento, com acompanhamento de agentes de segurança.

É de ser observado, assim, o procedimento previsto na Recomendação n. 62/2020 do CNJ.

As fotografias dos flagrados colacionadas aos autos não revela a existência de lesões corporais aparentes. Ainda, os flagrados foram encaminhados previamente para realização de exame médico, cujo laudo instruiu o expediente e atesta a inexistência de lesõs corporais aparentes. Ao que se colhe, pois, inexiste qualquer ilegalidade a macular o presente auto de prisão em flagrante.

De todo o modo, deverá a casa prisional verificar a integridade física do flagrado através da equipe de saúde do própro estabelecimento prisonal e, caso verificada lesão corporal, encaminhá-lo para perícia.

2. Trata-se de auto de prisão em flagrante lavrado em desfavor de Giovane Fernando Borges, Daniela dos Santos e Mariele de Oliveira, pela prática, em tese, dos crimes de tráfico de entorpecentes e associação para o tráfico (artigos 33 e 35 da Lei n. 11.343/06).

A prisão em flagrante encontra respaldo constitucional (art. 5º, LXI, da CF) e para ser homologada pela autoridade judicial pressupõe a demonstração da tipicidade da conduta supostamente praticada pelo agente, da configuração de pelo menos uma das situações de flagrância (art. 302, do CPP) e da obediência às formalidades constitucionais e leis.

Na hipótese, a situação de flagrância encontra-se devidamente caracterizada (art. 302, inciso I, do CPP), com elementos convergentes para a tipicidade e autoria.

O laudo de constatação preliminar de natureza das substâncias apreendidas demonstra a existência do fato.

Com relação à autoria, de acordo com o relato prestado pelo condutor e demais policiais que atuaram no flagrante, em cumprimento a mandado de busca e apreensão na residência dos flagrados foram localizadas drogas diversas (crack, maconha e cocaína) em vários locais da casa (atrás do sofá, em cima de uma centrífuga ao lado da cama, em uma caixa sobre o rack), além de dinheiro, cinco telefones celulares, objetos sem procedência a três cadernos com anotações.

Em seus interrogatórios, os flagrados reservaram-se ao direito de permanecer em silêncio.

O auto de apreensão revela que, no total, foram apreendidas 122g de maconha, divididas em 42 porções, 10g de cocaína, divididas em 15 porções, e 0,50g de crack, divididas em 04 unidades, além de R$ 828,90 em dinheiro.

O mandado de busca e apreensão que instruiu o expediente, outrossim, demonstra que houve expressa menção ao cumprimento no endereço em que localizados os flagrados.

Reunidos tais elementos, verifica-se que há indícios suficientes de autoria.

Foram observados, outrossim, os pressupostos...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT