Acórdão nº 52485086320218217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Oitava Câmara Criminal, 23-02-2022

Data de Julgamento23 Fevereiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualHabeas Corpus
Número do processo52485086320218217000
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoOitava Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001560266
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

8ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Habeas Corpus (Câmara) Nº 5248508-63.2021.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Crimes de Trânsito (Lei 9.503/97

RELATOR: Desembargador LEANDRO FIGUEIRA MARTINS

PACIENTE/IMPETRANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

IMPETRADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

LORENZO ALBERTO PAULO, advogado, impetrou habeas corpus em favor de VANDERLEI PORCIUNCULA DUARTE.

Em suma, sustentou que: (a) foi negado "o oferecimento do acordo de não persecução penal em razão dos antecedentes do paciente e da sua conduta habitual criminal, mesmo não havendo quaisquer elementos que indicassem tais circunstâncias" (processo 5248508-63.2021.8.21.7000/TJRS, evento 1, INIC1, fl. 2); (b) "a PGJ, ao revisar o pedido do ANPP, também recusou a propositura do ajuste (processo 5248508-63.2021.8.21.7000/TJRS, evento 1, INIC1, fl. 2); (c) "ao prescrutar-se a certidão judicial criminal do paciente (anexa), constata-se que não há qualquer condenação que indique antecedentes e conduta habitual criminal" (processo 5248508-63.2021.8.21.7000/TJRS, evento 1, INIC1, fl. 2); (d) "somente existem termos circunstanciados em andamento, que, de qualquer forma, não devem ser utilizados para fundamentar eventuais antecedentes e conduta habitual criminal" (processo 5248508-63.2021.8.21.7000/TJRS, evento 1, INIC1, fl. 3); (e) "a existência de procedimentos policiais nunca poderá servir à comprovação de maus antecedentes e de conduta habitual criminal, em virtude da garantia constitucional de não culpabilidade, esculpida no art. 5º, inciso LVII, da Constituição Federal" (processo 5248508-63.2021.8.21.7000/TJRS, evento 1, INIC1, fl. 3); (f) "é cristalino que o acordo de não persecução penal é cabível após o recebimento da denúncia" (processo 5248508-63.2021.8.21.7000/TJRS, evento 1, INIC1, fl. 7); (g) "a Procuradoria Geral de Justiça simplesmente sustentou que o acordo de não persecução penal seria insuficiente para a reprovação e prevenção do delito, sem qualquer fundamentação, sendo que a própria PGJ, em seu parecer, afirmou que a negativa deve ser fundamentada" (processo 5248508-63.2021.8.21.7000/TJRS, evento 1, INIC1, fl. 8).

Pediu, ao final, a concessão da ordem, "para que seja determinada a propositura do acordo de não persecução penal ao paciente". Subsidiariamente, postulou "o retorno dos autos ao órgão acusador para que, acaso não reconsidere sua decisão, apresente motivação idônea que sustente a negativa em propor ao paciente a celebração de acordo processual legalmente previsto" (processo 5248508-63.2021.8.21.7000/TJRS, evento 1, INIC1).

Sobrevieram as informações requisitadas à autoridade apontada como coatora (processo 5248508-63.2021.8.21.7000/TJRS, evento 11, PROMOÇÃO1).

A Procuradoria de Justiça lançou parecer, manifestando-se pela denegação da ordem (processo 5248508-63.2021.8.21.7000/TJRS, evento 14, PARECER1).

Conclusos para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Consoante mencionado no relatório acima, foi impetrada a ordem de habeas corpus em favor de VANDERLEI PORCIUNCULA DUARTE, sendo objeto da demanda o acordo de não persecução penal (ANPP) previsto no artigo 28-A do Código de Processo Penal (CPP).

A despeito da referência à Procuradora-Geral de Justiça do Rio Grande do Sul em exercício como autoridade coatora, juntamente com a 2ª Promotora de Justiça da Promotoria de Justiça de Capão da Canoa/RS, o polo passivo fica restrito à última, na medida em que, objetivamente, foi quem definiu pela não apresentação do ANPP.

Passando ao mérito, diante da manifestação do Ministério Público, estando adequadamente fundamentada a questão, não é caso de concessão da ordem, destacando-se haver, com relação à impossibilidade de cabimento do ANPP, atenção ao disposto no artigo 28-A do CPP1.

Neste contexto, transcrevo, inicialmente, o pronunciamento do Ministério Público na origem, subscrito pela Procuradora-Geral de Justiça em exercício (processo 5012779-70.2021.8.21.0141/RS, evento 26, PARECER1):

"2. Acordo de não persecução penal não configura direito subjetivo do investigado.

O caput do artigo 28-A do Código de Processo Penal é expresso ao consignar que o Ministério Público poderá propor o acordo de não persecução penal.

Neste sentido, o enunciado elaborado pelo Grupo Nacional dos Coordenadores de Centro de Apoio Criminal do Conselho Nacional dos Procuradores-Gerais - GNCCRIM/CNPG:

ENUNCIADO 19 (ART. 28-A, CAPUT) O acordo de não persecução penal é faculdade do Ministério Público, que avaliará, inclusive em última análise (§ 14), se o instrumento é necessário e suficiente para a reprovação e prevenção do crime no caso concreto.

