Acórdão nº 70082549460 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Terceiro Grupo de Câmaras Criminais, 29-01-2021

Data de Julgamento29 Janeiro 2021
ÓrgãoTerceiro Grupo de Câmaras Criminais
Classe processualRevisão Criminal
Número do processo70082549460
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO




LAS

Nº 70082549460 (Nº CNJ: 0226855-61.2019.8.21.7000)

2019/Crime


AÇÃO DE REVISÃO CRIMINAL.
ESTUPRO DE VULNERÁVEL. JUSTIFICAÇÃO CRIMINAL. NOVA DECLARAÇÃO DA VÍTIMA. PROVA INSUFICIENTE. CONDENAÇÃO MANTIDA.

Na espécie, a simples retratação isolada da ofendida, mesmo que produzida mediante ação de justificação judicial, com observância dos princípios do contraditório e da ampla defesa, não se mostra hábil e suficiente para desconstituir a sentença condenatória e, consequentemente, o acórdão correlato, fundada em condenação por prova falsa.
Na hipótese vertida, a condenação se baseou também em outros elementos, os quais não são afetados por essa nova declaração da ofendida.

REVISÃO CRIMINAL JULGADA IMPROCEDENTE.
UNÂNIME.
Revisão Criminal


Terceiro Grupo Criminal

Nº 70082549460 (Nº CNJ: 0226855-61.2019.8.21.7000)


Comarca de Passo Fundo

J.

.
.
REQUERENTE

M.R.-.
M.P.E.R.G.S.

..
REQUERIDO


ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.


Acordam os Magistrados integrantes do Terceiro Grupo Criminal do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em julgar improcedente a revisão criminal.

Custas na forma da lei.


Participaram do julgamento, além da signatária, os eminentes Senhores Des.
Ivan Leomar Bruxel (Presidente) e Des. Sérgio Miguel Achutti Blattes, Dr. Ricardo Bernd, Dr. Volnei dos Santos Coelho.

Porto Alegre, 29 de janeiro de 2021.

DES.ª LIZETE ANDREIS SEBBEN,

Relatora.


RELATÓRIO

Des.ª Lizete Andreis Sebben (RELATORA)

Cuida-se de Revisão Criminal, com pedido liminar, proposta pela defesa constituída de J.S.F, condenado pela prática do delito de estupro de vulnerável, à pena privativa de liberdade de 12 anos de reclusão, em regime fechado.


A defesa pede, em síntese, a revisão da condenação, sustentando a ausência de provas quanto à prática delitiva.
Afirma que, em ação de justificação, houve retratação por parte da vítima. Nesses termos, requer, liminarmente, a suspensão do cumprimento do mandado de prisão; e, no mérito, a procedência da ação de revisão criminal, para que o réu seja absolvido.

A liminar restou indeferida.


Apensado CD contendo a mídia referente à justificação criminal.


Em parecer, da lavra do Dr. Silvio Miranda Munhoz, a Procuradoria de Justiça opinou pela improcedência da revisão criminal.


Por fim, vieram os autos conclusos para julgamento.


O 3º Grupo Criminal desta Corte procedimentaliza a regra do art. 170, inc.
II, e § 1º, do RITJRS, no âmbito do sistema processual informatizado \"Themis2G\", com a disponibilização de relatório no corpo do próprio voto do Relator.

É o relatório.

VOTOS

Des.ª Lizete Andreis Sebben (RELATORA)

Na espécie, tenho que a presente revisão criminal não merece procedência.
Explico.
O art. 621 do Código de Processo Penal elenca, de forma taxativa, as hipóteses de cabimento da revisão criminal, nos seguintes termos:
Art. 621.
A revisão dos processos findos será admitida:
I - quando a sentença condenatória for contrária ao texto expresso da lei penal ou à evidência dos autos;
II - quando a sentença condenatória se fundar em depoimentos, exames ou documentos comprovadamente falsos;
III - quando, após a sentença, se descobrirem novas provas de inocência do condenado ou de circunstância que determine ou autorize diminuição especial da pena.


Assim, a ação revisional tem por finalidade principal corrigir erros judiciários, não se prestando, no entanto, para rediscutir a prova dos autos, já que não se trata de recurso, mas sim de uma ação de rescisão da res judicata, expressamente prevista no ordenamento processual penal.
Dita demanda não se trata, portanto, de uma nova instância recursal de julgamento.

Pois bem.
No caso sob análise, em ação de justificação judicial (CD de mídia acostado), a ofendida prestou nova declaração sobre os fatos, referindo que mentiu sobre os abusos, sendo forçada pela madrasta a imputar ao requerente a prática de atos sexuais contra ela.


Diante disso, o requerente pleiteia a revisão do processo com base na nova declaração dada em Juízo pela vítima.


Ocorre que a declaração em questão não se mostra suficiente para desconstituir a sentença condenatória e o acórdão proferido no julgamento do recurso de apelação (recurso defensivo desprovido, de forma unânime), uma vez que a prova produzida ao longo do feito é apta e segura para fins de manutenção da condenação do ora requerente.


Com efeito, a alegação de que a sentença condenatória se fundou em prova falsa, consubstanciada nos depoimentos da vítima, que era sobrinha do requerente à época dos fatos, não merece amparo.


Digo isso porque as demais provas supervenientes são firmes e convincentes no tocante à materialidade e à autoria do crime sexual praticado pelo requerente contra a ofendida.


Pela pertinência, transcrevo a análise realizada no acórdão referente ao recurso de apelação nº 70058735846, senão vejamos:

?
(...)

A denúncia imputa ao réu a prática do crime de estupro de vulnerável.


A sentença vergastada acolheu a imputação, julgando procedente a ação penal.


Não prospera a pretensão recursal absolutória.


A autoria e a materialidade restam demonstradas pelos elementos probatórios coligidos, mormente pelos depoimentos colhidos em audiência de instrução, detidamente analisados pelo Exmo.
Juiz de Direito Dr. Orlando Faccini Neto, em sua sentença, que mantenho por seus próprios e jurídicos fundamentos, os quais, rogada vênia, adoto como razões de decidir:

?
A condenação por este delito acarreta consequências inestimáveis à vida de um acusado, pois além da restrição da liberdade, o estigma decorrente da pena o acompanhará por um longo período. Contudo, comprovada a prática do crime, a sanção imposta torna-se necessária, ainda mais quando o delito é cometido contra crianças, as quais geralmente são ludibriadas por meio da confiança depositada no abusador, indivíduo que, na maioria das vezes, trata-se de pessoa que pertence ao seu núcleo familiar ou social, e pela qual geralmente a vítima nutre sentimentos sinceros e amorosos. A gravidade de tal prática é, aliás, constitucionalmente reconhecida, como faz crer o artigo 227, paragrafo 4º da Constituição Federal.

Trata-de do presente caso.
A vítima A. era sobrinha do acusado J. que, à época dos fatos, a hospedava em sua residência.

A materialidade do crime está demonstrada pelo boletim de ocorrência n.º 21800/2011 (fls.
09/10), pelo auto de exame de corpo de delito (fl. 21), pela cópia da certidão de nascimento de A.R. de B. (fl. 20), pelos termos de declarações (fls. 12/13, 16/19 e 34), pelo laudo psicológico da vítima Suzana Lemes (fls. 13/28), pelo auto de arrecadação (fls. 30/33), pelo boletim de ocorrência n.º 27873/2001 (fls. 37/38), pelo boletim de ocorrência n.º 21765/2011 (fls. 39/40) e pela prova oral coligida ao processo.

A autoria é certa e recai sobre o réu.


Ao ser interrogado, J. dos S.F. informou que era inocente das acusações feitas contra sua pessoa.
Relatou que o pai da vítima, seu ex-cunhado, sempre foi ausente na vida dos filhos, sendo que os mais velhos são drogados e, inclusive, estão presos. Quanto aos fatos, explicou que possivelmente esta acusação foi inventada pela vítima em virtude de vários motivos, dentre eles, por ela ter ?namoradinhos? e esconder de seus pais, ou, em razão de sua madrasta, M.L., tê-la pego no flagra nua com um menino dentro de um carro, ou ainda, pelo fato do pai e da madrasta da vítima afirmarem a ela e seu irmão que, caso não se comportassem, iriam para a FEBEM. Mencionou que foi autor de diversas denúncias de maus-tratos, as quais teriam sido praticadas por M.L., contra Jo., irmão da vítima. Por fim, frisou que, durante o processo, a data do possível abuso foi referida de maneira divergente pelas testemunhas, fato que denota a sua inveracidade. Segue o teor do interrogatório (fls. 230/233):

Juiz: Aconteceu isso aqui, J.?


Interrogando: Referente a esses fatos que estão relacionados ai que eu teria abusado da minha sobrinha A., não aconteceu nada, sou inocente, desde o inicio eu relatei pro meu cunhado, relatei na Delegacia de Policia, inclusive fui eu que fiz a primeira ocorrência, antes da M.L. e do P., porque ela já tinha apontado pra mãe dela e pra toda vizinhança que eu era um estuprador.
Relatei na Delegacia da Criança e do Adolescente também, que era inocente, e aqui também digo que sou inocente, nunca fiz nada.

Juiz: E por que surge essa acusação aqui, a que o senhor atribui isso?


Interrogando: Queria pedir permissão pro senhor pra relatar essa historia que ela, posso até complementar melhor, (...) algumas perguntas ali que fica assim meio difícil de entender, porque tem uma acusação, eu dou razão ao meu cunhado, ele é uma ótima pessoa, trabalhador honesto, tudo, só que ele tem um defeito como pai, como pai ele é um pai ausente, inclusive ele tem dois filhos presos que eu ajudei a criar nos meus braços, até me comovi a hora que minha cunhada falou que os filhos dele, ele nunca foi visitar no presídio e coisa.
Então como pai e como marido pra mulher dele, ele foi um pai ausente, mas como cidadão, como homem, vinte e dois anos nós temos de amizade. Então eu falei pra ele \"P., não podemos botar essa nossa amizade fora assim, de vinte e dois anos, vamos esclarecer, se fosse comigo, com minha filha\", que minha filha tem quase a idade dele, \"eu faria a mesma coisa que você, eu queria averiguar os fatos e se fosse verdade e coisa, cadeia no criminoso\", até porque como eu citei ali, eu trabalho a mais de dezessete anos com crianças, nesse meio, eu entendo um pouco do assunto também. o que aconteceu, esse fato aí, até o momento nós vivíamos tranquilos, vinte e dois anos ali, embora eu tenha morado quatro anos lá em Araranguá com a minha cunhada, mas eu tinha casa do lado ali, nossa relação sempre normal, eu ajudei sempre ele a criar os filhos desde pequenos, os filhos sempre foram drogados, inclusive estão presos, a menina pegou dezesseis anos de cadeia agora, ano passado minha esposa...

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