Acórdão nº 70083190959 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Oitava Câmara Criminal, 29-06-2022

Data de Julgamento29 Junho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo70083190959
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoOitava Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO


NOP

Nº 70083190959 (Nº CNJ: 0291004-66.2019.8.21.7000)

2019/Crime


apelação crime.
crimes contra a dignidade sexual. estupro qualificado (1º fato). DESCLASSIFICAÇÃO à importunação sexual. reconhecimento. prática delitiva consumada em momento anterior à ENTRADA EM vigência do artigo 215-A DO CÓDIGO PENAL. PENA COMINADA À CONTRAVENÇÃO PENAL EM VIGOR À ÉPOCA QUE DETERMINA A PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE DA PRETENSÃO PUNITIVA ESTATAL.
Conduta descrita na exordial acusatória que trata sobre a prática de ato libidinoso sem o emprego de violência ou grave ameaça, não se subsumindo à norma prevista no artigo 213, § 1º, do Código Penal, melhor se adequando à importunação sexual, cujas elementares se encontravam dispostas no artigo 61 do Decreto-Lei nº 3.688/1941 à época.


Sanção cominada à figura contravencional que prescreve em 02 (dois) anos, de acordo com o disposto no artigo 114, inciso I, do Código Penal.
Lapso transcorrido entre o recebimento da denúncia e a data de publicação da sentença penal condenatória, ausentes causas suspensivas ou interruptivas. Declaração da prescrição intercorrente da pretensão punitiva estatal.

CONTRAVENÇÕES PENAIS.
IMPORTUNAÇÕES OFENSIVAS AO PUDOR (2º E 3º FATOS). OFENSAS VERBAIS. REVOGAÇÃO DA FIGURA CONTRAVENCIONAL NA QUAL ENQUADRADAS AS CONDUTAS
.
ENQUANDRAMENTO TÍPICO NO ARTIGO 65 DO DECRETO-LEI Nº 3.688/1941
, REVOGADO PELO ADVENTO DO CRIME DE STALKING
.
CONTINUIDADE NORMATIVO-TÍPICA. INOCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE PLURALIDADE DE CONDUTAS. ABOLITIO CRIMINIS OPERADA.
Revogação do artigo 61 da Lei de Contravenções Penais pela Lei nº 14.132/2021 que conduz à subsunção da conduta de proferir ofensas verbais ao pudor alheio à norma prevista no artigo 65 do mesmo Diploma Legal, este superado pela introdução do artigo 147-A ao Estatuto Repressivo.


Continuidade normativo-típica no novo tipo penal incriminador que depende da pluralidade de condutas, sem a qual se opera a abolitio criminis.

Ausência de reiteração que determina a extinção da punibilidade pela retroatividade da lei que não mais considera o fato como criminoso, manifesto vácuo decorrente da sucessão de alterações legislativas.
Inteligência do artigo 107, inciso III, do Código Penal.
DECLARADA EXTINTA A PUNIBILIDADE DO AGENTE PELA PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE DO RÉU (1º FATO) E PELA RETROATIVIDADE DE LEI QUE NÃO MAIS CONSIDERA O FATO COMO CRIMINOSO (2º E 3º FATOS).


Apelação Crime


Oitava Câmara Criminal

Nº 70083190959 (Nº CNJ: 0291004-66.2019.8.21.7000)


Comarca de Bagé

L.A.S.H.

.

APELANTE

M.P.

..
APELADO


ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.


Acordam os Desembargadores integrantes da Oitava Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em declarar extinta a punibilidade do réu, quanto ao 1º fato pela prescrição intercorrente da pretensão punitiva estatal, com fulcro nos artigos 107, inciso IV, e 114, inciso I, ambos do Código Penal, e em relação aos 2º e 3º fatos pela retroatividade de lei que não mais considera o fato como criminoso, nos termos do artigo 107, inciso III, do Estatuto Repressivo.

Custas na forma da lei.