Assim sendo, cabe ao Ministério Público, com exclusividade, a apreciação do preenchimento, ou não, pelo imputado, dos requisitos legais para o oferecimento do acordo de não persecução penal, nos termos do artigo 28-A do Código de Processo Penal. A negativa de proposta por parte do Ministério Público, na qualidade de titular da ação penal, desde que fundamentada, é ato legítimo, o qual não comporta revisão judicial.

3. O acordo de não persecução penal deve ocorrer antes do recebimento da denúncia.

O momento adequado para deliberar sobre o (des)cabimento do acordo de não persecução penal é a fase pré-processual, tanto que o artigo 28-A, caput, do Código de Processo Penal, refere-se expressamente à realização da avença com o investigado, situação jurídica distinta da figura do réu, ou seja, o acordo de não persecução penal é viável antes do juízo positivo de admissibilidade da acusação.

Esta conclusão decorre da própria natureza do acordo de não persecução penal, que, na essência, é o negócio entre investigado e Ministério Público, no qual este deixa de oferecer a denúncia, desde que aquele cumpra determinadas condições.

Destarte, oferecida e recebida a denúncia no caso em relevo, é inviável o acordo de não persecução penal neste momento processual.

4. Não preenchimento dos requisitos legais para a formalização do acordo de não persecução penal.

Assentado que não há direito subjetivo do investigado à proposta de acordo de não persecução penal, cumpre analisar se estão presentes os pressupostos e os requisitos legais para a solução consensual do caso.

Assiste razão a agente ministerial da origem, que deixou de oferecer o acordo de não persecução penal, mediante alegação de que o instituto não é suficiente para prevenção e reprovação do crime.

Vale lembrar que o artigo 28-A do Código de Processo Penal dispõe ser viável o acordo de não persecução penal, desde que necessário e suficiente para a reprovação e a prevenção do crime.

Por conseguinte, ausentes os pressupostos previstos no artigo 28-A do Código de Processo Penal, apresentando-se como adequada a recusa de proposta de acordo de não persecução penal exarada pelo agente ministerial em atuação no feito.

5. Pelo exposto, ratifico a manifestação defendida pelo Ministério Público na origem, mantendo-se a negativa de oferecimento do acordo de não persecução penal ao denunciado Vanderlei Porciuncula Duarte".

Com efeito, não se constata flagrante ilegalidade a justificar o deferimento da ordem de habeas corpus.

Isto porque o acordo de não persecução penal - trazido ao ordenamento jurídico por meio da Lei n. 13.964/2019 -, pelo que se retira do disposto no artigo 28-A do CPP, anteriormente mencionado, constitui prerrogativa do Ministério Público, não direito subjetivo absoluto do acusado.

Neste sentido, menciono julgado do Supremo Tribunal Federal (STF):

"AGRAVO REGIMENTAL. HABEAS COUS. ACORDO DE NÃO PERSECUÇÃO PENAL EM RELAÇÃO AO DELITO DE ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO DE DROGAS (ART. 35 DA LEI 11.343/2006). INVIABILIDADE.
1. As condições descritas em lei são requisitos necessários para o oferecimento do Acordo de Não Persecução Penal (ANPP), importante instrumento de política criminal dentro da nova realidade do sistema acusatório brasileiro. Entretanto, não obriga o Ministério Público, nem tampouco garante ao acusado verdadeiro direito subjetivo em realizá-lo. Simplesmente, permite ao Parquet a opção, devidamente fundamentada, entre denunciar ou realizar o acordo, a partir da estratégia de política criminal adotada pela Instituição.
2. O art. 28-A do Código de Processo Penal, alterado pela Lei 13.964/19, foi muito claro nesse aspecto, estabelecendo que o Ministério Público "poderá propor acordo de não persecução penal, desde que necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime, mediante as seguintes condições".
3. A finalidade do ANPP é evitar que se inicie o processo, não havendo lógica em se discutir a composição depois da condenação, como pretende a defesa (cf. HC 191.464-AgR/SC, Primeira Turma, Rel. Min. ROBERTO BARROSO, DJe de 26/11/2020).
4. Agravo Regimental a que nega provimento" (HC 191124 AgR, Relator(a): ALEXANDRE DE MORAES, Primeira Turma, julgado em 08/04/2021, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-069 DIVULG 12-04-2021 PUBLIC 13-04-2021).

Nesta ótica, o Ministério Público, quando da apresentação da denúncia, justificou a razão pela qual deixou de oferecer o referido acordo ao paciente VANDERLEI, nos seguintes termos (Evento 1, INIC1, Ação Penal):

"O Ministério Público deixa de oferecer a suspensão condicional do processo e acordo de não persecução penal, uma vez que ele, conforme a certidão judicial criminal em anexo, possui antecedentes e conduta habitual criminal, circunstâncias que impedem a celebração do ajuste, conforme caput do artigo 89 da Lei 9.099/95 e vedação do §2º, inciso II, do art. 28-A do CPP (CERTANTCRIM1 do evento 05)".

Por conseguinte, estando fundamentada a razão para o não oferecimento do ANPP, adequado todo o procedimento adotado na origem, destacando-se, como fundamento à presente decisão, julgado desta 8ª Câmara Criminal:

"HABEAS COUS. RECEPTAÇÃO....

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT