Acórdão nº 70078605201 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quarta Câmara Criminal, 20-04-2023

Data de Julgamento20 Abril 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualCrimes de Calúnia, Injúria e Difamação de Competência do Juiz Singular
Número do processo70078605201
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoQuarta Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO


JCF

Nº 70078605201 (Nº CNJ: 0225732-62.2018.8.21.7000)

2018/Crime


AÇÃO PENAL ORIGINÁRIA.
PREFEITO. QUEIXA-CRIME. CRIMES CONTRA A HONRA. CALÚNIA. ART. 138 DO CP. DIFAMAÇÃO. ART. 139 DO CP. AUSÊNCIA DE FATOS DETERMINADOS. HONRA SUBJETIVA. PRESCRIÇÃO.

1. Pratica o crime do art. 138 do CP quem, com animus caluniandi, imputa a alguém fato definido como crime. No caso em apreço, não há imputação de fato criminoso determinado ao querelante. Fato atípico.
2. Pratica o crime do art. 139 do CP quem, com animus difamandi, imputa a alguém fato ofensivo a sua reputação. Na espécie, apesar de o Prefeito ter dirigido publicamente diversas ofensas em desagravo ao querelante, em limites que extrapolam a liberdade de expressão, por conta da falta de indicação de fato determinado, as qualidades depreciativas utilizadas no discurso atingem tão somente a honra subjetiva do querelante, objeto do crime de injúria.
3. Deve ser extinta a punibilidade do acusado quando superado o prazo previsto no art. 109, VI, do CP, aplicável ao crime do art. 140 do CP, desde o recebimento da denúncia.

EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE.

Crime de Calunia Injur Difamac


Quarta Câmara Criminal

Nº 70078605201 (Nº CNJ: 0225732-62.2018.8.21.7000)


Comarca de Bagé

LUIZ FERNANDO MAINARDI


QUERELANTE

DIVALDO VIEIRA LARA


QUERELADO

MINISTERIO PUBLICO


INTERESSADO


ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.


Acordam os Desembargadores integrantes da Quarta Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em julgar extinta a punibilidade do querelado, com base no art. 107, IV, do CP.

Custas na forma da lei.


Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores Des.
Rogério Gesta Leal (Presidente) e Des.ª Gisele Anne Vieira de Azambuja.

Porto Alegre, 20 de abril de 2023.


DES. JULIO CESAR FINGER,

Relator.


RELATÓRIO

Des. Julio Cesar Finger (RELATOR)

LUIZ FERNANDO MAINARDI, Deputado Federal já qualificado, ofereceu queixa-crime contra DIVALDO VIEIRA LARA, Prefeito Municipal de Bagé/RS, imputando a ele a prática de crimes contra a honra, noticiados nas fls.
02/18.

Afirma que, no dia 19 de março de 2018, tomou conhecimento de vídeo publicado na rede social Facebook (na página do ?
Movimento Avança Brasil?) em que o querelado fez afirmações ofensivas a sua reputação, chamando-o de corrupto, e imputou a ele a prática de crimes, dentre os quais, o peculato, desvio de rendas públicas e dano. No mesmo dia, o Prefeito teria novamente proferido declarações ofensivas à reputação do Deputado e de seus correligionários, durante entrevista concedida à Rádio Difusora, dizendo terem eles desviado dinheiro público e se apropriado de bens móveis existentes na Prefeitura Municipal, quando estavam no governo. Diz se tratar de conduta reiterada do querelado, citando como exemplo os anteriores Pedidos de Explicações protocoladas neste Tribunal sob o número 70073840969 e 70075473579. Acostou documentos (fls. 19/86).

Notificado (fl. 91), o querelado apresentou resposta (fls.
131/156). Alega, preliminarmente, a deficiência do instrumento do mandato, que fez simples referência ao nomen juris da conduta imputada. Entende, outrossim, que a inicial é inepta, pois informou a prática de difamação e postulou a condenação pela prática de injúria, deixando de descrever esta última e de postular em relação à primeira. Afirma, por outro lado, ter ocorrido a decadência, pois os pedidos de explicação acostados (70073840969 e 70075473579) correspondem a fatos ocorridos em 19/02/2017 e 23/05/2017. No mérito propriamente dito, afirma dever ser rejeitada a queixa por falta de justa causa, por não ter sido verificada acusação específica ao querelante, senão discurso com viés político pautado em fatos passíveis de comprovação. Pede, assim, a rejeição da queixa-crime.
Certificados os antecedentes junto à Justiça Estadual, Federal e Eleitoral (fls.
94/116).

Intimado o querelante a propósito da resposta escrita (fls.
166/167), requereu o recebimento da queixa.