Participaram do julgamento, além da signatária (Presidente), os eminentes Senhores Des.ª Fabianne Breton Baisch e Des.
Leandro Figueira Martins.

Porto Alegre, 29 de junho de 2022.


DES.ª NAELE OCHOA PIAZZETA,

Relatora.


RELATÓRIO

Des.ª Naele Ochoa Piazzeta (RELATORA)

O MINISTÉRIO PÚBLICO ofereceu denúncia contra L. A. S. H., nascido em 14-04-1972 (fl. 24), com 44 anos de idade à época dos fatos, dando-o como incurso nas sanções do artigo 213, § 1º, do Código Penal, com as disposições da Lei nº 8.072/90, e do artigo 61 do Decreto-Lei nº 3.688/1941 (duas vezes), tudo na forma do artigo 69 do Estatuto Repressivo, pelos fatos assim narrados na peça acusatória:

?
[...]

1° FATO DELITUOSO
No dia 16 de dezembro de 2016, por volta das 15h30min, na Rua Nilo Vaz Cachapuzz, n.º [...], bairro Santa Cecília, no Município de Bagé/RS, o denunciado L. A. S. H., constrangeu a vítima M. S. N., mediante violência e grave ameaça, a praticar atos libidinosos diversos da conjunção carnal.

Na ocasião, o denunciado, o qual é pastor da igreja que a vítima frequentava, foi até a residência da ofendida, a pretexto de conversar com ela sobre assuntos religiosos.

Então, a sós com a vítima, o increpado passou a tocar e acariciar suas pernas e seios, sem o consentimento da adolescente, a qual possuía 15 (quinze) anos de idade à época do fato.

Na sequência, o denunciado pediu para M. abraçá-lo e beijá-lo.
Com a negativa da ofendida, o imputado reagiu agressivamente, puxando-lhe o cabelo com força e segurando-a pelo braço.
A vítima, à época do fato era menor de 18 anos - nascida em 04/11/2001, consoante cópia da certidão de nascimento encartada à fl. 09 do inquisitivo.

2° FATO DELITUOSO
No dia 16 de outubro de 2016, por volta das 22h, na Travessa Euclides Moraes, n.º [...], bairro Floresta, no Município de Bagé/RS, o denunciado L. A. S. H. importunou, em lugar acessível ao público, de modo ofensivo ao pudor a vítima J. F. R..

Na ocasião, o denunciado, o qual é pastor de igreja que a vítima frequentava, ao dirigir-se aos fundos do estabelecimento religioso com ela e sua filha de três anos de idade, importunou ofensivamente ao pudor de J., mediante a realização de perguntas e comentários sobre a sua intimidade sexual, questionando a vítima, inclusive: ?
como é que tu gosta de fazer, como tu gosta de dar? Eu sei que tu gosta de dar de quatro?.
3º FATO DELITUOSO
No dia 15 de dezembro de 2016, por volta das 15h, na Travessa Euclides Moares, n.º [...], bairro Floresta, no Município de Bagé/RS, o denunciado L. A. S. H., importunou, em lugar acessível ao público, de modo ofensivo ao pudor, a vítima C. C. R..

Na ocasião, o denunciado, o qual é pastor de igreja que a vítima frequentava, importunou ofensivamente o pudor de C., mediante a realização de perguntas e comentários sobre a sua intimidade sexual, questionando, inclusive, se a ofendida o deixaria ?
olhar? e ?tocar? o seu corpo, bem como se ela se interessava por homens mais velhos.
[...]?.

Denúncia recebida em 19-05-2017 (fl. 33).


Citado pessoalmente (fls.
40-v), o réu apresentou resposta à acusação por intermédio de defensor constituído (fls. 35-36).

Não havendo hipótese ensejadora de absolvição sumária, nos termos do artigo 397 do Código de Processo Penal, foi determinado o prosseguimento do feito (fl. 39).


Durante a instrução, foram colhidas as declarações das vítimas, inquiridas 10 (dez) testemunhas e interrogado o réu (fls.
61-78, 88-111 e 120-122v, CDs das fls. 79, 112 e 123).

