Acórdão nº 52480986820228217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Sexta Câmara Criminal, 31-01-2023

Data de Julgamento31 Janeiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualHabeas Corpus
Número do processo52480986820228217000
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoSexta Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003199471
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

6ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Habeas Corpus (Câmara) Nº 5248098-68.2022.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Estelionato (art. 171)

RELATOR: Desembargador JOSE RICARDO COUTINHO SILVA

PACIENTE/IMPETRANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

IMPETRADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

Trata-se de habeas corpus, com pedido de liminar, impetrado por OLADIPUPO IBRAHIM AROLU OLAOKE, em favor de MOSES OGEH FRIDAY, com prisão preventiva decretada em 18.10.2022, pela prática, em tese, do crime do art. 171, § 2º-A e § 4º, nove vezes, e art. 288, caput, ambos do Código Penal, conforme a capitulação da denúncia (processo 5042448-88.2022.8.21.0027/RS, evento 1, DENUNCIA1).

Em suas razões, aduz que a paciente teve sua prisão preventiva decretada em razão da prática do crime de estelionato, além de possível organização criminosa e lavagem de dinheiro, contra vítima idosa. Menciona que o paciente é pai solteiro e reside com seu filho menor de 12 anos e, com a decretação da prisão, além de ter afetado a rotina da criança, impede o exercício dos deveres com seu filho. Destaca que a reincidência não é motivo para decretação da prisão do paciente, que nunca foi condenado por um delito com violência, grave ameaça ou crime hediondo. Refere que, embora não esteja preso, demonstra boa-fé e requer a revogação da prisão, o que evidencia não ter a intenção de frustrar a lei penal e o interesse em não deixar seu filho em situação de vulnerabilidade. Menciona que, ao contrário do referido pelo juízo de origem, o paciente não foi condenado pelo crime de tráfico de drogas, não tendo sido localizado pela Polícia Federal para notificação da expulsão do país, o que demonstra a ausência de fundamentação da decisão proferida, salientando, ainda, que não há indicativo de que seja integrante de organização criminosa. Destaca a aplicabilidade do art. 318-A do Código de Processo Penal, pois, embora não seja mãe gestante, há interesse, no caso, do vulnerável. Pugna, ao final, pela concessão, já em liminar, de salvo-conduto, para que seja evitada a concretização de ameaça ao direito de locomoção do paciente, com posterior confirmação.

Indeferida a liminar, foi dispensada a prestação de informações (evento 4, DESPADEC1).

A Procuradoria de Justiça se manifestou pela denegação da ordem (evento 9, PARECER1).

Os autos vieram conclusos para julgamento em 19.12.2022 (Evento 10).

É o relatório.

VOTO

Quando da análise do pedido liminar, em 06.12.2022, entendi que era caso de indeferimento do pedido, nos seguintes termos:

"(...)

A decisão que decretou a preventiva da paciente, datada de 18.10.2022, por representação da autoridade policial, foi, assim, fundamentada (evento 7, DESPADEC1):

Vistos.

1. Trata-se de analisar representação da autoridade policial pela decretação da prisão preventiva de GALINA SANIE MDAKANE, JOSEPHINA KWALIMUSHE AMUTSE, MOSES OGEH FRIDAY, SAHEED ISHOLA ADEMOLA e SILVANIA DA SILVA LIMA, pela prática, em tese, do crime de estelionato contra idoso, que teve início em janeiro do corrente ano (evento 1, DOC1).

Com vista, o Ministério Público manifestou-se pelo parcial acolhimento da representação, com decretação das prisões preventivas de GALINA SANIE MDAKANE, JOSEPHINA KWALIMUSHE AMUTSE e MOSES OGEH FRIDAY (evento 5, DOC1).

É o sucinto relatório. Decido.

Os requisitos para a decretação da prisão preventiva encontram-se previstos no artigo 312 do CPP, que estabelece que A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver [1] prova da existência do crime e [2] indício suficiente de autoria e de [3] perigo gerado pelo estado de liberdade do imputado”.

Além disso, o § 2º desse mesmo dispositivo impõe que a decisão que decretar a prisão preventiva deve ser motivada e fundamentada em receio de perigo e existência concreta de fatos novos ou contemporâneos que justifiquem a aplicação da medida adotada”.

Disso se extrai, portanto, que prova da materialidade e indício suficiente de autoria (fumus comissi delicti) configuram pressupostos para que se possa avançar na análise, verificando-se a presença de algum dos requisitos para a prisão (garantia da ordem pública, ordem econômica, conveniência da instrução, ou para assegurar a aplicação da lei penal), além do periculum libertatis (perigo gerado pelo estado de liberdade do imputado).

E no caso dos autos, verifica-se que a prova da materialidade do fato e os indícios suficientes de autoria decorrem do teor do registro da ocorrência policial, do depoimento prestado pela vítima e do auto de reconhecimento por fotografia, além das demais peças que instruem o pedido.

Conforme se extrai da representação, a vítima Léo Domingo Tolio, com 78 anos de idade, em depoimento à autoridade policial contou que iniciou um conversa com uma mulher no Facebook, que se dizia soldada norte-americana e estaria realizando missão na Síria, referindo que teriam invadido uma base militar naquele país, encontrando diversas caixas contendo milhões de dólares e que ela estava disposta a investir o dinheiro do Brasil. Relatou que, com a finalidade de transferir os dólares para o Brasil, fez transferências para as contas de Josephine Amutse, Juliana Camargo Volpato Rosseti, Galina Sanie Mdakane e Moses Ogeh Friday, totalizando a importância de R$ 257.150,00 (duzentos e cinquenta e sete mil cento e cinquenta reais). Ainda, teria conversado com um suposto diplomata denominado "Rodrigues", que esteve em Santa Maria/RS, portando uma mala com um cofre dentro, sendo que encontrou tal diplomata no Hotel Paraíso. Aduziu que após esse encontro, o suposto diplomata passou a solicitar mais dinheiro para o envio de mais dólares, sendo que só percebeu tratar-se de um golpe quando seu filho o alertou.

A vítima reconheceu, através de fotografia, a pessoa de Mosés, como sendo o "diplomata Rodrigues", apontando sem sombra de dúvidas como sendo o representado (evento 2, DOC3).

No curso da investigação a autoridade policial realizou quebras de sigilos bancários e buscou dados junto à Polícia Federal, apurando que Josephine é natural da Namibia, Galina natural da África do Sul, Moses e Saheed naturais da Nigéria. Ainda, realizada a quebra de dados bancários, a autoridade policial apurou que foram realizadas transferências de valores da conta de Juliana para Emeka, Clarisse e Josephina, bem como constatou que a conta bancária em nome de Juliana foi aberta com documentação falsa.

E além dessas circunstâncias, a autoridade policial apontou a participação de cada um dos representados na empreitada delituosa, o que demonstra o fumus comissi delicti, nos seguintes termos:

"(...) MOSES OGEH FRIDAY: recebeu diretamente em sua conta a quantia de R$ 226.000,00, transferiu para outra conta em seu nome a quantia de R$ 100.000,000, além de ter efetuado diversos saques, compras, pagamentos de parcelas de financiamentos, quitado um empréstimo no valor de R$ 18.743,19, com os valores oriundos das transferências realizadas pela vítima

JOSEPHINA KWALIMUSHE AMUTSE: recebeu diretamente em sua conta corrente a quantia de R$ 6.450,40, utilizou documentos falsos para abrir conta em nome de Juliana Camargo Volpato Rossetti, recebendo nessa conta R$ 15.200,00.

GALINA SANIE MDAKANE: beneficiária do valor de R$ 9.550,00 diretamente da conta da vítima em 24/03/2022. A quebra de sigilo da conta da investigada até o presente momento não houve resposta da instituição financeira. GALINA aparece como beneficiária da quantia de R$ 5.000,00 transferidos da conta do investigado MOSES OGEH FRIDAY, no dia 27/04/2022 e enviando diversas transferências para a conta de JOSEPHINA KWALIMUSHE AMUTSE, comprovando a ligação entre os investigados.

SAHEED ISHOLA ADEMOLA: Saheed recebe a quantia de R$ 18.900,00 da conta do investigado MOSES OGEH FRIDAY. Essas transferências são realizadas em diversos dias, o que demonstra não ser um fato isolado na conduta dos investigados.

SILVANIA DA SILVA LIMA: sua conta corrente é repassada para a vítima para que ela transfira parte do valor de R$ 200.000,00 que lhe fora solicitado, mas que ela acabou não realizando a transferência. Depois seu nome aparece em três transferências na conta de MOSES OGEH FRIDAY. Após diligências e consultas, constatou-se que SILVANIA é companheira de MOSES, tendo com ele dois filhos.(...)"

Presente, portanto, o fumus comissi delicti.

Quanto aos requisitos da medida, apontou a autoridade policial a necessidade de acautelamento da ordem pública, conveniência da instrução criminal, além da necessidade de assegurar a aplicação da Lei Penal.

O Ministério Público, no entanto, com vista, apontou como necessária a prisão tão somente dos representados GALINA SANIE MDAKANE, JOSEPHINA KWALIMUSHE AMUTSE e MOSES OGEH FRIDAY, como forma de acautelar-se a ordem pública.

E no particular caso dos autos, ainda que se trate de delito praticado sem violência ou grave ameaça, tem-se como presentes os requisitos apontados pelo Ministério Público e pela autoridade policial, pois imprescindível, diante das particulares circunstâncias em que o fato foi praticado, a medida extrema, afinal, nos termos do que apurou a autoridade policial, trata-se de organização criminosa formada por estrangeiros, em processo de expulsão do país, por terem sido condenados por tráfico internacional de drogas.

Observo, nesse particular, que conforme informado pela Polícia Federal no evento 1, DOC3, JOSEPHINA e GALINA não foram sequer encontradas para serem notificadas da expulsão, ao passo a que MOSES, notificado, informou endereço inexistente.

Ademais, os acusados, que vieram para o Brasil traficando entorpecentes, o que por si só já demonstra...

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