O Ministério Público, então, opinou pela designação de audiência preliminar de tentativa de conciliação e/ou análise da aplicação dos institutos despenalizadores da Lei 9.099/95.
A sugestão foi acolhida na fl. 188 e, embora tenha sido designada a audiência em duas oportunidades (fl. 490), resultaram inexitosas (fls. 215/216 e 224/225).

Dada vista ao Ministério Público (fl. 228), opinou pelo recebimento da queixa-crime (fls.
230/231).

A queixa-crime foi recebida por esta Câmara na sessão do dia 29/08/2019, em decisão assim ementada:

Ementa: AÇÃO PENAL.
LEI Nº 8.038/90. QUEIXA-CRIME. PREFEITO. CALÚNIA. ART. 138 DO CP. DIFAMAÇÃO. ART. 139 DO CÓDIGO PENAL. PRELIMINAR. PROCURAÇÃO. ART. 44 DO CPP. REQUISITOS PREENCHIDOS. ART. 41 DO CPP. JUSTA CAUSA. FATOS, EM TESE, TÍPICOS. RECEBIMENTO. 1. Segundo entendimento firmado no STJ, a procuração outorgada para fins de propositura de queixa-crime, nos termos do art. 44 do CPP, não exige descrição pormenorizada do fato, bastando menção a ele, que resulta satisfeita tanto pela indicação do artigo de lei quanto da denominação legal do crime cuja prática é atribuída ao querelado. Precedentes. Não bastasse isso, na hipótese em tela, eventual mácula que pudesse ser reconhecida se encontra superada pelo fato da querelante ter firmado a inicial juntamente com seus procuradores, sendo que os poderes especiais podem ser substituídos pela assinatura aposta diretamente na queixa. Precedentes. 2. Atendidos os requisitos do art. 41 do CPP na peça acusatória e, presente justa causa para o processamento do feito, não estando configurada qualquer das condições para a sua rejeição, deve ser recebida a queixa-crime que imputa ao Prefeito Municipal a prática, em tese, dos crimes previstos no art. 139 do Código Penal. No caso, os elementos coletados apontam para a possível prática dos crimes de calúnia e difamação nas manifestações efetuadas pelo Prefeito Municipal, que apontou ter o querelado, Deputado Federal, se apropriado de verbas públicas, causado danos, entre outros, além de não ser dotada de predicados apontados como inerentes ao povo do município, em desprestígio a sua reputação. Nesse passo, a tese sustentada pela defesa de insuficiência de provas do dolo deve ser dirimida no momento próprio, ao final da instrução judicializada. Nesta quadra processual, de mero juízo de admissibilidade da acusação, havendo prova da materialidade e indícios suficientes de autoria, impõe-se o recebimento da queixa-crime, quando ausente qualquer das hipóteses previstas nos arts. 395 e 397 do CPP. 3. As declarações efetuadas pelo querelado apontam para possível excesso, ainda que proferidas em meio ao contexto de debate e disputa política, situação que depende de apuração. PRELIMINARES REJEITADAS. QUEIXA-CRIME RECEBIDA.(Crimes de Calúnia, Injúria e Difamação de Competência do Juiz Singular, Nº 70078605201, Quarta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Julio Cesar Finger, Julgado em: 29-08-2019)

O querelado apresentou resposta à acusação (fls.
278/301).

No curso da instrução, foram ouvidas testemunhas e interrogado o querelado (fls.
357/369, 373/374, 377/381).

Apresentadas alegações escritas pelo querelante (fls.
401/411) e pelo querelado (fls. 415/424).

O Ministério Público lançou manifestação nas fls.
426/436, opinando pela improcedência da ação penal privada, com base no art. 386, III, do CPP.

Vieram os autos conclusos para decisão.

É o relatório.

VOTOS

Des. Julio Cesar Finger (RELATOR)

A inicial acusatória imputa a DIVALDO VIEIRA LARA a prática dos crimes de calúnia e difamação, em face de LUIZ FERNANDO MAINARDI, por fatos ocorridos nos dias 19/03/2018 e 20/03/2018, ambos no Município de Bagé.


De plano, inicio pela transcrição de parte da decisão que recebeu a denúncia, dando conta da prova da materialidade e dos indícios de autoria:

As condutas apontadas na queixa-crime possuem amparo nos documentos das fls.
19/26, sobretudo as atas notariais (fls. 19 e 22) e áudios (fl. 22v) que registraram os eventos narrados. Neles, aponta-se que o querelado ? Prefeito Municipal de Bagé ? fazendo uso da palavra, primeiramente, por meio de rede social, e, mais tarde, na rádio local, proferiu críticas direcionadas ao Deputado querelante, também...

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