Apresentados memoriais pelo Ministério Público (fls.
126-130v) e pela defesa (fls. 133-135).

Atualizados os antecedentes criminais (fl. 136).


Sobreveio sentença (fls.
137-159), publicada em 31-05-2019 (fl. 160), julgando procedente a pretensão punitiva, para condenar o acusado como incurso nas sanções do artigo 213, § 1º, do Código Penal (1º fato), e artigo 61 do Decreto-Lei 3.688/41, duas vezes (2º e 3º fatos), tudo na forma do artigo 69 do Estatuto Repressivo, às penas de 08 (oito) anos e 04 (quatro) meses de reclusão, em regime inicial fechado, e 30 (trinta) dias-multa à razão unitária mínima
.
Custas pelo réu e deferido o direito de recorrer em liberdade.

Intimado da sentença pessoalmente (fl. 178), interpôs recurso de apelação (fl. 166).


Em suas razões, postula a absolvição por insuficiência probatória (fls.
174-177).

Recebida (fl. 171) e contrariada a inconformidade (fls.
180-184), vieram os autos a esta Corte, manifestando-se o ilustre Procurador de Justiça, Luiz Henrique Barbosa Lima Faria Corrêa, pelo desprovimento do recurso defensivo (fls. 187-191v).

Esta Câmara Criminal adotou o procedimento informatizado utilizado pelo TJRS, tendo sido atendido o disposto no art. 609 do Código de Processo Penal, bem como o art. 207, II, do RITJERGS.


Conclusos para julgamento.


VOTOS

Des.ª Naele Ochoa Piazzeta (RELATORA)

Trata-se de recurso de apelação interposto por defensor constituído em favor de L. A. S. H. no qual se insurge da condenação pela prática dos crimes de estupro (1º fato) e importunação sexual (2º e 3º fatos) às penas de 08 (oito) anos e 04 (quatro) meses de reclusão, em regime inicial fechado, e 30 (trinta) dias-multa à razão unitária mínima.


Em suas razões, postula a absolvição por insuficiência probatória (fls.
174-177).
Inicio pelo exame da 1ª conduta descrita na denúncia.


Não colhe.

A materialidade e a autoria do fato em questão vieram demonstradas por meio do registro de ocorrência policial nº 28/2017 (fl. 03 ?
1º fato), bem como pela prova oral colhida
, esta devidamente sintetizada pela julgadora monocrática Naira Melkis Pereira Caminha, ao que transcrevo excerto para evitar desnecessária repetição:

Em relação ao 1º fato descrito na denúncia (vítima M.):

?
[?]Réu: Primeiro o caso esse aí da M. eu estava em casa, ela me ligou de manhã, do telefone do padrasto dela e perguntou se eu estaria na igreja à tarde [...]. Eu disse pra ela que à tarde eu ia na igreja e que passaria na casa para ver o que ela queria, passei na casa dela, estava a mãe dela e o padrasto dela, eles estavam no fundo tomando banho de piscina com a menina pequena e a moça M. estava ali já esperando. [...]. Volta e meia a mãe dela entrava, me oferecendo água, suco [...] o padrasto foi trabalhar, [...] a M. estava em dúvida com algumas coisas da palavra. Ela foi ali, pegou um suco, nós tomamos, eu, a Lídia e a menina conversamos, daqui a pouco eu fui embora [...]. Nós estávamos ali conversando, os três juntos, [...], pra ver que tem coisa aí que não está fechando. Ninguém molestou ninguém e ninguém fez nada, [...] ninguém ficou sozinho com ninguém [?]. Juíza: A que o senhor atribui os depoimentos que elas deram? Réu: [...] isso aí foi tudo dor de cotovelo, ciúmes, [...] tinha um irmão lá que queria [...] aparecer sempre, mas [...] eu faço muita doação de brinquedo, e esse irmão se levantou contra mim em fofoca,...

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